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Crítica | Rei Arthur: A Lenda da Espada

O diretor Guy Ritchie definitivamente já provou sua marca ao cinema. Com filmes como Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes e Snatch: Porcos e Diamantes, seu estilo diretorial foi estabelecido e, com o passar do tempo, mantido, porém não aperfeiçoado. Com o seu crescimento na indústria, esse cineasta “street-level” foi flertando mais e mais com modelos mais clássicos de cinema, como no filme de espião descolado e retrô O Agente da U.N.C.L.E. e a reinterpretação blockbuster da maior criação de Arthur Conan Doyle em Sherlock Holmes e sua sequência. Encontrou sucesso financeiro nas duas aventuras do investigador, e certo sucesso artístico em U.N.C.L.E. Dito isso, a sua marca vista nas suas primeiras obras não era tão forte nestas mais recentes, portanto tendo um estilo mais seguro e garantido.

Mas chegou 2017 e Ritchie está lançando seu novo filme, seu novo blockbuster, sua nova reinterpretação de uma figura clássica. Essa figura é Arthur Pendragon (Charlie Hunnam), ou Rei Arthur, como é mais conhecido. A proposta desse primeiro capítulo de uma suposta (mas improvável) trilogia é contar a história de seu personagem por um viés desromantizado, cru e ocasionalmente humorístico. Ou não. Veja bem, Rei Arthur: A Lenda da Espada não tem certeza do que quer ser. Por mais que momentos do filme tragam uma direção inspirada, edição precisa e energética e o que for de Ritchie e sua equipe, outros falham em se destacar do número até notável de aventuras capa e espada medíocres que recebemos nos últimos anos, de Fúria de Titãs até o chocante O Sétimo Filho. Antes de explorarmos esses méritos e deméritos, uma breve sinopse.

A família Pendragon, linhagem real da Bretanha, é inicialmente ameaçada por feiticeiros, que conjuram elefantes gigantescos para uso nos campos de batalha. O pai de Arthur (Eric Bana), com sua espada Excalibur, derrota tais feiticeiros, mas acaba pego de surpresa pela traição de seu irmão, Vortigern (Jude Law), que conspirava com os feiticeiros para conseguir poder ilimitado sobre o reino, além da própria espada. Arthur, nesse momento apenas uma criança, é colocado em um bote pelos pais, indo rio a baixo. Orfão, é encontrado por mulheres do bordel local, de Londinium, onde é criado. Com o passar dos anos, Arthur envelhece e Vortigern acumula poder sobre o reino. Até que Arthur se depara com seu passado e a interferência de certas figuras, e segue então a missão de recuperar o que é seu por direito e salvar o reino. Nada profundo ou surpreendente. Usam cavalos de verdade e não cocos, não há coelho assassino.

A trama é previsível, como a maioria das prequels. Seu estilo, nem tanto. O crescimento de Arthur é exposto energicamente, em uma excelente  e memorável cena, produto da inspiração então alinhada de Ritchie, seu montador James Herbert, o cinematógrafo John Mathieson e o excepcional compositor Daniel Pemberton, que aqui traz temas baseados em batidas e sons respiratórios que ficam com o espectador após a sessão. Grande parte do filme possui tal estilo, mas nunca alcançando novamente a inspiração dessa maravilhosa cena. Certos diálogos entre os personagens, como Bedivere (Djimon Hounsou) e Goosefat Bill (Aidan Gillen, o inconfundível Little Finger de Game of Thrones) trazem aquele carisma e certa esperteza dos primeiros filmes de Ritchie, que inspiraram cineastas como Matthew Vaughn, de Kingsman: O Serviço Secreto, onde a temática também envolve, curiosamente, a ideia de Arthur e seus cavaleiros da Távola Redonda. Até aí, Rei Arthur constrói sua identidade, uma visão idiossincrática dessa antiga lenda. Charlie Hunnam faz um ótimo trabalho, provando que também consegue ser um bom protagonista de blockbuster além de séries ou dramas (e futuro Arqueiro Verde, por favor), enquanto Jude Law traz sua versatilidade ao papel do vilão, alternando entre seriedade e uma prazerosa faceta paranoica, esquisita e insana (não é um Eddie Redmayne em O Destino de Júpiter, felizmente).

Em meio a esses momentos e qualidades até empolgantes, no entanto, o filme cai nas armadilhas típicas de um blockbuster mediano. O uso de CG alterna entre econômico e exageradamente ridículo, com cenas ao final que trazem à memória a cena de Neo contra os Smiths em Matrix Reloaded, onde a transição entre atores e “bonecos” computadorizados só ressalta o quão não convincente a tecnologia consegue ser. E qualquer construção de clima e estabelecimento do duelo entre Arthur e Vortigern é jogado pela janela com um embate final digno de “quick time event” decepcionante de videogame (aquelas cutscenes que exigem pressionar botões, que te matavam e irritavam em Resident Evil 4), onde a batalha é travada entre um homem (computadorizado) e… algo, também computadorizado.

Se não fosse a confusão do ato final, que se estende demais e apresenta eventos e eventos até que nem esperemos um final, o filme seria uma maneira divertidíssima de passar o tempo no cinema, sendo conduzido por uma direção, elenco e trilha entusiásticas. O que gera todos esses problemas é a insegurança de seus criadores e produtores, temendo que um filme inteiramente Guy Ritchiesco (de nada, pelo neologismo) não fosse garantir a proposta trilogia. Assim, encheram o filme de certo espetáculo vazio em momentos e cordas soltas em outros, deixando alguns dos principais elementos do personagem e seus cavaleiros para uma sequência.

Mesmo com todos esses problemas, preciso admitir: com todas as qualidades presentes, e um elenco promissor, eu pagaria para ver uma sequência mais confiante e determinada. Esse é ainda competente e se diferencia, além de ser um entretenimento fácil e (na maior parte) bem realizado. Não chega aos níveis de outras adaptações da lenda como Monty Python e o Cálice Sagrado e Excalibur, mas sem dúvida é bem melhor que a versão entediante de Antoine Fuqua com Clive Owen no papel, Rei ArthurComo um próximo não deve rolar, pelo menos levo para casa o desejo imenso de escutar de novo e de novo a trilha de Daniel Pemberton, que já marcou presença em sua colaboração com Ritchie em U.N.C.L.E. e marca novamente neste filme aqui. Se existe alguma lenda nessa obra, é a de Pemberton que estamos vendo crescer.

Texto escrito por Júlio Vechiato

Rei Arthur: A Lenda da Espada (King Arthur: Legend of the Sword, EUA/ Reino Unido – 2017)

Direção: Guy Ritchie
Roteiro: Guy Ritchie, Joby Harold, Lionel Wigram
Elenco: Charlie Hunnam, Jude Law, Eric Bana, Djimon Hounsou, Astrid Berges-Frisbey, Aidan Gillen, Tom Wu, Freddie Fox, Annabelle Wallis
Gênero: Aventura, Ação
Duração: 126 min

Redação Bastidores

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