Crítica | O Homem Elefante
Quando você faz o filme certo, recebe as oportunidades certas. Com David Lynch foi assim. Após experimentar ferrenhamente no surrealista Eraserhead, Lynch foi agraciado com sua primeira produção vinda de um estúdio hollywoodiano. No caso, a Paramount. Mas O Homem Elefante não é sua primeira obra-prima apenas porque Lynch é sim um gênio do Cinema, mas principalmente por causa de um nome muito conhecido, mas que você não fazia ideia de que estava envolvido com essa obra: Mel Brooks.
Brooks já estava de olho em Lynch desde a estreia de Eraserhead no circuito fechado em 1977. O produtor, diretor e ator consagrado pelas comédias que o alçaram ao estrelato é uma das peças principais na história da produção desse drama biográfico. Brooks foi o produtor executivo da obra, mesmo não assinando um bendito crédito do filme – na época, ele temia que as pessoas associassem o drama com uma comédia por conta do seu nome estar enraizado no gênero.
Não fosse por Brooks na produção de O homem Elefante, Lynch não teria sua primeira obra-prima. O produtor peitou os executivos da Paramount exaustivamente para conseguir garantir toda a liberdade que o diretor precisava, apenas concordando que dessa vez Lynch realmente precisava contar uma história com todos os pingos nos is. A junção do rei da comédia com Lynch que viria a ser um mestre surrealista rendeu nada menos que um dos melhores filmes da História do Cinema.
O Médico e o Monstro
Ao contrário do muitos possam imaginar – por se tratar de um filme de David Lynch, O Homem Elefante talvez seja a sua obra mais acessível pelo teor narrativo clássico. O roteiro de Lynch, Eric Bergren e Christopher De Vore adapta o livro de memórias do médico Frederick Treves, o responsável por encontrar o dito Homem Elefante, Joseph Merrick – no filme, o personagem é nomeado como John.
Acompanhamos Treves (interpretado por um ótimo Anthony Hopkins) se aventurando em um pequeno circo itinerante no século XIX. Lá, na área reservada às atrações chamadas Freaks (aberrações de circo), descobre um lugar que promete exibir o Homem Elefante. Tomado pela curiosidade, o médico negocia com o dono da criatura para conseguir vê-la. Firmando negócio, Treves adentra o calabouço e lá conhece a aberração. Fascinado pela criatura, pede para que o homem permita levar o monstro para o hospital central de Londres a fim de examiná-lo.
Pagando a quantia certa, Treves leva o Homem Elefante para descobrir a natureza dos males que afligem o ser. Porém, diagnosticando os tumores que deformam o rapaz, Treves acaba descobrindo que a criatura não é um animal imbecil completo, mas sim um homem chamado John Merrick dotado de plenas faculdades mentais. Logo, a relação torna-se mais complexa e uma amizade passa a florescer. É a chance de o Homem Elefante ser apenas um Homem, abandonando a vida decadente repleta de agressões físicas e psicológicas submetidas pelo seu “dono”. Uma chance de conhecer a alegria pela primeira vez na vida.
Basicamente, o texto de O Homem Elefante é baseado em contrastes para mostrar o melhor e o pior que a humanidade oferece no tratamento de excluídos e deformados. São diversas passagens que acompanham o desenvolvimento de John Merrick em voltar a ser humano, após ser tratado como lixo por tantos anos. Muito disso vem pelo domínio visual de David Lynch sobre sua encenação e da atuação espetacular de John Hurt sob quilos de maquiagens para encarnar o amedrontado deficiente.
Desse modo, temos três linhas de desenvolvimento competentes para as três pontas da narrativa. A primeira e a melhor, trabalha na jornada de John em descobrir a felicidade, mesmo que esta seja constantemente interrompida pelos abusos do porteiro noturno do hospital que explora e assedia o protagonista. Depois, há todo o conflito psicológico de Treves que não consegue se decidir se ele é um homem bom ou mal, pois também, em primeiro momento, explorou a condição bizarra de seu paciente para conquistar prestígio na comunidade médica.
E a terceira, a mais simples, mas não menos perturbadora, envolve a relação parasitária de Bytes, o homem que explorava a condição de Merrick anteriormente para lucrar. Como disse, por ser uma obra de estúdio, concessões foram feitas, mas creio que foram para o melhor. O roteiro de O Homem Elefante frisa esses paralelos entre Bytes e Treves explicitamente, além dos diálogos com Merrick expressarem os sentimentos do protagonista com clareza, seja sua felicidade ou desgraça. Não existem meias palavras, mas ainda assim, a obra não descamba para o brega em momento algum tal força possui a imagem.
Mas nisso também entra o mérito dos roteiristas e da direção de Lynch em saber como iniciar essa jornada. Até encararmos totalmente John, sem ele estar encoberto pelas sombras ou por objetos, leva um bom tempo, despertando uma curiosidade mórbida em todos os espectadores. Desse modo, Lynch realiza um bom experimento extra filme que raramente existe no cinema comercial. Ele transforma o espectador em um personagem da história, sem o menor julgamento. Podemos virar tanto os curiosos sádicos ou as pessoas que, posteriormente, vão até John para conhecer quem é o homem por trás da deformidade física.
Não posso falar por todos, mas acredito que a maioria dos espectadores se concentrem na esfera boa e otimista que o roteiro toca. Na cena mais bela do filme, na qual John visita a casa de Treves e conhece sua esposa, temos outra experimentação que transpõe o espaço fílmico. Curioso pelos retratos de crianças e familiares dos Treves, John mostra o pequeno retrato de sua mãe para Sra. Treves e diz que nunca entendeu como pôde nascer tão horrendo quando é filho de uma moça de face tão angelical. Revela seu desejo de conhecê-la para mostrar quem realmente é e ser amado como nunca foi. Nisso, sra. Treves desanda a chorar e, com quase toda a certeza do mundo, você também se emociona com a dor do personagem.
Um jogo claramente simples. E essa simplicidade é quem comanda O Homem Elefante. Pouco a pouco, a figura do monstro é desconstruída para erguer um verdadeiro homem com desejos (Lynch materializa essa construção do ser e viver através da maquete de St. Phillips), sonhos, frustrações, cultura e, principalmente, gentileza. Essa é uma das poucas características que não é explicitada em diálogos, sobre como John, um homem renegado pelo mundo, é capaz de ter um coração puro e abraçar cada oportunidade bondosa que surge. Por esses muitos contrastes, o personagem se torna muito complexo e afável. Nossa empatia nos força a celebrar cada vitória de John, assim como nos deixa aterrorizados pela ameaça e crueldade do mundo externo.
Aliás, outra boa característica do texto é exibir diversas classes sociais tendo contato com o protagonista. Vemos que independente de cultura e riqueza, homens e mulheres tem o potencial de infligir maldade e bondade em John. Mas Lynch não trabalha com ambiguidades aqui. Cada personagem é taxado de bom e mau logo de cara, seja pela intenção ou pelas atuações que não abrem margem de interpretação. Há certo tralho para mostrar Bytes como uma alma perturbada, mas as ações o definem como antagonista.
Um Gênio colocado à prova
Quem viu Eraserhead sabe que há sim alguma narrativa no meio de tanta experimentação de linguagem. Por isso, apostar que Lynch dominaria a arte da narrativa clássica logo em seu segundo filme seria uma jogada arriscada para muita gente – tanto que o estúdio procurou desesperadamente Terrence Malick para dirigir o projeto. Mas Lynch nunca foi um homem convencional e, aqui, contrariou todas as apostas contrários.
Não só sua direção aprimora e refina o roteiro, mas também consegue ter passagens totalmente surrealistas que se comunicam com clareza pelo espectador. A abertura do filme é um desses segmentos – Mel Brooks brigou feio para preservar as passagens surrealistas da obra. Nela, vemos uma mulher, a mãe de John, sendo atacada violentamente por elefantes (é possível inferir que ela tenha sido violentada pela tromba do animal). Seria a gênese do monstro, um híbrido entre homem e elefante. As fusões do rosto da mulher com dois elefantes deixam a ligação clara, além do horror dela com toda a situação.
De modo onírico, já é transmitido para o espectador que a mãe de John desistiu dele por sua deformidade. Ela mesma seria uma vilã da obra, ainda que romantizada pelo protagonista como um poço de virtudes. Mas isso é subjetivo e subvertido pela ponta oposta da obra, o segmento surrealista que fecha o filme. Nele, temos a mesma mulher com olhares carinhosos, consolando alguém enquanto determina que ninguém morrerá. As passagens dos dois sonhos podem muito bem representar a percepção de mundo que John tinha. No começo, tudo horrível, hostil e violento (as reações mais comuns de terceiros ao enxergarem John) para no fim virar algo transcendental, belo e de significância divina e misteriosa.
O surrealismo também marca o encantamento de John em sonho e realidade. No único sonho explicitado no texto, vemos um pesadelo no qual ele se olha no espelho e só enxerga um elefante. Nem mesmo em sua própria mente, há paz e conforto. Depois, o inverso – novamente, contraste. A breve passagem se dá na realidade quando John aprecia uma peça de teatro pela primeira vez na vida. As criaturas fantasiadas e pirotecnias se misturam em fusões com os olhares maravilhados do protagonista, ligando não somente um fascínio e paixão, mas também uma realidade alternativa na qual John não seria uma aberração de circo, mas um ator prestigiado.
O domínio imagético de Lynch não fica restrito apenas na sua zona de conforto surrealista. O Homem Elefante é uma obra completa em todos os sentidos. Lynch tem seus méritos partilhados com John Hurt e Christopher Tucker (criador da maquiagem). Mesmo debaixo de tantos prostéticos, Hurt consegue transmitir uma sensibilidade fascinante. Toda sua atuação é consistente, mantendo as dificuldades de caminhar e respirar em toda a obra. Porém, o mais fascinante não são esses detalhes, mas sim todo a evolução também transmitida na atuação de Hurt.
No começo, vemos o medo de John que sempre está curvado, olhando para baixo, sem falar, se fingindo de idiota. O conquistar da confiança e amizade entre Treves e John leva certo tempo e, pouco a pouco, Hurt volta a ficar humano, ereto, demonstrando emoções mais complexas. O ator deixa de fazer as vezes de um animal acuado e traumatizado para virar um poeta em movimento, com gestos elegantes e expressivos, mostrando um lado da psique do personagem que não é colocada em diálogos. No fundo, mesmo sabendo que é horrendo, John se sente belo como verdadeiro lorde britânico culto, educado e apreciador da hora do chá.
Sem dúvida alguma, é uma das atuações mais impactantes e humanas que podemos testemunhar no Cinema.
Poucos sabem, mas não somente David Lynch conferiu humanidade para o Homem Elefante. Ele também resgatou um dos melhores cinegrafistas do Cinema de volta para a atividade. Parado por duas décadas, Freddie Francis não fotografa absolutamente nada. Lynch tinha medo que Francis não desse conta do recado, mas era o nome favorito para a produção. Depois de receber um conselho honesto de um produtor – “ninguém se torna um vencedor sendo um bundão”, Lynch decidiu tirar Francis da aposentadoria (e realmente tirou, pois Francis só parou de trabalhar depois de voltar à ativa quando morreu).
A escolha de filmar em preto e branco foi outro perrengue que rendeu dor de cabeça a Mel Brooks com a Paramount. Mas as dificuldades foram superadas – depois de tudo isso, só tenho medo de imaginar como é entrar numa discussão com Brooks -, e o filme acabou finalizado em P&B.
Por conta disso, O Homem Elefante recebeu um dos looks mais interessantes de fotografia em P&B do cinema americano. A começar, a escolha era pertinente para retratar o período vitoriano da Londres do século XIX. Mas ao contrário das grandes obras monocromática da Era de Ouro, Francis e Lynch não glamourizaram o efeito. Aqui, ele é cru, sem filtros, vaselina ou meias de nylon para conferir ares angelicais. Todo o visual rudimentar se assemelha a observar uma fotografia muito antiga em movimento, com todas imperfeições deterioradas.
Ou seja, a foto consegue refletir diversas coisas, mas realmente se trata de uma representação depressiva do sofrimento do protagonista e da pobreza do espírito humano. Também pela fotografia e a abordagem com uma criatura estranha, os diretores flertam com a iluminação do expressionismo alemão. Em particular, mais voltada à visão de Fritz Lang em Metrópolis. Apesar não investir tanto em luzes tão duras, baixas e sombras cruas, vemos Lynch homenagear Lang nas sequências que separam os atos da narrativa.
Essas quebras acontecem sempre com imagens de arquivo, ainda mais deterioradas que a imagem do filme em si. Nelas, vemos fábricas, fornalhas e homens infelizes trabalhando em condições ainda rudimentares de anos pós-Revolução Industrial. A associação com o trabalho de Lang é imediata, mas as imagens conferem complexidade para os verdadeiros monstros que infernizam a vida de John. Através dessas imagens, Lynch mostra uma vida tão miserável e vazia que a única forma daqueles homens se sentirem mais poderosos ou felizes é causar a miséria alheia em um monstro inofensivo. Toda a síndrome de exploração e pequeno poder é sintetizada no personagem do porteiro que apenas é outro covarde.
Assim, Lynch mostra que a miséria do Homem e tão profunda que três pessoas perfeitamente normais se aproveitaram, em algum momento, para benefício próprio, de um deficiente. Em termos de linguagem, Lynch mantém pleno domínio na sua decupagem preocupada, após revelar o rosto de John, em preservar muitos close-ups valorizando a maquiagem, a narrativa e os atores.
O motivo dessa predominância é bastante belo, também conversando com um ponto do texto que é primordial para o personagem: os retratos. Desse modo, com John colecionando retratos de seus diversos amigos, Lynch também coleciona retratos valiosos do elenco. Um dos frames, inclusive, guarda o sonho mais íntimo do protagonista: dormir como uma pessoa normal – ele dorme sentado porque poderia se asfixiar durante o sono por conta da deformidade caso dormisse deitado.
