Crítica | Black Mirror - Temporadas 1 e 2

Crítica | Black Mirror - Temporadas 1 e 2

O formato da antologia é uma das formas de narrativa mais vantajosas e eficientes do meio audiovisual. Às vezes, uma história é longa demais para um formato mais curto, ou simples demais para algo que transcenda a definição de longa-metragem ou múltiplas temporadas. Além da Imaginação foi o ápice dessa coleção de histórias, onde cada episódio apresentava uma trama fechada que mantinha a assinatura de Rod Serling ao longo de suas reviravoltas e personagens marcantes.

Agora, ainda que o formato tenha se espalhado por diversas produções da televisão mundial (notavelmente, por Ryan Murphy e seu American Horror Story), a série que carrega o manto de Serling mais honradamente e serve como a definitiva versão contemporânea de sua obra prima é Black Mirror, do britânico Charlie Brooker. O título da série vem da esperta sacada com aparelhos eletrônicos, mas especificamente os smartphones e monitores de computador, já assumindo que sua antologia é centrada na influência da tecnologia na sociedade, jogada em um cenário de ficção científica que flerta com a distopia e o cyberpunk.

Tamanho o sucesso da série, a Netflix lançará uma nova temporada este ano, então é o momento perfeito para conhecer pela primeira vez a criação de Brooker.

Aqui, vamos dar uma olhada nos episódios que compoem as duas temporadas.

1ª Temporada

1 - Hino Nacional

O piloto da série apresenta a trama mais "simples" e contemporânea da série, passando longe de grandes inovações tecnológicas ou ficção científica pesada. Aqui, o Primeiro-Ministro Michael Callow (Rory Kinnear, excelente) é chantageado quando a princesa Susannah (Lydia Wilson) é sequestrada por uma figura misteriosa, que ameaça matá-la a menos que o político vá na televisão ao vivo e faça sexo com um porco vivo.

Isso mesmo. Essa ameaça absurda e os vai-e-vem do governo britânico para evitá-la tomam boa parte de Hino Nacional, que concentra-se principalmente no furor midiático e ameaças invisíveis, que garantem um episódio intenso e corrido nesse quesito. É também a primeira amostra do que é Black Mirror: uma sátira perturbadora que não tem medo de explorar decisões extremas e levar seus personagens aos mais obscuros e bizarros cantos de suas mentes, e por essa linha de raciocínio, não é preciso entrar em território de spoilers para descobrir o que acontece no desfecho do episódio.

O que mais importa, porém, é o motivo pelo qual tudo isso ocorre. O sequestrador tem um ponto a provar, algo digno do Coringa de A Piada Mortal e do John Doe de Seven - Os Sete Crimes Capitais, e é realmente desconfortável assistir ao que ocorre, ainda mais quando temos a revelação dos motivos que levam o soturno antagonista a armar esse circo midiático. Todos os roteiros tem a assinatura de Charlie Brooker, e cada uma das histórias mira um elemento tecnológico para desenvolver sua visão perturbadora.

A mídia aqui é o primeiro alvo, mas Brooker ainda iria mais longe nos episódios a seguir.

2 - 15 Milhões de Méritos

A grande distopia da série, 15 Milhões de Méritos abraça o espírito de George Orwell e Aldous Huxley ao nos apresentar a uma sociedade que está sempre pedalando. Seja assistindo aos mesmos programas de televisão ou jogando os mesmos jogos repetitivos de sempre, todas as pessoas nesse ambiente pedalam em bicicletas a fim de gerar créditos pessoais e energia para a instalação, controlada por autoridades nebulosas. Nunca aprendemos nada sobre o mundo exterior ou algo além, mas fica implícito ser uma realidade alternativa.

Nesse cenário, conhecemos Bing (Daniel Kaluuya), um "pedalante" entediado que acaba se interessando por uma colega, Abi (Jessica Brown Findlay), e parece decidido a ajudá-la a ser selecionada pelas autoridades para participar de um show de talentos popular e escapar da rotina das pedaladas.

Pode parecer uma premissa boba, mas basta pensarmos no incidente com o porco para lembrarmo-nos que Black Mirror tem a capacidade de ser incrivelmente sombrio. Aqui, vem na forma de humilhação pública e a obsessão da sociedade do espetáculo, que é bem representada através do show que é um misto de The Voice e Masterchef, com jurados ainda mais sarcásticos e impiedosos do que os da vida real. A jornada de Bing é outra grande virada do texto de Brooker, que brilhantemente vira do avesso suas intenções de tornar-se um símbolo revolucionário após a irônica conclusão, que revela como absolutamente tudo pode tornar-se comerciável.

Em um nível técnico, é a maior produção de todos os episódios, e que ainda assim, surpreende pela simplicidade. O design de produção de Joel Collins e Daniel May aposta em paletas de cor cinza e imagens chapadas, dando espaço certeiro para todas as gigantescas telas de televisão e adereços simplórios, assim com o figurino de Jane Petrie é sábio em apostar em trajes de moletom para todos os "pedalantes". A direção de Euros Lyn também aproveita bem o espaço para criar enquadramentos estranhos e inventivos, como o plongée invertido para as tomadas do elevador ou as luzes ameaçadoras do gigantesco palco do talent show.

3 - Toda a Sua História

Enter the cyberpunk.

Um dos temas no qual Black Mirror se sai excepcionalmente bem é ao misturar tecnologia com relacionamentos (que renderia outra obra-prima, no premiere da segunda temporada), e aqui somos apresentados a um futuro onde a maioria da humanidade registra todos os seus acontecimentos diários com uma câmera instalada em seus globos oculares - uma tecnologia conhecida como Grain - e os armazena em vídeo, podendo literalmente acessar suas memórias instantaneamente e até mostrar projetá-las em televisores e hologramas.

É o setting perfeito para uma trama de suspense, ação e principalmente, espionagem moderna, mas o que torna este episódio tão especial é o fato de nos concentrarmos no mundano e nas situações cotidianas. Nada mais envolvente do que pegar essa premissa cabeluda e lhe inserir no clássico cenário da traição, no caso a suspeita de Liam (Toby Kebbell) de que sua esposa Ffion (Jodie Whittaker) esteja envolvida com um antigo namorado, Jonas (Tom Cullen).

Essa paranóia e obsessão que lentamente se apoderam de Liam são interessantíssimas, sendo um excelente exemplo de drama humano que ganha força extra através do elemento fantástico. O Grain é um mero instrumento que ajuda a tornar a situação mais extrema e desesperadora, ainda mais quando a narrativa nos surpreende com a dimensão que a história alcança, tendo início de uma observação tão minúscula durante um jantar entre amigos. A performance de Toby Kebbell é fantástica ao transmitir a obsessão quase psicopata de Liam, e somos capazes de ficar ao seu lado mesmo durante os momentos mais sombrios e tristes.

A ideia do Grain é outro elemento sensacional. O recurso de acessar memórias para rever tiques faciais em uma entrevista de emprego, mostrar uma festa incrível para amigos ou o deprimente momento em que Liam e Fion transam enquanto revivem memórias de outros eventos são apenas alguns dos momentos que o fabuloso texto de Brooker nos traz aqui. É também, por incrível que pareça, um dos poucos episódios da série que termina com uma catarse otimista e necessária, ainda mais quando percebemos que o abuso do Grain foi um dos grandes responsáveis pelos problemas dos personagens - na lógica da série, a ignorância seria uma benção para o atormentado Liam.

2ª Temporada

1 - Volto Já

Ainda que todos os episódios tenham uma relação próxima, Volto Já é praticamente uma sequência espiritual de Toda a Sua História. A segunda temporada começa com o pé na porta naquele que definitivamente é um dos melhores e mais envolventes episódios de toda a série, com Charlie Brooker já demonstrando um amadurecimento estilístico e temático muito mais forte aqui.

A história começa nos apresentando ao casal Martha (Hayley Atwell) e Ash (Domhnall Gleeson), que vivem bem quando o moço não está totalmente mergulhado em seu smartphone. Após um acidente, Ash é morto e Martha entra em um processo de luto terrível, o que leva sua amiga a lhe apresentar um aplicativo experimental que permite manter o contato com um falecido. Não exatamente, na verdade, já que o aplicativo coleta todas as informações e dados online que a pessoa um dia compartilhou, criando assim uma cópia comportamental, vocal e até física de seu referencial. 

Basicamente, é uma versão mais dark, complexa e corajosa de Ela - e dado o fato de que este episódio foi exibido no começo de 2013, não duvido que Spike Jonze tenha se inspirado aqui para seu romance sci-fi. É o tema mais delicado que Black Mirror toca até então, com a performance sensacional de Hayley Atwell demonstrando as mudanças em Martha e seus sentimentos complicados em aceitar uma cópia virtual de seu falecido namorado. A relação entre a viúva e o que começa como um mero aplicativo de smartphone é fascinante, com diálogos honestos e inteligentes de Brooker e a direção delicada de Owen Harris garantindo uma experiência marcante.

Por tratar-se de Black Mirror, é de se esperar que a situação tome voltas sombrias, e é justamente o que ocorre quando esta nova versão de Ash começa a revelar suas imperfeições, mas matenho a zona livre de spoilers para um maior aproveitamento do espectador. Resta dizer que é uma história importante, bem contada e imprevisível.

Charlie Brooker em sua melhor forma.

2 - Urso Branco

Se as duas temporadas de Black Mirror fossem Game of Thrones, este seria o episódio 9. O mais ambicioso, grandiloquente e épico de todos os episódios, Urso Branco é também um dos mais chocantes. Quanto menos se souber sobre, melhor. Por isso, tentarei descrever o mínimo possível, mas podemos começar dizendo que tem início quando Victoria (Lenora Crichlow) acorda em uma casa bagunçada sem saber o que aconteceu ou quem é, apenas para ser surpreendida na rua por assassinos a perseguindo enquanto multidões de estranhos acompanham a situação fotografando e gravando tudo em seus celulares.

Temos indícios do que parece ser um "apocalipse de smartphones" quando a situação revela ter desolado uma porção da cidade, e agora Victoria precisará descobrir o que diabos está acontecendo. É uma sensação que toma conta do espectador também, dada a natureza bizarra da situação e os flashes de memória que fornecem pequenas pistas para Victoria, que parece ter lembranças fundamentais para a resolução desse ataque que parece um misto de Uma Noite de Crime com os longas de George A. Romero.

Mesmo que perdidos quanto ao significado de tudo isso, já é brilhante a crítica explícita de Brooker à sociedade do espetáculo e de uma população viciada em seus smartphones e a mania de registrar tudo, completamente alheios ao fato de termos pessoas lutando pela vida em um cenário hostil. É um universo verdadeiramente bizarro que Brooker criou neste episódio, e que definitivamente vai chocar o espectador quando enfim revelar a real natureza de suas ações e eventos, que envolve a presença de um paradoxo perturbador.

Não é um episódio perfeito (ainda que chocante, não é a mais original das reviravoltas), mas é certamente o mais ambicioso e desafiador.

