Alguns gêneros nunca deixarão de existir. Os filmes trash, B, exploitation (filmes super exagerados) fazem parte da cultura cinematográfica e me orgulho em dizer que sou fã desse tipo peculiar de “arte”. As homenagens mais recentes (que valem a pena de se mencionar) foram o interessante “Planeta Terror” e o excelente “À Prova de Morte”. Agora, o diretor Patrick Lussier ressuscita este tema misturando carsploitaition (filmes exagerados com carros) com o uso correto e comercial do 3D estereoscópico.
Milton escapou do Inferno a procura de vingança. Sua filha foi assassinada por um líder de uma seita satânica que visa trazer o tinhoso em pessoa para explodir o planeta. No meio de sua viagem desesperada para “involuntariamente” salvar o mundo, conhece Piper e seu Dodge Charger – dois acompanhantes que se mostrarão muito úteis em sua jornada do “além da vida”. Ele tem até a próxima lua cheia para se vingar do satanista antes do fim do mundo.
Renovando a homenagem
O roteiro de Todd Farmer e Patrick Lussier sabe muito bem dar continuidade a idiotice divertida praticada por George Romero, Ed Wood e Sam Raimi. Conta com um protagonista tirado diretamente do Inferno, loiras, nudez explícita, sexo, violência gratuita, explosões, muscle cars voadores, vilões caricatos e consequentemente uma narrativa fraca. Até mesmo o próprio roteiro tem dificuldade de explicar a história para o espectador utilizando inutilmente flashbacks maçantes. Infelizmente, isso resulta em uma falha notável no roteiro – por exemplo, como Jonah (é a quinta vez que vejo um filme trash com um vilão “satânico” chamado Jonah) reconhece logo de imediato Milton sendo que os dois nunca haviam se encontrado antes? Outra coisa injustificável é a participação de Piper na história, visto que ela é uma personagem apêndice – Milton conseguiria ter cumprido sua missão com ou sem ela, já que ele é from hell.
Entretanto, ele diverte ao criar a cena mais memorável do filme inteiro – a parte que Milton dá um novo significado ao título de masculinidade em que realiza quatro proezas ao mesmo tempo. Seus personagens também são interessantes, sendo o melhor deles o único e original “Contador” em que aproveita para fazer críticas a seitas e inserir os momentos mais absurdos do filme. Ele também tem a esperteza de resolver rapidamente os conflitos secundários da narrativa, além de sempre ser criativo nas matanças de Milton. Mesmo assim os problemas superam suas qualidades. Diversas vezes, me senti desinteressado a respeito da conclusão previsível da trama, fora o cansaço mental das reviravoltas que mantém o desenvolvimento do filme inteiro – as pausas para desenvolver os personagens são quase inexistentes e quando aparecem, apenas servem para encher os minutos da projeção do longa.
Diretamente do Inferno
Nicolas Cage está amaldiçoado há algum tempo. “Caça as Bruxas” foi o fundo do poço e, consequentemente, não havia como ele afundar mais. Entretanto, aqui está muito bem no papel de bad ass chegando até a revelar algumas expressões inéditas, sem abandonar, claro, sua marca registrada, a famosa “cara de caçar mosca”. Sua atuação é caricata, ele é o típico anti-herói que conquista todas as garotinhas da lanchonete. Além disso, criou um sotaque forte, grave, pesado e pausado para enfatizar as diversas frases de efeito provenientes do roteiro. Infelizmente, não soube medir as horas que deveria atenuar e largar o sotaque de lado – o melhor exemplo disso é a cena que ele comenta como é a vida no Inferno com uma fala tão trágica que chega a ser cômica.
O melhor da atuação de Amber Heard é sua beleza estonteante. O máximo de esforço que fez foi criar um sotaque tipicamente caipira, soltar umas lágrimas aqui e bater nos membros da seita satânica (aliás, isso ela faz muito bem). Billy Burke é responsável em partes pela péssima pose de vilão que criou. O roteiro é o maior culpado. Suas falas são ruins demais, sempre com um tom bíblico, poético, profético, épico e vários outros “ico” que possa imaginar. E ele conseguiu deixa-las ainda piores, graças ao seu modo de falar completamente inusitado e esquisito. Para completar, sua atuação recheada de expressões ridículas deixou seu personagem com um ar mais patético que do que já possuía. A única coisa bem feita em seu personagem é a caracterização esplêndida que o figurino o conferiu.