Já em termos de movimentação de câmera, o diretor não arrisca por dois bons motivos: a história se trata de um drama estacionário deprimente e Lynch visa simular o visual de filmes pertencentes a uma fase marcada pela imobilidade da câmera. Logo, todo a postura da câmera, mesmo bastante descritiva, é íntima ao máximo com o assunto. Assim como Treves e nós, ela se torna confidente de John aos poucos. Tanto que quando o personagem cai em desgraça pela segunda vez, toda a postura é subvertida. Os pontos de vista tornam-se reclusos e solitários, quase nunca se aproximando de John. É como se o próprio instrumento cinematográfico se horrorizasse com a crueldade praticada, observando tudo de longe, com a maior frieza possível.
O Pecado Original
Mesmo sendo uma das obras mais valiosas do cinema americano, é consideravelmente difícil assistir a O Homem Elefante. É um filme que leva tão a sério seus contrastes que se torna uma obra belíssima, mas profundamente triste e depressiva. Lynch vai a fundo para mostrar o quão profundo é o poço da decadência do desejo humano. Mas também mostra o quão elevado pode ser o espírito de uma alma tão sofrida como a de John.
No fim, essa obra-prima de David Lynch é também uma bela alegoria do Pecado Original. Isso é mostrado em tela, inclusive, logo no começo do filme com Treves adentrando o circo itinerante. Vemos na profundidade de campo os dizeres The Fruit of the Original Sin com uma maçã mordida e um bebê deformado preservados em um tonel de formol.
No decorrer do filme inteiro observamos justamente as consequências da desobediência ao sagrado: a imperfeição humana – figurativa nos coadjuvantes desprezíveis e literal no físico do bom homem John, do sofrimento humano – em praticamente todos os personagens, e da existência do mal profundamente enraizada no Homem. Ao fim, observamos uma criatura dita como profana e tosca tornar-se imaculada pela sua bondade que ajuda a edificar a bondade e evitar a tentação nos poucos homens bons.
O Homem Elefante (The Elephant Man, EUA – 1980)
Direção: David Lynch
Roteiro: David Lynch, Christopher De Vore, Eric Bergen, Frederick Treves, Ashley Montagu
Elenco: Anthony Hopkins, John Hurt, Anne Bancroft, John Gielgud, Wendy Hiller, Freddie Jones, Dexter Fletcher, Hannah Gordon
Gênero: Drama Biográfico
Duração: 120 min
Crítica | Baywatch: S.O.S. Malibu
Apesar de uma audiência massiva que a sustentou por 11 temporadas, Baywatch ou S.O.S Malibu como a série é conhecida no Brasil, não era uma pérola de narrativa, atuação ou valor de produção. Entretanto, pelo carisma de David Hasselhoff, Pamela Anderson e outras inúmeras beldades que passaram no icônico slow motion que definia o seriado, salvaram a produção a ponto de entrar no imaginário coletivo. Querendo ou não, Baywatch tornou-se parte intrínseca do imaginário americano.
Essa nova onda vinda com Anjos da Lei, diversos estúdios decidiram “redescobrir” seriados antigos e moldá-los para um novo formato nos cinemas. No caso de Anjos da Lei, a aposta foi mais que certeira rendendo dois excelentes filmes. Porém, outras empresas já morreram na praia ao ressuscitar obras que deveriam permanecer no passado. Isso aconteceu com O Cavaleiro Solitário e, recentemente, com CHIPS – filme que nem chegou a estrear por aqui. Agora é a vez de Baywatch ser presenteado com uma porcaria de primeira linha.
A tempestade perfeita
A narrativa de Baywatch é pífia. Tão rasa que frequentemente e literalmente, tudo pausa, para termos uma tentativa cômica frustrada por alguns bons minutos. Aqui, acompanhamos as seletivas para novos trainees na equipe lendária do Baywatch, os salva-vidas de Emerald Bay. O viciado e apaixonado pelo ofício, Mitch Buchannon, abre três vagas para novos integrantes. No teste, passam apenas o ex-medalhista olímpico problemático e bad boy Matt Brody, o gorducho nerd Ronnie e a crânio sabichona Summer Quinn (a qual vira interesse romântico de Brody).
Os três novos recrutas vão auxiliar uma investigação secreta de Buchannon sobre uma suspeita de tráfico de drogas que está degradando o paraíso litorâneo da Flórida. E é isso. Acredite que até o filme entrar nesse núcleo destinado à investigação custa uma eternidade, ao menos 40 minutos. Esses problemas de ritmo e sequenciamento narrativo não são os únicos problemas desse “roteiro”.
Os preceitos mais básicos de narrativa são jogados no lixo pelos roteiristas de Baywatch que mais se comporta como uma coletânea de esquetes cômicos esdrúxulos amontoados numa tigela decadente de história – para encaixar as “frenéticas” cenas de ação e um clímax ridículo. Não há qualquer cuidado em amarrar essa investigação, pois muita coisa é presumida pelos personagens que agem apenas na base do palpite. A ligação de um evento para guia-los até a vilã pode facilmente ser considerada risível pela enorme preguiça em construir algo minimamente coerente.
Enquanto não chegamos nessa investigação que rende as melhores cenas do filme, somos obrigados a aguentar uma rixa interna em um conflito forçado entre Buchannon e Brody. Sobre todos os personagens, já aviso que o espectador não encontrará nada além dos estereótipos mais básicos.
Brody é o único que tem alguma relevância e motivação externa para entrar na equipe de Baywatch – não dá para dizer que a motivação de Ronnie em pegar a personagem CJ seja lá muito criativa. Brody é ex-medalhista olímpico que caiu em desgraça após um evento brega nas Olimpíadas do Rio de Janeiro. Essa crise existencial do personagem é interessante, mas os roteiristas insistem em apenas adicionar camadas desprezíveis para um anti-herói que já é bastante difícil de sentir empatia. É como se Zac Efron encarnasse o mesmo personagem de Vizinhos, só que em uma versão ainda mais burra, estúpida e egoísta. Ao menos, pela sua atuação, há bons contrastes de seu choque e despreparo em notar que a profissão de salva-vidas é algo bastante sério – a sequência que dá origem a essa reação é ridiculamente ruim.
Outro foco sobre seu desenvolvimento é a tentativa de uma jornada do herói básica e bastante deteriorada. Todo o conflito que move a relação entre Buchannon e Brody é sobre a inaptidão do coadjuvante em conseguir trabalhar em grupo. Sobre não saber fazer parte de um time e todas essas coisas que você já viu oitocentos filmes antes desse. Bom, a novidade é que não tem nada de novo. Esse conflito consegue sim, porém, humanizar um pouco o personagem e ao menos confere um nítido desenvolvimento nessa bagunça. Logo, o personagem mais imbecil é também o mais bem escrito (uma das muitas ironias involuntárias dessa pérola). Aliás, há um mistério sobre o passado de Brody que nunca é revelado, mas é apontado diversas vezes ao ponto de se tornar um furo, já que se trata da motivação de Brody em entrar no Baywatch.
Infelizmente, o restante do elenco também sofre na mão dos roteiristas. Nunca tinha visto um rol de personagens femininas tão inúteis como vemos aqui. Até mesmo a inteligente e determinada Summer é esquecida rapidamente só retornando para concluir a tensão sexual furada que forçam com Brody – as piadas recorrentes aqui focam nos peitos da atriz Alexandra Daddario (inclusive, a primeira delas é extremamente deslocada da cena). Depois temos Stephanie e CJ Parker (outrora papel de Pamela Anderson, aqui encarnada por Kelly Rohrbach), personagens que os roteiristas realmente não têm a menor ideia do que fazer com elas, pois elas nem mesmo conseguem virar alvo de piadas ruins. No fim, servem como par amoroso dos outros dois personagens masculinos.
Já o outro personagem, Ronnie, ganha alguma função no final do filme, explorando o lado tecnológico e nerd. Mas, em maioria, os roteiristas insistem em piadas envolvendo pintos e outros recursos que apostam em demasia na performance medíocre de Jon Bass (o ator mais parece uma versão nova bizarra de Danny McBride). Na verdade, esse talvez seja o cerne dos problemas de Baywatch: seu elenco. Não temos humoristas trabalhando aqui e o timing pessoal deles é péssimo para emplacar até mesmo as piadas mais elaboradas – como a de Buchannon chamar Brody com diversos apelidos (a piada envelhece rápido).
Já no lado antagonista, temos a vilã Victoria Leeds, tão mal escrita quanto o restante da obra. Seu plano maléfico não tem a menor justificativa plausível, além de ficar, gradativamente, cheios de furos tampados com informações vomitadas em exposição xucra. O modo de operação da vilã se torna burro demais principalmente pelo fato de matar seus oponentes do modo mais estúpido possível dando brechas para qualquer investigador amador ver que os acidentes montados por ela são mesmo assassinatos.
A caricatura péssima da Priyanka Chopra também não ajuda a conferir nenhuma camada para a personagem. Chopra assume uma pompa incoerente com tudo, sempre posando de sabichona, vestida para matar, sem o menor resquício de sutileza e preparada enquanto a personagem cai nos truques e roteirismos mais forçados do gênero. As conveniências e facilidades para o grupo de Buchannon entrar em colisão com a vilã são tantos que extrapolam o limite do bom senso de qualquer espectador.
Nesse roteiro cheio de piadas sobre pintos, peitos, vômitos e referências torpes, com uma infinidade de personagens irritantes e inúteis (destaque especial para o pior policial de todos os tempos), uma vilã bizarra que não sabe em qual filme pertence e uma história que se estende mais do que o necessário com reviravoltas que conseguem ofender a sua inteligência, tudo se resume a um festival de vergonha alheia de duas horas. Não existe carisma de Dwayne Johnson que salve esse filme.
Afogando Gordon
De longe, esse é o pior trabalho de Seth Gordon que já havia dirigido obras consideravelmente engraçadas (pelo menos em algumas partes) como Quero Matar Meu Chefe e Uma Ladra Sem Limites. Em ambos trabalhos anteriores, Gordon sabia manter tom e consistência ao longo de toda a obra, sem tentar almejar mais do que o texto propunha.
Claramente esse não é o caso aqui em Baywatch. Isso é bastante nítido logo no começo da obra, em seus créditos iniciais. Vemos belas imagens de Emerald Bay até um desafortunado banhista espancar sua cara nas rochas costeiras. Rapidamente então, em contra plongée e na contraluz, vemos Dwayne Johson correr em câmera lenta para salvar o dia ao se atirar no mar! Carregando o homem ferido nos braços, vemos o título em letras garrafais explodir ao fundo embalado pela trilha musical cheia de graves eletrônicos. Claramente algo brega e cafona para não ser levado a sério. Pensei então que veria uma boa paródia ao decorrer da obra.
Mas isso não acontece, pois Gordon nunca decide qual bendito tom ele assumirá no restante da obra. Portanto, temos um ora um filme policial, ora um melodrama, ora uma comédia pastiche, depois drama novamente e assim vai até o filme acabar. Essa inconsistência de tom é nitidamente exibida na confusão feita pelo elenco como na já mencionada péssima performance de Priyanka Chopra.
Em termos visuais, há sim cenas montadas com um descuido irritante, mas no geral, Gordon trabalha na gramática cinematográfica correta. Mesmo que não seja nada substancialmente bom ou inspirado, ao menos não chega a ser uma porcaria até nisso como no caso do também péssimo O Chamado 3. Na verdade, as belas vistas litorâneas potencializadas pela fotografia saturada salvam um pouco o sufoco que é aguentar a obra em sua totalidade.
Baywatch também tem um motivo ilustre para se orgulhar: entrará na lista de piores efeitos visuais já vistos em um blockbuster com toda a certeza. Caso tenha coragem de conferir essa bomba, terá o prazer de rir involuntariamente na cena de um resgate da equipe em um barco pegando fogo. Sem dúvida, em toda essa década, esse será o pior efeito simulando fogo, faíscas, fumaça e detritos de incêndios que você verá em uma obra hollywoodiana. É algo tão primário que parece ter saído das versões mais rudimentares do After Effects. Até as introduções flamejantes de Tela Quente colocam os efeitos visuais de Baywatch no lixo.
Esse festival de vergonha alheia é retomado no clímax com um show de fogos de artifícios “lutando” contra um péssimo helicóptero de CGI digna de um GTA de PlayStation 2. Além de aprovar algo tão ridículo a ponto de te tirar do filme, Gordon não consegue realizar sequer uma boa sequência de ação. Há tentativas de movimentos de câmera interessantes como um que acompanha Brody saltando de uma moto para salvar uma mulher que está afogando.
Nota-se, então, que houve, em algum momento, o mínimo de interesse de Gordon pela obra, mas assim como o público, o interesse foi embora no fim do primeiro ato.
Nem o campo sonoro se salva. O uso histérico da trilha original e das canções licenciadas em absolutamente todas as cenas de ação também é um equívoco de Gordon. Se ele já usa excessivamente a montagem e a encenação equivalentes de propagandas sedução-fascínio e videoclipes latinos, as músicas só colaboram em tornar sua visão sobre a obra ainda mais enlatada. A condução delas também se faz presente para prejudicar o filme ao evidenciar muito mais as já mencionadas mudanças tonais bipolares.
Bayflop
Baywatch: S.O.S. Malibu é uma das comédias mais falhas e inexpressivas que já tive a tristeza de ver. Com ao menos 5% das piadas conseguindo tirar um sorriso falso do meu rosto, fica absolutamente impossível apontar que esse filme tenha o dom da boa comédia (sei que a graça é um conceito abstrato – pode ser que você se divirta, mesmo que eu ache improvável). Por uma infinidade de motivos, Baywatch consegue tirar a paciência de quem assiste.