3 - Momento Waldo

 

Mesmo que seja o episódio mais fraco da série, ainda é uma obra de qualidade e muito eficiente em sua proposta. É o episódio em que Brooker finalmente resolve falar um pouco de política, apresentando-nos ao personagem de animação Waldo, que é dublado e atuado via motion capture pelo comediante Jamie Salter (Daniel Rigby). Uma mistura entre o ursinho Ted e os personagens de South Park, Waldo ataca candidatos ao Parlamento inglês durante um período de eleição, e seus discursos chulos e apelativos são tão bem sucedidos que ele próprio acaba tornando-se um candidato inesperado à eleição.

É um episódio que carece do ritmo agitado e das ideias mais mirabolantes que Brooker utilizava tão bem com a ficção científica, tendo aqui como principal elemento do gênero, a animação de Waldo. Há uma questão muito bem trabalhada quanto à personalidade dupla de James e Waldo, assim como seu sentimento de vazio por sua maior realização profissional ser um boneco animado que poderia ser controlado por qualquer um, mas é o mais próximo que temos do espírito dos demais episódios - sem mencionar a sensacional cena pós-créditos, claro.

De resto, Momento Waldo é uma eficiente sátira política. A falácia agressiva e apolítica de Waldo garante momentos hilários, ainda mais pelo fato de termos uma animação interagindo grosseiramente com políticos comportados. A forma como a trama se desenrola, com os produtores do programa de TV do Waldo sendo contactados pela CIA, que veem nisso uma oportunidade nebulosa, garante um dos pontos mais altos do episódio.

Especial - Natal Branco

Que sorriso cínico o showrunner Charlie Brooker deve ter esboçado ao ter sido liberado para fazer um especial de Natal de Black Mirror. De todas as séries por aí, essa é a mais improvável para ganhar um especial dedicado a ceias natalinas, reuniões de família e trocas de presente sobre a luz de uma lareira. Fico feliz que isso de fato tenha acontecido, já que Natal Branco é um desfecho absolutamente excepcional para a fase britânica da antologia.

A história começa com dois homens, vividos por Jon Hamm e Rafe Spall, isolados em uma instalação no gelo. Sem contato com o mundo exterior, os dois preparam uma ceia de Natal enquanto começam a compartilhar contos sobre suas vidas passadas. Primeiro, vemos o passado de Hamm como um misterioso analista de relacionamentos, um orientador que acompanha jovens tímidos via transmissão de vídeo enquanto estes vão a festas conhecer garotas e se dar bem nos flertes. Hamm acompanha tudo por vídeo, enquanto transmite a visão de seu "orientado" para um seleto grupo de outros homens.

A segunda história também é centrada no personagem de Hamm, que relata ao colega seu bizarro emprego. Nele, vemos uma tecnologia conhecida como Cookie, que permite criar uma cópia virtual da mente de uma pessoa, com o único propósito de fazê-la cuidar de tarefas domésticas e organizar a agenda de seu empregador, e os métodos utilizados por Hamm nesse "treinamento" são horrorizantes, e essenciais para o desenrolar do restante da trama. 

Por fim, finalmente o personagem de Rafe Spall se abre. Em sua crônica, vemos a melancólica situação em que sua namorada se viu surpreendida por uma gravidez inesperada. Ainda que Spall fique maravilhado com a notícia, ela o rejeita e o bloqueia de sua vida através de um aplicativo chamado Olho Z, que impede que Spall a veje em absolutamente qualquer lugar, seja pessoalmente ou por fotos, vídeos ou qualquer outro meio virtual com sua imagem.

A melhor maneira de descrever Natal Branco seria compará-lo com uma boneca matrioshka. Cada uma dessas histórias é exibida e narrada numa sequência específica que vão deixando diversas pistas sobre o quadro maior da trama; seja pelo comentário aparentemente vago sobre um relógio na parede ou a própria introdução de todas essas diferentes formas de tecnologia, que convergem-se num clímax impressionante que finalmente esclarece ao espectador o contexto no qual os personagens de Hamm e Spall se encontram. Brooker reclica muitas das ideias exploradas anteriormente, especialmente as de Toda Sua História e Urso Branco, mas nunca soa como uma repetição dado o novo contexto e o ponto de vista alternativo aqui.

Sem dúvida, um dos melhores episódios da série.

Através do Espelho Quebrado...

Black Mirror é algo realmente especial. Não só é o perfeito sucessor e a evolução natural de Além da Imaginação, mas é uma das obras audiovisuais que melhor fez uso de conceitos de ficção científica ambiciosos e que oferece um olhar sociológico necessário e assustador sobre o avanço da tecnologia na Humanidade.

As histórias de Charlie Brooker são criativas e originais, e mal posso esperar para explorar mais desse universo quando a nova temporada chegar na Netlix...


Review | Mafia II

Review | Mafia II

Bem-vindos ao sonho americano da década de 1940, local de liberdade, trabalho justo, mobilidade social e entre outras coisas que a terra do Tio Sam pode oferecer, ou será que não? Mafia II mostra que o “sonho” não é tão real assim e que viver no crime organizado é o verdadeiro modo de se ter mulheres, dinheiro e, o mais importante, respeito.

Mafia II foi lançado em agosto de 2010 pela 2k Czech para todas as plataformas sendo a continuação do primeiro jogo da série, aqui estamos na pele do jovem Italiano Vito Scalleta um menino simples com uma família humilde que acaba de se mudar para os Estados Unidos na cidade fictícia de Empire Bay em busca de novas oportunidades de vida.

Tudo parece ir muito bem e de fato Vito se empolga em ver tudo que a cidade tem a oferecer, porém a realidade é lamentável e Vito se depara com sua família numa casa suja e podre para se viver do mínimo possível. Os anos passam, Vito e seu melhor amigo Joe Barbaro acabam entrando no mundo do crime roubando lojas, pessoas e entre outros pequenos crimes, até que em uma noite de azar em seus roubos ele acaba sendo preso e qual a consequência disso? Bom alguém tem que falar italiano na guerra da Sicília chamada de “operação Husk”, e é exatamente aqui que o jogo começa.

Assim que iniciamos o jogo a primeira coisa que podemos notar é a maravilhosa música que toca no menu principal com uma pequena paisagem de Empire Bay, toda a trilha original do jogo foi feita por Matus Siroky e Adam Kuroc que já fizeram outras trilhas para jogos da 2K, é importante mencionar o impacto que essa trilha sonora inicial tem sobre os jogadores que estão para começar Mafia II, perdendo até um tempinho para ouvir essa grande obra musical.

A história de Mafia II é de fato o ponto mais forte e ao mesmo tempo o ponto que o jogador mais deve se importar em dar atenção. A trama que gira ao redor de Vito e das 3 famílias rivais que dominam Empire Bay pode acabar pegando de surpresa jogadores mais desatentos, personagens marcantes como Leo Galante, Henry Tomasino e o próprio Joe Barbaro farão o jogador se importar não só com a vida do personagem principal Vito, mas também com todas as decisões que esses personagens secundários têm a oferecer.

Muitas pessoas curiosas acabam vendo Mafia II como um GTA IV da época de 40. Errado quem pensa isso, de fato o jogo tem sim seu próprio estilo, enquanto GTA é focado em um mundo aberto onde podemos fazer o que quiser em qualquer momento do jogo, Mafia II tem um estilo focado em capítulos no qual já temos um objetivo proposto e devemos segui-lo para avançar na história, prendendo um pouco o jogador de poder explorar a cidade de Empire Bay.

Mafia II contém ao todo 15 capítulos, no qual o jogador tem a escolha de fazer entre os modos easy, normal e hard. Essa opção é importante para quem deseja finalizar o jogo 100%, já que em cada capítulo completo o jogador recebe uma medalha correspondendo a dificuldade que o capítulo foi feito e 2 concepts arts sendo um dos personagens envolvidos no capitulo e o outro do cenário e da cidade em si. Para aqueles jogadores que estão preocupados com o modo Hard podem ficar tranquilos, a única diferença mesmo é a quantidade de munição e um pouco mais de dano sofrido ao receber socos e tiros.

A inteligência usada em Mafia II é realmente de se aplaudir. O melhor exemplo disso são os policiais que circulam a cidade de Empire Bay, caso o jogador seja pego fazendo algo errado a polícia começará uma grande caça contra o jogador e ainda por cima anotando a placa do seu carro e as vestimentas que está em Vito. Graças a essa inteligência nos personagens, o jogo se torna mais difícil de se completar, obrigando o jogador a sair da rota do capítulo para ter que trocar a placa do carro ou comprar novas roupas e se livrar das perseguições constantes que a polícia fará.

Mafia II também oferece diversas lojas para serem usufruídas na cidade, dependendo da região da cidade que pode ser mais rica ou pobre, o jogador irá achar roupas elegantes e modernas para Vito, carros luxuosos, postos de gasolina, centrais de comércio de armas, bares e muitas outras coisas que o jogador pode interagir com a temática dos anos 40 e 50. Ao todo existem 45 tipos de veículos e 16 tipos de armas da época, como a Thompson 1928, aquela antiga arma do filme Scarface.

Os gráficos de Mafia II estavam muitos bons para o ano de 2010, é claramente visto a emoção dos personagens como raiva, tristeza e dor. Os cenários depois de uma série de capítulos se transformam do inverno cheio de neve na cidade para o verão quente, as noites são brilhosas com a quantidade de luzes fortes em postes e prédios, os personagens muito bem desenhados com detalhes nas testas e expressões e sem falar dos carros da época e os detalhes para os danos que eles sofrem.

Mafia II contém uma jogabilidade mesclada entre stealth e ação, em alguns momentos do jogo seremos obrigados a nocautear inimigos sem sermos percebidos para avançar nos capítulos, já em outros o tiroteio toma conta do cenário estando dentro do carro ou fora se escondendo em paredes e por último, os confrontos corpo a corpo com socos e esquivas que teremos que passar, tudo muito fluido e bem correspondido com os comandos que o jogador faz.

Mesmo sendo um jogo bem longo ainda existem pequenos extras um tanto “diferentes” para dar algumas horas a mais ao jogo, Vito deve pegar as Magazines da Playboy e rasgar os cartazes de “procurado”. Como Mafia II não oferece um modo free roam o jogador deve ficar muito atento para não pular nenhum desses coletáveis e ter que repetir o capítulo novamente para fazer 100% do jogo.

Mafia II com certeza é um must-play para os amantes de videogame em geral, a história é realmente forte e prende o jogador do início ao fim, os personagens são carismáticos e podemos sentir impacto em suas decisões e ações, a falta de um free roam original feita pela própria 2K faz uma grande falta já que não podemos explorar a cidade de Empire Bay e ver a vida presente no mesmo, a trilha sonora está fantástica e com rádios tocando músicas época de 50, para aqueles que amam um bom jogo em mundo aberto Mafia II é de fato um jogo que deve ser jogado até hoje.


Review | Tomb Raider (2013)

Review | Tomb Raider (2013)

Todos sabemos que jogos com grande peso se tornam uma enorme responsabilidade entre os desenvolvedores, cada detalhe, animação e esforço se tornam cruciais para o jogo sair de forma impecável. Tomb Raider com certeza adquiriu uma enorme legião de fãs ao longo de suas gerações dês do seu primeiro jogo em 1996 para Playstation até os dias atuais no qual a musa Lara Croft continua com seu trono de majestade dos games de ação/aventura. Com a moda dos reboots, criando uma nova história e um novo jeito de enxergar as coisas, será que “Tomb Raider 2013” seria bem aceito para o público?

