Godzilla Minus One | Final Explicado

Spoilers severos de Godzilla Minus One e Shin Godzilla (2016) à frente!

‘O que mais precisa se entender sobre um filme de kaiju gigante?!’ – você deve estar se perguntando. Bom, como o final de 2023 agora foi presenteado com um filme tão bom como Godzilla Minus One que lembrou o que entretenimento bem feito de verdade pode ser, o próprio filme deixa umas arestas abertas que poderão (e com certeza vão) ser exploradas no futuro – afinal nenhum filme está a salvo de ter continuações caso o sucesso se prove de imediato, como vem sendo com o retorno do monstrão à sua versão nipônica aterradora!

Ironicamente essas arestas em aberto ficaram justamente na que é a parte mais abrupta e talvez ‘fraca’ do filme em si que é seu final, quando temos o tão aguardado reencontro do nosso herói Koichi (Ryunosuke Kamiki) com sua amada Noriko (Minami Hamabe) ao descobrir que ela está viva e sobreviveu à explosão causada pelo sopro atômico do Godzilla no meio do filme. Quase que como um presente divino pelo sacrifício e sua alcançada redenção e paz interior, o final é lindamente recompensador, mas com uma pequena triste alusão deixada em seus últimos segundos que revelam a jovem infectada por um vírus misterioso depois de ser atingido pela explosão de radiação de Godzilla, fora, é claro, o último frame do filme sendo a cabeça explodida da criatura começando a se regenerar de volta à vida.

Radiação e Mutação

Tendo em vista de que o próprio Godzilla se criou por mutação da radiação deixada pelas bombas nucleares que atingiram o Japão. Tudo em volta dele se dá pela desculpa da ‘contaminação radioativa’ e os temores que ela revela: deterioração física, mutação corpórea, o humano se tornar inumano etc. Mas para entender um pouco do que Godzilla Minus One e o seu diretor / roteirista Takashi Yamazaki podem estar aludindo com esse final, devemos ir a outro filme do lagartão, Shin Godzilla (2016).

No filme de Hideaki Anno e Shinji Higuchi, o elemento de mutação desempenhou um papel ainda maior na formação do Godzilla. Em sua concepção original pelo filme de 1954 de Ishirô Honda, no qual Minus One se baseia fortemente, a fera surgiu como uma forma alegórica viva para os bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki. Que tal como o Gozilla em Minus One, o bichão era uma lenda popular na região de pescadores por onde ele perambulava no Pacífico. Um antigo tipo de dinossauro ainda vivo, que depois de ser atingido pelas explosões nucleares durante os testes da Operação Crossroad, ele sofre uma mutação para o lagarto nuclear gigante que todos conhecemos e amamos (e tememos).

Mas o que é assustador sobre a versão de Shin Godzilla é que ele possivelmente era apenas uma criatura do fundo do mar que se transformou neste demônio da natureza de aparência assustadora. Quando ele surge, passa de uma forma quadrúpede para bípede, constantemente evoluindo e ‘mutando’ para se ajustar aos perigos potenciais como um mecanismo de autodefesa, adaptando-se ao seu ambiente hostil por qual ele caminha e enquanto espalha destruição por onde caminha.

No filme, a equipe humana formada por cientistas e militares descobre que as placas e o sangue do bichão funcionam como um sistema de resfriamento, teorizando que eles poderiam usar um agente coagulante para congelá-lo. Depois de milhares de baixas, eles obtêm sucesso no plano. Mas o frame final do filme revela algo tenebroso na cauda do Godzilla: criaturas humanóides aparecem congeladas no processo de emergir, como pode ver abaixo:

Se pensarmos que o Godzilla é uma criatura assexuada que se reproduz sozinho, e está em constante evolução predatória de autodefesa, o seu pior inimigo eram os humanos. Formiguinhas que, como um pequeno enxame poderiam eventualmente tomá-lo, não importa-se quantos ele esmagasse no processo. Então seu próximo passo evolutivo após ter atingido sua forma máxima, seria claro reproduzir para se defender dessa ameaça, no que prometia ser um exército de mini-Godzillas humanóides instaurando um caos nível filme de zumbi misturado com ameaça Kaiju – e sim esse era o possível plano para um Shin Godzilla 2 que infelizmente nunca teremos…

Bom, sendo que tudo está vindo de dentro da casa de produções da Toho, não é exagero supor que Yamazaki esteja reciclando um conceito não usado para ser finalmente adaptado em um filme do Godzilla. Onde mesmo depois dele ter sofrido de uma descompressão rápida, que se você olhar para criaturas do fundo do mar sendo trazidas à superfície, isso basicamente derrete seu sistema  – sem falar de uma explosão no bocão; ele vai se regenerar e voltar com tudo no que talvez seja um Godzilla Minus Two.

E se você pensou que isso foi uma piadinha de tio do pavê, na verdade soa como verdade tendo em vista que ‘Minus One’ se refere ao nível menos um negativo que o país do Japão conseguiu se afundar em sua tragédia e terror após a guerra, agora com a vinda de um monstro que encapsula todos os seus piores temores. O seu retorno seria apenas uma evolução natural do caos por ele deixado. Assim como na sequência da queda das bombas nucleares, o que seguiu a devastação e a destruição foi o resultado de envenenamento por radiação.

Pode ser talvez isso que Noriko esteja carregando com ela, o que pode ser apenas uma última despedida agridoce do filme e do destino de seus personagens neste cenário do pós-guerra, onde não importa tudo o que recuperaram, as cicatrizes permanecerão com eles. Ou o filme está realmente aludindo ao que veremos em uma sequência com o retorno de Godzilla de uma forma ainda mais mortal e com proles, sendo que qualquer pessoa infectada por sua radiação pode sofrer mutação em outra coisa. Seja como for, seu terror está longe de acabar!