Review | Uncharted 2 – Among Thieves
A primeira entrada da franquia Uncharted – Drake’s Fortune, com lançamento no ano de 2007, contava com uma pequena campanha single-player mas com muitos elementos interessantes e bastante criatividade da desenvolvedora Naughty Dog com fases e jogabilidade eletrizante. A primeira vez que tive a oportunidade de jogar o primeiro game, Uncharted ainda era somente um nome desconhecido na prateleira da locadora. No entanto, assim como a frase que nos é apresentada logo no início desta entrada, grandeza em pequenos começos. Chegou sem grande alarde mas foi recebido de forma muito positiva. O anuncio da sequencia ocorreu logo em seguida e em 2009 recebemos Uncharted 2 – Among Thieves, que viria a se tornar um dos melhores games da história da Playstation e dos games em geral.
Shangri-La
Seguindo a linha do primeiro jogo, Nathan Drake e seus parceiros precisam encontrar uma misteriosa cidade antes que um grupo de mercenários chegue primeiro. A cidade da vez é Shangri-La e o jogo se inspira bastante nas aventuras de Marco Polo e lendas populares para criar a ambientação e movimentar a história do jogo. Apesar de uma trama comum para o tema e já explorada diversas vezes no cinema e nos games (inclusive na primeira entrada da franquia), Nathan Drake e os outros personagens Chloe Frazer, Elena Fisher e Victor Sullivan apresentam um carisma excepcional para a história. A química entre esse grupo principal e a animação dos modelos computadorizados com as expressões, maneirismos e “atuação” parece de um grupo de atores profissionais e a sensação de estarmos em um filme é presente o jogo inteiro. Isso se deve em grande parte à decisão de usar captura de movimentos dos dubladores para algumas cenas, criando uma experiência cinemática plausível.
Eletrizante
Desde o início do jogo, que é contado de modo não-linear, somos presenteados com sequencias cinematográficas de encher os olhos e suar as mãos no controle. Raras vezes na indústria de games um jogo possui fases tão diferenciadas uma das outras, com quebra-cabeças interessantes (embora um pouco mais fáceis que os de seu antecessor), fugas eletrizantes e combates explosivos. As fases mesclam tiroteios com um sistema de cobertura aprimorado e opção de modo furtivo, exploração com bastante escalada que te fará lembrar dos velhos tempos de Prince of Persia, resolução de enigmas e cenas de fuga emocionantes que até hoje são imbatíveis dentro da franquia. Os controles são fáceis de aprender e sem grandes complexidades. Existe uma certa curva de aprendizado ao controlar Drake em partes onde é necessário pular e se pendurar por mapas inteiros que pode deixar um novo jogador frustrado, mas de forma alguma prejudica a experiência do jogo. Por sinal, os momentos de exploração combinados com os gráficos e enquadramento da câmera, entregam bons momentos de relaxamento e diversão.
Cenários
Outro motivo de aplauso para o jogo são seus cenários e ambientação. Seja escapando de um trem dependurado de um penhasco, seja caminhando por um vilarejo nos montes do Tibet ou enfrentando hordas de mercenários no meio das cidades do Nepal, o jogador sempre se sentirá imerso. Pequenos detalhes do mapa como uma prateleira de livros caindo ou pegadas deixadas na neve são feitos com imenso capricho e esmero. Interações de Nathan com personagens não jogáveis também auxiliam nessa imersão. Em termos gráficos, o jogo utiliza tudo que o Playstation 3 têm a oferecer.
Melhorias
Se o primeiro game da franquia possuía uma campanha pequena que se resolvia em poucas horas, Among Thieves traz 20 horas de jogo para seu modo história, que é muito mais adequado ao genêro que as 6 horas de Uncharted – Drake’s Fortune. E mais. Com um novo modo multiplayer local e online, Uncharted agora pode ser jogado com amigos em aventuras co-op. A inteligência artificial dos inimigos foi aprimorada, criando um desafio maior ainda e exigindo mais estratégia do jogador. As expressões faciais e detalhes do rosto possuem notáveis diferenças para seu antecessor, melhorando ainda mais a sensação de estarmos em um filme.
Sucesso
Grandeza em pequenos começos é uma das frases que ecoam pela narrativa da franquia, mas que também se aplicam ao seu sucesso. Uncharted é uma “introdução” de Indiana Jones ao mundo dos games e à nova geração, com o tema de exploração de ruínas e relíquias e artefatos antigos, em alguns casos, mágicos. Mas seu grande trunfo é a experiência. Em alguns momentos quase que caóticos, o caminho deixado ao jogador é claro e os eventos que acontecem ao redor do personagem são de pura adrenalina. Nada disso, no entanto, teria valor se não nos importássemos com as histórias pessoais de cada personagem e com eles próprios. As interações são sempre dosadas com bom humor e drama suficiente para nos gerar emoção. Nathan é carismático, mas também Sullivan, Chloe e Elena. Ninguém aparece na tela somente para preencher espaço ou para ser um rosto bonito. Existe também bastante cooperação entre Nathan e os companheiros durante as missões. Os coadjuvantes ajudam com tiroteios, pedem uma mão para escalar algo muito alto e ajudam com os enigmas, sempre de forma orgânica mantendo nosso interesse.
Melhor Uncharted
Aprimorando mecânicas introduzidas em sua primeira entrada e adicionando novos e excitantes elementos para a franquia, Uncharted – Among Thieves resiste até hoje como o melhor Uncharted. Com uma história satisfatória e criatividade exuberante na construção das fases e missões, este game deve constar na prateleira de qualquer fã de games e de aventuras. Bastidores certamente recomenda este título!
Crítica | Mitologia Nórdica - O Lado Pesquisador de Neil Gaiman
O nome de um autor famoso sempre pesa, não é mesmo? E quanto maior o sucesso deste, maior é a expectativa, o que – convenhamos – tem um potencial imenso para gerar frustração. Como estamos falando de Neil Gaiman, multipliquemos o risco. Considerando que você aí não esteja a fim integrar nenhuma turba extremista descerebrada, seja do lado do “amei” ou “odiei”, a leitura do recente Mitologia Nórdica (Norse Mythology) é recomendada.
Necessário dizer que não há nada remotamente similar a Deuses Americanos ou O Oceano No Fim Do Caminho, narrativamente falando. Este talvez seja o ponto no qual os detratores radicais vão agarrar-se. A pegada é muito simples: Gaiman reconta os mitos nórdicos em formato de pequenos contos, em uma ordem coerente até chegar ao Ragnarök, quando o ciclo encerra-se. Em uma comparação distante, mas pertinente, podemos citar Tolkien com A Queda de Artur e A História de Kullervo.
Legal! Agora que você já sabe o que ele fez, cabe perguntar-se qual é o seu grau de interesse no assunto, assim como o alcance do seu conhecimento sobre ele. Gosta da parada? Ótimo. Meio caminho andado. Se, além disso, você não souber muito sobre o panteão escandinavo e suas histórias, Mitologia Nórdica é uma ótima introdução ao tema. Compre já, pois a edição lançada pela editora Intrínseca, com suas 288 páginas, tem um preço acessível (na Amazon,pelo menos).
Correndo o risco de puxar demais o saco de um livro que nem ganhou minha nota máxima, algo que explicarei mais à frente, vou além. Gostaria de ler histórias bacanas para seus filhos em idade de descoberta, que estimulem a imaginação deles e o gosto pelo conhecimento? Eis uma excelente oportunidade. Aliás, para qualquer um apaixonado pela arte de contar histórias, o prefácio do próprio Gaiman é um chamado difícil de ignorar, mesmo que você já seja algo versado no tema. Some isso a uma escrita que proporciona uma leitura rápida e dinâmica e temos uma experiência bastante prazerosa.
Para um público que teve seu primeiro contato com esses personagens através das versões da Marvel*, será interessante conhecer os originais nesta reorganização. Nem é preciso preocupar-se com grandes liberdades tomadas pelo autor, já que não há afastamento da essência neste trabalho, apenas alterações unicamente em favor da fluidez, mantendo as características de cada uma dessas divindades, coadjuvantes e eventos.
*(Aliás, se ainda não leu O Carniceiro dos Deuses e Bomba Divina, faça-o logo…)
Estão lá o nascimento de Odin e sua busca por sabedoria, o surgimento de Asgard e os outros reinos, como o pouco inteligente Thor adquiriu seu martelo e os tantos Gigantes que matou, os problemas criados pelas tramoias de Loki e muitas outras histórias. Quando terminamos o capítulo do Ragnarök , Mitologia Nórdica inspira seu leitor além da satisfação que ler um bom livro traz. Quem tiver pretensões criativas, vai se sentir estimulado de alguma forma.
Uma grana fácil para o autor
Justificando a nota atribuída, apesar de muito divertido e movimentado, arrancando sorrisos por toda narrativa, estamos falando de uma obra que já estava pronta. É exatamente esse caráter de reciclagem que não pode ser ignorado. Mesmo que absolutamente tudo ali seja novidade para o leitor, esse fator pesa na avaliação.