Com desenvolvimento da Crystal Dinamics e distribuído pela grande Square Enix, Tomb Raider chega as várias plataformas como um belo "recomeço" para a história de Lara Croft, a sacada dessa vez é mostrar o lado humano de Lara e sua evolução para ser uma grande exploradora, criando novas portas para continuações mais centradas e com maior impacto nas emoções humanas entre os personagens. Logo, isso faz com que o jogador não veja só a ação do jogo e sim acabe sentindo algo pela personagem principal e pelos personagens secundários no jogo.

A nova história é realmente empolgante e interessante de se acompanhar. Nela podemos ver Lara Croft, recém-formada, seguindo o seu sonho de ser uma exploradora famosa assim como seu pai. Lara e sua equipe acabam indo a uma expedição de navio para a ilha de Yamatai localizada no Japão, porém uma terrível tempestade ocorre e o navio é naufragado deixando eles presos na ilha. Mal sabe Lara que uma tribo hostil de assassinos e animais selvagens espreitam os arredores das ilhas cabendo a nossa heroína agora descobrir como sobreviver e como escapar dessa ilha misteriosa.

Um ponto muito interessante ao decorrer do jogo é o trabalho que fizeram com a nossa heroína. Inicialmente podemos ver uma Lara mais simples, frágil, sem a coragem de caçar ou matar para sobreviver. Depois temos uma Lara mais rígida, irritada, intimidadora e confiante. Sua aparência muda em todos os momentos, adquirindo machucados pelo corpo, roupas rasgadas, armas e acessórios em suas costas e curativos nos braços.

O contato com a água faz Lara ficar com frio e suas roupas dão sinal de estarem molhadas e sujas, danos altos como quedas ou pancadas fazem Lara ficar mais tonta e com visão atrapalhada. Tudo isso foi extremamente planejado para dar um toque mais real dos problemas que Lara acaba passando na ilha, tanto fisicamente como psicologicamente. Outro fator importante e a relação que o jogador sente não só com Lara, mas com todos os outros personagens envolvidos sentindo o drama e esforço de cada um para planejarem um modo de fugir da ilha e sobreviver.

O clima também pode ser um grande aliado ou um inimigo incômodo em Tomb Raider. As noites fazem o jogo tomar outra cara dando para se esconder e surpreender inimigos que estão mal posicionados. Já as manhas ajudam Lara a ver tudo plenamente, conseguindo achar objetos secretos e locais para caçar e caminhos escondidos. Outro fato interessante é as chuvas no qual fazem Lara escorregar em certos momentos do game. A imersão gerada por esses efeitos de física é completa.

O mapa de Tomb Raider é bem grande, dando uma grande importância para a exploração. Seu estilo semiaberto funciona perfeitamente dividindo o mapa em setores, como penhascos, florestas, praia e etc. Algo muito notável é a vida animal e vegetal que existe em cada setor do jogo como aves, cervos, lobos, frutas tudo para detalhar cada local que Lara percorre. Os tão aclamados coletáveis ficam espalhados pela ilha inteira e missões secundarias são bem difíceis de serem concluídas, isso dá um ótimo acréscimo ao jogo para quem quer fazer 100% da campanha toda.

Existe uma arvore de habilidades no qual o jogador pode fazer dois tipos de upgrades em Lara. O primeiro reúne as habilidades de sobrevivência como recolher flechas já atiradas, vasculhar corpos mortos, aguentar mais danos e outros muito úteis nesse aspecto. Já o segundo tipo de upgrade é ligado as suas armas, aumentando dano de pistolas, metralhadoras, diminuindo coices e até mesmo a quantidade de munição que a arma pode carregar.

Tudo isso pode ser localizado nos acampamentos que o jogo fornece ao decorrer de suas aventuras, vale ressaltar também que existe o método de fast travel de acampamento para acampamento, facilitando a busca de tesouros e itens em outros locais já ultrapassados em torno da ilha.

O multiplayer de Tomb Raider é divertido, mesmo sendo um pouco abandonado. Seus modos de jogo variam desde mata-mata e capture the flag até jogos mais competitivos e ranqueados. Quanto mais experiência e level o jogador adquirir, mais personagens e armas ele poderá jogar no modo multiplayer. Diferente da campanha, o modo multiplayer lembra muitos jogos de FPS em terceira pessoa como Gears of War ou Red Dead Redemption.

As armas têm um impacto bem forte nos personagens não precisando dar vários tiros para finalizar um oponente. Mesmo assim o multiplayer tem sua originalidade, como armadilhas que podem ser colocadas para atrapalhar outros jogadores, melhorias que podem ser feitas em seu arsenal de armas e claro, muito movimento e atenção de ambos os jogadores.

Tomb Raider é um jogo completo e lindo, vale cada centavo pelas horas de diversão e entretenimento que o jogador recebe. O cuidado que os produtores e desenvolvedores tiveram com o jogo é recompensador criando uma grande obra de arte em mais um título de enorme peso. Mesmo sendo um pouco abandonado, o multiplayer é divertido de se experimentar e de testar com outros jogadores que já experimentaram o jogo. Os colecionáveis são para aqueles que realmente querem platinar o jogo e perder mais algumas horinhas procurando os tesouros e fazendo as missões secundarias.

Aqui, cada minuto vale a pena.


Review | Dota 2

Review | Dota 2

Defense Of The Ancient 2 ou Dota 2 é um jogo estilo Moba onde o objetivo é destruir as torres adversárias e quebrar o trono principal de cada time, sendo eles, Radiants e Dire. No game temos os personagens principais chamados de heróis, no qual os cinco jogadores de cada time escolherão um dos diversos heróis no jogo, farão suas estratégias, além de entrar em um longo confronto para ver qual time é o melhor, assim vencendo ou perdendo a partida.

Dota 2 não é um jogo fácil de início, por ser jogo de pura estratégia e habilidade. É difícil de se adaptar sozinho para rapidamente conhecer os diversos itens que estão presentes no jogo, aprender a função e habilidade de cada herói é maior ainda, então não se irrite ou tenha medo de ser surpreendido, já que tempo e dedicação é a palavra chave para o jogador poder usufruir de verdade desse Moba.

Falando um pouco mais dos heróis do game temos ao todo um total de 111 personagens para serem escolhidos e jogados cada um com seus atributos primários como força, agilidade e inteligência, assim também tendo suas devidas funções como carregador, puxador, nuker e etc. O interessante de Dota 2 é que seu personagem pode ser montando de diversas maneiras, já que itens adquiridos matando creeps e neutrais nas florestas de cada time ajudam seu personagem a ter uma evolução mais rápida e a ter mais facilidade no jogo. Essa parte também é muito importante para combater heróis ou inimigos, podendo usar itens para desequilibrar carregadores ou até mesmo de proteger seu herói de diversas magias. Quanto mais gold seu personagem tiver em menos tempo de jogo, mais rápido e útil ele será para seu time.

Uma das coisas legais de Dota 2 é que realmente se trata de um verdadeiro Free to play, ou seja,colocar dinheiro no jogo não te dará atributos extras ou vantagens em suas partidas, a única coisa que o dinheiro real serve em Dota 2 é para comprar skins de personagens, narradores e até mesmo entregadores de itens. Outra coisa bem chamativa é o fato de que as skins são feitas pela comunidade do jogo graças ao Workshop da Steam, lá são encontrados diversas armaduras, modos de jogo, entre outras coisas que esperam aprovação para entrar no jogo e serem usufruídas.

Por falar em modos de jogos Dota 2 tem muitas opções, desde modos mais casuais como Escolha livre ou Individual onde jogadores novos querem aprender ou relaxar jogando uma partida tranquila e amistosa levando regras básicas de jogo e de mapa. Já os mais competitivos como modo dos capitães e os modos ranqueados são mais brutos e sérios fazendo você mostrar todo seu conhecimento e inteligência para ganhar uma partida com sua equipe e assim subir seu MMR tanto sozinho como em grupo, te colocando em novas posições de jogadores cada vez mais e mais habilidosos no jogo.

Não vamos esquecer os modos estilo coliseu onde diversos heróis se unem em 4 times diferentes e se matam até o final. Pudge Wars onde todos jogam com um único herói tentando puxar um aos outros e fazerem pontos. Por fim, mesmo Dota 2 sendo um jogo com seu estilo próprio a comunidade também cria novos mods para serem usados e para chamar players que querem se divertir sem se estressar.

A palavra estressar é algo gigante nesse jogo, e isso é a pior parte do jogo, a comunidade do jogo tem alguns enormes problemas, muitas vezes o jogador sofrerá xingamentos e conviverá com pessoas bem ignorantes, lembre-se você já tem que enfrentar 5 inimigos do outro time, ter que enfrentar mais 3 ou 2 do seu time se torna algo enjoativo e chato. Mesmo que o jogador tenha a opção de mutar a pessoa, o jogo perde seu clima já que comunicação é essencial para ter um bom rendimento no jogo. Existem Servers diferentes e dedicados para cada região do mundo, mas também é um pouco mal trabalhado, já que em muitas vezes você pode procurar games em sua região e achar pessoas de outros lados do globo.

Dota 2 é um jogo bem complexo, com diversas mudanças ao longo das atualizações, de dificuldade é bem alta e requer um conhecimento básico para engatinhar no jogo, a comunidade se dedica muito em trazer novos conteúdos para junto com a equipe da Valve. O grande problema são grupos ignorantes que estragam a diversão e acabam estressando muitas pessoas. Excetuando isso, Dota 2 é realmente um jogo free to play de nível alto, um dos melhores.


Crítica | Demolidor - 2ª Temporada

Crítica | Demolidor - 2ª Temporada

Acredito que nem a própria Marvel ou a Netflix esperavam o gigantesco sucesso de Demolidor. Tendo uma primeira temporada consistente e que injetava uma dose de visceralidade e temas adultos no universo colorido da editora, a série sobre o Demônio Destemido tornou-se uma das mais bem avaliadas e comentadas do ano passado; literalmente todo mundo falava sobre Demolidor. Não por acaso, uma segunda temporada não planejada foi anunciada dois dias após o lançamento em streaming.

Isso sem falar na ideia ambiciosa de lançar Os Defensores, série que uniria o Demolidor com os demais personagens do pacote Marvel-Netflix, que incluem Jessica Jones, Luke Cage e o Punho de Ferro. Tivemos que passar pela estreia de Jessica Jones antes, mas a segunda temporada de Demolidor chegou com tudo em Março deste ano. Sai Drew Goddard, entra Steven S. DeKnight para assumir o cargo de showrunner, novamente contando com 13 capítulos e uma estrutura narrativa quebrada; ainda que mais linear dessa vez.

Na melhor tradição das grandes continuações de adaptações de quadrinhos, esta nova temporada concentra-se em Matt Murdock (Charlie Cox) lutando para balancear sua vida dupla de advogado criminal durante o dia e vigilante mascarado durante à noite. Seu melhor amigo Foggy (Elden Henson) é o único que sabe de seu segredo, enquanto Karen Page (Deborah Ann Wolf) vai cultivando uma relação cada vez mais íntima com Murdock, colocando em dilema seu alter ego. Tudo piora quando um misterioso assassino parece estar massacrando diversas gangues diferentes por cada canto de Hell's Kitchen, atraindo o Demolidor para uma perigosa investigação, que também lida com alguns fantasmas de seu passado, incluindo o retorno de sua imprevisível ex-namorada Elektra Natchios (Elodie Yung).

