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Crítica | Amsterdam desperdiça grande elenco com trama enfadonha e sem graça

É curioso observar como David O. Russell foi das celebrações mais exageradas ao esquecimento total. No início dos anos 2010, o cineasta americano conseguiu uma trifecta invejável ao ser indicado ao Oscar três vezes consecutivas, além de garantir indicações e vitórias para boa parte de seus respectivos elencos: o drama de boxe O Vencedor, a comédia dramática O Lado Bom da Vida e o thriller cômico Trapaça; todos lhe garantiram indicações como roteirista e diretor.

Mas após Joy: O Nome do Sucesso, foi como se Hollywood subitamente se cansasse de David O. Russell. Pessoalmente, nunca tive admiração alguma por seu trabalho, com exceção do charme irresistível de O Lado Bom da Vida, e tal fiasco levou o diretor a “se esconder” por 7 anos até o lançamento de Amsterdam, produção que aposta novamente em um elenco gigantesco um mix de gêneros que tanto agradam ao diretor. Porém, o resultado aqui é sem dúvidas o ponto mais baixo de sua carreira até agora.

Na trama, os amigos e veteranos de guerra Burt Berendsen e Harold Woodsman (Christian Bale e John David Washington) são contratados para investigar a misteriosa morte de seu antigo general. Porém, os dois logo são incriminados pelo assassinato brutal de sua neta, e precisarão se reencontrar com uma velha amiga enfermeira (Margot Robbie), para limpar seus nomes e encontrar os responsáveis por trás do crime.

De início, Amsterdam adota diversos elementos de um clássico whodunit; subgênero que Hollywood aprendeu a amar novamente após o sucessos de Entre Facas e Segredos e Assassinato no Expresso do Oriente. A ambientação é extremamente funcional, com o design de produção recriando com perfeição a Nova York dos anos 30, e a dupla de Bale e Washington facilmente se encaixando como duas figuras típicas do cinema de detetive noir da década de 1940. A amizade da dupla, por sinal, é de longe o ponto mais brilhante e agradável do filme todo.

Assim que o roteiro de Russell começa a avançar no desenrolar do mistério, tudo começa a desmoronar. Apesar de um bom estabelecimento de amizade entre Bale, Washington e a enfermeira de Margot Robbie – e o desejo do trio de largar tudo e conseguir voltar para os dias de paz e conforto em Amsterdã -, é virtualmente impossível de se manter em interesse na jornada do filme. O desfecho e o objetivo geral de Russell, que supostamente é inspirado em eventos reais, é extremamente absurdo e digno de um desenho animado de baixa qualidade

Não ajuda o fato de que, mesmo absurda, a trama do filme seja bem linear e direta e constantemente interrompida. O grande problema está no tamanho do estelar elenco, que parece ter uma regulamentação para o tempo de tela de cada um: o filme literalmente estaciona seu desenvolvimento e jornada para dar atenção a cada um dos membros de seu extenso elenco, que inclui grandes personalizes como Michael Shannon, Rami Malek, Anya Taylor-Joy, Chris Rock e até o veterano Robert De Niro. Amsterdam dá as mais bruscas e tediosas pausas em sua – igualmente tediosa – trama para dar espaço a cada um deles, que atuam como se estivessem hipnotizados; em uma estranha decisão de Russell como diretor de atores, que parece conduzir seu elenco como se estivessem em uma peça de teatro ruim.

A única exceção fica com Christian Bale, que parece navegar muito bem nesse palco torto e estranho. É uma das ocasiões em que o astro mais pôde exercer seus músculos de comediante, visto que seu personagem exibe muita comédia física graças ao fato de ter um olho de vidro muito mal encaixado. É literalmente o único elo fácil de se seguir e acompanhar, já que nem o pseudo casal formado por Margot Robbie e John David Washington é capaz de oferecer alguma química ou brilho.

Falho como roteirista e condutor de elenco, David O. Russell mostra-se igualmente problemático em sua direção técnica. Mesmo aliado do badalado diretor de fotografia Emmanuel Lubezki (triplamente premiado com o Oscar por Gravidade, Birdman e O Regresso), Russell faz de Amsterdam uma experiência visualmente genérica e sem qualquer valorização de seu grande elenco e ambientação. A linguagem de Russell se resume a planos médios lotados de pessoas e movimentações de câmera simplórias, que em nada parecem aproveitar as forças de Lubezki – preso a uma paleta de cores imutável e lavada.

Mesmo com um elenco maravilhoso em mãos, David O. Russell faz de Amsterdam uma das experiências mais vazias e tediosas de 2022. É uma história impossível de se seguir com interesse, povoada por figuras desinteressantes e diálogos enfadonhos. Pode não ser o pior filme do ano, mas é um dos mais insuportáveis.

Amsterdam (EUA, 2022)

Direção: David O. Russell
Roteiro: David O. Russell
Elenco: Christian Bale, Margot Robbie, John David Washington, Chris Rock, Rami Malek, Anya Taylor-Joy, Robert De Niro, Zoe Saldaña, Michael Shannon, Mike Myers, Taylor Swift, Timothy Olyphant
Gênero: Comédia
Duração: 134 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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