Com a recepção morna de A Rebelião das Máquinas, a franquia Exterminador do Futuro entrava no complicado período que enfrenta até hoje: as reinvenções para sobreviver. A cada novo projeto, estúdio e distribuidora, a saga de James Cameron ganha uma nova roupagem e abordagem, e em 2009, com os direitos sendo transferidos de Mario Kassar e Andrew G. Vajnar para a Halcyon Company, veríamos pela primeira vez um capítulo da franquia completamente diferente dos demais. Esquecendo a viagem no tempo e a já redundante fórmula de impedir o Julgamento Final, O Exterminador do Futuro: A Salvação vem com a empolgante premissa de ficar apenas no futuro apocalíptico que os outros filmes haviam apenas sugerido. O resultado? Muito menos do que poderia ser, mas não deixa de ser um entretenimento eficiente.
A trama é ambientada na Los Angeles de 2018, mas um pouco diferente da que conhecemos agora. A humanidade foi praticamente erradicada após a Skynet tomar consciência no Julgamento Final, e pequenas facções de um grupo conhecido como a Resistência lutam contra andróides e exterminadores, procurando humanos sobreviventes. Nesse cenário, John Connor (Christian Bale) precisa provar seu valor e tornar-se o líder da Resistência, e o grande teste vem quando ele precisa garantir a sobrevivência de seu futuro pai, ainda um jovem Kyle Reese (Anton Yelchin). No meio disso tudo, um estranho chamado Marcus Wright (Sam Worthington) acorda nesse cenário desolado, e apresenta uma estranha conexão com a Skynet que pode determinar o futuro da guerra.
As Consequências do Julgamento Final
Era o caminho ideal para a franquia. A ausência de novidades em A Rebelião das Máquinas demonstrava que a fórmula estava batida, e até mesmo a série de TV Terminator: The Sarah Connor Chronicles também já tinha extraído muito suco daquela dinâmica familiar, então é certo assumir que uma história ambientada na guerra futurista era o único caminho possível – afinal, todos sabemos o mumble jumble que o então inédito Exterminador do Futuro: Gênesis iria causar, certo? O roteiro traz apenas os nomes de John Brancato e Michael Ferris creditados, visto que o contrato da dupla do filme anterior incluía um quarto filme, mas é de conhecimento geral que o longa foi uma bagunça nesse departamento. Nomes como os de Paul Haggis, Shawn Ryde e até mesmo de Jonathan Nolan passaram pelo texto, que acaba soando desnecessariamente complexo e inchado de tantas subtramas; em algo que deveria ser algo simples e direto, como foi Mad Max: Estrada da Fúria alguns anos depois.
As ideias certamente funcionam. Ter Connor como uma espécie de “messias” por parte dos resistentes e taxado como lunático pelos superiores é uma linha de raciocínio lógica e condizente com o caráter religioso de seu próprio nome, além de se realista por não deixar um qualquer assumir a liderança da única linha de defesa da Humanidade. A inversão de papéis envolvendo o jovem Kyle Reese também é divertida, pelo simples de fato de termos o protetor do primeiro filme entrando no papel de alvo principal, e precisando ser salvo por seu próprio filho adulto, para garantir sua existência… É um paradoxo maluco, mas digno do trabalho original de Cameron. O problema é que nenhuma dessas linhas ganha um tratamento apropriado, com Brancato, Ferris e todos os outros escritores fantasmas trazendo um tom esquizofrênico e diálogos que se levam a sério demais e forçam um tom sombrio que jamais convence.
A questão com o personagem de Marcus Wright é outra adição agridoce. Por mais que a revelação de que o sujeito seja um Exterminador sem saber seja eletrizante, seu conceito no geral não faz sentido. É uma máquina com órgãos e consciência? Tudo bem que estamos falando de ficção científica, mas nunca fica claro como Marcus pode ter sobrevivido após tantos anos e ainda funcionar nesse estado peculiar; e todo o clímax que envolve seu confronto online com a Skynet sendo representada por Helena Bonham Carter é simplesmente ridículo, além de passar sobrevoando pelo velho clichê da criatura que não encontra seu propósito para sobreviver. Mas Sam Worthington é bem eficiente e carismático em seu retrato de Marcus, sendo sua primeira grande performance em Hollywood antes do estrondoso sucesso de Avatar, naquele mesmo ano.
Antes da Estrada da Fúria
Como filme de ação, A Salvação funciona melhor. Não é surpresa nenhuma dizer que McG é a escolha menos inspirada do mundo para se dirigir um filme de Exterminador, mas felizmente vemos um esforço real do cineasta de As Panteras Detonando aqui. Optando por um visual completamente distinto dos filmes da franquia, e também de sua própria filmografia, McG e o diretor de fotografia Shane Hurlbut adotam um filtro de película especial que garante uma colorização predominantemente cinza e dessaturada ao filme, já estabelecendo um look pós apocalíptico impactante e capaz de criar uma atmosfera própria. Tal decisão estética também contribui para o visual sujo dos personagens, com destaque para os exterminadores criados através de um misto de maquiagem, efeitos práticos e CGI – os T-600 são amedrontadores com seu sistema de “camuflagem” que inclui roupas humanas e uma pele falsa sobre o endosqueleto metálico.
Na ação, McG se mostra mais inventivo e pé no chão do que o normal. Sua câmera é urgente e aposta em diversos planos longuíssimos, como aquele em que acompanhamos a queda de helicóptero de Connor em um único enquadramento no interior da cabine ou as trocas de eixo quando Marcus, Kyle e a pequena Star (Jadagrace) fogem de um posto de gasolina. Essa mesma abordagem é adotada em uma das melhores cenas do filme, quando o mesmo trio precisa fugir de “Moto-Exterminadores”, uma atualização interessante e ameaçadora para este mundo. A câmera de McG é intensa na medida certa, ao passo em que a trilha sombria de Danny Elfman e a montagem precisa do veterano Conrad Buff IV são os toques finais para que essas sequências se sobressaiam.
Só fica menos interessante no clímax, que é certamente o setor mais fraco do longa. Aqui, a ação também torna-se um pouco mais debilitada, com muito mais CGI e uma estética clean que destoa radicalmente daquele universo. Claro, temos o memorável fan service com a aparição de um T-800 com a cara de um rejuvenescido Arnold Schwarezenegger para lutar com John Connor, mas não vai muito além disso.
Não deu pra salvar
Por mais saborosa que seja sua premissa, O Exterminador do Futuro: A Salvação não consegue viver à expectativa. Um roteiro amarrotado acaba ficando no caminho de uma condução muito eficiente e uma mitologia vasta, mas temos bons momentos quando o filme de McG se dedica exclusivamente à ação. É uma pena que o resultado seja apenas mediano. Quem sabe o futuro não ganha uma nova chance em outra realidade?
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O Exterminador do Futuro: A Salvação (Terminator Salvation, EUA – 2009)
Direção: McG
Roteiro: John Brancato e Michael Ferris, baseado nos personagens de James Cameron
Elenco: Christian Bale, Sam Worthington, Bryce Dallas Howard, Anton Yelchin, Moon Bloodgood, Common, Helena Bonham Carter, Jadagrace, Jane Alexander, Michael Ironside, Ivan G’Vera
Gênero: Ação, Ficção Científica
Duração: 115 min