Caveira Vermelha

É uma série de arcos muito mais complexos e intrincados do que a temporada anterior, porém, quase todos são mais empolgantes. Como todos sabemos, o assassino misterioso mencionado é Frank Castle (Jon Bernthal), o Justiceiro, e sua entrada na série garante diversos momentos memoráveis. Aliás, essa temporada num geral é muito melhor estruturada do que a anterior, já que nos 5 primeiros episódios temos o Justiceiro como principal "ameaça", para logo depois dar espaço à entrada de Elektra e o subsequente núcleo antagonista do Tentáculo e a volta de Stick (Scott Glenn).

Mas vamos por partes. A começar com Frank Castle. Bem, não é nenhum exagero nem a conquista mais difícil do mundo afirmar que Jon Bernthal seja a versão definitiva do personagem, que teve uma árdua trajetória no cinema com 3 adaptações fracassadas que envolveram Dolph Lundgren, Thomas Jane e Ray Stevenson na pele do vigilante. Bernthal se sai melhor ao abraçar a psicopatia do personagem e a brutalidade de suas ações, tornando-se uma figura muito ameaçadora de início. Porém, vemos o brilhantismo do ator e da equipe de roteiristas quando exploram a ternura do personagem e suas motivações nada absurdas em alguns monólogos.

Há uma interessantíssima discussão de Castle com o Demolidor em um terraço, onde divagam sobre as diferenças em seus métodos e o ato de tirar uma vida ou não (sobrando referência para A Piada Mortal e a questão do "um dia ruim"), levada ainda mais além no excelente episódio Guilty as Sin, quase que inteiramente dedicado ao polêmico julgamento de Castle em um tribunal, levantando questões relevantes acerca do vigilantismo e da pena de morte; é um trabalho dificílimo defender Castle, já que este parece ter prazer em matar.

Porém, voltando à justificativa do personagem, o quarto episódio, Penny and Dime, é capaz de arrancar pequenas lágrimas quando nos deparamos com um monólogo arrasador de Castle, onde compartilha com o Demolidor a história da matança de sua esposa e filha criança pelas mãos de gângsteres. A direção de Pete Hoar é certeira e dedica quase que um plano inteiro para todo o monólogo de Castle, que fica ainda mais poderoso graças à sensacional performance de Bernthal. É de uma profundidade emocional que não havíamos encontrado em muitas adaptações de quadrinhos por aí.

Presente de grego

O Justiceiro era apenas uma das grandes promessas da segunda temporada. A outra, claro, residia na forma de Elektra, outra icônica personagem do leque de histórias do Demônio de Hell's Kitchen. Vale lembrar que a assassina já havia ganhado um filme solo com Jennifer Garner em 2005, mas agora vamos esquecer imediatamente daquela bomba e nos concentrar na interpretação de Elodie Yung para a companheira de Murdock. Surgindo no ótimo cliffhanger de Penny and Dime, Elektra surge para requisitar a ajuda de Matt em uma missão nebulosa que está diretamente ligada ao Tentáculo, uma organização ninja milenar que planeja um ataque sem precedentes na cidade de Nova York.

A partir daí, temos encontros e desencontros onde Matt procura evitar o contato com a poderosa femme fatale. Através de flashbacks em Kinbaku e The Dark at the End of the Tunnel, conhecemos o início da relação de Matt e Elektra, assim como o passado amoroso que logo transformou-se em uma situação assombrosa quando o instinto assassino e sádico da jovem grega acaba por afastá-los. A grande coincidência é que, quando criança, Elektra também recebeu treinamento de Stick, o que gera reviravoltas instigantes durante a conclusão da temporada.

No geral, Yung agrada pela sensualidade que confere a Elektra. Seu sotaque exótico e feições mestiças tornam sempre empolgante sua presença em cena, que garante ótimos momentos como uma luta em conjunto com o Demolidor em seu luxuoso apartamento em Kinbaku e, principalmente, o excelente mini arco que se desenrola em Regrets Only, onde Elektra e Matt devem se infiltrar em um baile de gala a fim de invadir um escritório fortemente protegido e roubar arquivos relacionados ao Tentáculo. Sob a direção de Andy Goddard, o episódio traz fortes ecos de Batman - O Retorno e O Cavaleiro das Trevas Ressurge, tanto pelo fato de os heróis trajarem vestimentas de gala ou pela belíssima fotografia amarelada de Martin Ahlgren.

Ninjas, Ninjas, Ninjas...

Com tudo isso, parecia que a segunda temporada de Demolidor poderia ser ainda melhor do que seu já ótimo ano de estreia. Mas é aí que começam os problemas. É no episódio 10, The Man in the Box, que a organização do Tentáculo enfim se assume como o grande antagonista da temporada - em ambos os sentidos, ironicamente. Dessa forma, a série fica presa a uma entediante repetição de temas e oponentes, insistindo em enfiar lutas com ninjas em quase todos os episódios seguintes e até trazer a ridícula ideia de um buraco gigante de onde saem mais ninjas e suas respectivas versões imortais e invencíveis, incluindo a volta de Nobu. É divertido ver uma luta de ninja aqui e ali, mas torna-se maçante e repetitivo, e isso também se deve à nítida queda de qualidade nas cenas de ação, que foram o grande acerto da temporada anterior.

Marcada pela famosa luta em plano sequência do corredor na primeira temporada com Cut Man, os idealizadores se viram na terrível cilada do "maior e melhor" e inventaram uma sequência de briga absurdamente elaborada no episódio New York's Finest, trazendo o Demolidor enfrentando uma série de oponentes em um plano longo falseado que passa por corredores, escadas e portas. É algo que certamente exigiu um trabalho pesado da equipe de dublês, mas que em cena surge completamente over the top e abaixo da simplicidade impressionante do confronto visto no ano passado.

As inúmeras batalhas com ninjas também causam bocejos, ainda mais pelo fato de a fotografia surgir ainda mais escura e a coreografia ser genérica, tendo apenas como exceção a "luta de silhuetas" de Matt e Elektra dentro de uma sala colorida em Regrets Only e, claro, a violentíssima cena em que o Justiceiro encara um corredor inteiro de prisioneiros em uma armadilha na cadeia. Impressiona menos pela coreografia do que pelo valor de imagem: Bernthal com suas roupas brancas completamente ensaguentadas é um dos ícones absolutos desta temporada.

Falta um oponente icônico e imponente como o Rei do Crime de Vincent D'Onofrio, que tem uma curta e memorável participação durante o arco de Castle na cadeia. Basta notar como um aparentemente "inofensivo" Wilson Fisk em sua cela é mais ameaçador do que qualquer outro oponente nebuloso e sem graça que Murdock enfrenta aqui. Justamente por isso, é mais interessante observar suas relações com Foggy e Page. A dualidade de sua vida como vigilante acaba por destruir sua amizade com Foggy, rendendo ótimas cenas entre Charlie Cox e Elden Henson, e também pelo envolvimento romântico entre Murdock e Page, algo que acaba um tanto inconsistente ao longo da temporada, mas que rende bons momentos como o "encontro" em Penny and Dime - sim, é de longe o melhor episódio da temporada, não é à toa que está sendo tão mencionado.

A segunda temporada de Demolidor traz muitos aprimoramentos em relação à primeira, na mesma medida em que traz deméritos. A forma de intercalar as histórias e seus personagens surge infinitamente superior aqui, dando uma boa ênfase no conflito interno do protagonista e o destaque merecido às figuras de Justiceiro e Elektra. Deixa a desejar no quesito de ação e na artificialidade de sua organização antagonista, que acaba fadada a repetir temas e elementos.

Ei Netflix, menos ninjas da próxima, por favor.

Demolidor - 2ª Temporada (Daredevil - Season 2, EUA - 2016)

Showrunner: Steven S. DeKnight
Direção: Pete Hoar, Andy Goddard, Phil Abraham, Stephen Surjik, Ken Girotti, Euros Lyn, Marc Jobst, Floria Sigismondi, Michael Uppendahl
Roteiro: Whit Anderson, Sneha Koorse, Douglas Petrie, Marco Ramirez, Steven S. DeKnight, Lauren Schmidt, John C. Kelley, Mark Verheiden
Elenco: Charlie Cox, Deborah Ann Wolf, Elden Henson, Jon Bernthal, Elodie Yung, Vincent D'Onofrio, Rosario Dawson, Scott Glenn, Peter Shinkoda
Emissora: Netflix
Episódios: 13
Gênero: Ação, Aventura
Duração: 50 min aprox

https://www.youtube.com/watch?v=-KGftw5LZqM

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Crítica | Preacher - 1ª Temporada

Crítica | Preacher - 1ª Temporada

Nunca li nenhuma edição da popular série de quadrinhos Preacher, criação de Gareth Ennis para o selo Vertigo da DC, mas basta uma espiada na orelha da capa ou um breve sumário da história para se dar conta de que é um material bastante controverso; ainda mais para ganhar uma adaptação audiovisual - e 10 vezes mais se estamos falando de uma para a televisão aberta. Mas é isso que os showrunners Seth Rogen, Evan Goldenberg e Sam Catlin partiram para fazer no final de 2013, e com a primeira temporada da série ganhando vida pela AMC só agora em 2016, temos um dos programas mais únicos e diferentes de toda a grade de programação.

Mesmo não conhecendo bem os quadrinhos, sei o suficiente para ter a noção de que muita coisa foi modificada nesta adaptação, então me manterei centrado apenas na história destes 10 episódios. Ela começa quando a entidade conhecida como Gênesis, o fruto de uma cria proibida entre um Anjo e um Demônio, escapa do Céu e cruza a Terra em busca de um hospedeiro. Ela encontra um na forma de Jesse Custer (Dominic Cooper), um pastor do Texas que busca honrar o legado de seu pai ao tocar a pequena igreja de sua cidadezinha enquanto constantemente luta para apagar seu passado criminoso, que está sempre batendo à porta na figura de sua persistente ex-namorada Tulipa O'Hare (Ruth Negga). Quando o Gênesis entra no corpo de Jesse, ele ganha a misteriosa habilidade de controlar outros a seu redor, que obedecem todas as palavras que saem de sua boca.

Una isso ao fato de termos o vampiro irlandês fanfarrão Cassidy (Joseph Gilgun), a dupla de Anjos Fiore e DeBlanc (Tom Brooke e Anatol Yusef) e o inescrupuloso empresário Odin Quincannon (Jackie Earle Haley) e temos o palco armado para uma narrativa incomum e que constantemente surpreende o espectador com sua inventividade e ideias completamente fora de série. É um leque de personagens tão carismáticos e divertidos que parecem ter saído das mentes de Quentin Tarantino e dos Irmãos Coen; que são mencionados o tempo todo, aliás.