A proposta de bom divertimento é subvertida a tal ponto que a poltrona do cinema vira uma cadeira iron maiden já que o filme parece interminável em suas duas horas – até Silêncio, com três, passa mais rápido do que a sensação provocada pela montagem rudimentar do filme “bronzeado”. Entretanto, Baywatch não é o pior filme desse ano – esse trono ainda está reservado para outra obra já mencionada no texto. Mas, acredite, esse filme se esforça ao máximo para conseguir o lugar mais alto do pódio.
Baywatch: S.O.S Malibu (Baywatch, EUA – 2017)
Direção: Seth Gordon
Roteiro: Jay Scherik, David Ronn, Thomas Lennon, Robert Ben Garant, Mark Swift, Damian Shannon
Elenco: Dwayne Johnson, Zac Efron, Priyanka Chopra, Alexandra Daddario, Kelly Rohrbach, Ilfenesh Hadera, Jon Bass, Rob Huebel, David Hasselhoff, Pamela Anderson
Gênero: “Comédia”, Ação
Duração: 116 min.
Artigo | Um Gênio do Sistema: A História dos Filmes de Monstros da Universal
O Gênio da Universal
História, por si mesma, é fascinante. Não digo apenas das que pertencem à ficção – essas, reservamos um espaço mais que especial para preservá-las e apreciá-las, mas falo da nossa própria história (ainda bastante desconhecida). Entretanto, dentro de todos os horrores testemunhados no século XX, talvez a lufada mais bela e apaixonante seja a consolidação da indústria cinematográfica, do cinema como linguagem, do Cinema como arte.
Quase todos os estúdios possuem grandes histórias de fundação, crescimento e estabelecimento no mercado que despertam o interesse até do mais apático leitor. Dentre todos, nos anos 1930, a era de ouro dos estúdios hollywoodianos, a Universal se destaca por uma junção de fatores absolutos que a salvariam da Grande Depressão de 1929. Esse fator máximo tem nome: Carl Laemmle Jr., um dos gênios do sistema.
A Universal, desde sua fundação em 1912, era considera uma minor major. Ou seja, uma das menores companhias quando comparada aos titãs consolidados rapidamente como a Warner, United Artists, RKO, MGM, 20th Century Fox e Paramount. Assim como a grande maioria dos outros estúdios, a Universal controlava sua produção em três pontas: tinha a produção, distribuição e também a exibição – todos os estúdios perderiam as cadeias exibidoras após o processo da Lei Antitruste americana (uma boa história para outro artigo).
Em sua história, além de receber os louros da fundação e estabelecimento bem-sucedido do estúdio, Carl Laemmle Sr. merece elogios por sua visão de mercado. Enquanto as outras sete majors se esforçavam ao máximo em suprir as demandas do mercado interno com grandes metrópoles como Nova Iorque, Laemmle Sr. já olhava com bons olhos para o mercado europeu e suas fascinantes histórias fantásticas de horror. O movimento iniciado por Robert Wiene em O Gabinete do Dr. Caligari em 1920 já provava que o Cinema era um dos maiores popularizadores de arte da História.
O que antes era considerado cult e para poucos apreciadores, o horror expressionista alemão popularizou-se de modo nunca antes visto. E quando há muito burburinho, há dinheiro. E quando há dinheiro, existem produtores hollywoodianos atrás de novos talentos. A importação de nomes europeus para Hollywood marcou toda a década de 1920, assim como o início de 1930.
Entretanto, Carl Laemmle Sr. já sentia o peso da idade e já era podre de rico. Cansado de tanta correria e guerra de egos, Laemmle, em um movimento surpreendente, dá o cargo de presidente dos estúdios Universal para seu filho, Carl Laemmle Jr, como presente de aniversário de 21 anos em 1928.
Assim como aconteceria hoje, aconteceu em 1928. As más línguas já detonavam Laemmle Jr. como o queridinho do papai, o tachando de incompetente, além do consenso geral ser que o magnata-pai continuaria a controlar tudo em seu escritório em Nova Iorque... Porém, o destino tem suas maravilhosas surpresas para silenciar invejosos. Laemmle Sr. de fato deixou seu filho fazer o que quisesse com o estúdio. E o que Jr. fez, na verdade, era uma obra de um gênio. Um gênio do sistema.
Carl Laemmle Jr.
Nasce Uma Estrela
Em 1928, ninguém poderia prever a hecatombe financeira que atingiria a bolsa de Nova Iorque – bom, em parte, mas isso não cabe nesse artigo. Mas, em um movimento bastante esperto, Laemmle Jr. salvou muitos milhões de dólares da Universal em seu primeiro ordenamento no estúdio: vender a grande maioria das salas exibidoras precárias e ainda não atualizadas com sistemas de som. Preservando e reformando apenas os seus movie palaces, Laemmle Jr. cresceu o caixa da companhia em milhões o que permitiria uma reformulação significativa do ordenamento de produção da Universal.
No final desse ano, Laemmle Jr. encomenda as duas produções que seriam os marcos do estúdio por eras: o musical Broadway e o épico de guerra Sem Novidade no Front. Com orçamentos que flertavam com o milhão (valor altíssimo para uma produção Universal), Laemmle Jr. teve a satisfação de ver muito sucesso de público e crítica, além de faturar o primeiro Oscar do estúdio pela recém-aberta Academia Cinematográfica – esse seria o terceiro Oscar de Melhor Filme da história da premiação.
Broadway saiu em 1929 enquanto Sem Novidade no Front estrearia em 1930, já com muita gente perdendo as esperanças de uma melhora significativa na economia. Mesmo com esses sucessos, Leammle Jr. sentiu a Grande Depressão bater à porta da Universal. No entanto, no biênio de 29-30, a Universal não chegou a perder mais do que três milhões em prejuízo enquanto as outras sete majors acumulavam déficits de 60 milhões de dólares em conjunto. Só a Warner veria seus lucros sendo assassinados por 20 milhões em prejuízo.
Mas é justamente em tempos sombrios e de grandes dificuldades que garotos viram homens. Carl Laemmle Jr. virou sim, um grande homem.
Bela Lugosi como Drácula.
Onde os Fracos Não Têm Vez
Sem medo de represálias, Laemmle tinha um nome a prezar: o de sua família. Não queria ver o legado de seu pai indo pelo ralo por conta de uma necessidade de autoafirmação em continuar investindo em fitas de grande custo, repletas de audácia. Ele já tinha emplacado dois sucessos e ganhado alguns Oscar somente em seus primeiros anos. Era hora de cortar o mal pela raiz.
E assim foi. O jovem produtor decidiu que o ano fiscal de 1930-31 não superaria o investimento de 7,4 milhões de dólares destinados para novas produções e marketing. As 34 novas produções já estavam definidas e Drácula de Tod Browning já era uma delas. O produtor não era nenhum idiota e já estudava muito bem as relações de seu pai com o mercado europeu. Também se lembrava dos sucessos que o estúdio havia emplacado com o astro Lon Chaney em 1924 e 1926 com O Corcunda de Notre-Dame e O Fantasma da Ópera.
O baixo custo de filmes de horror e o alto retorno que eles proporcionaram nos experimentos do estúdio nos anos 1920 inspiraram Laemmle Jr. a apostar nessas produções para superar a crise financeira. A figura de Lon Chaney era igualmente respeitada tanto que já era o escolhido para interpretar o famoso vampiro na nova produção, porém, todos foram pegos de surpresa com sua morte precoce após o diagnóstico de um câncer na faringe.
Um evento péssimo para Laemmle Jr. que conseguiu segurar as pontas de um diretor abalado – Tod Browning e Lon Chaney eram carne e unha, um dos casos mais célebres de simbiose ator/diretor. Nisso, surge a figura de Bela Lugosi que já participara em outros filmes em papeis secundários. A escolha do casting fora absolutamente perfeita tanto que hoje é inconcebível não imaginar Drácula senão a versão estupenda apresentada por Lugosi e o seu famoso Eu sou Drácula!
Lugosi e Browning conversando no set de O Drácula.
A obra ditaria ferrenhamente a estética de todos os filmes de monstro que estúdio viria a trazer em toda a década de 1930. E essa estética tinha nome e endereço: o diretor de fotografia Karl Freund que viria a dirigir A Múmia com Boris Karloff em 1933. Freund era uma das conquistas de Laemmle Jr. que o havia chamado para desenhar toda a iluminação de Sem Novidade no Front – o jovem produtor já admirava o cinegrafista em seus trabalhos sensacionais em Metrópolis, clássico expressionista alemão de Fritz Lang. Quem pesara no recrutamento de Freund seria Paul Leni, outro alemão diretor de arte que o pai do jovem produtor já tinha chamado para trabalhar em diversos clássicos silenciosos da Universal.
Freund então incorporou toda a estética expressionista de iluminação baixa e contrastes fortes que Laemmle Jr. tanto requisitara para potencializar todas as cenas de horror. E a história foi feita em 1931, na estreia de Drácula que conquistou os pesadelos do público que procurava assombrações de ordem sobrenaturais, pois as da realidade já estavam virando passado. Por sinal, uma curiosidade. Anos antes, a Paramount especulara fazer seu próprio Drácula para o mercado americano, mas a maioria dos diretores votou pela desistência do projeto taxando de “maluquice de europeu”... Se arrependimento matasse, a diretoria inteira da Paramount estaria à sete palmos naquela época.
Somente para provar seu forte faro empreendedor, Laemmle Jr. já orquestrava, por baixo dos panos, a adaptação de Frankenstein de Mary Shelley paralelamente a Drácula. Dessa vez ele não cometeria o erro de matar a criatura no final sem poder aproveitar quaisquer potenciais de novas sequências. Porém, já com Drácula nos cinemas, Bela Lugosi sabia que tinha o poder da negociação (o que se provou um erro para ele depois).
Laemmle queria muito que Lugosi fosse a criatura de Frankenstein, mas o ator recusava pois estaria encoberto de maquiagem, o deixando irreconhecível para o público. Sem muita paciência para esse ego, Laemmle resolveu testar Boris Karloff, um gigantão com semblante melancólico juvenil que já participara de uma centena de filmes como figurante e coadjuvante durante a administração de seu pai. Aprovando o que tinha sido apresentado, Laemmle deu a chance do estrelato tardio para Karloff que já tinha lá seus 40 anos de idade.
James Whale observa o cenário de Frankenstein.
ESTÁ VIVO!
A produção de Frankenstein não teria somente dor de cabeça com Bela Lugosi e suas frescuras. O diretor original do projeto, o veterano Robert Florey, seria descartado por Laemmle Jr. por conta da total inexperiência do diretor com os talkies, filmes falados. Quem já chamava sua atenção por um bom tempo era James Whale, um britânico metido a brincalhão que criava movimentos de câmera mais que espetaculares nos filmes de Howard Hughes como Anjos do Inferno.
Ao contrário de muitos produtores, Laemmle Jr. sabia o momento de ceder. E foi assim que conseguiu Whale para dirigir Frankenstein, um projeto de escolha do próprio Whale, após ter que engolir as filmagens de um filme chamado A Ponte de Waterloo do qual ele tinha zero vontade de fazer.
Frankenstein foi uma produção abençoada depois desses entraves. Whale pode utilizar a cidadezinha construída para Sem Novidade.., além de contar com os nomes de Karl Freund na foto e o gênio maquiador Jack Pierce para criar a icônica maquiagem do monstro em Karloff que acabou ganhando mais 45 centímetro de altura.
Enquanto Frankenstein era aprovado na sala de montagem e já partia para a exibição nos cinemas também se tornando um tremendo sucesso de bilheteria ainda mais elogiado que O Drácula, Laemmle Jr. já voltava seus olhos para 1932 no qual programara lançamentos como O Assassinato na Rua Morgue, A Casa Sinistra também com James Whale e Boris Karloff e A Múmia, com direção de Karl Freund e Boris Karloff encarnando o monstro egípcio.
Boris Karloff recebendo a maquiagem icônica do personagem.
O terror estava impregnado na Universal tornando-se o gênero mais respeitado por Laemmle Jr. que, embora não trouxesse os louros das premiações, trazia coisas melhores como dinheiro e expansão de negócios. E mesmo assim, em 1932, com tantos filmes bem-sucedidos, o produtor ainda teve que engolir seu orgulho materializado com os carésimos Broadway e Sem Novidade. A Universal fechava seu terceiro ano em prejuízo: 1,7 milhões de dólares.
Embora o cenário da Universal permanecesse favorável, era inevitável que a concorrência mexeria seu planejamento para surfar na onda assombrada de Laemmle Jr. A MGM preparava A Máscara de Fu Manchu e Monstros, outro clássico de Tod Browning; a Paramount adaptaria O Médico e o Monstro e a Warner faria Dr. X.
Vendo o filão da concorrência, Laemmle teve motivo para rir à toa. Já tinha comprado os direitos das maiores histórias de horror e já planejava um futuro brilhante para sua franquia de sucesso. Em 1933, o produtor, James Whale e John Fulton, técnico de efeitos especiais, conseguiriam surpreender o mundo com O Homem Invisível, lançamento de horror solitário naquele ano.
Novamente, nesse período, Laemmle Jr. mostrava ser mais do que um produtor sensato, mas um homem genuíno dos negócios. Ele sabia que a fonte estava longe de secar, mas preferiu resguardar seu poder de fogo, lançando poucas obras de terror em 1933-34. Era hora da Universal apostar em filmes femininos e dar mais atenção aos musicais sempre rentáveis. De certa forma, eram mais baratos de fazer, pois se tratavam de obras “formulaicas” com pouco custo de roteiro e produção. Na base do tapa buraco de sete rolos, a Universal conseguiu lucrar em 1934 com 300 mil dólares – sim, as outras majors ainda estavam tomando uma surra financeira.
