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Crítica | O Predador (2018) é uma péssima tentativa de reboot

Trazido ao mundo por John McTierman no excelente filme de ficção científica de ação, o Predador rapidamente tornou-se um dos ícones do gênero no cinema. É uma conquista praticamente única, visto que a continuação protagonizada por Danny Glover não provocou o mesmo entusiasmo, o reboot com o estelar elenco liderado por Adrian Brody não alcançou seu potencial e os conflitos em Alien vs Predador definitivamente não passaram de um entretenimento guilty pleasure.

O Predador definitivamente merecia mais, e é uma barra alta para alcançar. Por isso, a Fox resolveu tentar novamente, encomendando um novo reboot com o diretor Shane Black, conhecido por seu trabalho em comédias policiais – como Máquina Mortífera, Beijos e Tiros e o fantástico Dois Caras Legais. Porém, o experimento deu terrivelmente errado. Batizado simplesmente de O Predador, o novo filme comprova que Black deveria manter sua atenção em sua zona de conforto, e mostra tudo o que não devemos fazer com o personagem.

A trama começa quando um Predador rebelde segue em rumo para a Terra, sendo perseguido por uma versão maior e mais brutal do alienígena. Com a queda de sua nave, alguns de seus aparatos acabam nas mãos do atirador de elite Quinn McKenna (Boyd Holbrook), que logo os envia para sua própria casa a fim de escondê-los do governo. A máscara e a manopla do Predador acabam com o filho de Quinn, Rory (Jacob Tremblay), iniciando uma corrida contra o tempo entre os dois Predadores rivais, McKenna, a cientista Casey (Olivia Munn) e um grupo de soldados lunáticos.

Shane Blackismos

Confesso que não foi nem um pouco fácil sumarizar e tentar lembrar de cabeça a premissa básica de O Predador. Desde sua concepção inicial, a ideia de ter Shane Black envolvido com um dos grandes ícones da ficção científica parecia equivocada. Não importa se Black até participou do filme de Arnold Schwarzenegger como ator, seu trabalho na criação da história (ao lado de Fred Dekker) é absolutamente desastroso, pois notamos como o estilo muito particular de sua escrita não é capaz de sustentar a fórmula específica do gênero, tampouco reinventá-lo ou trazer algo novo.

Todas as decisões parecem ser erradas, principalmente em execução. A própria ideia de McKenna enviar a caixa com equipamento alienígena altamente perigoso para sua própria família é de uma estupidez insana, assim como a ideia ainda mais absurda de que uma criança seria capaz de acionar e controlar os aparatos do Predador em seu próprio porão. 

De muitas formas, este novo Predador remete muito ao desserviço que Colin Trevorrow fez com a franquia Jurassic Park em seu Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros. O fato de termos personagens constantemente referenciando o filme original, as piadas auto conscientes com a mitologia do alienígena e até mesmo o fato absurdo de alguns personagens literalmente “brincarem” com as armas do Predador resultam em sua completa desmistificação. Algo que era especial, misterioso e único tornou-se banal, com destaque para a cena final do longa, que é uma verdadeira ofensa não apenas aos fãs do personagem, mas diria que também do bom cinema. 

Mesmo com um bom elenco em mãos, é difícil se afeiçoar aos personagens, que são tão mal escritos e têm infortúnio de proclamar alguns dos diálogos mais ridículos do ano – não existe fan service pior do que os vistos aqui (“You are one beautiful motherfucker”). Boyd Holbrook faz um bom papel como protagonista, mas nada que realmente se destaque. Olivia Munn surge deslumbrante como sempre, mas sem ter muito o que fazer. A grande surpresa fica com Sterling K. Brown, que interpreta um sujeito deliciosamente asqueroso e inescrupuloso, e comprova a versatilidade do ator para papéis antagonistas.

A carta fora do baralho, especialmente quando ouvimos o nome Predador, é o jovem Jacob Tremblay. Infelizmente, o esforçado ator está preso em um filme completamente diferente, apenas servindo à necessidade obsessiva de Black de ter “crianças espertinhas” em seus filmes, algo presente em praticamente em todos os seus roteiros. O retrato que Tremblay faz de um garoto autista é funcional e respeitoso, mas desperdiçado a serviço de algo anacrônico e sem sentido. Por fim, Trevante Rhodes (de Moonlight: Sob a Luz do Luar) tenta trazer algum peso dramático na pele de um comandante suicida, enquanto Keegan-Michael Key, Thomas Jane, Augusto Aguillera e Alfie Allen preenchem a cota de alívios cômicos. 

A Caçada é uma Bagunça

Como diretor, Black não apresenta nada demais. Se comparar com seu trabalho feito no irregular Homem de Ferro 3, que ao menos contava com algumas cenas de ação interessantes, é uma tremenda queda em seu talento. Colocando todas as cenas de ação à noite, sua mise en scéne é vítima da confusão e de efeitos visuais medianos, onde mal conseguimos acompanhar as lutas e perseguições. Há um terrível desequilíbrio tonal, onde Black mistura as intenções de fazer um tipo de cena intensa e rápida com uma abrupta entrada de atmosfera mais lenta (apenas reforçada pelo desaparecimento da trilha musical de Henry Jackman), algo que gera um desapego completo do espectador, que não sabe se deveria estar vibrando, com medo ou dando risada. 

A montagem do filme é das mais problemáticas, do tipo em que diversos núcleos (como o da esposa/ex-esposa de McKenna, o status nem ao menos fica claro) acabam simplesmente esquecidos de uma transição de cena a outra. E sabemos que elipses são importantes para economizar informações, mas elementos cruciais como um novo arsenal de armas e até mesmo um helicóptero não podem surgir magicamente nas mãos dos protagonistas, que eram soldados repreendidos naquele ponto – e me questiono quantos soldados americanos realmente conseguiriam arranjar um helicóptero tão rápido, no meio da noite. Fica aí uma ideia de derivado bem mais interessante.

Quanto à criatura do título, Black não faz nada para expandir sua mitologia de forma animadora. O chamado “Super Predador” é uma mera versão mais alta e forte do Predador comum, com a diferença de ser criado inteiramente por efeitos digitais, que transparecem facilmente em cena – especialmente quando temos um ator de carne e osso interpretando o outro Predador. O vilão nunca torna-se ameaçador ou memorável, com a ausência de uma máscara também atuando contra sua vantagem, e nem todo o sangue digital do mundo (o gore é presente, mas artificial e risível) conseguem nos fazer temer esse personagem tão genérico. 

Get to the chopper… E fuja desse filme

O Predador é uma verdadeira bagunça de filme, nunca sabendo se irá mesmo honrar o terror e suspense do original ou descambará de vez para o trash e o humor negro deslocado. Força a violência gráfica de forma artificial e tece algo que definitivamente é uma das manchas mais feias que o alienígena já teve em sua trajetória pelos cinemas. Mostra que Shane Black definitivamente não funciona fora de sua zona de conforto, e ele faria um grande favor a si mesmo – e ao público – se ficasse longe de blockbusters e trouxesse mais pérolas preciosas como Dois Caras Legais.

O Predador (The Predator, EUA – 2018)

Direção: Shane Black
Roteiro: Shane Black e Fred Dekker, baseado nos personagens de Jim Thomas e John Thomas
Elenco: Boyd Holbrook, Olivia Munn, Sterling K. Brown, Keegan Michael Kelly, Jacob Tremblay, Trevante Rhodes, Thomas Jane, Alfie Allen, Augusto Aguilera
Gênero: Ação, Ficção Científica
Duração: 108 min

Especial Predador

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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