O problema é que essa temporada poderia ter sido resolvida em 5 episódios e o efeito seria o mesmo. A plot que envolve Tulipa desesperadamente tentando convencer Jesse a se juntar a ela e dar cabo em um ex-parceiro que os queimou em um antigo serviço é arrastada e dá voltas e voltas até chegar no mesmo ponto de partida, como bem evidenciado na decepcionante mudança de opinião de Jesse ao final do terceiro episódio. O fato de a trinca de Jesse, Tulipa e Cassidy funcionar tão bem chega a ser irritante pela inabilidade dos produtores em unirem suas histórias, rendendo um tremendo desperdício de potencial; Jesse e Tulipa, Tulipa e Cassidy e Jesse e Cassidy são as combinações, mas nunca temos o trio que, acredito eu, possa tornar-se um dos mais memoráveis da Televisão.

Mas felizmente Preacher consegue entreter, mesmo quando nitidamente preso em uma narrativa que não anda pra frente e sofre com o efeito "enchimento de linguiça". A começar por Jesse Custer, a quem Dominic Cooper fornece uma performance carismática e na medida certa, como um sujeito problemático que reage de formas curiosas aos diversos eventos sobrenaturais que batem a sua porta. A dinâmica do Pastor e sua habilidade do Gênesis rendem ótimas situações, como a antológica cena em que ameaça um agressor no banheiro de um posto de gasolina, o conselho de "abrir o coração" e até a inesperadamente sombria reviravolta em que, acidentalmente, manda um dos personagens ir ao Inferno - para seu azar, o Gênesis não é muito bom com metáforas.

Tudo melhora com os personagens que rodeiam Jesse, a começar pelo mais sensacional vampiro que tive o prazer de conhecer nos últimos anos. Vivido por Joseph Gilgun com intensa ironia e um sotaque acertadíssimo, Cassidy garante momentos de humor negro hilários, desde referências ininterruptas à cultura pop ("O Grande Lebowski é superestimado!"), um talento especialmente notável para a carnificina e hábitos estranhos - genial a ideia deste o tempo todo se esconder do sol com chapéus enormes e protetores solares -, Cassidy é o ponto alto absoluto e rende uma dinâmica fantástica com Cooper.

Já Ruth Negga é prejudicada pelo arco fraquíssimo no qual Tulipa é inserida aqui, que fica no vai e vem de convencer Jesse a lhe ajudar em sua missão - pra se ter ideia, em um episódio a personagem é tão jogada que ela passa todas as cenas cuidando de um cachorro, sem mais nem menos. Isso quase afeta a excelente performance de Negga, que faz de Tulipa uma criança crescida que acabou por tornar-se uma badass, vide sua memorável introdução no primeiro episódio e todas as cenas na qual ela é forçada a interagir com os amigos de igreja de Jesse, o que inclui uma relação de inimizade e ciúmes com a Emily de Lucy Griffiths. Negga é excelente, só queria que ela tivesse mais o que fazer aqui.

Outro personagem coadjuvante que acaba por render algumas das melhores cenas da série é o garoto Eugene Root (Ian Colletti), infamemente apelidado de Cara de Cu, graças à sua horrenda deformação na boca que fora provocada por uma tentativa de suicídio. É um personagem que provoca extrema empatia e dó pelo bullying e agressividade com que sofre constantemente, fruto também da ótima performance de Colletti, que consegue transmitir o medo e insegurança de Eugene mesmo com os quilos de maquigem em seu rosto; cuja voz abafada ganha até mesmo legendas em inglês. Aliás, um dos momentos mais belíssimos da série é quando Eugene passa a ganhar uma redenção por parte das outras crianças da escola (fruto do poder do Gênesis), que o surpreendem com um intimista show de fogos de artifício.

Grande surpresa também a competência de Seth Rogen e Evan Goldenberg. Quem conhece o trabalho da dupla, que é composto majoritariamente de comédias stoner e nonsense, jamais pensaria que seriam capazes de tirar do chapéu uma série com cenas de ação consistentes e uma estética visual que impressiona a cada episódio. Claramente inspirados no trabalho de Vince Gilligan em Breaking Bad (temos referências a Albuquerque, a presença do compositor Dave Porter e até o uso do mesmo cenário do icônico episódio Ozymandias), a dupla impressiona pelas composições criativas e a paleta de cor que privilegia o verde e a temperatura de cor mais quente, algo diretamente relacionado à geografia da série e as misteriosas cenas que envolvem um cowboy que aparentemente não tem nenhuma conexão com o restante da série... Até o NONO episódio nos revelar de forma brilhante qual é seu papel aqui.

Rogen e Goldenberg ainda mostram seu talento para ação em duas sequências do primeiro episódio. Uma delas envolve Jesse enfrentando um grupo de arruaceiros em uma brutal briga de bar, que surpreende justamente por mostrar as até então desconhecidas habilidades de luta do protagonista. A outra, claro, traz o vampiro Cassidy em uma situação que começa como uma festa social em um avião em pleno ar com um bando de estranhos, apenas para que tudo se revele como uma armadilha destes para capturá-lo. O que se segue é uma pancadaria muito bem coreografada e montada, e ainda divertida por contar com a sagacidade de Gilgun.

A série contina a impressionar no quesito quando tivemos a luta entre Cassidy e os Anjos Fiore e DeBlanc dentro de uma igreja em See, que envolve um bizarro ritual e membros sendo decepados por motosserras. Se isso já não fosse o maior gore da série, ela se supera em Sundowner, onde Guillermo Navarro traz toda a sua habilidade sangrenta de Hannibal para um confronto inusitado e completamente ousado entre Jesse, Fiore, DeBlanc, Cassidy e um outro Anjo que é enviado atrás do grupo. Sempre que um dos Anjos morre, outro corpo se manifesta e assim por diante, rendendo uma carnificina inesperadamente divertida e sensacional, ainda mais pelo plano em que Navarro coloca a câmera através de um buraco na parede. O plano final com todos os corpos "descartados" é marcante.

Então, chegamos ao episódio final da temporada. Não quero entrar em spoilers, mas é certo dizer que Rogen, Goldenberg e Caitlin tomaram uma decisão radical que certamente vai irritar muitos e agradar outros. É uma reviravolta narrativa que imeditamente dá um novo início à série, que agora promete seguir uma plot mais similar à da HQ, onde a trinca de Jesse, Cassidy e Tulipa embarcam em uma road trip surreal.

A primeira temporada de Preacher peca pela inconsistência e o ritmo enrolado de seus primeiros episódios, mas torna a visita muito agradável e divertida graças a seu inacreditável leque de personagens e as ideias brilhantes que traz da HQ de Gareth Ennis. Fica a torcida para que a já anunciada 2ª temporada faça um uso ainda melhor e mais satisfatório destes.


Crítica | The Night Of traz retrato cruel e realista sobre sistema penitenciário e jurídico

Crítica | The Night Of traz retrato cruel e realista sobre sistema penitenciário e jurídico

Foi um ano turbulento para a HBO. Claro, a badalada emissora de televisão a cabo teve seus números estratosféricos e a fanbase habitual com a sexta temporada de Game of Thrones, mas sofreu com a decepção de sua caríssima e ousada principal estreia, Vinyl, que acabou cancelada mesmo depois de ser renovada. A ausência da terceira temporada de True Detective, que no momento encontra-se em uma caixa de Schrödinger que parece nunca ser aberta, também deixou a HBO com algo a mais faltando. Ainda há a estreia da promissora adaptação de Westworld para Outubro, mas até o dia chegar, a minissérie The Night Of surge para salvar a programação e oferecer uma das mais eficientes e inteligentes peças audiovisuais de 2016.

Inspirado na minissérie britânica Criminal Justice, a história começa com o estudante paquistanês Nasir Khan (Riz Ahmed), que certa noite pega escondido o táxi de seu pai para uma festa. No percurso, dá carona para a jovem Andrea (Sofia Black-D'Elia), com quem acaba eventualmente saindo para um passeio e acaba em uma noite de sexo e drogas. Algumas horas depois, Nasir acorda e a garota está morta, e ele não tem lembrança alguma do que aconteceu, sendo preso com a arma do crime e embarcando em uma longa e tortuosa jornada pelo sistema judiciário americano.

É uma narrativa que explora minuciosamente cada etapa do processo, desde a prisão de Nasir até a condenação, os exames, transferências, julgamentos e custódias. É normalmente a porção de histórias que seriados de "caso da semana" e filmes policiais costumam eliminar por elipses e passagens temporais, e são elementos que definitivamente podem cair na monotonia caso não executados de forma engajante. Felizmente, temos o guru Steven Zaillian como diretor da maioria dos episódios e Richard Price na função de roteirista. Juntos, a dupla também é responsável por tocar o barco no setor criativo da série; em outras palavras, showrunners.

Zaillian, nome que normalmente associaríamos a um cargo de roteiro, é responsável pela direção de 7 dos 8 episódios (o outro crédito vai para James Marsh, que comandou o 4º episódio), e eu sinceramente espero que ele mantenha atuação no ofício. A mise em scene de Zaillian é clássica e elegante, com um uso mínimo de câmera na mão e uma abundância de planos longos onde encontramos o fundo desfocado para concentrarmo-nos em seus personagens. A paleta de cores frias e cinzenta da fotografia de Frederick Elmes, Igor Martinov e o grande Robert Elswit (que fotografou o primeiro episódio) é eficiente também em transportar o espectador para esta Nova York claustrofóbica e opressora.

Todos os episódios foram escritos por Price, cuja prosa é inteligente e envolvente, trazendo um trabalho de criação e desenvolvimento de personagens virtualmente perfeitos. A começar por Naz, que protagoniza o arco mais transformador da narrativa. De garoto assustado e ingênuo, o processo criminal o faz esperar o julgamento em uma prisão, onde o ambiente e as diferentes figuras ali acabam forçando-o a adaptar-se para sobreviver, fazendo com que aquela figura frígida e indefesa de Naz no início da série torne-se algo mais ameaçador e durão. Aliás, essa metamorfose é pivotal para o grande senso de dúvida que a série provoca no espectador: nem nós nem o próprio Naz têm certeza de sua inocência. Tudo o que havíamos visto até então apontava para um caso de injustiça, mas as mudanças físicas e psicológicas do personagem revelam uma natureza interior muito diferente e perigosa. 

Todo esse núcleo na cadeia transformam The Night Of em uma série diferente. Quase uma variante de Oz, tais cenas revelam o incrível talento de Riz Ahmed, ator britânico com origem muçulmana que rapidamente vai conquistando espaço em Hollywood (começou como o assistente de Jake Gyllenhaal em O Abutre e agora é um dos rebeldes de Rogue One: Uma História Star Wars). Seu Naz é uma figura cativante e pela qual é fácil de se torcer, mas a transformação na cadeia que provoca a ambiguidade no espectador é o principal mérito do ator, favorecido pelas tatuagens e a cabeça raspada. Porém, mesmo diante das suspeitas, Ahmed nunca permite que Naz torne-se um monstro, e nunca paramos de torcer para que o personagem seja de fato inocente.

