Crítica | Besouro Azul - Filme da DC com cara de Marvel

Crítica | Besouro Azul - Filme da DC com cara de Marvel

Besouro Azul não figura entre os mais conhecidos e idolatrados heróis da DC, mesmo com o personagem existindo desde a década de 30 (versão da editora Fox) e só surgindo com o formato atual nas Hqs, apenas na década de 80, com o cientista Ted Kord sendo o herói e tendo as primeiras edições publicadas após Crise Nas Infinitas: Terras. É pensando em expandir o seu universo cinematográfico que a DC leva Besouro Azul aos cinemas.

Com direção de Angel Manuel Soto e roteiro de Gareth Dunnet Alcocer, o longa que tem no elenco Xolo Maridueña (Cobra Kai) e a tão aguardada estreia da brasileira Bruna Marquezine em Hollywood, narra a história do jovem Jaime Reyes. Ele é possuído por uma relíquia alienígena, que se prendendo ao seu corpo e concedendo poderes inimagináveis a Jaime. A partir desse ponto, já se pode imaginar o que irá acontecer, pois o herói terá que lutar contra os vilões e enfrentar diversos desafios.

Apenas mais um filme de herói

Há uma discussão recente no mercado audiovisual, que na verdade não é tão recente assim, mas vem ganhando mais força nos últimos anos: a de que que o público está se cansando de filmes de super-heróis. O debate é valido, porém talvez não seja o público que esteja cansado do gênero, mas sim dos filmes que não trazem nada de novo ou de relevante para o cenário. Nesse contexto que se encontra Besouro Azul.

A obra da DC não é ruim, mas é exageradamente boba, com um humor desproporcional ao que a história pede, lembrando até mesmo de produções ruins da Marvel que exageraram no tom cômico, como Thor: Amor e Trovão (Taika Waititi). Algumas piadas até funcionam e devem tirar risos dos espectadores, enquanto outras se mostram constrangedoras. Frases de efeito sendo jogadas apenas para gerar humor, mas que na realidade, são completamente sem sentido.

Em sua estrutura narrativa, o longa tem um roteiro praticamente idêntico ao de Shazam! (2019), com a diferença de que em Besouro Azul, a família de Jaime Reyes o auxilia na batalha utilizando itens mágicos, e não são transformados em campeões, como ocorre em Shazam! Isso apenas evidencia a fragilidade do roteiro, que, ao contrário de The Flash, em que houve uma verdadeira jornada ao multiverso da DC, não apresenta nada de novo que já não tenhamos visto em outras produções de heróis. Trata-se de uma obra que simplesmente repete a fórmula de outras produções sem acrescentar novos elementos ao formato.

Na verdade, Besouro Azul lembra mais um filme da Marvel que uma obra da DC, com um humor bobinho e cenas de ação com muita destruição. Diverge do estilo sombrio de Zack Snyder e até do tom sério empregado em Adão Negro. Esse humor inserido em Blue Beetle é algo que os produtores da DC já estavam trabalhando nas últimas produções e que estava sendo implementado antes de James Gunn e Peter Safran assumirem como co-CEOs da DC Studios.

Bruna Marquezine brilhando em Hollywood

Quando Bruna Marquezine foi anunciada no elenco de Blue Beetle, logo gerou grandes expectativas entre os fãs e, especialmente, no público brasileiro. Isso não se deve apenas ao fato de ter uma atriz brasileira em Hollywood, mas também porque ela assume o papel de protagonista em uma produção de super-heróis, gênero que dá confere muita visibilidade ao artista.

Bruna Marquezine é a protagonista do filme, ao lado de Xolo Maridueña, que se destaca no papel de Jaime Reyes. Os elogios à atriz os elogios vão desde sua atuação impecável como Jenny Kord até a maneira como a personagem é construída. A interpretação da atriz não segue o padrão caricato que os estúdios frequentemente utilizam ao representar personagens latinos.

Esse é o longa que apresentou o elenco mais diversificado com qual a DC já trabalhou, e isso é uma grande conquista. Há tempos o público demandava por mais diversidade, e os produtores finalmente conseguiram aplicá-la. A maior parte do elenco é composta por nomes latinos ou de descendência latina - Mariduenã é americano com ascendência mexicana. Até mesmo os diálogos dos personagens indicam o tom que o roteiro deve adotar, com frases sobre o imperialismo norte-americano e sobre como os mais pobres se tornam "invisíveis" para os mais ricos.