Vendo o cenário melhorar, decidiu que era hora de assustar sua plateia mais uma vez com James Whale em A Noiva de Frankenstein, programado para estrear em 1935. Uma ideia tão boa não tinha saído da cabeça de Laemmle Jr., porém, que apenas planejava um bom filme de retorno da criatura. Foi a chegada de James Whale que fez tudo ser reescrito do zero por um bom motivo: o diretor havia decidido que esse seria seu grandiosíssimo final. Depois dessa obra, ele nunca mais revisitaria o gênero.
Whale tinha experimentado novas liberdades criativas enraizando seu humor negro em A Casa Sinistra e O Homem Invisível. Com A Noiva de Frankenstein, a coisa não seria diferente. O humor camp kitsch dessa vez viria com a performance sensacional de Elsa Lanchester que daria vida para a noiva-título em si, uma morta-viva cheia de carisma que estava longe de querer amar o monstrengo interpretado novamente por Boris Karloff.
Porém, mesmo feliz por trabalhar na sequência, Whale já estava se cansando do gênero. 4 anos haviam se passado e ele só vinha fazendo filme de terror. O diretor queria mais, queria uma nova oportunidade para mostrar seu talento.
Paralelamente a A Noiva de Frankenstein, Laemmle Jr. preparava novamente outro blockbuster star driven com Claudette Colvert chamado Imitação da Vida, dirigido por John Stahl. O filme custou gordos 665 mil dólares, mas provou ser um risco certeiro, pois atingiu lucro na bilheteria e renderia um novo Oscar para a Universal após um hiato de 4 anos. Mas tudo que é bom demais para ser verdade, geralmente é mesmo.
Hora do chá de Elsa Lanchester em 1935, nas filmagens de A Noiva de Frankenstein.
O declínio de um gênio
Em 1935, após colecionar sucessos e encher os cofres da Universal de dinheiro, Laemmle Jr. tinha motivos para dar sorrisos que dariam a volta na lua. Reconhecendo que Stahl e Whale eram seus maiores nomes na direção e também por mostrar gratidão ao ótimo trabalho, Laemmle decidiu que era hora de apostar em filmes de primeira linha novamente, assim como tinha feito em 1930. Naquela altura, seria sensato pensar que a sorte e o sucesso não iriam acabar. Mas o que aconteceu foi o completo oposto.
Stahl foi designado para o melodrama milionário Sublime Obsessão e James Whale enfim receberia o presente dos deuses que tanto queria, sua chance de ouro. O britânico foi agraciado com a refilmagem mais ambiciosa da década: o musical Show Boat – Magnólia.
Nesse momento, pela primeiríssima vez, Laemmle Jr vacilou em suas escolhas que beiraram sim a insanidade. O ego falou mais alto ao permitir a produção de duas obras de primeira linha simultaneamente, além de permitir a loucura de tirar James Whale da linha de filmes de horror do estúdio. Com o nome forte de Whale ausente desses filmes, era questão de tempo até a franquia monstruosa degringolar. Além disso, Laemmle tinha decidido ele mesmo produzir Magnólia deixando o estúdio sem qualquer capitão durante esse período.
O provérbio é sempre verdadeiro: quando o gato sai, os ratos fazem a festa. E assim foi com a Universal que entrou em um abismo de erosão na gestão interna e de disciplina nas outras produções do estúdio. Justamente Sublime Obsessão marcou problemas intensos já que o produtor encarregado não tinha nenhum controle sobre Stahl que estava cheio de si após o sucesso do filme anterior.
As coisas começaram a dar errado muito rápido e a produção atrasou e encareceu – 25 dias e 200 mil dólares. Certamente um mal sinal que já devia trazer Laemmle Jr. de volta a realidade. Magnólia, apenas com seu elenco, custara 300 mil dólares. Só James Whale custou 90 mil para dirigir. Piorando o cenário, uma produção biográfica chamada o Czar de Ouro encontrava um problema atrás do outro envolvendo locações e o ator protagonista. O caixa da Universal estava quase entrando em colapso por conta de decisões imaturas de Laemmle Jr.
A situação estava caótica e, justamente nesse momento, Laemmle Sr. retorna à Universal City para entender o que raios estava acontecendo na gestão promissora de seu filho. Sem arredar de seu posicionamento, Jr. citou outro produtor-gênio, David Selznick: “Há dois tipos de mercadoria que podem ser produzidos com lucro nesse negócio, os filmes muitos baratos e os filmes muito caros.”. O detalhe que Jr. se esquecera de mencionar é que Selznick concentrava seu poder de fogo em um produto e um único mercado (ainda mais porque era produtor independente). Laemmle Jr. estava fazendo essa loucura com todos os produtos Universal para todos os segmentos do mercado.
Lon Chaney Jr. virando o lobisomem em O Lobisomem, 1941, um dos primeiros sucessos dos Monstros da Universal após a saída de Laemmle Jr e James Whale do estúdio.
Convencido pelo discurso do filho, Laemmle pai foi atrás de um empréstimo do diabo: pegou 750 mil dólares em um contrato no qual Cheever Cowdin, dono do empréstimo, poderia comprar todas as ações menores da Universal por 5,5 milhões de dólares, caso os Laemmle não pagassem a dívida em noventa dias.
Sublime Obsessão estrearia muito bem em dezembro de 1935, mas Magnólia continua em processo de produção em ritmo lento demais. O desastre O Czar do Ouro nem era mais considerado com qualquer potencial de lucro pela Universal e o filme de Whale estava consumindo sempre os rendimentos que Sublime Obsessão fazia na bilheteria. As coisas foram de mal à pior e noventa dias se passaram. Cowdin então comprou os 80% da companhia conforme o contrato e os Laemmle perderam a Universal. O novo presidente Robert Cochrane contratou Laemmle Sr. como chefe do conselho de diretores enquanto o garoto prodígio, Laemmle Jr. foi afastado indefinidamente. Sr. viria a morrer em 1939 e Jr. nunca mais seria visto em Hollywood.
Sob nova direção, a Universal conseguiu ver o último sucesso de Laemmle Jr e James Whale com Magnólia, porém os filmes de horror estavam fadados a um futuro incerto. A nova diretoria manteve as produções do gênero bastante ativas, mas a qualidade dos filmes entrou em queda livre em questão de pouco tempo na década de 1940. Porém, a nova gestão viu o potencial de fazer crossovers criando o primeiro universo compartilhado da História do Cinema com Frankenstein Encontra o Lobisomem em 1943 com o retorno de Boris Karloff e Lon Chaney Jr. reprisando seus icônicos personagens.
Porém, para tudo isso ver a luz do dia novamente, os novos responsáveis tiveram que suar muito para tirar a Universal da zona da falência. Felizmente, um anjo havia pousado em Universal City. E ela tinha nome: Deanna Durbin, a fofa atriz de musicais que, praticamente sozinha, salvou um estúdio inteiro.
Nesse glorioso e peculiar caso, a Bela não matou a Fera. Mas a salvou. Graças a Durbin, a Universal conseguiu manter seu cronograma cheios de monstros até 1960.
E essa é uma excelente história para outro dia.
Bibliografia: "O Gênio do Sistema", de Thomas Schatz.
Crítica | A Múmia (2017)
A Múmia é uma dádiva da Sétima Arte. Acredite, essa história incrível é original das telonas desde 1932 com a primeira incursão da criatura trazida pela Universal com Boris Karloff como a Múmia, dirigido por Karl Freund. Desde então, não somente o estúdio original preservou a marca com diversos filmes B, como a própria maldição da múmia conseguiu fundar seu próprio subgênero e uma legião de fãs.
Porém, desde 2008 que não tínhamos uma nova adaptação para essa lenda cinematográfica imortal. Com o advento de um novo universo compartilhado, dessa vez pelos monstros clássicos da Universal, A Múmia ressurge para cravar seu nome como a origem de uma nova franquia que consegue tirar os ares de mesmice que os blockbusters atuais insistem em tropeçar. Sim, pasmem, A Múmia é um filme nada menos que excelente.
A Nova Onda da Múmia
Nessa história inacreditavelmente escrita por seis pessoas, acompanhamos uma mistura de formatos para desenvolver a narrativa. Em grosso modo, acompanhamos as desventuras de Nick Morton, um soldado golpista que rouba artefatos arqueológicos para vender no mercado negro, que acaba libertando uma antiga maldição no deserto iraquiano que pode ameaçar toda a vida no mundo.
Como sempre afirmo, quanto menos gente melhor. E com o roteiro de A Múmia não é diferente. O principal problema desse filme, como um todo, é seu texto muito atropelado. O roteiro visa homenagear os clássicos de 1930 assim como a trilogia com Brendan Fraser ao iniciar o filme contando toda a breve história amaldiçoada de Ahmanet, única filha do Faraó que perde o direito ao trono após seu pai receber um novo herdeiro ao trono.
É a clássica história de maldição, mas com detalhes atualizados pelo fato dessa Múmia que dá o título do filme ser uma mulher – os diferentes clichês permitidos por isso são bem colocados na trama posteriormente. A enorme exposição inicial consegue transmitir as motivações da vilã preservando a verve dos clássicos. Ou seja, não espere por muita “humanização” complexa além da conta neste A Múmia. É um filme que tem a simples função de entreter.
Já o núcleo humano consegue se sustentar por conta de quebra de padrões. Em especial, com seu protagonista. Nick, interpretado com muito carisma por Tom Cruise em excelente timing, é mais um anti-herói do que um mocinho clássico. Ele não é predestinado a nada. É apenas um homem comum, desonesto e egoísta que tem o azar de se deparar com uma maldição de cinco mil anos. Justamente por ser tão raso, assim como a história, que os roteiristas caem em armadilhas escritas por eles mesmos.
Isso não demora nada a acontecer. Assim que a Múmia passa a movimentar a trama ativamente, a junção dos fatos constantemente se atropela em passagens repetitivas, com diálogos repetitivos e até mesmo imagens repetidas. Isso quase preenche o segundo e o terceiro ato inteiros que exibem reviravoltas consideravelmente previsíveis. Pior ainda é notar como os seis roteiristas parecem não saber juntar onde o trabalho de um termina para o outro começar. Praticamente todos os finais de sequência de perseguição ou luta contra a antagonista terminam através de um deus ex machina muitíssimo arbitrário.
Outra grande fraqueza do texto é a personagem arqueóloga Jenny Halsey. Enquanto ela serve de contraponto à moral insossa do protagonista, é ótima. O atrito romântico entre os dois funciona pelo contraste, assim como as muitas passagens cômicas que ocorrem no começo do segundo ato em Londres. Porém, as características originais da personagem se desfarelam por conta de reviravoltas menos previsíveis que acabam simplificando a moça. Para piorar, ela e Nick constantemente trocam de papéis nos quais eles intercalam a vez de quem vai salvar a vida de outro em determinada cena.
Em essência bruta, esses são os principais pontos negativos de A Múmia. Mas há bastante coisa a ser elogiada no texto problemático do filme. A jornada do protagonista é bastante interessante ao abordar um tipo diferente de transformação em herói. O filme inteiro aposta nessa dualidade da moral do personagem: ele é bom ou só um idiota completo? E para concretizar essa luta interna, Nick constantemente se vê entre a tentação da manipulação mental de Ahmanet enquanto se apaixona, gradualmente, por Jenny que sempre frisa o lado bom do personagem.
Essa característica da maldição é igualmente bem trabalhada, mas não enfatizada através do horror, mas sim por uma mistura de medo e comédia camp britânica. Isso é uma das características mais subjetivas da obra, ficando totalmente a critério do espectador gostar ou não. Para mim, funcionou muito bem.
A comédia de A Múmia é consideravelmente mais refinada para blockbusters do gênero sem recorrer a piadas esdruxulas escatológicas ou ofensivas. São situações diversas que a maldição propõe na narrativa brincando constantemente com pontos de vista e escuta o que rende bons momentos para a montagem trabalhar potencializando a gag. Desse modo, conseguem até mesmo salvar a figura do sidekick do protagonista, Vail, como alívio cômico.
A questão da dualidade também é representada pelo personagem de Russell Crowe que prefiro não revelar de quem se trata dentro da narrativa, pois tirará boa parte da surpresa. O personagem atua como o núcleo desse novo universo que o estúdio inaugura aqui com competência. São piscadelas que dão diversas dicas dos elementos que estão por vir, mas que, por si, funcionam dentro do contexto do filme jogando o protagonista no principal conflito na escolha entre luz e sombras. Ou seja, Nick é um dos pilares fundamentais dessa franquia.
Ainda sobre Tom Cruise e Crowe, é absolutamente necessário apontar o grande divertimento trazido pelas cenas que os dois contracenam. É uma química canastrona clássica absolutamente genial que entretêm muito mais do que o necessário. Nunca eu imaginaria ver esses dois caindo em uma briga bastante carismática - certamente um dos pontos mais altos da obra.
Mãos à Obra
A Múmia também traz uma grande peculiaridade fora do comum: a direção de Alex Kurtzman. Roteirista famoso na indústria, Kurtzman é basicamente um estreante no campo de direção e isso certamente é sentido nessa experiência. Não se trata de um trabalho ruim, mas muito inconsistente.
Kurtzman consegue preservar a vibe exótica da história seja na retratação da lenda mostrando deuses e reis sobre um império de areia e nada até os dias atuais no Iraque com a descoberta da tumba. Essa sequência é primorosa em oferecer uma estética geográfica bem apurada conseguindo contar detalhes intrincados sobre Ahmanet e sua história oferecidos através de muita exposição – os roteiristas utilizam esse recurso em exaustão.