Se ainda levarmos em conta que veio de alguém que sabemos já pesquisar e utilizar esse conhecimento há décadas, explicando no prefácio que é algo do coração desde criança, até começamos a refletir sobre os motivos da empreitada. Nada contra essa iniciativa, mas é evidente que Mitologia Nórdica foi escrito com uma mão (e um pé) nas costas, o que torna inevitável a imagem dos editores pedindo um livro novo em um prazo apertado. Plausível, não?
Claro que nada disso apaga os méritos, só a deixa como uma obra menor do autor. Mesmo assim, se você se deu ao trabalho de ler esta resenha até aqui, suponho que seu interesse no tema seja, no mínimo, razoável. Portanto, não há motivo para não ler. Então, nada melhor do que encerrar com as palavras do próprio Neil Gaiman:
Leia as histórias deste livro, depois se aproprie delas e, em uma noite gelada de inverno – ou em uma noite de verão em que parece que o sol não vai se pôr nunca -, conte a seus amigos o que aconteceu quando o martelo de Thor foi roubado, ou como Odin obteve o hidromel da poesia para os deuses
Via: Formiga Elétrica (site parceiro do Bastidores)
Crítica | Gotham 1889 - Batman vs. Jack, o Estripador
O final dos anos 80 foi ótimo para os fãs do Homem Morcego. Tivemos nessa época o lançamento de grandes histórias do personagem: Piada Mortal, Ano Um, Morte em Familia, e é claro o lançamento do filme de Tim Burton, a primeira vez que Batman apareceria nos cinemas.
E tivemos também o lançamento de uma das histórias mais interessantes do homem morcego, mas não tão exaltada como as outras citadas, que é Gotham 1889, escrita por Brian Augustyn, na época o principal Editor da DC Comics, e desenhada por Mike Mignola, que no futuro se tornaria famoso por desenhar as HQS do Anti Herói Hellboy.
A história é considerada a primeira do mundo Elseworld, revistas não canônicas onde personagens da DC são levados para épocas diferentes. Em Gotham 1889, o maior detetive das HQS é colocado frente a frente contra Jack o Estripador, o assassino em série mais famoso da história, e que até hoje nunca teve sua identidade conhecida. Ou seja, nem precisa dizer o quão inteligente foi ter colocado esses dois seres numa revista.
O ESTRIPADOR
Embora muitas pessoas conheçam a persona de Jack, o Estripador, não custa nada dizer um pouco mais sobre essa figura misteriosa. O Estripador foi um pseudônimo usada por um assassino em série que matou e mutilou 5 prostittuas na periferia de Whitchapel, um dos distritos de Londres. O nome do assassino surgiu de uma carta entregue aos jornais na época dos assassinatos. Hoje suspeita-se que a carta tenha sido forjada pela imprensa na intenção de aumentar o interesse do público pelo caso.
Diversos foram os suspeitos considerados, e cerca de 2000 pessoas foram levadas a delegacia para prestar depoimento sobre. Como os assassinatos aconteceram sempre ao fim de semana, considerou-se que o assassino era um trabalhador regular e que vivia perto dos locais do crime. Em ao menos 3 vítimas, os orgãos internos foram retirados, o que levou as pessoas acreditarem que Jack deveria ser um médico, porque apenas alguém com conhecimento em medicina poderia fazer esses atos cirúrgicos de maneira tão precisa. Apesar da grande investigação, até hoje a identidade do assassino é um mistério.
Existe uma teoria da conspiração, que afirma que o autor dos assassinatos foi Sir William Gull, o médico da Rainha Vitória, e que os crimes foram uma conspiração da maçonaria junto com a coroa inglesa. Diversos estudiosos do caso negaram a história,mas devido ao teor dramático da teoria, ela acabou ganhando força com os produtores de obras de ficção, que a usaram como base para fazer obras baseadas nos assassinatos. Temos como exemplo a famosa HQ Do Inferno, do escritor Alan Moore, que acabou virando um filme com Johnny Depp como protagonista.
STEAMPUNK
Gotham 1889 é uma história considerada steampunk. Esse estilo surgiu na literatura e depois alcançou outras mídias. No steampunk personagens reais são mesclados junto com heróis fictícios, e juntos partem em histórias fictícias. Nessas histórias a tecnologia a vapor se desenvolveu de maneiras impossíveis, e superou até mesmo as tecnologias que usavam de eletricidade.
A maioria das histórias steampunk se passa na Era Vitoriana inglesa, época em que o uso das maquinas a vapor estava em alta, e varias tecnologias foram desenvolvidas. Mas o gênero não se prendeu apenas a essa época, visto que se expandiu para outros épocas da história, como por exemplo Velho Oeste e Idade Média. Existem também histórias onde o steampunk se mistura com contos de terror e fábulas.
O maior exemplo de literário que usou muito desse estilo foi Julio Verne. Em suas histórias, era comum o uso de uma tecnologia extremamente avançada para a época, como exemplo ” 20 mil léguas submarinas”, onde temos o Capitão Nemo e seu submarino Nautilus, uma obra extremamente avançada de engenharia.
Mas Verne não foi o único a propagar esse estilo. vários foram os escritores abordaram esse estilo em suas obras, como por exemplo HG Wells, Arthur Donan Coyle, Mark Twain, Charles Dickens, etc. Mas essas obras apenas foram nomeadas como steampunk no futuro, nas décadas de 1980, quando o nome foi inventado. Muitos discutem se é correto dizer que esses autores podem ser considerados como parte do estilo, visto que quando escreveram as obras, eles viviam na Era Vitoriana, mas isso é uma discussão para outra hora.
BATMAN VITORIANO
Agora vamos falar da história. Na revista, somos levados ao século XIX, 1889 para ser mais preciso. Bruce Wayne está na Europa, estudando com o doutor Sigmund Freud, onde afirma que não consegue parar de sonhar com a morte dos pais. Decide então voltar a Gotham e acaba trombando na viagem de volta com um antigo amigo dos seus pais, Jacob Parker.
Ao chegar em Gotham, Bruce visita o seu amigo Jim Gordon, que conta a Bruce sobre o aumento da criminalidade dentro da cidade. Wayne então decide vestir seu manto de morcego e começa a caçar criminosos.
Porém, ao mesmo tempo, varias mulheres começam a ser mortas na noite de Gotham. Suspeita-se que o morcego seja responsável pelos assassinatos, mas então a polícia descobre que o autor do crime é Jack, o Estripador, que fugiu da Inglaterra após cometer seus crimes e decidiu se instalar na América, e procurar novas vítimas.
As suspeitas então caem sobre Bruce Wayne, visto que os assassinatos começaram bem na época em que ele retornou da Europa. Então, ao fazer uma revista na casa de Bruce, a policia encontra uma faca ensanguentada, e ele é preso, julgado e condenado a morte. Cabe então ao próprio Bruce a descobrir quem é o verdadeiro assassino.
UM CONTO QUE VALE PELA ARTE
O roteiro da história, desenvolvido por Augustyn, é muito bem trabalhado. Ele conseguiu trazer para a Era Vitoriana diversos fatores do universo do Morcego. Temos a morte de Thomas e Martha Wayne, o exílio de Bruce para treinar e desenvolver habilidades que poderia usar na luta contra o crime. Temos também referências ao Coringa, vilão mais famoso do morcego, que foi citado como um homem que matou a esposa e depois tentou se matar, mas acabou apenas ficando com um sorriso maligno no rosto.
Outro ponto bem feito na história é a relação do Batman com o Estripador. Temos um ótimo argumento aqui que explica de maneira satisfatória o porque de o assassino ter escolhido Gotham City como seu novo alvo. Também temos o fato do assassino fazer parte do passado de Bruce, e ter uma relação com seu passado, o que traz uma grande e excitante reviravolta a trama
Uma parte que infelizmente me incomodou foi o fato de não terem abordado mais o lado detetive do morcego. Temos aqui o maior detetive da história, e um dos assassinos mais misteriosos. Era de se esperar que o lado da investigação fosse mais abordado. Porém, esse ponto foi colocado na obra de uma maneira rápida demais na trama, o que pra mim foi algo errado, visto o argumento elaborado.
Porém, não da pra negar, o ponto alto da história é o desenho de Mike Mignola. Seus desenhos apresentam um tom soturno, e junto com o uso de sombreamento dá um tom bem gótico a HQ. Isso tudo combinado com a paleta de cores frias usadas pelo colorista David Hornung.
Mignola também acerta na diagramação ao colocar dentro dos quadrinhos noticias de jornais sobre os acontecimentos de dentro da Trama, e também anotações dos diários pessoais tanto de Bruce quanto de Jack. O que traz uma belíssima estética, e contribui para que a história tenha uma boa fluidez.
Gotham 1889 não é um conto perfeito, tendo alguns percalços no roteiro, mas ainda sim é uma história com uma trama bem costurada e com uma belíssima arte, e que sem dúvida é uma das melhores Hqs do Batman no mundo Elseworld.