Besouro Azul entrega aquilo que os fãs esperavam: boas cenas de ação, entretenimento, um vilão estiloso com desejos malignos e bons efeitos visuais. No entanto, peca por não trazer nada de novo a um formato que já se encontra saturado. Não há mais surpresas sobre os eventos da trama, tudo é bastante previsível. Blue Beetle (nome original) não vai muito além de mensagens jogadas aqui e ali. Como entretenimento cumpre sua função e deve trazer bastante alegria ao público e aos fãs, mas isso não quer dizer que é uma obra-prima do gênero, pelo contrário, está muito longe disso

Besouro Azul (Blue Beetle, EUA, 2023)

Direção: Angel Manuel Soto
Roteiro: Gareth Dunnet-Alcocer
Elenco: Xolo Maridueña, Bruna Marquezine, Susan Sarandon, Harvey Guillén, Raoul Max Trujillo, Gabriella Ortiz, George Lopez, Belissa Escobedo
Gênero: Ação, Aventura, Ficção Científica
Duração: 127 min


Crítica | Megatubarão 2 só abraça o ridículo quando é tarde demais

Sucesso surpresa da Warner Bros em 2018, Megatubarão marcava uma tentativa séria do estúdio em levar o fator trash de franquias como Sharknado com a escala gigantesca de um blockbuster milionário. A empreitada garantiu uma rara colaboração entre um estúdio americano com produtoras chinesas, e uma nova franquia teve início, levando como base a extensa série de livros de Steve Alten.

Seis anos depois, a Warner inesperada resolve voltar para o oceano e com suas criaturas pré-históricas para Megatubarão 2, que mantém a proposta absurda de seu anterior, mas infelizmente não encontra muito o que fazer com suas (limitadas) novas ideias.

A trama volta a acompanhar o mergulhador Jonas Taylor (Jason Statham), que segue trabalhando para o Instituto Oceânico na exploração de uma fenda localizado  quilômetros abaixo do mar. Durante a expedição mais recente, a equipe de Jonas é sabotada por espiões, que acabam por liberar novas classes de tubarões megalodontes para a superfície.

Assim como seu anterior, Megatubarão 2 tenta andar na corda bamba de um filme "sério" enquanto promete as artimanhas de um grande festival trash. O problema é que, mesmo quando o longa aposta em uma trama risível pautada em espionagem industrial, empresárias maquiavélicas e até mesmo mercenários espanhóis com vendetas pessoais com o protagonista (!), é difícil levar a sério. Não ajuda que o roteiro assinado por Dean Georgaris e a dupla Erich e Jon Hoeber seja inchado e patético, apresentando um material que parece destinado à porção narrativa de filmes pornográficos, mas tratados com a seriedade de um Tubarão, de Steven Spielberg, pela direção de Ben Wheatley.

Wheatley, por sinal, é uma escolha inesperada para comandar Megatubarão 2. Substituindo Jon Turteltaub (A Lenda do Tesouro Perdido). Tendo dirigido produções de "prestígio" como Free Fire: O Tiroteio e No Topo do Poder, o cineasta britânico faz um trabalho competente e bem superior à qualidade do roteiro. Ao lado do diretor de fotografia Haris Zambarloukos, Wheatley aproveita os valores de produção de sets, cenários e até mesmo de paisagens submarinas, garantindo uma sequência impressionante de caminhada na fossa oceânica - perfeitamente iluminada pelos trajes coloridos dos personagens.

O trabalho de câmera de Wheatley também é formidável, mesmo quando esteja voando para acompanhar reviravoltas novelescas ou encontrar ângulos criativos para as mais banais trocas de diálogos. Wheatley, curiosamente, só não traz essa mesma inspiração no ponto em que Megatubarão 2 deveria triunfar: o terceiro ato que abandona qualquer senso de realismo e "seriedade" para se entregar ao pastelão, seguindo as peripécias de três tubarões megalodontes e um polvo gigante em meio a uma ilha de turistas. É uma cópia maior e mais complexa do clímax do anterior, mas que acaba perdendo o carismático Jason Statham (incapaz de entrar na brincadeira) para o super star chinês Wu Jing - garantindo alguns dos momentos mais embaraçosos do cinema hollywoodiano em 2023.

Finalmente respondendo a pergunta de como seria um filme de Tommy Wiseau com orçamento de US$140 milhões, Megatubarão 2 é uma experiência absolutamente ridícula, mas que só se dá conta disso durante seus minutos finais. No que diz respeito ao trash 100% assumido, Sharknado ainda é a opção mais divertida.

Megatubarão 2 (Meg 2: The Trench, EUA/China - 2023)

Direção: Ben Wheatley
Roteiro: Dean Georgaris, Erich Hoeber e Jon Hoeber, baseado na obra de Steve Alten
Elenco: Jason Statham, Wu Jing, Sienna Guillory, Cliff Curtis, Page Kennedy, Skyler Samuels, Sergio Peris-Mencheta, Shuya Sophia Cai
Gênero: Aventura, Ação
Duração: 116 min

https://www.youtube.com/watch?v=vFy_ZbgSef0


Crítica | Além do Tempo – Um drama que não entrega seu potencial

Johanna (Sallie Harmsen) e Lucas (Reinout Scholten) estão em um relacionamento concreto e feliz. Nos anos 80, os dois velejam juntos pelo mar e presenciam um acidente envolvendo o filho único do casal e que irá mudar a vida deles para sempre. Tal fatalidade acaba levando a separação dos algum tempo após o acontecimento.