Através de bons planos abertos e bem cronometrados, Kurtzman consegue valorizar a produção do longa de modo bastante satisfatório. Os problemas surgem na hora de mostrar a ação, pelo menos em primeiro momento. Inexperiente, o diretor coloca diversas câmeras em inúmeros pontos da ação para mostrá-la com diversos pontos de vista de diferentes. Isso só acaba poluindo a sequência com uma montagem frenética de tão absurda.
Porém, em algumas set pieces, o diretor mostra o oposto revelando um olhar talentoso. A mais interessante delas é a queda do avião tão mostrada pelos trailers do filme. Kurtzman gosta de mostrar a ação se desenrolando tanto em primeiro plano quanto na profundidade de campo muito bem utilizada. Vemos o chão se aproximando enquanto o veículo despenca das alturas, além de exibir as diversas acrobacias dos atores em gravidade zero. Outra sequência muito boa é a da tempestade gerada pela Múmia em Londres na qual Kurtzman consegue justificar com inteligência a origem de tanto pó e areia em plena cidade grande.
Aliás, essa transição entre o exótico para o Ocidente também é um ponto que merece elogios. Tanto pela simbologia do medo de maldições estrangeiras de países ora ligados ao místico quanto para o estabelecimento dos futuros filmes que vão se concentrar em monstros anglo-saxões.
Apesar de não trabalhar a imagem a um nível estético tão apurado, Kurtzman é ótimo para definir clima e atmosfera. Falo, obviamente, da apresentação de Ahmanet como Múmia na qual Sofia Boutella dá um show de expressão corporal criando algo frágil, decrépito e absolutamente aterrorizante. Aliás, é ótimo como o diretor frisa muito mais os poderes sobrenaturais da criatura nessa interpretação auxiliada por efeitos visuais razoáveis (disfarçados pela escuridão e névoa). Também acho muito interessante como o diretor flerta bastante com o videogame logo na apresentação de Nick que mais se assemelha, em primeiro momento, a um Nathan Drake, protagonista dos jogos Uncharted.
Com a inserção de, literalmente, uma legião de mortos vivos, a ação pode flertar sempre com piadas e verdadeiro horror. Aliás, Kurtzman sempre consegue equilibrar as coisas, sem um clima interferir com outro, tirando a tensão proporcionada na correria. O seu trabalho de câmera também não é muito elegante, mais parecendo uma extensão da força bruta de Tom Cruise.
Além disso, ainda sobre a montagem, o diretor peca por repetir planos de uma pedra em faíscas ou outras do deserto com Ahmanet durante as alucinações do personagem principal. São competentes para ligar uma coisa à outra, mas quando isso acontece quase quatro vezes, é porque tem algo de muito errado.
Universo de Deuses e Monstros
Acredito que eu não tenha deixado claro isso no texto por estar atento à análise do filme, mas A Múmia é uma fantástica obra de entretenimento e diversão. Desde Kong: A Ilha da Caveira que eu não tinha uma sessão tão divertida, viva e carismática como essa incursão da Múmia se provou ser. E quando temos algo tão bacana, tão autoconsciente de suas origens e que cumpre o principal propósito de entreter, além de captar perfeitamente o espírito dessa lenda que apenas flerta com o horror, mas que na verdade é ligada à autodescoberta humana, é possível perdoar todas as imperfeições técnicas que mencionei.
O carisma de Tom Cruise contagia, além do ator conseguir ter espaço para criar coisas novas depois de tanto tempo. As sequências de ação, o payoff e o estabelecimento do universo são os pontos altos dessa obra monstruosa que pode vir a te agradar bastante, caso você se apresente bastante receptivo às novidades propostas pelo Dark Universe. Parafraseando o filme, às vezes é preciso um monstro para combater outro. Querendo ou não, seja a sua experiência positiva ou negativa, não há como discordar de um fato: agora não tem mais volta. Um novo universo cinematográfico nasceu. E dele, guardo boas expectativas.
A Múmia (The Mummy, EUA – 2017)
Direção: Alex Kurtzman
Roteiro: David Koepp, Christopher McQuarrie, Dylan Kussman, Jon Spaihts, Jenny Lumet, Alex Kurtzman
Elenco: Tom Cruise, Russell Crowe, Annabelle Wallis, Sofia Boutella, Jake Johnson, Courtney B. Vance, Marwan Kenzari, James Arama
Gênero: Fantasia, Aventura, Monstros
Duração: 110 min
Crítica | O Homem Invisível (1933)
Com o advento da evolução das ciências químicas, não tardou nada para que a ficção jogasse sua atenção sobre elas. Conforme cientistas criavam compostos diferentes e até mortais, a transição da ciência como fenômeno material e não mágico, foi gradual até a população se acostumar com as maravilhas e horrores daquilo tudo.
O desenvolvimento acerca desse tema na literatura já era sentido no século XIX, com clássicos como Frankenstein de Mary Shelley comprovando o sentimento de medo e dos horrores que a ciência poderia criar – e que certamente é um pesadelo real até hoje. É evidente que Frankenstein vai muito além desse sentimento de receio, abordando temas deveras humanos, mas o foco desse texto é de uma obra que também traduz a Ciência como arma: O Homem Invisível de H.G. Wells, um dos maiores autores de ficção científica da História.
Junção dos Cosmos
A história da Universal pode ser facilmente dividida em eras pré e pós presidência de Carl Laemmle Jr., filho do fundador do estúdio Carl Laemmle, um dos pioneiros em tornar o Cinema em uma verdadeira indústria de entretenimento. Isso acontece em meados de 1930, justamente a década que o estúdio começaria seu grandioso projeto que ficou conhecido como Os Monstros da Universal.
Ao contrário do pai, Laemmle Jr. era muito mais aficionado em contar grandes histórias e despertar profundas emoções nos espectadores. Não foi à toa que sob sua gerência que houve uma profunda revolução na Universal em renovação de equipamentos e sonorização do todos os lançamentos. Laemmle Jr. conseguiu até mesmo o primeiro Oscar do estúdio com Nada de Novo no Front em 1930.
Porém, com muito gasto e sucessos módicos, Lammle Jr. teve a brilhante sacada de renovar a seção de Filmes B da Universal para reaver a verba de tanto investimento e dos cortes causados pelas medidas anti-truste que proibiram o controle de três pontas da produção cinematográfica (produção, distribuição e exibição). Daí veio a ideia em amedrontar o mundo com os chamados Monstros que sustentaram a Universal por toda a década de 1930 até a venda do estúdio para novos proprietários em 1951 – os filmes de monstros seguiram até os anos 1960.
Aposta certeira
O sucesso de Drácula e Frankenstein apenas confirmaram como o faro de Laemmle Jr. era aguçado. Porém, foi no segundo filme da franquia que o jovem produtor encontrou sua cara metade: James Whale. Embalado pelo tremendo sucesso dos filmes e também pela amizade que se firmou entre os dois, Laemmle Jr. já tinha o projeto certo para Whale assumir o quanto antes: O Homem Invisível de H. G. Wells. Outro sucesso cult nascia ali.
O roteiro do filme passou por muitas mãos até chegarmos a versão final de R.C. Sherriff – até Whale chegou a escrever um. Mas como H.G. Well estava bem vivo na época, ele não vendeu os direitos da obra sem que ao menos tivesse o poder de aprovar o projeto. E demorou bastante já que diversos roteiristas sempre insistiam em esquecer da característica científica da obra. Mas, com algumas concessões ao estúdio, Wells acabou aprovando o texto de Sherriff.
Nele, o cientista Jack Griffin, auxiliar do químico Cranley, descobre um fluído que, combinado com a substância monocaína, consegue conferir invisibilidade para quem o ingere. Testando nele mesmo, Griffin consegue tornar-se invisível, mas um dos efeitos colaterais desconhecidos pelo cientista começa a fazer efeito: a insanidade e a violência. Assim, completamente invisível, o cientista começa a aterrorizar duas vilas inteiras causando mortes diversas o que motiva uma força-tarefa da polícia de todo o condado para capturá-lo.
Mas não se engane pela sinopse, leitor. O Homem Invisível se vale bastante da organização narrativa bem ousada de H.G. Wells. Nosso primeiro encontro com o personagem já o mostra todo envolvido por bandagens e pesados óculos escuros para conseguir conviver com a condição. Fugindo de seu mentor, Griffin se hospeda em uma taverna para tentar reverter o efeito da descoberta, pois suas motivações não são puramente maléficas em primeiro momento.
Logo, enquanto Frankenstein, o Drácula e A Múmia davam vida à monstros que realmente eram externos à nossa natureza, sobrenaturais, O Homem Invisível traz um protagonista humano, mas enlouquecido, vítima de sua própria ambição. O insumo narrativa da obra se faz presente, mesmo seguindo algumas obrigações inerentes ao Cinema daquele tempo.
A começar há um romance que consegue conferir mais camadas para Griffin. A paixão de Flora por Griffin é impossível devido às circunstâncias que seu namorado se encontra. Para piorar, a psicose que o protagonista sofre, o transforma em um homicida de primeira linha que chega até mesmo a descarrilar trens. É através do núcleo romântico que sentimos ainda alguma humanidade restante ao protagonista e, por consequência, o final da obra torna-se poderoso e bastante corajoso para a época.
Em si, a história também não vai surpreender ninguém – a menos que você tenha vivido em uma bolha sem ter visto um filme na vida. Apesar do formato fora do padrão de narrativas clássicas, o segundo ato da obra fica em um grande marasmo mostrando as ações do Homem Invisível no vilarejo. Seja com bravatas, traquinagens e assassinatos por estrangulamento.
As coisas ficam mais interessantes quando Griffin reencontra seu antigo colega de laboratório, Arthur Kemp. Nisso, a obra começa a se desprender bastante do livro original, na qual vemos Griffin obrigando Kemp a virar seu ajudante na vilania. O coadjuvante em si é bastante descartável. O roteirista apresenta um triângulo amoroso entre ele, Flora e Griffin, mas abandona rapidamente ao torná-lo uma grande caricatura covarde histérica.
Mas, com essa nova relação, muito mais da mitologia do Homem Invisível é exposta ao espectador. O grande destaque do roteiro de Sherrif e tornar O Homem Invisível em uma das primeiras narrativas de cinema B que explora acontecimentos paralelos. Enquanto vemos o vilão tocar o terror, acompanhamos o pânico da população local e os esforços da investigação policial. Algo que por si só é único para esse filme na franquia.
Vivendo o Sonho
Um dos elementos completamente indissociáveis da direção de James Whale recai diretamente no roteiro: o humor camp dos teatros ingleses – esse tipo de humor faria o sucesso nos desenhos de Chuck Jones com Looney Tunes anos mais tarde. De fato, O Homem Invisível é mais uma grande comédia de humor negro do que um filme de terror.
Embora Whale respeitasse os desejos da estética expressionista exigidos por Laemmle Jr. para os filmes Monstros, o diretor sempre injetava o humor negro peculiar. A insanidade de Griffin é, em sua maioria, muito cômica. A reação exageradíssima de alguns personagens como Jeny Hall, proprietária da taverna interpretada por Una O’Connor, é sensacional. Uma histeria insuportável que nem mesmo o marido da personagem aguenta.
Também é preciso destacar o grande papel de estreia de Claude Rains. Apesar de, quando não invisível, o ator estar recoberto de bandagens e gaze, Whale teve uma incrível sacada em selecionar Rains, o homem dono de uma das vozes mais marcantes dos filmes de Monstro da Universal. O ator, quando visível, mantém sempre uma postura muito rija refletindo o temor de um homem tenso e bastante estressado. Se move com uma lentidão incomoda e, em momentos propícios, encarna a megalomania do personagem que flerta com o poder tirânico de domínio sobre os outros homens.
De resto, Rains só precisa abrir a boca e falar para fazer magia. A voz é tremenda, o sotaque cockney é bizarríssimo e as diversas nuances que o ator faz são memoráveis. É um som imprevisível que vai do terno para o insano em questão de segundos, além do divertimento sádico expressado pelo homem enquanto mata ou atazana outras pessoas. É de muita competência, pois tudo é claro para o espectador. Não há incertezas com o que Rains apresenta dentro e fora da tela.
A paixão pelo teatro inglês de Whale não fica restrita apenas pelo humor caricato e vibrante. O diretor abraça a linguagem cinematográfica digna de um John Ford em Como Era Verde o Meu Vale. Digo isso por conta do profundo respeito que o diretor expressa pelos grandes mestres do Cinema Silencioso, os grandes inventores da linguagem cinematográfica.
Whale, sempre que possível, define a geografia da cena em um simples plano geral que se movimenta com travellings sempre que possível – para todos os quatro lados. Ou seja, em boa parcela, ver ao filme é como assistir a um pequeno teatro filmado. Mas mesmo restrito sempre a um mesmo eixo, Whale não deixa sua decupagem menos diversificada. A linguagem já tinha evoluído a tal ponto que era possível mostrar apenas o rosto dos atores sem que a plateia ficasse chocada ao imaginar ver um rosto decapitado. Logo, os closes são constantes, assim como planos detalhes e cut ins diversos.
Whale também tem certa peculiaridade com alguns arranjos fora do convencional para a época. Por exemplo, em determinado momento, o jornalista no rádio avisa que o Homem Invisível está a solta e, logo depois, temos uma ligeira sequência em montagem mostrando diversas pessoas trancando janelas e portas. Essa sequência é aberta e fechada com um travelling que vai em direção ao rádio para abrir e fechar o segmento. É um capricho autoral.
Além disso, Whale consegue dominar, junto do seu técnico em efeitos especiais, John Fulton, as trucagens necessárias para realizar o efeito da invisibilidade de seu monstro. Enquanto os outros eram bem menos complexos requisitando apenas uma boa maquiagem, o Homem Invisível tinha que passar por processos de dupla fotografia com máscaras de veludo preto para separar as partes visíveis e invisíveis do ator. Em um dos planos mais intrincados, vemos Griffin retirando as bandagens enquanto se observa no espelho. Tanto ele quanto o reflexo somem progressivamente ao mesmo tempo – um processo que requisitou nada menos do que quatro etapas que foram coladas manualmente no positivo do filme.