Um Conto de Batman – Gotham City 1889 (Batman – Gothan By Gaslight) – EUA, 1989
Editora:DC Comics
Roteiro: Brian Augustyn
Arte: Mike Mignola
Colorista: David Hornung
Review | Destiny 2 é a sequência que precisávamos
No dia 6 de Setembro deste ano, a Activision junto com a Bungie lançou a sequência de seu MMO mais popular, Destiny 2. Quebrando recordes de venda na PSN (confira aqui), Destiny 2 trazia consigo uma gigantesca pergunta: uma sequência era mesmo necessária? Para a maioria dos jogadores já cativos da primeira entrada do que agora é uma franquia, existiria certa resistência ao desembolsar o equivalente a um jogo novo e, de certa forma, abandonar o personagem antigo e todo o investimento feito em pacotes de expansão para Destiny 1 (4 ao todo). O que novamente levanta o questionamento: quais incrementos no jogo são tão significativos que não poderiam fazer parte de uma nova DLC com um terço do preço de um jogo novo?
Necessário
A resposta a essa pergunta não é simples, mas para responde-la é preciso antes entender que Destiny jamais foi um jogo perfeito. Em seu lançamento em setembro de 2014 (meros três anos atrás), angariou críticas mistas e precisou ser incrementado com pacotes de expansão muito brevemente, devido sua campanha curta e um sistema de missões pobre em detalhes e bastante repetitivo. No entanto, Destiny possuía um item em que havia acertado em cheio: seu sistema de combate extremamente divertido e engajante. E é nisso que a Bungie aposta em sua sequência: nada de reinventar a roda, mas aprimorar a experiência.
Destruindo o Velho
Ao carregar a tela inicial do jogo, uma pequena homenagem aos jogadores que já possuíam conta no primeiro Destiny: pequenas telas com desenhos simples referenciando eventos e campanhas concluídas previamente, transmitidas como memórias de seu assistente pessoal, Fantasma. É um singelo toque de carinho e lembrança da Activision para seus jogadores mais antigos da franquia e, francamente, gera uma bela sensação de nostalgia. Confira um exemplo abaixo:
Após isso, somos arremessados na ação, vendo a Torre ser atacada pelo novo vilão do jogo, Dominus Ghaul. Em uma abertura em modo de tutorial, caminhamos pelas áreas destruídas enquanto vemos os principais tutores de classes de Destiny, Comandante Zavalla, Ikora Rey e Cayde-6, lutando ao seu lado e enfrentando o inimigo. Para um jogador costumeiro, momentos com tanta ação e adrenalina como este ainda eram raridade dentro do jogo. Ao fim deste primeiro cenário de caos e destruição, finalmente o vilão mostra seu real poder. Ao conectar uma gigantesca máquina de mineração no Viajante, o objeto cai em chamas dos céus sobre a terra. Todos os guardiões perdem sua “luz” que era alimentada pelo Viajante e se tornam indefesos contra as forças do exército de Ghaul. E é nessa cena que temos a oportunidade de ver o vilão com toda sua força, arremessando o nosso personagem do topo de uma plataforma para a morte. E cabe aqui um elogio à Bungie pela construção muito melhor de personagem em se tratando de antagonistas. Ghaul possui voz, diálogos com personagens de menor escalão de seu exército e personalidade, muito diferente dos alienígenas impessoais e vazios da primeira entrada.
Mais Drama, Mais Emoção
Com uma abertura tão dramática que altera os elementos básicos e familiares de Destiny, era de se esperar também mudanças tão dramáticas quanto no jogo e isso é sentido neste primeiro momento de calma. Ao se levantar da queda brutal, caminhamos nos arrastando pela cidade agora ocupada pelo Cabal. É uma caminhada difícil, lenta e que nos dá a sensação de destruição, mudança e senso de urgência para se esconder. Uma paleta de emoções novas para a franquia.
Acabamos por fim encontrando outro fantasma para se comunicar e nos ajudar em nossa caminhada. Com algumas pequenas batalhas curtas contra animais selvagens, finalmente encontramos a Fazenda; um lugar simples que se tornou refúgio de todos os guardiões que, como você, perderam sua luz com a queda do Viajante. A Fazenda chega para substituir a Torre e representa algo novo para a franquia: os Guardiões não são mais heróis ou uma classe superior dentro do jogo. Agora os guardiões são refugiados, derrotados e vulneráveis.
Extraordinário
Não se engane. Destiny 2 é tão Destiny quanto seu antecessor. Mudanças extraordinárias ou inclusões significativas não chegam a acontecer de fato, salvo por incremento de mapas e inimigos e uma leve alteração no sistema de aumentar nível. Mas todas as mudanças que vieram com o jogo, ficam no limiar da expansão e da sequência. Enquanto num pacote de expansão teríamos a adição de um planeta ou satélite com uma nova campanha, Destiny 2 traz uma forma diferente de passar pelos mapas e fazer as missões. E, devo dizer, é muito mais empolgante.
Com cores exuberantes e criatividade a todo vapor, a equipe Bungie e Activision capricharam. Os mapas são recheados de possibilidades e exigem uma jogabilidade mais focada em exploração do que somente em combate. Precisamos pular, nos abaixar, escolher rotas e escalar lugares novos a todo momento, sempre com certo sentimento de recompensa ao atravessar novos níveis. A familiar sensação de que “já havíamos feito essa missão antes” dá espaço à curiosidade, à surpresa. O design de níveis recebeu um tratamento especial e Destiny 2 cumpre a promessa de chacoalhar as fundações do que conhecemos como Destiny.
Conclusão
Já cantava o malandro urso Balu para o inocente Mogli, “Necessário, somente o necessário, o extraordinário é demais”. Para bem ou para mal, a desenvolvedora Bungie junto com a Activision optou por, em Destiny 2, incluir o necessário, mas não o extraordinário. Sem reinventar a roda, a franquia se sustenta no que a tornou popular e investe pesado nos itens que eram criticados pelos fãs. Difícil acreditar que uma expansão conseguiria resolver os problemas da mesma forma que esta sequência consegue. E a desenvolvedora merece ainda mais crédito por conseguirem implementar tantas transformações sem remover os elementos que tornam Destiny, Destiny.
A análise foi feita a partir de uma cópia gentilmente cedida pela Activision.
Crítica | Fuller House - 3ª Temporada: Parte 1
Full House (ou como foi chamada no Brasil, Três É Demais) tornou-se uma sitcom de grande sucesso entre as décadas de 1980 e 1990, levando para casa alguns prêmios e lançando no mercado nomes que hoje são bem conhecidos - como por exemplo as gêmeas Mary-Kate e Ashley Olsen. Desse modo, o anúncio de que a maior parte do elenco original retornaria para um revival nem um pouco premeditado e que continuaria um legado de mais de trinta anos nas telinhas chamou a atenção de muita gente, incluindo as novas gerações, apaixonadas por séries de comédia, e fãs do seriado original - que definitivamente se tornaram os primeiros a correrem para a Netflix e sentirem um gostinho de nostalgia fantástico.
Já em seu terceiro ano, Fuller House não teve suas iterações anteriores recebidas de forma agradável pela crítica, principalmente por se apoiar muito nesse resgate narrativo e atmosférico em detrimento de uma construção realmente satisfatória e com um propósito. Felizmente, a nova temporada da série parece, ainda que em passos lentos, caminhar para um acerto tonal e que agrade até mesmo os mais céticos - ainda que haja alguns tropeços na primeira metade.
Depois de atravessar o ano letivo e passar pelas comemorações de fim ano, a família Fuller-Tanner-Gibbler finalmente encontra uma paz com a chegada das férias de verão. O primeiro capítulo, intitulado Best Summer Ever, parece ter sido extraído propositalmente de um rip-off de High School Musical 2, trazendo os personagens principais em um prólogo musical um tanto quanto assustador à prima vista, mas que se torna fofo e pelo menos assistível. A sequência na verdade parte dos sonhos do pequeno Max (Elias Harger), cuja personalidade culta dá margem para um relaxamento quase utópico, dentro do qual sua família está em perfeita harmonia e todos se divertem. E levando em consideração que ele é filho do meio da protagonista Donna Jo (a.k.a. DJ), interpretada pela veterana Candace Cameron Bure, a coisa fica um pouco mais cômica, visto que esse é um desejo que não vai se realizar.
A casa está cheia novamente, e parece que as relações um tanto quanto duvidosas dos anos anteriores foram reformuladas, endossadas e trabalhadas ao extremo. Agora, DJ e Stephanie (Jodie Sweetin) conseguiram resgatar os laços fraternais que carregaram na série original, transportando uma maturidade imprescindível para a conexão entre as personagens e o público às telinhas - e isso também emerge graças à reformulação estética do criador Jeff Franklin. Afinal, o padrão televisivo para as sitcoms fornecia uma estrutura imagética quase errada para a série, que tentava ser algo além de seu potencial; após perceber que Fuller House é, na verdade, bem semelhante a outras do gênero, o retorno para as origens foi uma jogada certeira, e os diretores por trás dos episódios resolveram basear-se no jogo de campo e contracampo como montagem, com leves inclinações para o diálogo entre planos gerais, médios e alguns raros close-ups.
