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Análise | Final Fantasy VI – A Obra-Prima da Square

Sendo um gamer, é muito provável que você já tenha, no mínimo, ouvido falar de Final Fantasy VI. Ainda que o seu sucessor seja mais famoso, FFVI é, por muitos, considerado como a melhor entrada da franquia, o que não ocorre por mero acaso.

O sexto jogo da série marcou a substituição de Hironobu Sakaguchi por Yoshinori Kitase e Hiroyuki Itou como diretores do game. Sakaguchi, criador de Final Fantasy, permaneceu como produtor. Vale lembrar que o jogo foi lançado no ocidente para o Super Nintendo como Final Fantasy III, tendo o nome posteriormente corrigido para a numeração original nas versões para outros consoles.

A obra se inicia com uma cinemática que nos conta sobre a Guerra dos Magi, um conflito entre usuários de magia que chegou perto de destruir o mundo, que ocorreu mil anos antes dos eventos que acompanhamos no jogo. Com o seu término, a magia deixou de ser utilizada e, com o tempo, esquecida. Até que o Império Gestahliano passou a utilizar Espers para reviver esse poder antigo.

Não é preciso dizer que esse Império tem certas tendências expansionistas e uma sede insaciável por poder. Ainda mais óbvio, é o surgimento de um grupo rebelde para combater Gestahl, intitulados de Returners. No meio dessa trama, está Terra Branford (ou Tina, na versão americana de SNES), uma usuária de mágica que tinha sua mente controlada pelo Império. Esse controle mental se encerra durante a missão que abre o jogo. Terra é mandada com mais dois soldados, Wedge e Biggs (clara referência a Star Wars), para a cidade de Narshe, onde devem encontrar o Esper lá localizado e levarem de volta para o Império. Depois de uma resistência por parte das tropas locais, Wedge e Biggs são mortos pelo Esper que, então, deixa Terra desacordada.

Salva por um morador de Narshe, Terra tem sua tiara de escravo retirada, acabando assim com seu controle mental. A partir desse ponto, a menina é colocada no meio de eventos que acabariam fazendo dela a única esperança do grupo rebelde. Assim como na maioria dos jogos da série, a história parece ser a mais simples possível – é através dos detalhes e desenvolvimento dos personagens, contudo, que Final Fantasy VI se torna único.

Embora o Império seja constantemente uma ameaça no jogo, o verdadeiro vilão é Kefka Palazzo, a mão direita do Imperador Gestahl. Kefka é provavelmente a figura de maior insanidade em toda a franquia, veste-se como um palhaço e atua como o mago da corte, seguindo as ordens do imperador. Tão logo, contudo, descobrimos que ele tem seus próprios objetivos em mente. Desde o início do jogo sua maldade já é deixada em evidência pelos seus próprios diálogos e pelas tropas imperiais que conversam entre si, em medo da loucura do palhaço. Sem a menor sombra de dúvidas, a risada de Palazzo é uma das marcas de FFVI.

Ao contrário dos vilões anteriores da série, Kefka não é distante dos protagonistas, fazendo diversas aparições frente a frente dos personagens principais, ao longo de todo o jogo. Vale ressaltar, também, que seu poder não é nada grandioso no início do game, ele progride conforme a história se desenrola, culminando em sua aparição final como último chefe, em sua forma “divina”, marcando o início de uma caracterização recorrente na série quando se trata do último inimigo. Essa escolha por parte dos criadores permite que o antagonista seja desenvolvido gradualmente, possibilitando que o jogador o conheça melhor.

Também, de forma única até então na série, Kefka se revela como um personagem profundo, em detrimento dos vilões anteriores, que eram perversos simplesmente porque assim foram criados. Palazzo é fruto da primeira experiência do Império com a magia e, ao mesmo tempo que garantiu poderes à cobaia, garantiu sua insanidade. Sua crueldade desmedida e desprezo pela vida acaba progredindo, ao longo da história, para o niilismo, realizando diversos questionamentos sobre o propósito da vida humana.

 

Também fruto de experiências imperiais, Terra tem um paralelo traçado automaticamente com o palhaço – ela é o que ele deveria ter se tornado. A protagonista tem como seu traço mais marcante a inocência – com o término de seu controle mental, ela se torna confusa e pouco a pouco tem suas memórias reavivadas, em meio a diversos questionamentos sobre sua identidade. Aliás, toda a sua história funciona como trágica metáfora para o abuso sexual, até mesmo sua perda de memória reflete a memória suprimida por parte de vítimas dessas situações. Toda sua luta para ir contra aqueles que a utilizaram é o que faz da personagem uma das mais fortes de toda a franquia, gerando um vínculo imediato do jogador com ela.