E não somente existem os efeitos absurdos de invisibilidade, mas também ótimas cenas com objetos levitando, portas se movendo, pegadas surgindo na neve, etc. Tudo feito com cuidado digno de Oscar. Há cenas de profunda excelência na técnica de efeitos em objetos como a qual Griffin puxa um cigarro e começa a fumar. É algo absurdo para 1933.
Aliás, toda essa paixão pelas trucagens de filme dão um charme único para O Homem Invisível. Dentre todos os filmes de monstro do estúdio, ele é o que mais se aproxima a homenagear o Primeiro Cinema, movimento no qual grandes mestres ilusionistas como George Mélies assustavam o público com trucagens de câmera inspiradas e histórias fantásticas de ficção científica. Porém, havia a adição do som e, para uma história como essa, Whale soube muito bem aproveitar efeitos sonoros de passos em salas vazias ou escadas e outros de manipulação de objetos não só para indicar a presença da criatura, mas para transpor o sentimento de paranoia dos personagens assombrados.
Toda essa liberdade de criação também não é por acaso. A figura dos gênios do sistema (os produtores) era ainda mais mandatória do que os de hoje, já que comumente eles eram também os donos dos estúdios e das redes exibidoras. James Whale confere marcas autorais como mencionei acima sendo a principal delas o seu humor único. Isso dentro da máquina dos studio system era tão precioso como uma pérola. Whale pode muito bem ser o primeiro autor a impregnar seus filmes com suas características em um grande estúdio – algo que merece um estudo aprimorado.
Se você se pergunta “como?”, é bem simples resolver a questão. Whale teve a tremenda sorte de firmar uma poderosa amizade com seu produtor Laemmle Jr. que, extraordinariamente, conferia 100% de autonomia para Whale desbravar em seus filmes. Não foi mero acaso o diretor ter se aposentado no final da década de 1930. O tempo de bonança monstruosa acabaria, Laemmle Jr. perderia espaço como manda-chuva e, por desventura, Whale perderia sua liberdade cativante seguindo as ordens restritivas de novos produtores.
A Breve Alegria
Com o ressuscitar desse universo agora com o vindouro A Múmia, foi uma tremenda diversão revisitar esses clássicos de 1930 que ajudaram a moldar toda a fama de um estúdio tão expressivo e carismático como o centenário Universal. Como puderam ver, esses filmes B não carregam apenas o mérito de sua indubitável qualidade, mas também nos reapresentam uma parcela mágica da História do Cinema pré-televisão.
Se caso nunca tenha visto esses clássicos e ama Cinema, não há recomendação e tempo mais propícios para visitar e descobrir a genialidade de uma equipe que não se sentia ofendida em adaptar contos de horror e clássicos da literatura em Filmes B. Para eles e certamente para James Whale, não existia esse negócio de produção B. Se tratavam, sim, de filmes como quaisquer outros do estúdio que os empregavam. Nessa ligeira década de paz, homens e mulheres puderam expressar o melhor momento de suas carreiras com risadas, gritarias, sustos e surpreendentes efeitos visuais.
Uma breve alegria que trouxe luz através de histórias sombrias para um mundo que ainda nem imaginava os horrores reais que enfrentaria em 1940.
O Homem Invisível (The Invisible Man, EUA – 1933)
Direção: James Whale
Elenco: Claude Rains, Gloria Stuart, William Harrigan, Henry Travers, Una O’Connor, Forrester Harvey, Holmes Herbert, E.E. Clive, Dudley Digges
Gênero: Monstro, Suspense, Ficção Científica
Duração: 77 minutos
Os (Muitos) Acessórios da Mulher-Maravilha
O que seria de uma heroína sem seus muitos utensílios? Tudo bem que perto do Batman e seus bat-acessórios, ninguém conseguiria superar os gadgets do herói de mil e uma utilidades, mas digamos que a Mulher-Maravilha chega bem perto disso.
Não por menos, seus acessórios têm tanta personalidade que viraram uma parte poderosíssima da mitologia da heroína. Só de pensar na heroína, já a associamos com o Laço da Verdade, com os Braceletes e, obviamente, ao jato invisível, mas vocês já pensaram de onde vem todas essas coisas ou sobre os outros instrumentos que Diana usa para combater o crime?
Os poderes do Olimpo
Como muita gente já sabe, toda a história que circunda a origem de Diana Prince é envolvida diretamente com a mitologia grega. Esculpida no barro por Hipólita e trazida à vida por Zeus virando uma semideusa, a heroína acabou recebendo habilidades sobrenaturais. Isso, obviamente, trouxe diversas vantagens como superforça, destreza além do normal, sabedoria divina e uma quase imortalidade. Mas mesmo com todas essas vantagens inerentes à sua pessoa que a tornam completamente super-humana, Diana não larga seus acessórios na hora de quebrar tudo.
O principal é o bendito Laço da Verdade, a arma mais icônica da heroína. O laço forjado por Hefesto tem diferentes propriedades mágicas além de forçar quem estiver amarrado a falar a verdade. A corda consegue quebrar maldições poderosas de ilusões, devolver memórias perdidas e até mesmo restaurar a sanidade de um insano, além de servir como protetor de ataques mágicos. Por vezes, Diana o utiliza para conseguir comandar o oponente amarrado sem enfrentar quaisquer resistências.
Moda multifuncional
E depois do Laço, vem o que? Ora, é óbvio! Os Braceletes da Vitória que são vitais, sempre, para o look da heroína. Os braceletes foram feitos do próprio escudo de Zeus e, portanto, são indestrutíveis. É justamente por essa origem que Diana consegue manipular raios com o auxílio dos braceletes podendo se defender e atacar outros deuses como Ares.
Mas na maioria do tempo, Diana os usa apenas como instrumentos de defesa podendo defletir golpes poderosos de espadas e armas de fogo diversas. Como visto em exaustão no novo filme, toda vez que ela cruza os braços para se defender, os braceletes causam uma onda explosiva que derruba tudo a sua volta. Originalmente, eles também tinham uma função bem mais interessante: conter o verdadeiro poder de Diana. Uma vez que ela se libertava deles, sua força não era mais restrita à levando a um estado de pura raiva e insanidade. Tenso.
As manoplhas de Atlas e as sandálias de Hermes são oferecidas como um conjunto de armas.
Assim como os braceletes, Diana possui outras peças de seu look que também são verdadeiras armas de destruição. Sua tiara é uma delas. Apesar de ainda não termos visto nos filmes, a heroína geralmente costuma usar sua coroa de princesa como um poderoso boomerang que consegue aplicar um dano maior que podemos imaginar. Hoje a tiara é considerada parte de sua origem em Themyscira, mas antes se tratava de um presente dado por alienígenas em forma de gratidão por Diana ter salvo seu planeta.
A heroína também já utilizou em algumas histórias as famosas Sandálias de Hermes. Os poderes que o calçado oferece é exatamente os que você já pensa: habilidade de voar e super velocidade. Como em diversas narrativas Diana já possui esses poderes, ela pouco os utiliza. As sandálias já foram utilizadas por sua mãe Hipólita e também por Artemis.
Outro instrumento vindo diretamente de uma criatura mitológica é o par de Luvas de Atlas, o lendário titã encarregado de segurar o mundo nas costas. As manoplas aumentam a força do usuário em até dez vezes, além de proporcionar maior resistência física e estamina.
Obviamente não deixaria passar a famigerada Espada de Athena, uma das armas místicas mais poderosas da heroína. Apesar dela não possuir muita história por trás de sua origem, é sabido que a espada é capaz de ferir até mesmo o Superman sem qualquer auxílio de kryptonita para enfraquecê-lo antes tornado Mulher-Maravilha uma das personagens mais fatais da Liga da Justiça.
Minúsculos e invisíveis, mas poderosos
Diana também já foi agraciada com pares de brincos explosivos que também funcionavam como comunicadores durante a Era da Ouro. Além deles, ela já chegou a usar até mesmo Anéis de Poder – sim, as armas usadas pelos Lanternas.
Isso aconteceu na saga A Noite Mais Densa na qual ela morre e é ressuscitada como uma Lanterna Negra (como diversos outros heróis nessa saga). Porém, felizmente, Diana é separada do poder sombrio dos Lanternas Negras ao receber um anel de poder violeta para se transformando em Safira Estrela. Manipulando um anel de poder, Mulher-Maravilha consegue fazer as mesmas coisas que o Lanterna Verde criando construtos diversos através da manipulação de suas emoções – no caso, o amor.
Diana Prince como Safira Estrela.
E para encerrar qualquer artigo, há de se mencionar o veículo favorito de Diana Prince: o Avião Invisível. Muita gente se pergunta por que raios ela usaria um jato quando pode voar livremente por aí, mas na verdade, esse poder é algo relativamente novo nos 75 anos de história da Mulher-Maravilha. Por isso, o jatinho era necessário no começo para transportar Steve Trevor de volta ao mundo dos homens e vice-versa.
O avião, originalmente, tinha sido feito pelas Amazonas – depois alienígenas ajudaram Diana a melhorar ainda mais o veículo agregando poderosas armas, piloto automático, capacidade de voo no Espaço, auto reparo e até mesmo uma conexão telepática exclusiva com a heroína que permite invocá-lo a qualquer momento. Bem mais útil do que ser apenas um avião invisível, não é mesmo?
Esses são os instrumentos mais utilizados pela heroína em batalha em diversas fases de sua história e, felizmente, pudemos ver diversos desses em ação no novo filme. Será que veremos o famigerado avião invisível em Liga da Justiça?
Cine Vinil #05 | Lado B: Por que Odiei Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar
O CONCEITO
Dia vs Noite, TWD vs GOT, DC vs Marvel, BvS vs Guerra Civil, Xbox vs Playstation, Flamengo vs Fluminense, Android vs iOS, McDonalds vs Burger King, Nerd vs Nerd, Fanboy vs Fanboy.
O multiverso nerd é pautado por discussões intermináveis e, geralmente, extremamente redundantes. Mas com toda a certeza a gente adora aquela treta cósmica para provar que um lado é melhor que o outro – mesmo que o único convencido na discussão seja você mesmo. Analisando essa treta tão peculiar, decidimos trazer um pouco desse espírito “saudável” de discussão para o nosso site.
Sejam bem-vindos ao Cine Vinil! Calma, antes de soltar os cães nos comentários, entenda nossa proposta. Os discos de vinil foram um dos itens mais amados para reprodução de arquivos sonoros. Sua grande peculiaridade eram os lados A e B. O lado A era utilizado para gravar os hits comerciais das bandas, músicas mais populares. Enquanto o Lado B era mais voltado para canções experimentais ou mais autorais.
No caso, nos inspiramos pelos lados opostos do mesmo “disco” – de uma mesma obra. Serão dois artigos: o Lado A, que contém a opinião positiva, e o Lado B, com a versão negativa. Os autores, obviamente, serão distintos, e escolherão 5 pontos específicos da obra para justificar seus argumentos.
Explicado o conceito, nós lhes desejamos aquela ótima discussão para defender o seu lado favorito! Quem ganhou? Lado A ou Lado B? Que a treta perfeita comece!
Atenção aos spoilers.
LADO B
Por Matheus Fragata
Potencial Frustrado
Não tenho problemas com franquias que se estendem mais que o necessário. Algumas vezes, podemos ter ótimos surpresas como no caso da loucura divertida que virou Velozes e Furiosos. Porém, infelizmente, falta vigor criativo nesse retorno de Piratas do Caribe. E acredite, potencial havia de sobra. O fato de novamente tudo cercar um Macguffin já dá indícios de que as coisas vão mal. O maior problema reside nessa enorme tentativa da obra querer abraçar o mundo em apenas duas horas de narrativa o que nos leva para o próximo ponto.
Menos é Mais
O roteirista Jeff Nathanson teve que dar nó em pingos d’água para sustentar a narrativa deste Piratas. Além de introduzir e estabelecer a motivação, características fundamentais e o romance dos novos mocinhos: Carina e Henry, se preocupa em estabelecer um arco de decadência profunda para Jack Sparrow que está bêbado além da conta e totalmente viciado. Além disso, há toda a perseguição desnecessária dos ingleses ao grupo de piratas – algo tão sem-graça que rapidamente é retirado de forma arbitrária. E, não satisfeitos, também temos que ter algum desenvolvimento para Barbossa que realmente é interessante, mas o desfecho cai no clichê de um sacrifício que mal sentimos o peso, pois não vemos o desenrolar desse novo lado do carismático vilão. Ah, e obviamente, o vilão Salazar de tremendo potencial e ótima presença em cena, mas que rapidamente vira um personagem de uma nota só recebendo um dos piores desfechos que já vimos na franquia.
Johnny Depp está perdido
O que raios houve com Depp? Antes tão preocupado com a essência de seu personagem, aqui claramente temos o roteiro mais preguiçoso para com o azarado pirata. Sparrow nunca foi o protagonista desses filmes, mas sempre tivera momentos dedicados para desenvolvê-lo e mostrar uma face mais humana do herói carismático. A Vingança de Salazar não tenta nem oferecer isso ao público além de apostar em um conflito que já chegou a exaustão nesses filmes: alguém quer a cabeça de Jack Sparrow através de uma saborosa vingança. Não apenas o roteiro é bem pobre para o personagem, como Depp parece não conseguir criar absolutamente mais nada a ponto de confundir a dicção durante a apresentação de Sparrow nesse filme. Isso é para os espectadores mais atentos e apenas ocorre na versão legendada (imagino) tornando o problema mais grave. Até Sparrow chegar ao seu navio, temos Depp fazendo a voz e os tiques de dicção do Chapeleiro Maluco justamente no seu personagem mais consagrado. O que raios aconteceu aqui?