O ponto alto da temporada é sem sombra de dúvida as tiradas cômicas, os punch lines e o desenvolvimento das subtramas entre os personagens. Diferentemente dos anos anteriores, os quais se preocuparam muito em criar uma explicação autossuficiente e nada sutil sobre o que aconteceu nesses últimos trinta anos, a série retornou com diálogos mais limpos e mais sarcásticos que adicionaram momentos de puro prazer, tanto para os atores e atrizes quanto para o público em si. DJ, Stephanie e Kimmy (Andrea Barber) mais uma vez roubam a cena em diversos momentos como o “trio lupino” e seus bordões e personalidades contraditórias. De uma forma bem mais agradável e com uma competência chocante, por falta de outro adjetivo, o modo metódico da personagem de Bure entra em constante choque com os outros dois extremos de sua casa: Sweetin é a encarnação da rebeldia e da “vida mansa”, enquanto Kimmy mostra-se criativa, avoada e pueril.
Não posso dizer que o show tem uma grande complexidade, ainda mais porque este não é o foco. Diferente de outras comédias e dramédias da televisão contemporânea - como Master of None, Orange is the New Black e até mesmo BoJack Horseman -, a preocupação não reside na arquitetura de irônicas políticas ou sociais que permitam a quem assista refletir sobre ações e consequências; partindo da premissa da iteração original, Fuller House tem como único objetivo o entretenimento barato e agradável aos olhos, transportando-nos para uma perspectiva não muito original sobre o subúrbio de São Francisco, entrando como uma mimésis para as inúmeras outras séries que seguem o mesmo padrão narrativo.
Entretanto, é preciso fazer uma menção à entrada de Landry Bender como a nova colega de estudos de Jackson (Michael Campion), Rocki. Filha de Gia (Marla Sokoloff), antiga “amiga” de DJ, a personagem é um estereótipo escolar visto em diversas obras cinematográficas e seriadas ambientadas num colégio, mas passa por uma transformação interessante de ser acompanhada ao conviver com a família Fuller e ser contagiada por sua constante alegria - uma “alegoria”, se é que podemos chamar assim, de como nós nos sentimos ao assistir aos novos episódios e acompanhar, sem quaisquer pretensões, uma série que pode ser caracterizada como fofa.
Apesar de sua superficialidade, os capítulos não são totalmente pautados no vazio narrativo. Em alguns poucos momentos, temos diálogos que merecem ser acompanhados e que dissertam, ainda que brevemente, sobre a passagem da infância para a adolescência, sobre o relacionamento conturbado entre pais e filhos e sobre a superação de obstáculos que antes pareciam intransponíveis - e aqui gostaria de fazer uma menção ao arco narrativo que fez parte da jornada de Ramona (Soni Bringas), que não apenas teve sua primeira desilusão amorosa, mas também foi a que entrou em um mundo completamente diferente do qual estava acostumado ao deixar-se levar pela própria vontade de crescer e se aproximar dos frágeis laços entre os pais separados.
Entre trancos e barrancos, a primeira parte da nova temporada de Fuller House finalmente abraça sua nostalgia de forma a não ser totalmente dependente dela, criando mais ramificações para seus personagens e entregando o que promete sem cair em pretensões criativas: episódios fofos, consistentes e que deixam um certo gostinho de quero mais - que pode ser muito bem saciado com outras séries medianas do gêneor.
Fuller House – 3ª Temporada: Parte 1 (Idem, 2017 – EUA)
Criado por: Jeff Franklin
Direção: Rich Correll, Jean Sagal, Jody Margolin Hahn
Roteiro: Jeff Franklin, Boyd Hale, Kellie Griffin, Maria A. Brown, Jerry Collins, Kate Spurgeon, Alisha Ketry, Bryan Behar
Elenco: Candace Cameron Bure, Jodie Sweetin, Andrea Barber, Michael Campion, Elias Harger, Soni Bringas, Dashiell Messitt, Fox Messitt, Juan Pablo di Pace, John Brotherton
Emissora: Netflix
Gênero: Comédia
Duração: 27 minutos
https://www.youtube.com/watch?v=446dbFQEFJU
Crítica | Narcos – 1ª Temporada
Quando Narcos estreou na Netflix, a maioria dos brasileiros ficaram muito ansiosos pela série por ter José Padilha como produtor executivo e diretor de alguns episódio e Wagner Moura como o protagonista, o traficante Pablo Escobar. A expectativa valeu a pena e mesmo com problemas de estrutura, a primeira temporada deu uma boa impressão quanto a série.
Essa primeira temporada mostra toda a evolução de Escobar, que vai de um pequeno traficante ao o rei do narcotráfico e um terrorista ameaçador. Isso tudo é contado pelos olhos de Steve Murphy (Boyd Holbrock), um agente do DEA que vai até a Colômbia para capturar Escobar. Murphy contará com a ajuda de Javier Peña (Pedro Pascal), um agente local que vai explicando ao americano como funciona a justiça na Colômbia, já que prender Escobar não será uma tarefa fácil por ele se tornar uma pessoa cada vez mais poderosa.
No piloto, que é dirigido por Padilha, a série deixa claro que o seu estilo de narrativa é muito semelhante ao de Tropa de Elite. Além de ter uma narração em off – no caso, a de Murphy – toda a encenação lembra um pouco o estilo documental, com a câmera na mão sempre acompanhando de perto os atores. A série acerta ao colocar imagens de arquivo durante as narrações, que servem para que temos uma noção histórica de como foi o período, já que além da parte histórica, sue foco se mostra o período política também.
Além de Padilha, outros três diretores comandam os dez episódios da temporada: o colombiano Andi Baiz; o mexicano Guillermo Navarro; e o brasileiro Fernando Coimbra. Baiz - que continuou como um dos diretores da série durante as duas próximas temporadas - se sai relativamente bem, principalmente nos últimos dois episódios da temporada. Já Navarro se mostra o ponto mais frágil dos diretores, seus dois episódios (3 e 4) se mostram chatos e enrolados, não tendo a tensão que se tem durante toda a série. Os brasileiros não fazem feio, pois Padilha dá toda a gramática visual e narrativa da série, além de críticas diretas ao governo americano que são traços reconhecíveis do diretor. Já Coimbra faz dois episódios muito bons, com direito a uma ótima sequencia de perseguição. Em geral a direção da primeira temporada é bem eficiente, apesar de alguns erros aqui e ali.
O roteiro se mostra concreto narrativamente, mas com fragilidades na estrutura. A maioria dos episódios são escritos por Chris Brancato, que é showrunner junto com Carlo Bernard e Doug Miro, acertam em contar de maneira envolvente a ascensão de Pablo e toda a situação política e social da Colômbia. O próprio Escobar se mostra um personagem muito interessante, pois ao mesmo tempo que é uma pessoa capaz de fazer atos terríveis, se mostra um pai de família amoroso e um homem preocupado com o seu povo. Todo o seu desenvolvimento é muito bem feito, que mescla entre momentos que o personagem demonstra inteligência, amor e ódio. O melhor personagem dessa temporada é a bussola moral de Pablo, o seu primo Gustavo (Juan Pablo Rasa). É um personagem riquíssimo, que sempre lembra Pablo qual é a sua posição na sociedade, como um bandido. Além de trazer a Escobar a sua ética, questionando sobre os seus atos terroristas que matavam vários reféns.
Mas o protagonista não é Pablo, é Murphy, certo? Então, essa se torna um dos principais problemas dessa temporada, pois todo o núcleo do americano é chato. O personagem é desinteressante e seus arcos dramáticos só servem como encheção de lingüiça, como o sua esposa Connie (Joanna Cristie) que é completamente inútil para a trama. Parece que a série fica na dúvida sobre quem merece ser o protagonista, porque ela mesma parece que não se interessa por Murphy. O bom é que desse núcleo há personagens muito bons, como Peña e o coronel Carrillo (Maurice Compte), esse último sendo tão ameaçador e em alguns momentos tão cruel quanto Pablo.
O elenco se mostra muito bem, com destaque a Pedro Pascall que deixa o seu personagem o mais envolvente do núcleo policial, como um personagem que realmente entende que nessa realidade precisa sujar um pouco as mãos e como o guia de Murphy na justiça colombiana. Já Boyd Hoolbrook se mostra confiante com o seu personagem, mas o ator não pode ir muito por conta das limitações de Murphy como personagem. Mas Wagner Moura é o dono da temporada. O ator consegue segurar muito bem todas as suas cenas e sua composição física mostra o quanto o personagem é ameaçador. Os momentos mais fortes d atuação de Moura são os momentos que o seu personagem vai explodindo pouco a pouco, mostrando o seu lado violento. É um trabalho admirável, de um ator admirável.
Enfim, por mais que a primeira temporada tenha problemas de ritmo e estrutura, ela consegue ser bem eficiente. Apresenta bem o estilo da série e qual será o seu foco. O bom é que não fica só na promessa.
