O sucesso de Yojimbo foi monumental. Não só por ter um tremendo efeito no mercado e na noção de cinema oriental na época, mas como também virou o maior sucesso financeiro de Akira Kurosawa em mercado doméstico. Com olho no lucro praticamente certo em uma sequência da grandiosa história do Ronin sem nome, o misterioso Sanjuro, a Toho entrou em um acordo estranho com Kurosawa para que ele quebrasse a tradição de nunca realizar sequências.
Algumas tradições realmente nunca deveriam ser quebradas.
Com certeza minha opinião sobre Sanjuro é bastante fora da curva sobre a obra que recebeu aplausos tão intensos quanto o longa original, mas há simplesmente um enorme problema com Sanjuro: em essência, ele é muito parecido a Yojimbo.
Lá e de Volta Outra vez
Dessa vez Kurosawa apresenta Sanjuro escutando uma fofoca problemática de um grupo de dez samurais que estão discutindo uma problemática envolvendo o clã do superintendente da cidade, interessado em tomar em limar o clã rival para controlar a cidade. Novamente se fazendo presente pela moralidade do correto, Sanjuro decide ajudar os samurais totalmente imaturos que seguem o código à risca nunca agindo por si.
Para realizar tal feito, temos novamente um plano engenhoso de Sanjuro envolvendo se infiltrar no lado oposto para capturar informações e desestabilizar o forte grupo conspirador por dentro, do mesmo modo que vimos em Yojimbo.
De conceito muito parecido e uma leve distinção de moralidade indicando um desenvolvimento estranho ao protagonista, temos uma aventura que custa a engajar já que o grupo de samurais que Sanjuro se alia são extremamente chatos.
Para criar conflito, Kurosawa e os roteiristas pendem ao máximo para mostrar os jovens samurais como bobocas completos que agem pelo ímpeto sem nunca pensar em um plano ou analisar com firmeza uma situação dúbia. O contraste gerado com a figura do ronin sem nome que pouco se lixa pelo código é notado imediatamente, mas novamente há um excesso de repetição desse tema que só atinge certo ápice na cena final do filme na qual Sanjuro aprende uma valiosa lição sobre violência e o preço de uma morte, enquanto os samurais bocós saem mais maduros do grandioso conflito.
É um pouco mais difícil compreender a natureza do embate entre os clãs já que tudo envolve certa burocracia, além de ser exposto ao espectador de modo muito grosseiro e preguiçoso, embora flerte com a ótima cena de Yojimbo na qual o anfitrião explica lentamente ao samurai o inferno que se instalou na cidade.
Apesar de trazer esse interessante jogo de amadurecimento em Sanjuro que reconhece que a violência nem sempre é a melhor resposta, culminando em um clímax inteligente envolvendo a armadilha pacífica perfeita que o ronin cria para o clã oponente, é uma mudança muito brusca para uma aventura pouco catártica para o herói, já que os eventos ocorridos em Sanjuro são menos expressivos e intensos que o do anterior.
Simplesmente fica a aparência incomoda que Kurosawa, desapontado pelos espectadores não terem sacado a mensagem antiviolência de Yojimbo, decidiu tornar tudo explícito com o sofrimento de Sanjuro e através diálogos nada sutis para frisar que matar pessoas é algo ruim. O moralismo forçado simplesmente destoa do universo orgânico outrora construído
Logo, com essa mão pesada para guiar a história, o diretor parece pouco inspirado para superar o trabalho desempenhado antes. A estética suja fascinante de Yojimbo é deixada por uma plástica simétrica e bastante limpa, repleta de cenas internas em sets mais simples, com pouco ou nenhum movimento com enquadramentos que buscam sempre mostrar a unidade do grupo para superar as adversidades, além de inserir Sanjuro finalmente com outros samurais a todo momento.
Ou seja, no viusal, Sanjuro é uma obra bastante repetitiva, infelizmente, além de tediosa, apesar de vez ou outra Kurosawa nos apresentar boas sequências de ação bem coreografadas exibindo todo o talento de espadachim do anti-herói. Até mesmo a trilha musical, tão estilizada e potente de outrora, é diluída para fazer o filme ter uma atmosfera mais séria e dramática. É uma reviravolta de estilo muito radical para uma franquia que já havia nascido icônica.
Mesmo restringindo bastante o visual com os enquadramentos fechados de planos conjuntos, há momentos que Kurosawa se rende para inserir elementos poéticos bastante criativos como o intenso uso de um riacho como peça vital na narrativa e das pétalas de belas camélias, tonificando essa mudança de ares que Sanjuro experimenta em sua jornada, se tornando mais pacífico.
O Herói que não estava lá
Kurosawa simplesmente trai as características iniciais de seu personagem ao fazer um trabalho muito mais brando em Sanjuro com uma história pouco interessante. É óbvio que se deve levar em consideração que quem optar ver a este filme antes de Yojimbo, é bem capaz que goste da atmosfera distinta que o diretor apresente aqui, além de serem fisgados pelas características geniais do personagem em solucionar grandes problemas violentos. A história pode até mesmo funcionar melhor.
Porém, como se trata de uma óbvia continuação, Sanjuro infelizmente fica muito na sombra gigantesca de Yojimbo a ponto de se tornar uma obra fria, sem gosto e sem energia para retratar um samurai vagabundo que outrora era um perfeito anti-herói apaixonante.
Sanjuro (Tsubaki Sanjûrô, Japão – 1962)
Direção: Akira Kurosawa
Roteiro: Akira Kurosawa, Hideo Oguni, Ryûzô Kikushima
Elenco: Toshirô Mifune, Tatsuya Nakadai, Keiju Kobayashi, Takashi Shimura, Katamari Fujiwara, Yûzô Kayama
Gênero: Drama, Samurai
Duração: 95 minutos