E então chegamos a John Torturro. Depois de se submeter a participações hediondas nos Transformers de Michael Bay e algumas comédias não muito memoráveis, o ator ganha um personagem sensacional e repleto de camadas para explorar. Jack Stone é um advogado de porta de cadeia que ganha a vida negociando para o menor tempo de pena possível para seus clientes - que em 90% dos casos são culpados. Mas eis que Stone acredita na inocência de Naz e acaba por torná-lo o caso mais importante de sua carreira, e a performance de Torturro é impecável ao balancear a determinação e, ao mesmo tempo, melancolia do personagem. O fato de este passar toda a temporada enfrentando uma infecção nos pés - forçando-o a usar sandálias nada atraentes - é um fator importante para diminuir sua estima, além de ser uma subtrama que constantemente reflete seu progresso no caso; como uma súbita melhora ou uma crise de coceira terrível.

O elenco de apoio não decepciona. Bill Camp explode como o sargento Box, responsável pela investigação de Naz. Descrito pelo próprio como "uma fera sutil", Camp é eficaz ao explorar os anos de experiência e o cansaço de Box, mas também seu compromisso ininterrupto com o senso de justiça, que o mantém ativo na investigação mesmo após sua inevitável aposentadoria. Quem ganha o rótulo de fera sutil é Box, mas não tenho dúvidas de que a figura mais afiada e ácida ali seja a da promotora testa-de-ferro Helen Weiss. Jeannie Berlin lhe injeta muito sarcasmo e uma segurança quanta a facilidade de seu caso (reparem como ela nunca se exalta e jamais parece cogitar a possibilidade de sua derrota) que chegam a provocar pavor pelo destino de Naz. E, novamente, Weiss também não é reduzida a um mero estereótipo antagônico - sua ação durante o final do julgamento é absolutamente brilhante, além de provocar um irônico paralelo com o arco de Jack Stone.

Temos ainda a surpreendente Amara Karan, atriz novata que interpreta a igualmente novata advogada Chandra Kapoor, designada como advogada de defesa para Naz ao lado de Stone. Se a Weiss de Jeannie Berlin traz toda a segurança de forma natural, vemos nas expressões delicadas de Kapoor seu esforço para manter-se à altura de seus colegas de trabalho e sua determinação para triunfar no caso, em um trabalho realmente memorável de Karan. E ainda que tenham papéis menores, Peyman Moaadi e Poorna Jagannathan têm ótima presença como os pais de Naz, que ganham um tempo considerável para desenvolverem seus pequenos dramas - a mãe com o medo de seu filho ser culpado, o pai com a preocupação de garantir a estabilidade da família após uma onde de ataques racistas.

Por fim, um pouco sobre um dos melhores e mais complexos personagens da série: o Freddy de Michael Kenneth Williams. Líder de uma das gangues mais poderosas da penitenciária Rinkers, Freddy logo acolhe Naz e o guia para tornar-se um de seus companheiros e ajudá-lo a sobreviver em um ambiente hostil. Freddy é uma figura sábia e inteligente, sempre trazendo citações de obras como A Arte da Guerra e oferecendo pequenas palavras de sabedoria que ajudam a envolver o espectador durante o arco da prisão. Definitivamente um personagem que gostaria de rever, e a performance de Williams é chave para que Freddy torne-se uma figura tão fascinante.

The Night Of funciona como um longo e eficiente longa-metragem de 8 horas. Há um desenvolvimento narrativo e estrutura de atos essencialmente cinematográficos, beneficiando-se de um elenco inspirado, personagens marcantes e um cuidado estético impressionante.


Review | Batman Begins: O Jogo

Review | Batman Begins: O Jogo

Quando Batman: Arkham Asylum deu início à excelente franquia de games da Rocksteady, um dos grandes elogios da aventura stealth do homem-morcego era o de que finalmente era lançado um jogo decente baseado no personagem. E ainda que a série definitivamente seja o melhor material da área baseado em propriedades da DC, é injusto que a adaptação da EA Games de Batman Begins para Playstation 2, GameCube, PC e Xbox seja tão pouco lembrada, dado seu notável nível de qualidade e a forma como foi crucial para o nascimento da franquia Arkham.

O jogo segue uma estrutura simples de fases e chefões, sem a possibilidade de mundo aberto. As missões expandem os acontecimentos de Batman Begins mas preservam a mesma história, trazendo até mesmo grande maioria do elenco original do filme para as funções de dublagem. São sete fases que incluem jogabilidade com Batman e Bruce Wayne em 3ª pessoa e outras duas que deixam o espectador brincar com o poderoso e veloz batmóvel Tumbler apresentado na mitologia de Christopher Nolan.

Assim como a narrativa do filme, o grande aprendizado do jogador é a manipulação do medo nos inimigos a fim de derrotá-los e bolar estratégias baseadas no modo stealth, grande herança que o game deixaria para a vindoura série Arkham. Durante diversos momentos nos deparamos com situações em que inimigos armados tornam o combate direto mais difícil (mas não impossível, se stealth não é muito a sua praia), então o jogador tem a opção de explorar o ambiente a seu redor para encontrar uma forma de desarmá-lo e apavorá-lo; aliás, a reputação de Batman e o medo provocado por este na área são duas barrinhas de energia que vão preenchendo-se ao longo das missões.

Olhando agora em 2016, obviamente os gráficos sofreram um envelhecimento notável, mas ainda assim é possível encontrar um trabalho decente ali, ainda mais se estivermos analisando dentro do contexto de 2005, quando o game fora lançado. As faces digitais de Christian Bale, Liam Neeson, Michael Caine, Cillian Murphy e todos os diversos outros capangas e coadjuvantes são convincentes e certamente de ótimo nível para algo de mais de uma década. Todos mantém um trabalho consistente com suas respectivas performances no filme, e é sempre bom ter mais da voz grossa e ameaçadora de Bale como o Cavaleiro das Trevas.

O que ainda impressiona, porém, é o nítido esforço dos departamentos de arte para a criação dos diversos cenários por onde o game passa. Seguindo de perto a paleta de cores do diretor de fotografia Wally Pfister (pasmem, que tem uma divertida cameo dentro do jogo) e do designer de produção Nathan Crowley, a equipe da EA abraça o aspecto sujo e perigoso dessa Gotham City moderna e realista, permanecendo ainda imersiva a atmosfera fria e as cores amareladas do skyline da cidade, dando um bem-vindo passo além ao expressionismo daquele mundo criado em 2005. Locações como o Himalaia na fase de treinamento e as corridas noturnas com o Batmóvel são hábeis em simular um mundo expansivo que não existe, mas o grande destaque fica para os diferentes locais criados na fase Gotham City (que colocam Batman em um luxuoso hotel da Máfia, museus abandonados e muitas áreas de construção) e o incrível nível de detalhes para o Asilo Arkham, que ganha uma expansão muito envolvente e surge palpável e realista, respeitando as regras do universo.

Quanto à jogabilidade, é uma mecânica simples, mas eficiente. Os combates são simples e não exigem tanto do jogador (ainda que o modo Challenge seja consideravelmente complicado nesse quesito), e é bacana observar como os animadores criaram os movimentos e golpes baseando-se em ações de lutadores reais, sendo possível identificar estilos de luta distintos ali. É uma pena que os combos acabem sendo repetitivos e limitados, e o modo de intimidação do personagem acabe tornando-se cansativo após certo ponto. O game também carece de boas batalhas com chefões de fase, já que tanto Ra's Al Ghul quanto o Espantalho revelam-se adversários tão descartáveis quanto seus capangas.

Já as duas fases com o Batmóvel nos dão a sensação de um mundo aberto sandbox, mas o veículo segue firmemente uma rota já estabelecida pelo sistema. Porém, o carro é divertido de ser operado e os roteiristas são capazes de inventar boas missões durante as fases, que incluem perseguir e interceptar caminhões e carros da Máfia, fugir de luzes de helicópteros policiais e algumas missões de tempo que são facilitadas pelos muitos ativadores de boost espalhados pelo mapa. Só é estapafúrdio que o jogo nos faça acreditar que usar o Batmóvel como arma para estraçalhar carros não provoque diversas vítimas por aí, mas isso deixo pro Batfleck responder...

Tendo derrotado o jogo em uma campanha de aproximadamente 8 horas, não há muito o que se explorar. O game libera 3 diferentes trajes do Batman que podem ser utilizados em novas campanhas, trechos do filme que servem como cutscenes, duas missões extras com o Batmóvel (que também ganha uma nova variante, no caso a do protótipo) e um informativo making of em 6 partes que nos leva para o desenvolvimento e criação do game. Há também a chamada "Galeria do Medo", onde vemos todos os principais antagonistas do jogo confinados em celas do Asilo Arkham, na qual podemos visitar e recolher informações sobre cada um

Batman Begins é um jogo divertido e que garante ao jogador bons momentos na roupa do Cavaleiro das Trevas, sendo um importante precursor para a série Arkham e que definitivamente merece ser lembrado e até revisitado


Crítica | Além da Imaginação - 1ª Temporada: Episódios 1 a 8

Crítica | Além da Imaginação - 1ª Temporada: Episódios 1 a 8

Rod Serling, um dos maiores sonhadores de todos os tempos. Sozinho, revolucionou a tv revolucionária dos anos 1950 que atentava com força a colocar a indústria cinematográfica de joelhos e, com isso, provocando o surgimento de melhorias audiovisuais e tecnológicas. Tendo ganhado alto prestígio durante sua transmissão original que foi de 1959 até 1964, Serling conseguiu cravar The Twilight Zone – traduzida, Além da Imaginação — como um dos seriados mais importantes de todos os tempos.

Não apenas por elevar o padrão do seu pioneirismo em explorar gêneros tão mal vistos na época como o terror e a ficção científica, mas também ao apostar no dificílimo formato da antologia episódica. Ou seja, cada episódio possui atores, cenários, diretores e técnicos completamente distintos entre si. Por sorte, Serling já vinha no embalo do sucesso da série de antologias criada por Alfred Hitchcock em Alfred Hitchcock Presents, já mantendo, de certa forma, o mesmo formato que o mestre do suspense havia apresentado.

A dificuldade de realização nem se comparava com a complexidade criativa para tornar cada episódio verdadeiramente único e importante. Nesse primeiro trecho que selecionamos aqui, Serling consegue fazer isso e muito mais. Descobrir The Twilight Zone é de uma grande felicidade para qualquer espectador que leve muito em conta a qualidade de excelentes histórias. Dada essa breve introdução, vamos às análises dos episódios.

1 – “Where is Everybody?”

Como começar sua fantástica série com um murro atômico. Esse poderia ser o título deste episódio brilhante que pavimenta e comunica em perfeição qual será o feeling de The Twilight Zone em cada episódio. Logo de início, acompanhamos um cidadão sem nome vagando por uma estrada. Ele segue para uma cafeteria ordinária perto de uma cidade ordinária. Chegando lá, clama para ser servido, mas ninguém o atende. Ninguém responde em lugar algum. Não demora muito até que ele se dê conta que está completamente sozinho no mundo, mas com a estranhíssima sensação de que alguém o observa de perto.

Assim como grande maioria dos episódios, temos aqui o roteiro de Rod Serling dirigido por Robert Stevens - nome que faz toda a diferença para conferir todas as sutilezas simbológicas através das imagens. Por exemplo, o jogo do diálogo enquanto o personagem conversa com si mesmo defronte um espelho. As proezas técnicas já enchem os olhos rapidamente. Toda a produção artística aqui é impecável, aplicando elementos cotidianos funcionando normalmente como se tivesse sido manipulados há pouco. Todo o cuidado com os cenários diversos para conferir a dimensão necessária a fim de causar a ilusão de solidão necessária.

