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Crítica | Lightyear é o primeiro filme falso da História da Pixar

No que diz respeito à dupla central da franquia Toy Story, confesso que sempre fui mais fã do Buzz Lightyear. Naturalmente, vem da minha preferência pessoal de ficção científica à westerns, com a figura de um patrulheiro espacial sendo bem mais interessante e divertida do que a de um cowboy, por mais carismático que fosse. Por isso, é até com certa curiosidade que enxergo este peculiar Lightyear, um filme que não se encaixa tecnicamente como prelúdio ou derivado – e chegarei nisso mais à frente – mas também mantém a franquia da Pixar viva de forma única.

O problema, porém, é justamente a forma como a Disney e a Pixar optam por posicionar e contextualizar Lightyear, em uma decisão que – pelo menos para mim – mostra-se um verdadeiro tiro no pé.

A trama do filme nos apresenta ao patrulheiro espacial Buzz Lightyear (voz de Chris Evans no original), que acaba acidentalmente prendendo a si mesmo e sua equipe em um planeta alienígena desolado. Enquanto tenta encontrar uma forma de reparar seu erro e tirá-los dali, os experimentos envolvem o uso de hiper velocidade, o que acaba levando Buzz anos e anos em direção ao futuro. As viagens vão acelerando-se até o momento em que ele e seus colegas passam a ser atacados por uma força alienígena misteriosa.

Além do Infinito

Como fã de ficção científica, estou sempre aberto para aventuras espaciais, especialmente de exploração. O roteiro assinado por Jason Headley e o diretor Angus MacLane é bem simplista nessa proposta, oferecendo um objetivo claro e uma lição de moral que é bem presente. Repetitiva e sem muitas nuances, mas que funciona perfeitamente bem no tipo de história que Lightyear se propõem a contar, analisando a obsessão de um homem por seu serviço e as dificuldades diversas de se lidar com erros pessoais e o peso da culpa.

MacLane e Headley também criam diversos núcleos de personagem ao redor de Buzz, com o foco residindo em um grupo de guerreiros nada preparados e atrapalhados (claro). São boas interações e que garantem diversas tentativas de humor, mas nenhuma delas é tão eficiente quanto a de Sox, o gato robô que acompanha Buzz durante suas missões. Apesar de ser a tentativa mais apelativa possível de se vender brinquedos, é inegável o nível de humor e carisma que o bichano robotizado tem, principalmente por apresentar uma dicção sempre monótona e inexpressiva, potencializando ainda mais o elemento cômico.

Naturalmente, essa crítica não contém spoilers, mas há uma reviravolta complicada envolvendo o vilão Imperador Zurg (voz de James Brolin no original), que era uma figura icônica na franquia Toy Story, servindo como clara paródia ao Darth Vader de Star Wars. É uma excelente ideia no papel, mas que em execução se mostra confusa e sem sentido dentro da narrativa, quase como se o valor de choque fosse mais valioso do que a própria coerência.

Caindo com estilo

Ainda assim, o grande destaque de Lightyear é mesmo seu poderio técnico. A Pixar sempre esteve passos à frente no que diz respeito a animação em 3D, com obras como Procurando Nemo, Ratatouille e o recente Soul aprimorando ainda mais a criação de imagens totalmente computadorizadas. É um grau de realismo e sinergia visual que atinge um novo ápice com Lightyear, que impressiona com as sequências envolvendo as viagens espaciais, os saltos na velocidade da luz e também a variedade de ambientes, espaçonaves e alienígenas presentes ao longo da projeção.

Vale também pontuar a excelente habilidade do estreante Angus MacLane em comandar cenas de ação. Fã assumido do personagem de Buzz Lightyear há anos, desde antes de se formar como animador e co-dirigir Procurando Dory, MacLane aproveita ao máximo as liberdades da cinematografia virtual e da falta de limites físicos para criar ótimas cenas de ação: seja em confrontos de homens com robôs, perseguições de naves espaciais e, em especial, uma caminhada no espaço que é capaz de tirar o fôlego graças ao inebriante uso do silêncio para exacerbar a tensão e o suspense. Tudo movido também pela empolgante trilha sonora de Michael Giacchino, que apesar de ser sua colaboração mais fraca com a Pixar, ainda é perfeitamente funcional.

Porém, por mais que tenha todas essas qualidades gráficas e narrativas, há um elemento que simplesmente matou Lightyear para mim: o texto de abertura. Sim, antes de a narrativa de fato começar, há um lettering breve que explica que “em 1995, um garoto chamado Andy ganhou um boneco de Buzz Lightyear após assistir a seu filme preferido. Este era o filme que ele assistiu”. Dessa forma, toda a experiência de Lightyear foi simplesmente enfraquecida, já que o texto indica que tudo isso é apenas um filme falso dentro de um universo de animação. Nada muito diferente dos trailers de produções fictícias de Trovão Tropical ou a experiência de se jogar um Grand Theft Auto e sair para assistir a um filme falso dentro daquele universo.

É exatamente assim que Lightyear transparece comigo, me deixando incapaz de sentir qualquer medo, perigo, risco ou apego emocional com todos aqueles personagens em tela – teria sido muito mais fácil, mais sutil e elegante se simplesmente não houvesse texto algum. A necessidade incessante de se amarrar tudo, justificar qualquer tipo de nova produção dentro de suas respectivas “IPs” ou universos acabou sendo o fator que me invalidou o filme todo, infelizmente.

Foi isso o que tornou toda a experiência de Lightyear nula. É uma aventura funcional e divertida, com bons personagens e sequências de ação, mas que no fim não significa nada muito além de uma amostragem de gráficos e CGI. 

Mas fico feliz que o Andy tenha gostado.

Lightyear (EUA, 2022)

Direção: Angus MacLane
Roteiro: Angus MacLane e Jason Headley
Elenco: Chris Evans, Uzo Aduba, Keke Palmer, Peter Sohn, Dale Soules, Taika Waititi, James Brolin, Isiah Whitlock Jr.
Gênero: Aventura
Duração: 100 min

Crítica em vídeo no canal de YouTube do Lucas Filmes.

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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