Narcos – 1ª Temporada (Idem – Season 1, EUA/Colômbia – 2015)
Showrunner: Chris Brancato, Carlo Bernard e Doug Miro
Direção: José Padilha, Andi Baiz, Fernando Coimbra e Gillermo Navarro
Roteiro: Chris Brancato, Carlo Bernard, Doug Miro, Dana Calvo, Andy Black, Dana Ledoux Miller, Zach Calig, Allison Abner e Nick Schenk
Elenco: Wagner Moura, Boyd Holbrook, Pedro Pascal, Joanna Christie, Juan Pablo Raba, Maurce Compte, Jorge A. Jimenez, Paulina Gaitán, Stephanie Sigman, Bruno Bichir, Rául Méndez, Manolo Cardona e Cristina Umana
Emissora: Netflix
Episódios: 10
Gênero: Drama, Policial
Duração: 50 min
Review | Hellblade: Senua's Sacrifice
Hellblade: Senua’s Sarifice é o novo jogo da desenvolvedora Ninja Theory, que já emplacou alguns sucessos anteriormente como Heavenly Sword, Enslaved: Journey to the West e o reboot de Devil May Cry. Dessa vez eles apostaram em um jogo de médio orçamento, o chamando de “um AAA independente”. O resultado foi um jogo único.
As mecânicas
As mecânicas de jogabilidade do Hellblade são bem simples, boa parte do jogo é resolução de puzzles, que consistem basicamente em alinhar imagens para abrir portões. A resolução dos puzzles em si não é difícil, mas durante o gameplay, em algumas ocasiões, passei algum tempo procurando as imagens que deveriam ser alinhadas, são puzzles mais intuitivos do que do tipo que requer maior raciocínio.
Há também um pouco de combate no game, a mecânica de combate é simples, mas dinâmica. Assim que começa o combate, os controles da Senua mudam, agora ela pode se esquivar, bloquear, atacar e quebrar a guarda. Senua pode performar combos variando ataques fortes, fracos e melee, além de um habilidade especial que desacelera o tempo. O jogo possui alguns combates bem difíceis, alguns me prenderam por um tempo quando estava me aproximando do fechamento do jogo.
As lutas contra os chefões estão entre os mais divertidos e desafiadores combates do jogo, apesar de esse não ser o aspecto principal de Hellblade, você irá apreciar se é fã de Dark Souls, a dificuldade, o cuidado e movimentos precisos que são exigidos do jogador, lembram muito a famosa franquia da from software.
O jogo é linear e pode ser bem repetitivo, há pouca variação de puzzles, o que pode acabar irritando alguns jogadores, porém não vi isso como problema, afinal é um jogo bem curto, mas caso se prolongasse por mais tempo dificilmente o gameplay sustentaria o interesse dos jogadores.
Ambientação e Visual
Apesar do orçamento, Hellblade impressiona muito com seu visual. Todo o cenário é bem feito e detalhado, a equipe se esforçou bastante para trazer toda essa construção de um cenário medieval/nórdico sombrio. Ao contrário de muitos jogos, em Hellblade você não tem a sensação de estar passando pelo mesmo cenário outra vez, com vários elementos já mostrados anteriormente sendo jogados novamente na tela, os cenários são bem variados.
Quanto ao visual da personagem, ele está simplesmente magnifico. Devido a evolução da captura de movimentos, ela quase parece com uma pessoa real, suas expressões e olhares são genuínos e passam a impressão correta de uma personagem sofrida e atormentada, os desenvolvedores conceberam a Senua com um figurino/maquiagem característico de sua tribo celta, Pictos, que habitava a Escócia, cujos guerreiros usavam a mesma pintura corporal e cabelo que ela.
Foco principal: História
Hellblade é um jogo cujo aspecto mais forte é a história, que tem elementos raros para a ficção em todo o conjunto da obra, em geral nenhum videogame até hoje executou uma história como esse fez. Senua possui esquizofrenia, com alto grau de psicose e embarca em uma jornada para salvar seu amado Dillion dos domínios da Deusa Hela.
A principio achei a premissa do jogo familiar, me lembrando desde histórias pré bíblicas como o mito de Orfeu e Euridice, até um exemplo mais recente nos videogames, Dante’s Inferno, mas logo percebi que a trama não era tão simples assim.
Devido a sua psicose, Senua escuta várias vozes durante o jogo, muitas das quais dão dicas ao jogador de qual é o próximo passo a ser tomado, outras debocham da personagem, outras o encorajam, outras duvidam de sua capacidade e algumas vezes elas contam um pouco do backstory dela. É recomendado jogar com fones de ouvido para perceber todas elas, aliás, a mixagem de som é fantástica.
O jogador encontrará algumas runas pelo caminho, a maioria conta velhas histórias da mitologia nórdica, tiradas diretamente da Edda, outras vezes ela revelará mais da história da própria Senua. As runas são também um ponto de alivio para Senua, pois as escutando, ela foca em uma só voz, contando histórias que ela gostava da sua infância, assim parando o turbilhão de vozes em sua mente.
Entre as vozes, está a de um velho amigo de Senua, Druth, o velho tolo, que ficou preso por muito tempo no reino de Hela, sabendo bastante sobre o território e os deuses que Senua enfrentará, ele a auxiliará pela maior parte da jornada, às vezes Senua também vê a sua mãe, que compartilhou do mesmo problema dela, a psicose.
Mais tarde, outro personagem passa a habitar a mente de Senua, seu pai, Zynbel, que é representado como uma voz demoníaca e leva a crer que ele é um dos antagonistas da história. Logo descobrimos que Zynbel foi o responsável pela morte de Dillion, o sacrificando em um ritual, acontecimento que catapultou o desenvolvimento da doença mental de Senua e a levou para a sua jornada.
O ponto é que os desenvolvedores do jogo conseguiram fazer algo muito difícil, que é criar um personagem com toda essa doença mental e dar alguma complexidade para ele. Na maioria dos filmes e jogos, personagens com graves problemas mentais, como a esquizofrenia, são personagens bem unidimensionais, sendo retratados como o louco irritante que precisa de cuidados.
Aqui a história é sobre Senua e seu estado mental cria todo um universo. A equipe, fez uma pesquisa meticulosa conversando com especialistas e pacientes diagnosticados com a doença, para conseguir êxito na criação das camadas da personagem que a tornam crível.
O mundo é construído a partir de sua mente conturbada, assim temos vários cenários que fãs de terror psicológico certamente irão gostar, é um bom jogo para se jogar na madrugada com as luzes apagadas, tem trechos com terror atmosférico mais bem executado do que muitos games do gênero por aí.
Comentário com spoilers
Assim que cheguei ao final do jogo, achei que a história tomou um rumo previsível. Estabelecendo uma personagem com problema de esquizofrenia e repetindo frases como “As maiores batalhas se luta na mente” e “Senua já morreu três vezes” não deixam muito espaço para especular qualquer outra coisa, certamente pelo menos parte do que ocorre está somente na mente de Senua.
Chegando ao final, é revelado que não somente uma parte, mas tudo ocorreu somente na mente da Senua. Previsível, mas isso não faz a história perder a mínima fração de seu valor. Apesar da história se passar na mente da personagem principal, temos que considerar que as coisas que um esquizofrênico vê é real para ele, assim como toda jornada de Senua foi real para ela.
No final do jogo, vemos Senua aceitar a morte e deixar a deusa Hela finalmente mata-la. Hela carinhosamente apanha a cabeça de Dillion, a câmera move-se para baixo e ela joga a cabeça no abismo, quando ela volta a mostra-la, vemos que ela desapareceu e Senua está em seu lugar intacta. Todo esse tempo, Hela simbolizava o estado mental de Senua e, aceitando a morte de seu amado e a sua própria, ela está mais próxima de se tornar uma pessoa melhor, travando uma infindável batalha contra si mesma no mundo de sua própria construção, pelo menos é assim que interpreto.
Considerações finais
Hellblade: Senua’s Sacrifice é um jogo belíssimo, com mecânicas boas, mas um gameplay que acaba ficando repetitivo. Divertidos combates, principalmente com os bosses. Tudo que é apresentado no jogo, contribui para o entendimento da história, que é sobre Senua, quem ela é, e o que ela deseja se tornar, sendo uma jornada introspectiva sobre uma mente que difere do padrão. As pessoas que gostam de jogos com histórias diferentes e de qualidade, certamente apreciarão o jogo.
Desenvolvedora: Ninja Theory
Distribuidor: Ninja Theory
Plataformas: PS4, Xbox one e PC
Data de lançamento: 8 de agosto de 2016
Crítica | Orange Is the New Black - 5ª Temporada
CUIDADO: spoilers à frente. Siga à própria risca.
Desde sua estreia em 2013, Orange Is the New Black veio para ficar. A dramédia criada por Jenji Kohan tornou-se, em pouco tempo, uma das séries mais famosas da Netflix, principalmente por seu incrível, versátil e gigantesco elenco e por sua ousadia em se tratando de narrativa; afinal, a trama principal gira em torno de detentas da penitenciária de Litchfield e de suas não ortodoxas rotinas, as quais envolvem agressões físicas, advertências verbais - e agora rebeliões.