A Nova Dupla de Diretores Aconteceu
É, respondendo a minha própria pergunta. Nota-se que os noruegueses Ronning e Sandberg não deram conta do recado em sua maior parte – admito que a ação é razoavelmente bem filmada. Os indícios são vários, mas o descontrole na performance de Depp é um dos indícios mais fortes – realmente não custava ter avisado o ator dessa confusão tonal que remove o espectador logo no início do filme (céus, é a apresentação do personagem que estamos falando aqui). Apesar de ser um longa belo e com efeitos visuais excelentes, existe certo desconforto visual por conta da hierarquia de planos muito estranha que os diretores ordenam. As transições pouco naturais entre um núcleo narrativo para outro também são frustradas que só colaboram para esse sentimento inorgânico provocado por uma montagem excessiva. Também é evidente que ambos não conseguem sustentar um diálogo inteiro com uma variedade visual mais interessante, já apostando diretamente em um padrão televisivo bastante datado. Em suma, o refinamento estético passa longe do que Gore Verbinski tinha apresentada na trilogia original.
O Roteiro das Profundezas
Nem mesmo o argumento principal do veterano Terry Rossio se salva nessa. O filme aposta tanto no seguro e em um sentimento nostálgico falho que mais parece um filler requentado para reintroduzir a presença de Davy Jones em um próximo filme. Os bons elementos novos apresentados aqui não recebem o menor tratamento tornando-se absolutamente ridículos: decadência de Sparrow? Paternidade de Barbossa? Conclusão mais criativa para Salazar? O confinamento de Will Turner no Holandês Voador? A origem do Capitão Jack Sparrow? Tantos pontos mais interessantes para serem trabalhos, mas o que recebemos é outro final ruim, uma passagem bizarra de comicidade absurda em uma ilha X, muitas coisas jogadas ao acaso como esse primeiro encontro entre Sparrow e Salazar e também todo o arco dramático de Barbossa – já a sua motivação para entrar na corrida maluca atrás desse Tridente é bastante pífia. Infelizmente, também não faltou preguiça para amarrar muitas das pontas soltas.
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Lista | Os 5 Melhores Personagens de Javier Bardem
Javier Bardem é um dos atores mais versáteis de Hollywood. O espanhol já tinha um currículo muito sólido antes de ver sua carreira explodir após encarnar Ramón Sampedro em Mar Adentro de Alejandro Amenábar. Porém, a partir da excelente performance e também pelo fato do filme ter vencido o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, Hollywood passou a dar mais atenção ao exótico Javier Bardem.
Quase que imediatamente, Bardem já era cotado para trabalhar com os irmãos Coen, Woody Allen e Mike Newell – diretores respeitadíssimos na indústria. Com a trinca Onde os Fracos Não Têm Vez, Vicky, Cristina, Barcelona e O Amor nos Tempos do Cólera, Bardem já era um dos nomes mais quentes da indústria cinematográfica americana arrancando elogios da crítica especializada e alcançando o posto de galã tão desesperadamente carente de bons nomes – Brad Pitt e George Clooney já estavam saindo desse nicho de filmes da indústria.
Mesmo assim, com chuvas de contratos para diversos filmes, Bardem e sua equipe souberam escolher os projetos a dedo, permitindo que o ator sempre entregue performances de fato interessantes. Agora, parte de uma das franquias de maior sucesso na História do Cinema, o nome de Javier Bardem volta a chamar a atenção do grande público. Por isso, vamos escolher 5 de seus melhores papéis e performances até agora.
5 – Uxbal em Biutiful (2010)
Um dos filmes mais duramente criticados de Iñarritu também recebeu uma chuva de elogios para o domínio que Javier Bardem apresentou em cena. Encarnando um personagem muito difícil, Bardem fez a dor de Uxbal em algo único que não chega perto da caricatura bizarra que poderia ter se tornado através de um overacting.
No filme, Uxbal é diagnosticado com câncer terminal tendo que lidar com o fim da sua vida enquanto coloca suas pendências em ordem. Porém, feliz dele caso as pendências fossem simples. Enquanto tenta fugir do crime suburbano de Barcelona, Uxbal ainda tem que garantir a segurança de suas filhas para que elas não caiam na guarda de uma mãe abusiva. Só que com o fim da vida diante de seus olhos, Uxbal passa a ficar cada vez mais egoísta.
O filme pode ser bastante confuso, mas vale assistir pelo que Bardem apresenta em tela.
4 – Rámon Sampedro em Mar Adentro (2004)
Javier Bardem já tinha chamado atenção nos filmes Carne Trêmula, de Pedro Almodóvar, e Antes do Anoitecer, de Julian Schnabel, mas foi mesmo em Mar Adentro, de Alejandro Amenábar, que ele confirmou todas as expectativas depositadas na sua capacidade de representação.
Na pele de um tetraplégico lutando pelo direito de acabar com a própria vida, o ator espanhol, impedido de usar o próprio corpo na construção de sua performance, teve de transmitir toda a complexidade interior do personagem através dos olhos, das entonações vocais e expressões faciais. O resultado foi uma atuação inesquecível e um dos filmes mais devastadores e relevantes dos últimos anos. (Miguel Forlin)
3 – Juan Antonio em Vicky Cristina Barcelona (2008)
Woody Allen aposta nos olhares apaixonados e exóticos de Juan Antonio, o personagem que se envolve romanticamente com três personagens ao mesmo tempo nesse ótimo longa. A história é bastante simples, outra comédia de erros de Allen em sua fase europeia. Acompanhamos Vicky e Cristina em sua viagem de turismo para Barcelona.
Em pouco tempo, as duas conhecem o galã Juan que acaba seduzindo as duas mulheres que desconhecem essa simultaneidade até descobrirem que a ex-mulher do espanhol também está na mesma situação. Em vez de trilhar o caminho seguro, Allen joga as cartas no poliamor mostrando como uma relação disfuncional pode entrar nos eixos.
2 – Silva em 007 – Operação Skyfall (2012)
Com pouco tempo em tela, Bardem consegue criar um dos melhores vilões que a franquia já tinha visto até então. Silva se sustenta muito bem pelo roteiro que oferece nuances interessantíssimas para seu passado e sua motivação em destruir MI6 e toda a divisão 00. Porém, basta vermos Bardem entrar em cena que o vilão se transforma em algo melhor e maior.
O ator claramente sexualiza o personagem que tenta seduzir Bond, seus trejeitos levemente efeminados entram diretamente em contraste com seus momentos mais assustadores que revelam a loucura interior de uma criatura, literalmente. Skyfall tem diversos pontos positivos e Bardem é um dos seus maiores trunfos.
1 – Anton Chigurh em Onde os Fracos não Têm Vez (2007)
Eis o psicopata perfeito. Bardem entrega uma performance nada menos que avassaladora para esse monstro silencioso. Confundida como monótona, a atuação de Bardem é na verdade totalmente o contrário. Sentimos que Chigurh é humano, mas sua representação consideravelmente robótica que praticamente não indica nenhum prazer no ato de matar, o tornando extremamente imprevisível.
Quando Chigurh entra em cena, não sabemos se vamos testemunhar outro banho de sangue. É um personagem consideravelmente complexo por si só. Bardem e seu diabo na Terra também só explicitam a obra de mestre que os Coen realizaram nesta obra-prima chamada Onde os Fracos não Têm Vez. Não é por menos que Bardem foi agraciado com seu primeiro Oscar graças ao excelente desempenho.
Menção Honrosa: Capitão Salazar em Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar (2017)
Caso fosse melhor tratado pelo roteiro, Salazar seria facilmente um dos melhores vilões que Piratas do Caribe já viu. Por total competência de Javier Bardem, felizmente o personagem se destaca mesmo sendo de uma nota só. Toda a movimentação criada pelo ator e sua fantástica dicção fazem de Salazar uma presença nojenta, pesada, imprevisível e psicótica. Sua apresentação já é excelente, com Bardem andando com o auxílio de duas espadas que mais servem como muletas, além do senso de humor totalmente deturbado.
As expressões são assustadoras e fato do personagem babar piche a todo momento só conseguem torná-lo mais sinistro. A modulação virtual em sua voz asmática e o modo que Bardem declama Jack Sparrow já deve ter enaltecido o vilão em um posto alto para os fãs mais fiéis da franquia.
E vocês? São fãs de Bardem? Diga suas performances favoritas nos comentários!
O Retorno Amaldiçoado | O Final de Piratas do Caribe 5 Explicado
Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar pelo jeito se tornará mais um enorme sucesso da Disney – possivelmente chegará a marca do 1 bilhão de dólares em bilheteria. E como toda grande franquia que rende muito dinheiro – diga-se Transformers, a Disney fez questão de adicionar um gancho muito interessante para o 6º filme na cena pós-créditos desse Piratas do Caribe.
Mas antes, é preciso certa contextualização para que todo mundo entenda o que raios acontece na cena. Por isso, já aviso aqui: pare de ler, caso não queira receber spoilers.
Ao fim do filme, Jack, Henry Turner e Carina descobrem que para quebrar todas as maldições dos sete mares, é preciso justamente destruir o artefato mágico que estava procurando até então: o Tridente de Posseidon. Após quebrarem o instrumento, as maldições são quebradas. Salazar deixa de ser um fantasma condenado à maldição e, tão logo, Will Turner não está mais fadado a pilotar o Holandês Voador por toda a eternidade podendo retornar para sua amada Elizabeth e viver com seu filho Henry.
Acontece uma correria, Barbossa morre para salvar a vida de sua filha, Carina, e todos ficam bem. Jack volta a ser o capitão do Pérola Negra dizendo que precisa reencontrar alguém (seria Angélica?), Carina e Henry assumem um namoro e Elizabeth reencontra Will. Todos vivem felizes para sempre.
Até a cena depois dos créditos começar.
Will está dormindo tranquilamente com Elizabeth. Mas algo o incomoda. O capitão começa a ficar nervoso durante o sono enquanto uma figura muito conhecida pelos fãs entra lentamente no quarto. Vemos apenas a silhueta do maléfico Davy Jones espreitando o casal até que sua garra de caranguejo aparece, como se fosse matar Elizabeth ou Will.
Então Will acorda e tudo está aparentemente normal. Provavelmente era apenas um pesadelo... Porém, confirmando as suspeitas do público, a câmera abandona o casal e desce até mostrar o chão do quarto. Então é revelado uma poça de água com alguns crustáceos abandonados (cirripedias).
No fim das contas, não era um pesadelo. Davy Jones retornou. E quer vingança.
Como isso é possível?
Essa pergunta é respondida com facilidade: porque a Disney quis. Mas falando sério, no final de No Fim do Mundo, o coração de Davy Jones é apunhalado pelo moribundo Will Turner. Ele morre e cai no redemoinho, retornando para a sua amada Calypso, deusa do mar. Então, é bem possível que a divindade tenha feito algo com o corpo de Jones, o preservando de alguma forma, para não perder seu amado para todo o sempre.
Logo, Jones estaria envolvido em duas maldições no decorrer de sua vida. Como o Tridente foi quebrado, a segunda maldição sumiu, o libertando de qualquer magia que estivesse o aprisionando de alguma forma. Também é possível considerar que Calypso tenha deixado de existir por conta do fim da existência de poderosas magias no oceano. Isso é bem plausível, conferindo uma motivação bastante genuína para essa vingança de Davy Jones – tentar atacar o casal na cama já é uma boa pista da natureza desse retorno.
Pessoalmente, fico feliz que o vilão favorito da franquia tenha retornado. Além de Barbossa, nenhum outro pirata antagonista conseguiu suprir a ausência de Jones e da magnífica atuação de Bill Nighy na franquia – Salazar é interessante, mas os roteiristas não conseguem mostrar nem 1/3 do potencial que o vilão prometia.
E vocês? O que acharam do final deste Piratas do Caribe? Ansiosos pelo retorno de Davy Jones? Responda nos comentários!
Crítica | Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas
Em 2003 o futuro dos filmes live-action da Disney mudaria para sempre. Naquele ano, mais precisamente em 29 de agosto, estreou Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra baseado em um passeio temático dos parques megalomaníacos da companhia. Creio que na época, tinha apenas nove anos – uma idade fácil de se impressionar e não muito exigente com entretenimento. O resultado não poderia ter sido outro, me encantei com o universo apresentado pelo filme e por seus personagens inesquecíveis. Três anos depois a franquia retorna com um filme inferior ao primeiro e no ano seguinte, o terceiro longa destrói a reputação da cinessérie por causa de seu ritmo irregular, história maçante, metragem absurda, diálogos chatíssimos, segmentos infinitos – vide a parte do “sonho de Jack Sparrow” e várias outras falhas. Finalmente, a série volta com um ar renovado neste quarto filme.
Novamente sem seu querido Pérola Negra, Jack Sparrow continua a procurar a Fonte da Juventude. Após passar em Londres para ajudar Mr. Gibbs, o pirata reencontra uma paixão do passado e, consequentemente, acaba embarcando no Queen Anne’s Revenge – navio do pirata mais temido por todos piratas, o Barba Negra. Lá ele descobre que sua ex-namorada é filha de Barba Negra e que os dois estão determinados em encontrar a tal Fonte já que o pirata corre risco de morrer, mas para isso, é preciso encontrar itens para um ritual macabro. Enquanto isso, Barbossa – agora corsário do reino Inglês, tenta capturar Sparrow com outros planos em mente.