O texto também contribui com diversas reviravoltas que surgem a partir de descobertas intrigantes do personagem a cada cinco minutos para manter seu interesse aceso. A atuação de Earl Holliman é agradável ao não apostar tanto no caricato, mantendo o personagem no limite da loucura e desespero, além das ironias sarcásticas recorrentes de seus diálogos que quebram corretamente seu solilóquio. A música de Bernard Hermann completa a obra de mestre que é esse primeiro episódio.

É através dele que conhecemos o elemento mais marcante da série: as reviravoltas imprevisíveis carregadas de moral. Aqui, se reflete muito o medo atômico – isso é uma constante na série, além de possuir mensagens sobre o limite da psique humana em situações estressantes. A viagem espacial também está relacionada no contexto. Serling sempre buscava inserir diversos elementos contemporâneos à época nas histórias dos episódios. A maestria fica em realizar isso tão bem em tão poucos minutos de desenvolvimento.

2 – “One for the Angels”

Certamente inspirado pela escrita de Dickens em Um Conto de Natal, Serling busca trazer um elemento do universo paralelo: a índole de seu protagonista. Ao contrário de Scrooge, Lou Bookman não é o capeta em pessoa. Adorado por todos, o idoso senhor leva a vida simples como vendedor ambulante vendendo cacarecos sem grande valor. Sem muita perspectiva, além de alegrar a vida de umas crianças no prédio, acaba visitado pela Morte em pessoa. Ela avisa que a hora de Bookman chegou, porém, o audacioso senhor acaba firmando um contrato com o ceifador para não bater as botas. Pensando ter enganado a morte, Bookman se surpreende ao ter que negociar com ela novamente para salvar a vida de outra pessoa querida.

O grande destaque aqui é o roteiro de Rod Serling sempre muitíssimo elegante repleto de diálogos divertidos. O estabelecimento dos dois personagens principais é absolutamente fantástico fornecendo vasta mitologia para os termos do contrato da morte de um indivíduo. O mais legal é a caracterização da Morte vivida por Murray Hamilton. É austero, sério, educado e de boa aparência com tiques quase mecânicos para mimetizar a forma pragmática da negociação.

Como a ação inteira transcorre rapidamente em poucos cenários, Serling aposta nas características únicas desta negociação muito bizarra. Porém, como a direção frisa muito o estado de saúde da outra personagem, além de Serling explorar os desejos de Bookman anteriormente, a reviravolta é bastante previsível – a sequência dela é muito longa também. Porém nada disso diminui o caráter belíssimo da moral da história.

3 – “Mr. Denton on Doomsday”

Esse episódio é um dos primeiros que se passam em uma diegese inspirada no velho oeste. Aqui, trabalhando com clichés já muito bem construídos, Serling toca em temas pertinentes como a dignidade humana e o alcoolismo. O protagonista é um mendigo alcoólatra que faria de tudo por mais um gole de álcool, porém, no passado, já foi um dos melhores pistoleiros da região. Mudando seu destino por acidente, o ex-cowboy se mete em um duelo mortal. Para ajudá-lo, o sr. Fate oferece uma de suas infalíveis poções.

De costume, Serling também estende as ações do episódio baseado em poucos temas. Os diálogos são bastante melodramáticos – tendência que seguirá no próximo episódio. Novamente, trata-se de uma narrativa bem agradável de ser assistida, principalmente por conta da acuidade estética dos tons de cinza criadas pela fotografia. Até mesmo há diversos enquadramentos já ousados para a época.

Um detalhe que não havia comentado antes é o manejo de encenação exemplar que os diretores fazem em cada episódio. A câmera se movimenta bastante – algo impressionante para a época e para um seriado televisivo. Serling sempre quis que houvesse essa pegada cinematográfica em cada episódio e ele certamente conseguiu em diversos deles.

A twist final é encantadora voltando aos rumos imprevisíveis vistos no primeiro episódio. Traz consigo uma bela mensagem anti-guerra refletindo diretamente a paranoia gerada com a Guerra Fria.

4 – “The Sixteen-Millimeter Shrine”

Claramente inspirado em Crepúsculo dos Deuses, o episódio traz uma narrativa muito similar à de Norma Desmond. Aqui, acompanhamos uma estrela de cinema em decadência, Barbara Jean. Tendo alcançado o sucesso na juventude, vê-se velha e mal quista. Sem conseguir qualquer papel para filmes novos, passa seu tempo vendo e revendo todos os romances melodramáticos dos quais participou quando jovem, sonhando em reencontrar atores que viveram seus pares nos filmes. Seu agente e amigo pessoal, preocupado com o isolamento de Barbara, tenta resolver a situação, porém o desfecho disso tudo é inesperado.

Novamente, temos a situação definindo o ritmo do episódio. A história, apesar de boa, é bastante repetitiva. Temos 4 conflitos diretos sendo que três deles são cópias dos anteriores. Além da motivação de Barbara ser bem definida, mas nunca bem explorada. É perfeitamente compreensível para um episódio de pouco mais de 22 minutos, mas deixa a impressão que Serling possa ter dado um passo maior que as pernas.

Ou até mesmo que sua intenção era trazer o Crepúsculo dos Deuses somente para a reviravolta final muito audaciosa para a época. Foge completamente de lugares comuns servindo de inspiração para Woody Allen em A Rosa Púrpura do Cairo. Vale a pena pela twist, mas no geral é um episódio mediano se comparado aos outros. Até mesmo em questões técnicas deixa a desejar, principalmente na direção excessivamente quadrada de novelas mexicanas.

5 – “Walking Distance”

Até então, o episódio mais carregado de drama, investido muito pelo personagem protagonista. Une as duas situações marco: a atmosfera bizarra e o conflito genuíno do protagonista. Martin Sloan dirige a esmo pelas rodovias americanas. Apesar de ser um homem bem-sucedido, sente apenas o vazio em sua existência. Por acaso, para em um posto de gasolina. Lá, a distância, percebe uma placa que direciona justamente a sua cidade natal: Hometown. Contagiado pela curiosidade, parte para a cidadezinha.

Chegando lá, descobre que de alguma forma voltou ao ano de 1934 tendo a oportunidade de revisitar os entes queridos que já foram e deixar uma mensagem importante para o pequeno Martin Sloan. Novamente, um episódio bastante complexo devido a alto custo graças as diversas locações e cenários oriundos de Hometown. Sloan, apesar de ser um protagonista apagado pelas circunstâncias extraordinárias, consegue sua identificação forte com o espectador graças à mensagem do episódio que, para hoje, apesar de clichê, é uma potência emocional.

Serling moe o tempo com crueldades para Sloan no reencontro com os pais que agem de forma nada romântica. É isso que talvez defina a autoria de Serling: brincar com situações extraordinárias enquanto pauta os acontecimentos de modo realista e, por vezes, cruel. Novamente, temos Robert Stevens na direção de outro episódio baseado no desespero do protagonista isolado em uma cidade.

Enquanto no primeiro episódio tínhamos um personagem de fato isolado, aqui temos uma situação similar, mas com o protagonista rodeado de gente, mas igualmente isolado por não pertencer àquele tempo. O clímax culmina dentro de um carrossel, servindo como metáfora visual para a representação do tempo. Dessa vez, Serling não explica em voz over a moral da história. É um excelente episódio de drama refinado.

6 – “Escape Clause”

Eis que a comédia finalmente surge em The Twilight Zone. Aqui temos o hipocondríaco Walter Bedeker reclamando da vida, de seu médico e da sua esposa temendo a sua morte, apesar de ser um homem saudável. Entre tantas ladainhas, o demônio em pessoa aparece e oferece um contrato para dar imortalidade para Bedeker em troca de sua alma. Sem pestanejar, Bedeker aceita, porém ele descobre que viver para sempre pode não ser tão emocionante.

O episódio mais divertido do seriado por enquanto. Serling utiliza uma situação parecida com a que vimos em One for the Angels, porém mudando totalmente a essência dos personagens. Novamente, os diálogos são impecáveis marcando o ponto do episódio toda a negociação do diabo com Bedeker, um cidadão extremamente cético. Pautado pelo realistmo, Serling traz uma negociação onde o demônio não encontre quaisquer furos no contrato para trapacear Bedeker.

Aqui o discurso é plenamente construído durante as duas partes do programa, apesar do descontentamento de Bedeker com sua imortalidade vir cedo demais graças à algumas elipses. Rapidamente vemos os métodos que ele usa para tirar vantagem sobre os outros e até mesmo da relação com sua esposa. Embora o desfecho seja muito previsível e forçado para um protagonista que tinha tanto apego pela vida, se trata de uma das melhores reviravoltas do seriado até então. Repleta de ironia e humor negro.

7 – “The Lonely”

Esse esbanja potencial, porém sua trama é intrincada demais para ser enxugada tão rapidamente em 23 minutos. O pior é que a força motriz do episódio só surge exatamente no meio da exibição. Aqui acompanhamos um condenado chamado Corry. Em 2046, as cadeias da Terra estão lotadas, então os governos se uniram para criar complexos simples em asteroides que vagam pelo espaço. Lá, Corry vive sozinho cumprindo sua pena, tentando não enlouquecer por conta do isolamento. A cada três meses, provisões são lançadas para ele. Em uma das remessas, ele encontra uma robô humanoide feita para fazer companhia a ele. Porém, na cabeça afetada de Corry, ele crê que ela seja humana.

A sinopse do episódio já mostra a quantia gigantesca de elementos que Serling tenta trabalhar aqui. Por conta de muitos acontecimentos serem apenas jogados em tela e melhor do episódio ser restrito a tão pouco tempo de desenvolvimento, a ideia principal acaba atropelada. Nem mesmo a mensagem carregada de moral consegue surtir efeito, além da reviravolta final ser bastante previsível, acontecendo sem cerimônia.

Mas mesmo assim, há elementos valiosos em The Lonely. O solilóquio de Corry é bem apresentado, assim como a relação com os guardas das provisões. A rejeição dele com Alicia, a androide, também funciona, apesar de se estender por demais quase tornando o discurso em uma grande ladainha. Porém, quando Corry se entende com Alicia, os elementos se tornam mais românticos e interessantes enquanto a própria personagem ganha contornos mais complexos revelando emoções e desejos. Ainda assim, infelizmente, se trata do episódio mais fraco até aqui. Para quem gosta do tema, recomendamos Ex Machina.

8 – “Time Enough at Last”

Esse episódio é antológico. Parodiado diversas vezes, provavelmente você já deve conhecer o leit motiv da narrativa. Aqui, temos Henry Bemis, um bancário viciado em livros. Tudo que ele quer na vida é ler. Ler sem parar. Porém, esse seu vício atrapalha o seu rendimento no emprego e no relacionamento com sua esposa megera. Tendo o hábito de se trancar no cofre do banco durante o horário de almoço para ninguém atrapalhar seu momento de leitura, tudo muda quando o mundo acaba graças a um ataque nuclear onde somente ele resta vivo. Vendo que ninguém irá importuná-lo novamente, decide dedicar todo o seu tempo para aproveitar os livros da biblioteca nacional. Porém, todo o sucesso do seu passatempo depende dos enormes óculos que utiliza.