É um fato dizer que o quarto ano da série foi um dos mais impactantes na vida de todas as presidiárias, principalmente se levarmos em conta a morte de uma das personagens principais, Poussey Washington (Samira Wiley), pelas mãos de um dos guardas, indicando a clara rivalidade entre as duas “castas sociais” existentes naquele recinto e mostrando, de forma construtivamente delatora e reflexiva, a precariedade do sistema carcerário dos Estados Unidos - estendendo-se de forma antropológica para outros países. Com a emersão da violência policial frente às mulheres de Litchfield, as personagens decidem se unir em um motim que culmina em uma das maiores rebeliões do microcosmos seriado - e inclina-se para diversas referências da vida real.
Desde os primeiros anos de OITNB, fez-se necessário criar uma narrativa convincente e emocionante o suficiente para ofuscar a saturação de seus personagens, cujas subtramas e backstories fundiam-se em metáforas e simbologias muito interessantes para a conexão entre o público e as criações televisivas. Com os deslizes das temporadas anteriores, as quais tinham um enfoque desequilibrado em detrimento da contextualização geral que seguisse os passos de um arco bem delineado, a equipe criativa da série conseguiu juntar as peças faltantes e orquestrou uma ária à la Tiros em Columbine (1999), com direito à exploração do potencial faltante às mulheres protagonistas e à cronologia dos eventos, além da dosagem perfeita entre drama, suspense, comédia e ação.
A VINGANÇA É MINHA
Dê poder ao homem e verás quem ele é. Coloque-se no lugar de um grupo de prisioneiras cujos direitos humanos mais básicos são negados para a entrada de uma política muito mais dura e inadmissível. Agora, pense em todas as tensões raciais e sociais que ocorrem entre gangues dentro de uma penitenciária; misture tudo isso a um homicídio culposo que prova a impetuosidade com a qual os “superiores” tratam pessoas em reabilitação e o resultado é um barril de pólvora que já deveria ter explodido há muito tempo.
É exatamente isso o que acontece em Litchfield. Poussey tornou-se uma mártir, um símbolo para a revolução cujos ideais já maturavam nas mentes de algumas detentas. Em outras palavras, a imagem da personagem encarnada por Wiley é a principal engrenagem que move os clãs da prisão a se unirem contra uma força opressora e a organizar uma reviravolta no jogo tão grande que tem a capacidade de alcançar os mais altos patamares da mídia - seja ela sensacionalista ou não. É incrível como as nuances de roteiro conseguem transpassar os níveis essencialmente antropológicos para algo muito mais arquetípico, seja no funcionamento entre os diferentes núcleos da prisão, seja no que isso representa para o futuro de cada uma das personagens. Portanto, não é com bastante surpresa que Daya (Dascha Polanco) seja a primeira a se postar para tomar o revólver em mãos e marca o ápice de mudança da vida de todas. O que se torna inesperado é que ela realmente puxa o gatilho e atinge Humphrey (Michael Torpey) na perna.
A ação não poderia ser mais explícita ou clara: o modo como são tratadas culminou em um desespero por mudanças. É claro que a violência nunca é a melhor solução numa situação dessas, mas a complexidade da psique humana muitas vezes coloca as pessoas em uma queda livre em direção a instintos primitivos que negam o próprio conceito de sociedade, esquecendo-se de que estão lidando com outros seres humanos. E aqui não faço menção apenas à primeira sequência da quinta temporada, e sim a tudo a que as detentas de Litchfield foram submetidas pela crueldade e pela reafirmação constante de superioridade por parte de seus “comandantes”.
A partir daí, as cartas do jogo foram dadas e a única coisa que podemos fazer é aguardar o desenrolar da história. Os guardas são feitos de reféns e Caputo (Nick Sandow), apesar de ser o único a compartilhar do sentimento revoltante de abandono das prisioneiras, é levado junto como representação máxima das coercitivas atitudes de uma instituição falida frente aos considerados “estorvos da sociedade”. E o sentimento de união logo se dilui, à medida em que grupos específicos tentam tomar o controle para si, impondo métodos que consideram mais eficazes para manter a estruturação da rebelião e obrigar as autoridades responsáveis - ou seja, o governo - a concordar com as demandas exigidas.
Em suma, temos alguns lados da história nos sendo apresentados através dos treze episódios da quinta temporada: o primeiro, e talvez o mais importante, vem na figura de Taystee (Danielle Brooks), a principal organizadora do motim e uma das personagens mais bem construídas da gama de OITNB. Suas nuances de personalidade invadem os campos racionais e emocionais do ser humano em momentos eximiamente estruturados, começando com o crescente ódio e a vontade pela mudança que lhe invade com a morte da melhor amiga. Depois da tempestade, a calmaria vem com suas sutis inclinações diplomáticas, permitindo que ela e outras detentas - Cindy (Adrienne C. Moore), Alison (Amanda Stephen) e Janae (Vicky Jeudy) - organizem uma lista de melhorias dentro de Litchfield e vá ao encontro da própria Constituição dos direitos humanos.
O embate entre o que é certo e o que é justo é constante neste novo ano, e seja de modo hilário ou trágico, cada um dos beats é de extrema importância para a continuação e a evolução tanto da trama quanto do cenário que nos é apresentado. É um fato dizer que a penitenciária já teve seus dias de glória e agora não passa de um complexo rural para contenção de corpos. Não, não podemos nem dizer que essa ambiência comporta humanos, justamente por seus responsáveis deixarem-na chegar ao ponto que enxergamos. Conforma os episódios vão seguindo, percebemos que o anseio pelas melhoras deixa a maioria das prisioneiras à beira de um ataque de nervos - e isso é evidenciado principalmente com Red (Kate Mulgrew) e Blanca (Laura Gómez), as quais buscam nas drogas um refúgio da situação em que vivem para fazer justiça com as próprias mãos.
Apesar do tom irônico e sarcástico das personagens, cuja caracterização visual contrasta com sua rebuscada mentalidade e diálogos tão cômicos quanto metafóricos, percebemos que OITNB tem uma grande inspiração em clássicos da literatura e do cinema para entregar à crescente gama de fãs um produto satisfatório e estimulante. Conforme a prisão se transforma em uma versão modernizada de O Senhor das Moscas (1954), seja com o retorno de seres humanos ao primitivismo e à barbárie, seja com a constante segregação justiceira que se apossa das gangues - e isso também é “engraçado” de certa forma, visto que a união de brancos e latinos ascende apenas para separá-los do que consideram inferiores ou indignos.
ATTICA 2.0
A revolta na penitenciária de Attica foi um dos eventos de maior importância e emergência social que ocorreu em solo estadunidense na década de 1970, equiparando-se até mesmo ao massacre do complexo de Carandiru aqui no Brasil. A rebelião se iniciou dentro dos guetos da prisão e espalhou-se para todos os detentos, os quais uniram forças para exigir melhor tratamento, melhores cuidados médicos, reestruturação da equipe de segurança e melhores condições de vida para os presidiários negros e latinos, os quais eram tratados como animais. Apesar da pacificidade do motim e a inclusão de reféns para que suas propostas fossem analisadas com maior cuidado, Attica durou apenas quatro dias e foi brutalmente contida pela força policial, com um resultado de 43 mortos (sendo 32 deles detentos) e uma comoção generalizada sobre a lastimável conclusão.
Em Litchfield, as coisas seguem pelo mesmo caminho. Natalie Figueroa (Alysia Reiner), ex-diretora, acaba fazendo sua incrível reentrada na série como porta-voz do governador para iniciar as negociações com as detentas, representando a camada superficial e capitalista da organicidade econômico-social, enquanto Taystee e Caputo são encarnações defensoras daquilo que é melhor para não apenas a sobrevivência, e sim a vivência em comunidade dos que sofrem. Apesar dos breves momentos de pacificidade, as demandas das prisioneiras incluem a punição do responsável pela morte de Poussey e parecem ofuscar todas as outras necessidades básicas - educação, saúde, trabalho e afins -, e, após a libertação dos reféns, não se vê mais a necessidade de estender o contrato de paz.
Desse modo, é claro perceber o desfecho das presidiárias: a equipe da SWAT invade Litchfield, leva todas presas sem um pingo de compaixão e traz um futuro ainda mais incerto para personagens com as quais nos conectamos nesses últimos quatro anos, separando duplas que traziam tanta química para a cena que não podemos deixar de sentir o coração apertar ao vê-las se afastando. A queda da prisão é o símbolo mais ativo da decadência do sistema carcerário, e até mesmo o incêndio que se inicia nos minutos finais discorre sobre como nada será como antes e que não se sabe mais o que esperar: não há esperança, não há conclusões; só podemos nos apoiar no fato de que elas ainda estão vivas.
O brilho de OITNB vem justamente com sua capacidade de oscilar entre uma configuração mais ampla e uma perspectiva mais intimista e pessoal. Para tanto, em contraposição ao motim de Litchfield, temos os desenvolvimentos de relações afetivas entre outras detentas, e aqui faço um parêntese para as protagonistas mais constantes da série, Alex (Laura Prepon) e Piper (Taylor Schilling). Neste ponto, o público está familiarizado com suas histórias conturbadas e uma irritante indecisão sobre como proceder, ou seja, se elas devem ficar juntas ou separadas. Após entrarem numa montanha-russa de sentimentos, o casal se firma como um dos mais promissores e, juntas, passam por um processo de amadurecimento que viola as leis das comédias românticas para a adição de camadas mais complexas e interessantes, incluindo a participação direta na revolta e a oposição de ideais e valores que ora as afastam, ora as aglutina.