Desbravando os sete mares
O roteiro de Ted Elliot e Terry Rossio se comporta mais como uma relembrança das características marcantes da série do que uma proposta de reinvenção criativa. O espectador vai encontrar piadas inteligentes, os clássicos planos de fuga improvisados de Sparrow, impasses de armas, reviravoltas repentinas e a imprevisibilidade da narrativa. Esses aspectos começam a dar claros sinais de desgaste criativo, mas ainda conseguem divertir o publico. Porém o maior problema dos roteiristas é o primeiro ato da fita que termina quando Barba Negra finalmente aparece. Lotado de diálogos redundantes, vazios e chatos, poucas sequências agitadas, uma história enrolada e lenta, o início do filme abandona o espectador no ócio – aguentar a primeira parte do filme é uma dádiva de que você pode se orgulhar depois da projeção.
A história deste quarto filme soa muito vazia – a sensação no fim do filme de que pouca coisa interessante foi contada é muito forte. Sparrow não tem um motivo real para continuar a busca pela Fonte e Barba Negra é o antagonista mais ameno e fraco da franquia. Isso é fácil de reconhecer por causa de uma cena em que Barbossa ainda mostra os traços malignos de sua personalidade. Aliás, ele continua sendo o personagem mais interessante do filme e a causa de sua busca pelo vilão desperta a atenção da plateia.
Outro aspecto curioso do enredo é o abandono de vários personagens que fazem falta na história como a dupla de piratas Pintel e Ragetti ou a antiga tripulação do Pérola. Os personagens novos não têm tanto carisma como os antigos e causam certa antipatia com o público, por exemplo, a sereia Syrena e o clérigo Philip. Estes substituem Will e Elizabeth no arco romântico obrigatório da narrativa. Apesar de o roteiro proporcionar um fundo mais trágico e apaixonado que poderia facilmente conquistar o espectador, seus personagens pouco ajudam e assim acabam completamente excluídos – repare que Philip não tem outra razão de existência na trama além dessa.
Até mesmo a alma da série que eram os entraves explosivos entre os navios foram deixados de lado. Aliás, o filme todo carece de cenas memoráveis de ação que o consagrem na série. Entre tantas outras burradas do roteiro, também estão às soluções rasas, fáceis e ligeiras para diversos conflitos. Por exemplo, o clímax imprevisível do filme que é resolvido com muita correria sem o mínimo desenvolvimento. Novamente, erra em deixar Barbossa em terceiro plano do foco narrativo, além do pouco destaque de Angélica no filme. Mais um aspecto negativo é a relutância dos roteiristas em desenvolver Sparrow. Ele está se tornando aos poucos um personagem redundante e previsível e isso destrói o espírito inovador que tinha na trilogia original. Neste filme, eles tinham a oportunidade perfeita de evoluir o emocional de Jack com a condição de Barbossa, o reencontro com Angélica, e a amizade com Mr. Gibbs – este tem um papel importantíssimo para a narrativa. E, infelizmente, quando tenta solucionar o segmento das sereias de maneira complexa, acaba chateando o espectador porque novamente a utilização de efeitos visuais foi desperdiçada – as cordas encantadas do Queen Anne’s Revenge teriam “pescado” as sereias em menos de cinco segundos.
Entretanto, o filme possui alguns aspectos positivos. O segmento das sereias é a mais interessante do filme – absurdamente fantástica! Os diálogos entre Barbossa e Sparrow enriquecem a qualidade do filme. As poucas revelações do passado de Sparrow também satisfazem a curiosidade do espectador. As seletas cenas de ação conseguem empolgar e as referências aos filmes anteriores são um presente para os espectadores atentos. Fora isso, o casamento da narrativa fictícia com o período histórico é muito bem realizada. Também há a transformação hilária de Barbossa de pirata para corsário.
Yo Ho, Yo Ho! A pirate’s life for me
Johnny Depp mudou o conceito de atuação quando apresentou seu Jack Sparrow. O personagem cheio de tiques e manias rapidamente conquistou todos os espectadores ao redor do mundo. Graças à liberdade proporcionada pela direção e dos roteiristas, Depp fez o mais carismático personagem de toda franquia. Mesmo com três experiências vivendo Sparrow, consegue surpreender novamente. Aqui, continua com os traços marcantes do personagem como seu jeito único de andar, sua postura, a inclinação de seu corpo, seus inúmeros tiques nervosos, seu sotaque indistinguível e acima de tudo a fantástica linguagem de seus olhares que se comunicam com o espectador. Apesar de manter todos estes traços marcantes do personagem, arrisca diversas vezes novas expressões faciais e um grito ensurdecedor divertidíssimo.
Penélope Cruz não deixa ser ofuscada pela presença de Depp. Sua atuação é bem sensual, mas muito comportada por causa da censura PG-13. Ela é a presença definitivamente feminina que a série precisava. Cruz exala aquele ar espanhol apaixonante ajudado muitas vezes pelo sotaque latino carregado. Geoffrey Rush continua com seu carisma fantástico. Ele refaz totalmente o perfil de seu personagem graças a transformação que ele passou no intervalo do filme 3 ao 4. Rush aproveita inúmeras cenas para fazer tiradas cômicas muito inteligentes. Além disso, firma seu papel de maior antagonista da série. A maldade é charmosa em Barbossa. Suas expressões tanto físicas quanto faciais misturadas com a pronunciação ríspida e cheias de curvas de sua fala dão uma dimensão muito forte da personalidade do personagem.
Ian McShane nãofaz jus à reputação histórica de Barba Negra. Toda sua atuação é muito serena, imutável e elegante – características desprezadas por qualquer pirata. Nunca o espectador encontra momentos de ira e ódio como os de Bill Nighy quando incorporo Davy Jones. McShane deixa seu personagem muito cortês se portando como um cavalheiro ajudado pelas expressões de aparente cansaço físico. Barba Negra é o vilão mais fraco e educado de toda cinessérie aparentando ser mais um vovô do que um pirata tirano temido por todos.
Sam Claflin e Astrid Berges-Frisbey substituem Orlando Bloom e Keira Knightley. Os dois são tão ruins que é praticamente impossível analisá-los. As expressões de dor de barriga de ambos os atores cansam nos primeiros minutos que entram em cena. Eles até tentam fazer um esforço e criam um sotaque horrível. Claflin e Frisbey conseguem causar saudades de Bloom e Knightley no espectador para ter uma idéia da dimensão da falta de carisma deles. O resultado de disso foram os personagens mais chatos e insuportáveis da franquia. Keith Richards e Judi Dench em suas participações especiais relâmpago atuam com mais vontade do que estes seres abismais.
Tudo depende da luz
Dariusz Wolski foi o diretor de fotografia dos três filmes anteriores e retorna novamente para o quarto filme. No inicio do longa, para retratar Londres como muitos cinegrafistas optam, utiliza tons esbranquiçados mortos e frios, alguns desfoques e faz questão de capturar as ruelas úmidas da água da chuva em contraste da atmosfera seca. Porém, assim que a história sai de Londres, sua fotografia torna-se escura e sombria ao extremo. A melhor modelagem de luz do filme ocorre logo no começo, quando Sparrow combate uma pessoa em uma taverna. Ali, o cinegrafista utiliza brilhantemente a contraluz modelando belas silhuetas – realmente uma coisa muito bela de se ver. Outro destaque é a utilização de fontes luminosas naturais, ou seja, a oscilação da luminosidade causada pelas chamas inconsistentes do fogo dá outra dimensão em algumas cenas, principalmente na que citei acima.
É interessante acompanhar como ele se transforma junto com a situação de Barbossa. Enquanto corsário, ela é continua com as características fotográficas apresentadas em Londres, tudo muito claro, branco e higiênico. Repare que assim que Barbossa sai do navio da marinha na Baía Whitecap, ela começa a escurecer ganhando uma textura pesada e densa. Mesmo com imagens muito escuras, a modelagem do fotografo é bem mediana.
Para disfarçar as perceptíveis cenas rodadas em set, Wolski exagera na dose de névoa. A maioria das imagens do filme é embaçada pela névoa do gelo seco deixando muito difícil de ver o que se passa na tela quase sufocando o espectador. Quando a luz finalmente volta a aparecer em sua fotografia, a sensação é de alívio. Para compensar o excesso de escuridão, o cinegrafista recompensa os olhos do espectador quando abre as lentes de suas câmeras. Os planos gerais do filme são belíssimos aparentando ser pinturas.
Como sempre a direção de arte e o figurino dão um show de participação. Os cenários grandiosos e a reprodução do navio Queen Anne’s Revenge são de tirar o fôlego. Destaque para o cenário da Fonte da Juventude, simplesmente indescritível de tamanha beleza paradisíaca. Os figurinistas continuam a confeccionar vestimentas memoráveis para os personagens. É interessante notar como as roupas se correlacionam com a personalidade dos personagens, vide o clássico traje de Jack Sparrow.
O filme perde muito nos efeitos visuais e na maquiagem – os dois são praticamente inexistentes durante o longa. Os poucos efeitos que ele possui não conseguem impressionar e não empolgam deixando difícil de acreditar que se trata da mesma equipe que construiu o redemoinho digital e a tripulação “molusquiana” de Davy Jones no terceiro filme.
Mal de Zimmer
O melhor compositor da atualidade é Hans Zimmer. Dentre de suas maiores especialidades estão criar temas originais, únicos, viciantes, variados e inesquecíveis. O primeiro filme da franquia foi também uma surpresa musical. Praticamente todas músicas de A Maldição do Pérola Negra são facilmente relembradas por qualquer espectador.
Infelizmente as composições deste filme desapontam visto que o compositor tem um talento e potencial assombroso. A trilha é praticamente reciclada da trilogia anterior, ou seja, os temas de maior sucesso tocam excessivamente durante o filme. Fora isso as poucas composições originais dificilmente empolgam e se destacam. A música que toca no segmento das sereias é muito criativa graças ao fundo musical composto por cantos “sereianos”, mas pela duração praticamente infinita, cai na repetição que cansa a platéia. O tema de Barba Negra é muito inferior ao de Davy Jones. Somente 25 segundos da composição são prazerosos de ouvir.
Também fiquei impressionado ao escutar uma marchinha ridícula que ilustra a guarda real. Em contraponto, Zimmer se alia a dois espanhóis, Rodrigo & Gabriela, e consequentemente a mistura de seus estilos musicais são fantásticos. Em conjunto, os compositores criam temas que lembram muito o flamenco espanhol cheios de batidas rápidas e escalas crescentes e decrescentes nas cordas do violão elétrico utilizando de vez em quando algumas distorções inteligentes.
Adeus, Verbinski!
Este é o primeiro Piratas sem ser dirigido por Gore Verbinski. O antigo diretor havia perdido a cabeça no terceiro filme da franquia – totalmente acéfalo. O ego de Verbinski inflou e assim várias cenas de ação tomaram lugar da criatividade, diversão e da narrativa interessante. Para substituir antigo diretor, Rob Marshall assume o timão do navio. Marshall é conhecido pela estética impecável de seus filmes vide Chicago e Nine. Mas o diretor pouco mudou a concepção visual da série adotando a arte do antigo diretor sem preconceitos, talvez para poupar esforços e recursos do orçamento.
Adotando novas tendências, o diretor insere apenas um slow motion completamente desnecessário, além de rodar o filme em 3D estereoscópico – igualmente inexpressivo. Marshall aponta espadas e lança carvão flamejante na platéia nunca aproveitando o efeito para impressionar e divertir. Problemas no ritmo do filme são visíveis visto que o ato inicial da película demora uma eternidade a passar. A falta de pulso do diretor para com o elenco também é perceptível. Os atores antigos da franquia não possuem química alguma com os novos, excluindo McShane e Penélope Cruz.
A coreografia das batalhas é a mais bela de todos os filmes existentes, mas a artificialidade das cenas de ação acaba tornando-as previsíveis. Marshall deve ter treinado seus dublês e atores milimetricamente para tudo sair perfeito, ao contrário de Verbinski que deixava as lutas de espadas emocionantes, orgânicas e dinâmicas que prendiam o espectador na poltrona do cinema. Às vezes o diretor consegue surpreender no conjunto de suas cenas de ação como o interessante segmento da calorosa perseguição nas ruelas de Londres.
O modo que Marshall opera suas câmeras também é característico. No início do longa o público encontra diversas panorâmicas verticais herdadas de Verbinski que apresentam os cenários e as locações paradisíacas. Também é notável a preocupação do diretor em privilegiar a atuação de seus atores. Diversas cenas são rodadas com big closes que não deixam escapar um detalhe de expressão da face do elenco. Alguns desses closes também servem como tiradas cômicas caricatas, por exemplo, as imagens desconfortantes na face gorda do Rei George interpretado com muita vontade por Richard Griffiths.
Em Marés Estranhas
O novo Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas é melhor que seu predecessor, apesar de contar com muitas falhas que podem incomodar alguns. Ele consegue divertir e garante um bom entretenimento. As atuações de Depp e Rush, as composições originais de Zimmer e as piadas inteligentes são um ótimo motivo para conferir novamente a cinessérie. Além disso, também é uma experiência interessante ver Marshall na direção do filme. Porém a franquia começa a apresentar sinais severos de desgaste e esgotamento criativo.
Parece que a fonte da juventude da Disney finalmente parece secar. Uma prequela de A Maldição do Pérola Negra contando em detalhes e mantendo as características que consagraram a série sobre como Barbossa e a tripulação do Pérola se amotinaram contra Sparrow e adquiriram a maldição seria uma ótima idéia para continuar a franquia milionária que corre sérios riscos de perder-se em águas misteriosas.
Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas (Pirates of the Caribbean: On Stranger Tides, EUA - 2011)
Direção: Rob Marshall
Roteiro: Ted Elliot, Terry Rossio
Elenco: Johnny Depp, Penélope Cruz, Ian McShane, Geoffrey Rush, Sam Claflin, Astrid Berges-Frisbey, Keith Richards, Judi Dench
Gênero: Aventura
Duração: 136 min
https://www.youtube.com/watch?v=KR_9A-cUEJc
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