Digno de nota, também, é a introdução de um dos elementos mais emblemáticos da franquia, enquanto a ambientação de fantasia medieval é substituída por um universo steampunk, que mistura o velho ao novo, algo que veríamos em diversas futuras entradas da série. Claro que pontuais elementos mais futuristas já aparecem na franquia, como os barcos voadores, mas é aqui que essa fusão ocorre com toda a força. Então espere ver diversas máquinas e tecnologias à vapor, castelos de metal, sem falar no tom mais sombrio que o jogo automaticamente adquire, através das cores mais escuras, contrapondo-se aos tons vibrantes costumeiros dos jogos anteriores.

Esse tom sombrio é amplificado pela própria trama que é, do início ao fim, mais adulta – voltamos, pois, à metáfora do abuso -, com alguns momentos de alívio cômico. Tal fator permanece nos próximos dois jogos da franquia. O próprio Kefka é um bom retrato disso, sua psicopatia é, certamente, desconcertante em diversos momentos, já em outros ele apenas parece ser alguém com muitos parafusos a menos. Essa pluralidade, observada também em diversos outros personagens, faz deles todos inesquecíveis.

A jogabilidade permanece, em geral, a mesma de Final Fantasy V. O active time battle, agora já solidificado na franquia, faz o seu retorno. As batalhas estão mais dinâmicas que nunca, embora o grinding ainda seja necessário (é um JRPG afinal, não dá para fugir muito disso).

A inovação em termos de mecânica se encontra na equipe. Ela pode contar com até quatro membros dentre os catorze disponíveis (o maior número na série toda) adquiridos ao longo da história. É possível alterar os membros da equipe nos save points e enquanto fora de cidades ou dungeons. Assim como em FFIV, cada personagem possui habilidades únicas – através dos Espers e de acessórios, contudo, é possível ensinar habilidades novas para cada um deles – o jogador já experiente pode fazer de um membro da equipe o que ele quiser, desde um mago poderoso até um lutador, aumentando ainda mais a versatilidade da equipe, além de não nos limitar a um grupo fixo – em essência, podemos escolher aqueles que mais gostamos.

Em alguns pontos do game, os personagens são divididos em equipes diferentes, cada uma realizando determinada tarefa. Tais momentos, para a felicidade dos jogadores que visam um balanceamento da equipe, não duram muito, ocorrendo somente quando a história assim o pede. De qualquer forma, não deixa de ser uma bela inovação da franquia, que, mais do que nunca, prioriza a história e o desenvolvimento de cada personagem.

Não posso encerrar esta crítica sem antes falar da trilha sonora do game. Sem exageros, ela é uma obra de arte, definitivamente uma das melhores de toda a franquia, se não for a melhor. Peças como Terra’s Theme marcam o início do jogo, já nos colocando no clima mais adulto da obra, definindo, também, o tom épico da jornada. A música mais marcante, contudo, é Dancing Mad, tocada em partes nos estágios da batalha final contra Kefka. Em sua realização, Nobuo Uematsu, tomado pela loucura do palhaço, alega ter trabalho em cima dela sem parar, até a música adquirir seus 14 minutos de duração, se tornando uma das mais icônicas (e a mais longa) músicas de toda a franquia.

Não é à toa, portanto, que Final Fantasy VI é considerado um dos melhores RPGs já feitos. Ele conta com todos os elementos de sucesso da franquia até então e os insere em uma história nada menos que fantástica. Cada um dos personagens é muito bem trabalhado, principalmente, claro, a protagonista e o vilão Kefka, que irão rapidamente cativar qualquer jogador. Não é um jogo que merece, mas sim precisa ser jogado – é uma experiência simplesmente inesquecível, a obra-prima da Square.

Final Fantasy VI
Desenvolvedora:
 Square

Lançamento: 2 de Abril de 1994 (Japão), 20 de Outubro de 1994 (EUA)
Gênero: JRPG
Disponível para: SNES, PS, GBA, Wii Virtual Console, PSN, iOS, Android

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Publicado por Guilherme Coral

Refugiado de uma galáxia muito muito distante, caí neste planeta do setor 2814 por engano. Fui levado, graças à paixão por filmes ao ramo do Cinema e Audiovisual, onde atualmente me aventuro. Mas minha louca obsessão pelo entretenimento desta Terra não se limita à tela grande - literatura, séries, games são todos partes imprescindíveis do itinerário dessa longa viagem.

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