Nicky (Natasha Lyonne) e Lorna (Yael Stone) também fazem parte de um círculo mais fechado, e suas personalidades muito distintas criam um microcosmo a ser ovacionado de diversos ângulos. Nicky está em uma luta interminável contra sua inclinação para as drogas ao mesmo tempo em que tenta esconder seus crescentes sentimentos pela colega. Enquanto isso, Lorna cria em sua cabeça uma visão perfeita de sua vida quando finalmente sair de Litchfield, apesar de deixar sua fluidez levar-lhe para outros lugares - inclusive para os braços de uma de suas amigas mais antigas lá dentro. As coisas atingem uma tensão preocupante quando descobre estar grávida de seu marido Vince (John Magaro) e ser tachada de louca pela impossibilidade daquilo ter acontecido. Junte tudo com o fato de que as duas “trabalham” na enfermaria da penitenciária e... Bom, já podemos imaginar que a relação entre ambas é baseada tanto em momentos cômicos quanto em trágicos.
Sem sombra de dúvida, o maior mérito vem com a capacidade do roteiro e da montagem da série deixarem um pequeno espaço de tempo entre os acontecimentos se transformar em uma jornada quase transcendental para as personagens principais. Primeiro, precisamos entender que a quinta temporada tem o grande diferencial de ser cronologicamente menor que as outras, estendendo-se ao longo de apenas três dias. Sim, exatamente isso: os episódios abrangem uma trinca de vinte e quatro horas justamente para poder explorar mais as relações entre as detentas, o desenvolvimento das arquitramas e até mesmo como a mídia e as forças-armadas lidaram com uma situação caótica. O potencial da série é explorado em seu máximo, principalmente se levarmos em consideração o uso de flashbacks para explanar atitudes um tanto quanto estranhas, a priori.
PROBLEMAS NO JARDIM DO ÉDEN
Um dos melhores episódios da temporada é intitulado The Reverse Midas Touch, dirigido por Prepon. Neste momento da narrativa, temos o combate físico entre Red e Piscatella (Brad William Henke). Esse guarda sempre foi um dos personagens mais antagônicos de toda a série, desde sua entrada no ano passado, e emergiu como a personalidade mais dura e impiedosa de todas. Seus métodos de controle variavam desde tortura psicológica até física, colocando as presidiárias em patamares de subjugação para reafirmar a superioridade social entre os diferentes grupos. Após a tomada de Litchfield, Piscatella ficou longe da situação e transformou-se em um corpo impotente, mostrando um lado frágil.
Mas assim que consegue encontrar um modo de entrar na prisão, vai em busca da velha ruiva que ousou lhe desrespeitar, raptando sua família e colocando todas como a audiência para as atrocidades que tinha em mente, as quais se estenderam para humilhação e descaso extremos. A contextualização fica ainda mais dramática e pesada para alguns telespectadores justamente por harmonizar, em termos narrativos, com o passado deste personagem tão irreverente às concepções humanas, mas ainda assim tão verdadeiro para com seus valores autoritários. Descobrimos que Piscatella é, na verdade, gay, e teve um breve caso com um dos presidiários de outro complexo carcerário no qual trabalhou até que outros detentos estupraram-no e o deixaram em um estado de deterioração inenarrável. A partir daí, o guarda tornou-se um ser essencialmente formado pelo ódio, buscando a justiça que não encontrou para aquele que amava e canalizando suas frustrações para as mulheres de Litchfield.
O episódio é tão sensível e simbólico que facilmente entra para um dos grandes momentos de toda a série, arquitetando uma belíssima análise do comportamento humano e como alguém pode se tornar cego pelos traumas que outrora teve - e menciono apenas Piscatella, e sim todas as participantes dessa sequência de tortura que nos puxa memórias de obras audiovisuais ambientadas na II Guerra Mundial e até em narrativas mais contemporâneas.
UNIDAS VENCEREMOS
Orange Is the New Black não se tornou uma das melhores e mais populares séries da Netflix por qualquer razão. Além de quebrar padrões de gênero e de narrativa com seus incríveis e muito bem estruturados personagens, suas histórias emocionantes e sua capacidade de colocar detalhes pontuais que permita a um público diferenciado se conectar nos mais diferentes níveis com o que lhes é apresentado.
Afinal, este show é sobre pessoas. É essencialmente humano e não se resvale de artifícios fantasiosos ou científicos como base para os acontecimentos, e sim finca-se nas relações humanas, ainda que num ambiente inesperado, e como elas se tornam imprescindíveis para o amadurecimento não só individual, como também comunitário.
Orange Is the New Black – 5ª Temporada (Idem, 2017 – EUA)
Criado por: Jenji Kohan
Baseado em: Orange is the New Black: My Year in a Women's Prison, de Piper Kerman
Direção: Andrew McCarthy, Phil Abraham, Constantine Makris, Uta Briesewitz, Mark A. Burley, Jesse Peretz, Erin Feeley, Laura Prepon, Nick Sandow
Roteiro: Jordan Harrison, Tara Herrmann, Anthony Natoli, Josh Koenigsberg, Rebecca Angelo, Lauren Schuker Blum
Elenco: Taylor Schilling, Laura Prepon, Nick Sandow, Kate Mulgrew, Taryn Manning, Uzo Aduba, Danielle Brooks, Adrienne C. Moore, Dascha Polanco, Selenis Levya, Lea DeLaria, Natasha Lyonne, Yael Stone
Emissora: Netflix
Gênero: Comédia
Duração: 60 minutos
Crítica | Ozark - 1ª Temporada
Que grata surpresa é essa nova série original da Netflix. Estava faltando no catálogo da gigante do streaming algo desse gênero que "deixa o espectador sem ar", próximo do estilo Breaking Bad, Família Soprano e Bloodline. Os tons melancólicos e angustiantes da narrativa entregam uma história intensa, que passa da apatia para a violência com extrema sensibilidade. Os dez episódios desta primeira temporada de Ozark conseguiram me deixar preso frente aos acontecimentos e envolvido na trama de uma maneira que poucas séries conseguem atualmente.
Até conseguimos comparar detalhes nessa produção que são pertinentes a outras, mas a verdade é que Ozark apresenta uma maneira própria de levar a história. Ao mesmo tempo em que o roteiro caminha com paciência, sabe os momentos certos para introduzir os temas, personagens e situações aos quais recorre. Quando a narração do episódio piloto começa, você consegue ter uma noção do tom introduzido rapidamente ali, com cenas confusas de flashforward ambientadas em cenários escuros. Essa construção terrivelmente tensa guia o desenrolar do show, vindo ao encontro dos próprios problemas em que se envolve o protagonista.
Além de protagonista, Jason Bateman também dirige 4 episódios nesta temporada
A FORÇA DE UM BOM ROTEIRO
Parte do argumento da série depende de forjar uma família de anti-heróis, assim como Walter White está para Breaking Bad. Então, somos apresentados a Marty Byrde (Jason Bateman), um consultor financeiro desmotivado e melancólico que usa a empresa como fachada para lavar o dinheiro do segundo maior cartel de drogas mexicano. Paralelamente, ele está lidando com a relação extraconjugal da esposa Wendy (Laura Linney, em uma atuação inspiradora). Depois que o sócio de Marty rouba o cartel e, tendo um barril de ácido como único destino, ele convence o vilão Del (Esai Morales) que pode lavar muito mais dinheiro longe dos olhos curiosos de Chicago, na região do Lago Ozarks no Missouri.
Assim, com a mudança do casal e seus dois filhos, Charlotte (Sofia Hublitz) e Jonah (Skylar Gaertner), para o balneário com mais costa do que a Califórnia inteira, a história desenvolve-se norteada pela violência e miséria do local fora de temporada. Essa situação incômoda em que a família encontra-se é responsável para que o público torça por personagens de moral duvidosa sem perder a empatia por eles. Marty não tem uma índole ruim e o senso indestrutível de responsabilidade estabelecido para o personagem é excelente, um definidor para todo o andamento da história. A verdade é que a posição de anti-herói da família funciona - e funciona muito bem.
Grande parte da qualidade de Ozark se deve ao roteiro muito bem construído por Bill Dubuque (O Juiz). Em alguns momentos, a série até consegue fazer você ficar de boca aberta e coração acelerado, mas não é somente pela surpresa que esse roteiro brilha. Conforme a história vai sendo revelada e os personagens vão sendo construídos, Bill nos leva a um novo acontecimento impactante. E sem subestimar o espectador de forma alguma, pois as informações não são entregues de maneira mastigada. Isso faz com que o público reflita sobre as situações, especialmente sobre as fortes críticas sociais das quais falamos abaixo. Em certos momentos, a série me lembrou bastante os tons e diálogos construídos em House Of Cards, também um original da Netflix.
