Depois de dirigir filmes como Seven: Os Sete Crimes Capitais e Clube da Luta, David Fincher resolveu abordar outro tipo de suspense dirigindo O Quarto do Pânico. Deixando de lado mistérios policiais ou a temática mais urbana e rasteira de filmes anteriores, o diretor se propôs a desenvolver um filme a partir de uma ideia bastante simples – ainda que potencialmente muito claustrofóbica – e funcional no que diz respeito a criar conflitos na história. Tudo isso contribui para um trabalho muito mais homogêneo do diretor, seja para o bem ou para o mal.
A trama do filme acompanha Meg Altman (vivida por Jodie Foster) e sua filha Sarah (interpretada por Kristen Stewart), que estão se mudando para uma nova casa depois do divórcio de Meg. Logo de início o tal quarto do pânico já é devidamente apresentado e tem todas as suas funções explicadas pelo corretor imobiliário. Todo o conflito gira em torno da primeira noite das duas na nova casa, em que três homens invadem o lugar em busca de uma fortuna deixada pelo antigo detentor do imóvel. Sem ter muitas opções, Meg e sua filha se escondem no quarto do pânico enquanto buscam alternativas para escapar dos invasores.
Apesar dos 15 anos que se transcorreram entre o lançamento do filme até os dias de hoje, impressiona a habilidade que Fincher já possuía naquela época em conduzir um suspense de maneira a não deixar o seu espectador fatigado. A maneira como o cineasta consegue fazer takes mais longos e pacientes – levando inevitavelmente a pessoa que está assistindo a ansiar por algum acontecimento imediato -, ou como o diretor insiste em entregar um olhar mais distante dos acontecimentos, de maneira que o espectador se sinta parte da cena contribui muito para a vitaliciedade de seu suspense. É evidente como David entende de ambientação, considerando que desde o primeiro momento em que apresenta o quarto do pânico titular ele já apresenta uma noção de claustrofobia – notada principalmente em Meg. Essa maneira como o cineasta faz com que a própria ambientação de seu filme participe da narrativa é magnífica e raramente efetuada com outros cineastas.
O elenco recheado também merece seus devidos destaques. Jodie Foster – que aceitou o papel apenas nove dias antes do início das filmagens por conta de um acidente que Nicole Kidman, a intérprete original de Meg, sofreu nos bastidores de Moulin Rouge: Amor em Vermelho – está excepcional no longa. A atriz consegue expressar inicialmente a imagem de uma mãe frágil, indefesa e cheia de problemas pessoais – isso com apenas poucos minutos de filme. E em seguida ela passa por uma transformação abrupta, tendo que exprimir a imagem de uma mulher forte, independente e que consegue perpassar qualquer situação. Kristen Stewart, que beirava seus 11 anos na época das filmagens, também tem seu mérito. Ainda que falte presença na atriz, ela consegue transmitir uma sensação de controle esperada da personagem.
Entretanto, o grande pecado do filme está em seu roteiro – assinado por David Koepp (Jurassic Park: O Parque dos Dinossauros). O texto apresenta diversas situações exponencialmente improváveis e fora da realidade, dissonando da ideia inicial do filme de manter-se pé no chão. Em uma cena, mais especificamente, um dos invasores leva uma marretada diretamente na face e cai do segundo andar para o primeiro, o que obviamente deixaria algum estrago aparente em qualquer um indubitavelmente. Entretanto, passam-se alguns segundos e o assaltante se levanta e se arrasta até o andar superior, sem nenhuma cicatriz no rosto além de uma marca insignificante de sangue – esse erro, aliás, também recai na conta de Fincher. O roteiro também apresenta demasiados clichês ridículos que chegam a subestimar a inteligência do espectador, como por exemplo a cena de Meg tentando encontrar seu celular que culmina com ela, convenientemente, esbarrando no criado-mudo e derrubando o abajur, alertando os invasores de sua presença. Ademais, o roteiro de Koepp é repleto de diálogos expositivos – claramente colocados ali para explicar alguma questão para o espectador -, que destoam completamente e danificam a construção narrativa do ponto de vista técnico. Parece haver uma necessidade constante de tentar exteriorizar os pensamentos de cada personagem, o que é totalmente dispensável.
15 anos depois de sua estreia nos cinemas, O Quarto do Pânico parece manter a mesma noção cinematográfica que deixou na época: um bom suspense claustrofóbico e agoniante, e acima de tudo, um bom suspense de David Fincher. Não é nem de longe um de seus melhores, mas tem seus méritos e a assinatura do cineasta é palpável de certa maneira. Além de ser um filme que adere na noção de conhecimento da filmografia de um gênio do cinema, o longa também vale a pena por suas atuações sobressalentes e o suspense “Fincheriano” intrínseco – ainda que conte a história de maneira chula.
Crítica de Mateus Santos
O Quarto do Pânico (Panic Room, EUA – 2002)
Direção: David Fincher
Roteiro: David Koepp
Elenco: Jodie Foster, Kristen Stewart, Jared Leto, Forest Whitaker
Gênero: Suspense
Duração: 113 min