Novamente, o conceito de isolamento e do medo nuclear dá as caras no seriado, porém, aqui, acompanhados da comédia, já que toda a desventura de Henry é levada com tons mais leves, principalmente pela atuação muito inusitada de Burgess Meredith – sim, o mesmo ator do treinador de Rocky Balboa.

Meredith torna Henry em um verdadeiro zé-ninguém que sofre constantes abusos, mas que mesmo assim mantém o sorriso no rosto por ser covarde demais para se manifestar. Quando enfim ocorre o cataclismo, há até mesmo uma reação genuína de pesar por todo mundo ter morrido, mas os desejos do personagem logo tomam forma quando encontra a biblioteca municipal e passa a organizar os livros que deseja ler.

Serling consome bastante tempo até entregar a impagável reviravolta, jogando a redenção do personagem no lixo. Tudo isso ocorre em apenas três minutos. A segunda parte do episódio, onde acompanhamos Henry vasculhando o mundo pós-apocalíptico pode até dar um pouco de sono por conta do ritmo lento e livre de conflitos, porém todo o design de produção caprichoso e os comentários em over de Serling deixam as coisas menos enfadonhas.

O lugar onde nada e tudo acontecem...

Os primeiros oito episódios que Serling nos traz são absolutamente encantadores. As histórias com suas particularidades e semelhanças conseguem nos cativar e envolver inteiramente. Melhor, sempre que uma história acaba, já ficamos ávidos pela próxima que teremos a certeza de que também será tão boa quanto.

Se ficou interessado nesse vasto mundo impressionante criado por Rod Serling, já aviso que é muito fácil encontrar as temporadas clássicas nas lojas por um preço razoável. Porém, fique atento, por ser um seriado muito querido por fãs, é bastante provável que ela esgote rapidamente. A restauração audiovisual no DVD está impecável com som e imagem bastante nítidos – muito por conta do trabalho exemplar de conservação dos negativos originais do seriado –, além da apresentação da embalagem ser bastante decente.

Nosso plano aqui no site é cobrir todos os 156 episódios feitos durante a exibição da série clássica. Uma empreitada exaustiva, com toda a certeza, mas que trará grande satisfação e prestígio. Um trabalho hercúleo, digno de sua existência em Além da Imaginação.


Crítica | Demolidor - 1ª Temporada

Crítica | Demolidor - 1ª Temporada

Depois de conquistar os cinemas com seu universo cinematográfico que culminava em Os Vingadores, a Marvel Studios começava a expandir seus horizontes no audiovisual. Já tendo a iniciado a regular série Agents of S.H.I.E.L.D. e o projeto do que viria a se tornar Agent Carter na emissora americana ABC, a Casa das Ideias agora miraria na cada vez mais poderosa Netflix, que assinava um contrato de no mínimo 4 séries com o estúdio de quadrinhos.

Um conteúdo que divergiria bastante daquele que acompanhávamos nas aventuras coloridas e bem humoradas do cinema, que adotariam um tom soturno e realista no serviço de streaming, ainda que interconectadas com o quadro geral idealizado por Kevin Feige. A primeira série desse contrato seria um reboot de Demolidor, personagem cujos direitos enfim retornavam à Marvel Studios após a tentativa fracassada da Fox de lançar uma franquia com Ben Affleck e Jennifer Garner em 2003.

A chave para ressuscitar o personagem toma muita inspiração do processo que Christopher Nolan realizou com maestria com o Cavaleiro das Trevas em Batman Begins: sombrio e realista. A série de 13 episódios trouxe Drew Goddard para atuar como showrunner e apostou em uma abordagem adulta e que ecoa a fase em que o personagem passou pelas mãos de Frank Miller, a começar pelo uniforme ninja e o tom mais violento que acabou mais adequado à Netflix do que o cinema - ainda que não seja algo digno de uma censura de 18 anos, seu conteúdo é consideravelmente mais gráfico do que aquele que vemos no cinema do gênero.

Assim, a trama da série nos apresenta aos primeiros dias de Matt Murdock (Charlie Cox) em sua identidade vigilante no bairro de Hell's Kitchen, Nova York. Nos primeiros minutos já conhecemos a origem de sua cegueira e a manifestação de suas habilidades aguçadas em breves flashbacks, que acabam se alongando pelo restante da temporada, e seu humilde começo como advogado na firma que inicia com seu melhor amigo, Foggy Nelson (Elden Henson) e o caso inicial que os une com sua futura sócia, Karen Page (Deborah Ann Wolf). À noite, Murdock atua como um vigilante mascarado que vai pouco a pouco caçando criminosos e limpando a cidade de atividades ilícitas, seguindo uma trilha perigosa que o leva de encontro ao maior gângster da região: Wilson Fisk (Vincent D'Onofrio), o Rei do Crime.

É uma história de origens, mas cujo formato se difere um tanto pelo constante uso de flashbacks (chegaremos neles em breve), algo que pode ser justificado pelo próprio formato de narrativa seriada; um piloto de TV certamente exige que vejamos o herói uniformizado logo de início, o que adianta de certa forma os eventos e acelera algumas relações introdutórias de personagens - especialmente pela entrada de Page, logo no início.

Mas as decisões de Goddard aqui são quase todas acertadas. A influência do trabalho de Nolan é sentida fortemente aqui, desde a abordagem realista para introduzir seus personagens e conduzir as cenas de ação até o visual que abraça a escuridão e tons pastéis mais alaranjados - decisão que pode tornar-se um demérito graças ao trabalho demasiado escuro dos diretores de fotografia, que iluminam algumas cenas a ponto de tornarem-se incompreensíveis. Porém, isso garante uma atmosfera dark que é muito interessante de se mergulhar e explorar, tornando um lado diferente de Nova York que revela-se propício a seus habitantes nada simpáticos.

A escolha de Charlie Cox para Matt Murdock é brilhante. A começar pelo incrível trabalho do ator inglês em fazer um sotaque americano absolutamente impecável e seu desempenho formidável como um sujeito cego, o que exige sutilezas em seus músculos faciais dignas de reconhecimento. A dualidade do personagem também traz uma fúria impressionante do ator, que surge ameaçador na roupa preta inicial do Demolidor, ao mesmo tempo em que a doçura e leveza de Murdock nas cenas com Foggy e Page criam um interessante contraponto.

Mas talvez seja na figura do vilão que reside o grande ponto alto da série. Wilson Fisk pode muito bem ser o melhor antagonista que qualquer produção com o selo da Marvel já transportou para o audiovisual, criando um sujeito que é capaz de provocar genuíno pavor com sua brutalidade e a impecável performance de Vincent D'Onofrio. Os tiques faciais e a voz grave de D'Onofrio sugerem um homem que parece prestes a explodir de nervoso - e pavor - a cada segundo, sendo chocante ver os momentos em que o personagem enfim sucumbe a seus instintos violentos. Por outro lado, a série é inteligente por lhe garantir uma subtrama amorosa visceral e bem contada, além de um episódio de origem que corajosamente explora a infância perturbadora de Fisk com eventos e imagens realmente memoráveis. Um acerto gigantesco, sem dúvida.

Outro fator pelo qual a série ficou marcada é a qualidade de suas cenas de ação, que oferecem momentos que nunca havíamos visto no gênero antes. Tomando inspiração do estilo de luta adotado em produções como Operação Invasão, a pancadaria de Demolidor é visceral e convincente, apostando em combates corpo a corpo críveis e até alguns confrontos com ninja que mantém o pé no chão mesmo apostando em elementos mais fantásticos; como um terno incapaz de ser cortado por lâminas samurai. Mas o ponto alto no quesito é certamente a já icônica cena do corredor que finaliza o episódio Cut Man, onde um inacreditável plano sequência de 9 minutos nos leva em um embate do protagonista com um número muito maior de inimigos em um apertado corredor. É uma cena incrível que traz fortes ecos de Oldboy, ao mostrar seus lutadores cansados, cambaleando e até dando pequenas "pausas" antes de voltarem à porrada. Aplausos merecidos para a direção primorosa de Phil Abraham.

Outras sequências que definitivamente merecem destaque incluem outro plano longo envolvendo panorâmicas, dessa vez quando estamos no interior de um táxi acompanhando um chinês cego cantando, enquanto vemos a figura soturna do Demolidor surgir e arrebentar com criminosos ao passo em que a câmera vai girando e a cantoria serene do chinês dá o tom ideal. Temos também a excelente sequência em que Matt persegue um carro correndo pelos telhados da cidade, enquanto sua audição requintada vai lhe indicando o caminho, em The Ones We Leave Behind e a sangrenta luta contra o ninja Nobu em Speak of the Devil, onde temos um trabalho quase invisível de efeitos visuais tornando o embate possível.

E então, temos os flashbacks. Pessoalmente, acho que a história tem o ritmo gravemente danificado pela constante inserção dessas digressões temporais, especialmente todo o tempo dedicado ao jovem Matt e seu pai boxeador. É um recurso que ganha mais força em episódios específicos, como Stick, onde acompanhamos o treinamento de Matt com seu enigmático mestre vivido por Scott Glenn e Nelson v. Murdock, onde a narrativa mergulha fundo na relação entre Matt e Foggy, em um bom contraponto à situação agravante na qual encontram-se no presente.

Algumas subtramas também não são das mais empolgantes, sendo um desperdício de tempo e um claro filler das 13 horas de duração total. Tudo o que envolve Foggy e Page investigando uma moradora afetada por uma situação estranha na vizinhança e a cruzada do jornalista Ben Urich acabam tornando-se entediantes, ainda que rendam bons momentos de desenvolvimento de seus personagens e as relações entre estes; sem falar que as performances de Henson e Wolf são ótimas e naturais. Porém, a série daria a eles um papel muito mais proveitoso em sua segunda temporada, mas isso é assunto pra outro dia...

Ainda que traga algumas inconsistências em sua longa temporada de 13 episódios, Demolidor é uma grande surpresa e uma das melhores adaptações do selo Marvel já feitas no audiovisual. A série da Netflix impressiona pela abordagem dark e visceral, impressionando pela ação e o cuidado com seus excelentes personagens. Um começo memorável para uma parceria que promete continuar surpreendendo.

Demolidor - 1ª Temporada (Daredevil - Season 1, EUA - 2015)

Showrunner: Drew Goddard
Direção: Drew Goddard, Phil Abraham, Stephen Surjik, Ken Girotti, Euros Lyn, Steven S. DeKnight, Guy Ferland, Nick Gomez, Adam Kane, Nelson McCormick, Brad Turner
Roteiro: Christos N. Gage, Ruth Fletcher, Douglas Petrie, Marco Ramirez, Steven S. DeKnight, Joe Pokaski
Elenco: Charlie Cox, Deborah Ann Wolf, Elden Henson, Vincent D’Onofrio, Rosario Dawson, Scott Glenn, Peter Shinkoda, Matt Gerald, Ayelet Zurer
Emissora: Netflix
Episódios: 13
Gênero: Ação, Aventura
Duração: 50 min aprox

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