Laura Linney interpreta Wendy, a esposa infiel e cúmplice nos negócios ilícitos do marido
PERSONAGENS TRIDIMENSIONAIS
Além do enredo forte, o desenvolvimento dos personagens é outra característica marcante nestes 10 episódios. É fácil perceber as nuances que vão moldando-se em Marty, Wendy e nos coadjuvantes dessa região gélida. Dessa maneira, não fica cansativo acompanhar a evolução deles e as características levam o público a estabelecer uma conexão forte e rápida com a história. Aliás, praticamente todo o elenco consegue deixar sua marca através das atuações.
O que podemos presenciar é uma execução muito emocionante e madura do ator Jason Bateman (Quero Matar Meu Chefe), afinal, é incrível observar como Marty pode ser realmente frio em momentos chocantes e ao perceber que tudo está desmoronando. Entretanto, ao mesmo tempo em que ele está inerte, também volta à ativa rapidamente para medidas drásticas. Esse tipo de tridimensionalidade é comum nos personagens de Ozark, tanto em protagonistas quanto nos coadjuvantes. Você se depara com pessoas de moral flexível e que, através dessa representação, levam o contexto a um nível superior.
Bateman, que também dirige quatro dos episódios desta primeira temporada, é seguido imediatamente por Laura Linney (Sully: O Herói do Rio Hudson), que brilha como a esposa infiel e cúmplice dos crimes do marido. Caricatura por caricatura, destaco apenas a interpretação de Esai Morales (Caprica) para o poderoso chefe do cartel de drogas. Entretanto, na pele do vilão Del não dá para fugir muito disso e acaba sendo compreensível a falta de carisma, sem afetar diretamente a qualidade das cenas com ele. Para terminar, uma coadjuvante que merece atenção nesse elenco maravilhoso é Julia Garner (As Vantagens de Ser Invisível). A garota entrega contornos bem profundos para representar carência, força e desprezo em uma única cena da sua personagem, Ruth.
Julia Garner entrega uma atuação profunda como Ruth
ESPELHO DA SOCIEDADE
São todas essas características que você viu até agora que permitem levar Ozark ao ponto em que ela realmente se engrandece: a forte crítica social. A direção da série traz inúmeras simbologias que podem ser compreendidas através de uma leitura mais atenta da série. A ótima escolha do jogo de câmeras, filtros mais dark, cenas sem-pudor e uma montagem correta levam o espectador a entender que ele precisa compreender mais do que aquilo que está na tela. Ao assistir, até voltei a episódios anteriores para admirar novamente algumas cenas.
Fugindo das caricaturas, a série explora a ignorância e miséria de uma população, mas não faz isso unilateralmente. O enredo mostra como diferentes experiências de vida podem criar realidades ao mesmo tempo tão distintas e tão próximas, já que a mensagem é: todo mundo tem uma história e nossas ações norteiam os resultados. A dona do bar falido, o velho que espera a morte, o ‘caipira’ de má-reputação que busca uma vida melhor ou o investigador do FBI com desvios psicológicos são exemplos claros desta prerrogativa. Além disso, o texto transforma diálogos que poderiam ser rasos em verdadeiras lições de sociologia.
Por fim, eu estaria sendo injusto se não citasse a fotografia imponente e a trilha sonora precisa dos episódios. Ozark é muito bem escrita e conta com a experiência da Netflix em escolher elencos certeiros. Com episódios que te prendem do começo ao final, sem nunca perder a essência, a série deixa algumas pontas soltas no final - e que provavelmente serão esclarecidas em uma nova temporada. Eu diria que a série é candidata forte à virar uma queridinha do streaming, se não fracassar nos números de audiência guardados à sete chaves pela empresa.
Espero que venha uma 2ª temporada para manter em foco essa discussão sobre poder, dinheiro e moralidade. A verdade é que sempre é hora de qualquer pessoa aprender um pouquinho mais com tramas como Ozark.
Ozark – 1ª Temporada (Idem, 2017 – EUA)
Criado por: Bill Dubuque, Mark Williams
Direção: Jason Bateman, Andrew Bernstein, Ellen Kuras, Daniel Sackheim
Roteiro: Bill Dubuque, Paul Kolsby, Mark Wiliams, Martin Zimmermann, Whit Anderson, Ryan Farley, Alyson Feltes e Chris Mundy
Elenco: Jason Bateman, Laura Linney, Sofia Hublitz, Skylar Gaertner, Julia Garner, Esai Morales, Jordana Spiro, Jason Butler Harner, Peter Mullan, Lisa Emery.
Emissora: Netflix
Gênero: Drama, Crime
Duração: 60 minutos (aprox.)
Texto escrito por Evandro Claudio
Review | Jotun
Em 2015 os jogos indies estavam a todo vapor. Para quem não sabe grandes títulos como Axion Verge, Soma e até mesmo o próprio Undertale estavam saindo do forno para a mãos dos diversos jogadores em busca de novos desafios e histórias para serem apreciadas. Com isso, em setembro, Jotun chegou para entrar no time de elite dos melhores jogos indies de todos os tempos.
Jotun foi lançado em 29 de setembro de 2015 pela desenvolvedora Thunder Lotus Games. Em Jotun nos controlamos a viking Thora, na qual obteve uma morta inglória. Para recuperar sua honra, Thora deve impressionar os deuses vencendo os colossais Jotuns e assim conseguindo seu mérito para subir até Valhalla.
Ao começar a jogar Jotun, podemos notar a vasta rica história presente em cada passo que damos, cada cenário é uma lição da mitologia nórdica, fazendo até mesmo jogadores mais curiosos pesquisarem a respeito dos locais que Thora está. O purgatório no qual é chamado de Ginnungagap, o verdadeiro significado da palavra Jotun e a explicação de Jotunheimen, a criação de Niflheim e Muspelheim e outras informações mais interessantes completam a própria história dos Jotuns e dos motivos de estarem naqueles respectivos ambientes.
Falando um pouco mais dos Jotuns, existem ao todo 6 Jotuns no qual devemos enfrentar, cada um com sua forma de combate e poderes únicos que devem ser analisados para ter um maior sucesso em combate. Talvez essa seja a parte mais empolgante do jogo, já que enfrentar esses gigantescos inimigos se torna uma verdadeira prova de paciência e estratégia para cada um deles. Alguns Jotuns conseguem ser mais rápidos e desafiadores que os outros contendo 3 etapas de combate conforme suas vidas vão diminuindo, assim, obrigando o jogador a saber o momento exato de bater e esquivar dos golpes dos gigantes. Aqui, igual aos clássicos jogos da série Souls, ser mesquinho em seus golpes podem fazer o jogador a perder a batalha e ter que recomeçar uma extensa batalha novamente.
Para chegar até esses colossais inimigos, Thora deve obter as runas de Odin que estão presentes nas respectivas “fases” desses Jotuns. A exploração é um ponto crucial nesse momento do jogo, onde as recompensas fazem Thora ficar mais forte ao decorrer do jogo. Na exploração é possível achar a arvore de Ithunn e as estatuas em homenagem aos deuses, no qual melhora a vida e dão poderes de combate a Thora. Quanto mais o jogador obter esses coletáveis mais fácil será o progresso.
Cada fase consegue surpreender o jogador do início ao fim, a bela arte feita a mão pela produtora é um dos pontos mais incríveis de se observar criando uma obra de arte única em um mundo incrível no qual o jogador viaja. Existem acontecimentos nessas fases, aonde algumas delas requer a interação com certos objetos como se esconder em paredes, utilizar plantas medicinais, ou desvendar puzzles para abrir novas localizações de avanço.
Falando mais da personagem principal, Thora consegue ser totalmente um personagem de peso no jogo, conforme o jogador derrota os Jotuns Thora conta um pouco de sua gloriosa história desde seu nascimento até sua busca a surpreender os deuses e subir para Valhalla. A belíssima língua islandesa faz a narração ser excelente dando um toque perfeito para a personagem principal, as emoções de Thora são bem atrativas graças ao complemento da trilha sonora que consegue expandir melhor seus sentimentos.
E que trilha sonora. Talvez uma das trilhas mais incríveis e bem-feitas que pude escutar em um jogo indie, cada combate com Jotun, cada fase, cada momento de conquista tem uma trilha única perfeita e épica, o artista Max LL conquistou seu pódio graças a obra do jogo. A trilha mais lembrada seja a do Jotun do trovão no qual envolve uma trilha instrumental mais forte e impactante para o combate.
Infelizmente, Jotun é um jogo muito rápido, tendo um tempo médio de 3 horas de jogatina. Mesmo com a opção de BossRush e suas conquistas mais complicadas, o jogo não deve se estender exageradamente por um longo tempo, dando a verdadeira sensação de querer mais e não poder fazer nada a respeito.
Por fim, Jotun é um excelente jogo que deve ser apreciado devagar, sua história, arte, trilha, combate, todos esses detalhes no qual fazem o jogador explorar e explorar se tornam únicos para um game com um tempo tão rápido, mas um carinho e respeito enorme pelos fãs do jogo, e então “preparado para Impressionar os deuses? ”
Jotun
Desenvolvedora: Thunder Lotus Games
Plataforma: PS4, PC, Xbox One, Wii U
Gênero: indie, exploração