William Fichtner salvou o filme. Seu personagem é o melhor do longa inteiro graças a sua participação digna de aplausos. Sempre elegante com sua atuação cheia de manias, gestos suaves e com uma movimentação interessante, mas de poucas caras (uma coisa muito boa), anseia o espectador por cada cena em que participa sendo que sempre são as mais divertidas e marcantes.
Luzes, câmera e ação?
A fotografia de Brian Person é praticamente ausente. O único destaque de seu trabalho é a passagem no bar onde Piper e Milton se hospedam. Lá ocorre o único, mas impressionante, trabalho da modelagem de luz e sombra do filme inteiro. Só é necessário reparar na face de Heard e notar como a luz incide sobre ele, ajudando-a e muito a transmitir a emoção retratada, além de criar um incrível clima de suspense e perigo. Merece também um destaque pela grande variedade de planos nas complexas cenas de perseguição. Person é no mínimo uma pessoa inteligente e aproveitou a escolha do roteiro para filmar a maioria das cenas exteriores durante o dia, diminuindo, desse modo, o esforço de seu trabalho. Visto que sempre é um belo desafio simular artificialmente a iluminação noturna característica das estradas.
Os efeitos visuais são horrorosos e dão aquele ar trash extreme assumido pelo ridículo clímax que diverte o público. Alguns são tão ruins que até contam com falhas de renderização. Entretanto, eles impressionam na criação da “rodovia do Inferno”. A maquiagem também surpreende pela sua eficiência, em alguns casos.
Ouvidos do Rock
A música original composta por Michael Wandmacher rouba a cena a todo instante. O rock predomina soberano em sua trilha com batidas viciantes e frenéticas ajudando bastante a dar um dinamismo maior nas corridas cheias de explosões. As distorções pesadas da guitarra misturadas em harmonia com o som dos tambores deram resultados bastante interessantes de se conferir. Entretanto, aquelas que ele compôs com o intuito de envolver o espectador nas cenas de suspense falharam brilhantemente!
A trilha licenciada acompanha a qualidade da original contando com sucessos rock e pop. Como é impossível encontrar essas músicas comprando a trilha, vou lista-las para conferirem o ótimo som: “Raise a Little Hell”, “F*ck the Pain Away”, “Laserlove”, “I Like to Rock”, “You Want The Candy”, “That’s The Way I Like It” e “Stone in My Hand”.
3D EXPLOITATION
Patrick Bessier é um diretor horrível, isso não é novidade. Com filmes como “Dia dos Namorados Macabro” e “Drácula 2000”, provou sua total falta de talento. Entretanto, não há como negar que este cara é inteligente e que seu novo filme tem estilo e assumir que é apenas uma experiência visual tosca sem se levar a sério em algum instante.
Ele aproveitou todas às influencias dos filmes trash anteriores ao dele e fez uma mistura de “Corrida Contra o Destino” e “Evil Dead”, além de satirizar o misticismo ridículo do rock dos anos 80. Fora isso, utilizou o 3D estereoscópico formidavelmente jogando nos olhos da plateia cacos de vidro, machadinhas, balas, carros voadores, pedaços de gente mutilada, entre várias outras coisas. Então, já deu para entender que a maior diversão de assistir este filme são os efeitos 3D.
Às vezes, o diretor tem um lampejo de decência com a sétima arte e consegue enquadrar seus atores para a câmera de forma genial. Por exemplo, existe um plano consideravelmente longo quando o amigo de Milton chega para rebocar seu Dodge. E aí, nessa hora é que o enquadramento torna-se uma obra de arte. Enquanto ele acerta neste quesito, revela uma estética horrível durante os flashbacks sobrepondo várias imagens na tela misturadas com um filtro visual de péssimo gosto.
Além de tudo isto, adiciona com vontade e excesso vários slow motions em sua obra que desafiam todas as leis da física. Apesar de a gravidade não gostar de ser desafiada, o público se diverte com os capangas satânicos voando, explodindo e caindo em câmera lenta. Entretanto, o uso decorrente deste recurso acaba por tornar algumas cenas de ação bem maçantes devido à falta de dinamismo.
Cuidado ao estacionar
“Fúria Sobre Rodas” é um filme B engraçadíssimo que divertirá os fãs do gênero. Se você estiver procurando explosões encadeadas com o mínimo impacto, muscle cars dos seus sonhos, muita violência gráfica, personagens inexpressivos, história rasa, nudez, tiroteios, efeitos visuais abismais acompanhados de uma música sensacional, este é o filme certo e a diversão é garantida. Ele certamente é um filme que deixaria Charles Bronson orgulhoso, ou não…