Essa é a premissa de Além do Tempo, filme dirigido por Theu Boermans e com roteiro de Marieke van der Pol, que se desenvolve em duas linhas temporais distintas, sendo que a principal delas é apresentada no passado, com o casal tentando viver normalmente depois do acidente fatal envolvendo o filho, e em outra linha do tempo é mostrado o reencontro do casal após 35 anos, que seria o presente, com o ex-casal colocando a conversa em dia e revivendo o trauma particular pelo qual passaram.

O argumento proposto pelo roteiro é bastante raso. O próprio luto pelo qual a família passa é retratado de forma superficial, não indo além das sucessivas discussões entre os conjugues. Alguns desses desentendimentos fazem sentido para a trama, enquanto que outras cenas de embates não passam de pura enrolação, gerados para dar a ideia de conflito no relacionamento.

O processo de superação do luto é algo que toma grande parte da narrativa. Na realidade, o filme todo é sobre o processo de superação da morte do garoto e a respeito do drama pessoal pelo qual o casal passou, sendo que Lucas tenta esquecer o acidente através da arte, enquanto que Johanna parece ter dado seguimento à sua vida sem olhar para trás.

Um ponto positivo a ser mencionado não é a mensagem do longa em si, e sim o jeito como as lembranças pessoais são tratadas pelo roteiro, pois um simples vídeo antigo ou foto do filho que se foi já serve como gatilho para trazer de volta uma memória dele. A reflexão sobre a perda de um ente querido é algo bem aproveitado por Theu Boermans, mas que não causa a comoção esperada ao espectador.

Chama bastante a atenção o fato de que o trauma particular do casal, o sentimento de luto, e demais cenas que deveriam ser sensíveis ao público, não passam emoção alguma. Os protagonistas até que se mostram esforçados e não tem culpa dessa nenhuma pela falta de sentimento em cenas chaves. A culpa é sim do roteiro e da direção, que não exprimem a devida sensibilidade da história.

Além do Tempo tinha tudo para ser um drama instigante e sentimental. Contava com todos os elementos para que fosse desta forma. Porém, com uma trama sem conteúdo, um elenco que não convence com suas interpretações e uma direção que não leva a trama a lugar algum, a produção frustra com um final bastante genérico.

Além do Tempo (Zee van tijd, Holanda, 2022)

Direção: Theu Boermans
Roteiro: Marieke van der Pol
Elenco: Sallie Harmsen, Reinout Scholten van Aschat, Elsie de Brauw, Gijs Scholten van Aschat
Gênero: Drama
Duração: 116 min


Crítica | O Convento - Um terror vazio e sem essência

Filmes com freiras tendo um papel crucial para o roteiro, sendo vilãs ou não, estão na moda no cinema, principalmente no gênero do terror, e essa onda aparentemente não parece que terá um fim tão já. Em O Convento, longa dirigido por Christopher Smith (Alex Rider), há um erro primário do cineasta em não conseguir criar uma história decente e que possa fazer algum sentido para o espectador.

A trama gira em torno de Grace (Jena Malone), que vai até um Convento na Escócia para investigar a misteriosa morte de seu irmão. Chegando lá, percebe que a igreja local esconde vários mistérios que podem ajudar a solucionar esse terrível crime.

Produção escrita pela dupla Christopher Smith e Laurie Cook, é a clássica história de terror que tenta enganar o público de qualquer maneira, e no final das contas, quem se enganou mesmo foi o próprio diretor na hora de finalizar o produto audiovisual. A montagem de O Convento é terrível em todos os aspectos, sendo que a montagem foi essencial para que desse um rumo diferente para a narrativa.

O roteiro, ao explicar o mistério por trás de Grace e de seu irmão, se perde completamente. É quase que evidente que o diretor não tinha a mínima ideia do que queria fazer com a protagonista. Não dá para entender de onde vem a força demoníaca de Grace, muito menos dá para compreender sua mudança brusca de comportamento. Até o fim do primeiro ato parece ser um longa investigativo envolvendo a Igreja, depois muda para uma espécie de drama sem sentido, e termina sendo uma mistura bizarra de suspense com um terror barato.

A construção dos personagens é falha. Não sentimos empatia nem por Grace nem por qualquer outro personagem do longa, falta carisma ao elenco. O público terá grandes dificuldades em compreender o arco dramático de cada intérprete, principalmente o de Grace, sendo que a maioria das cenas são jogadas e sem explicação alguma.

Os flashbacks inseridos na história não tem lógica alguma para a narrativa, pelo menos não do jeito que esses flashbacks foram inseridos na trama, ficando algo completamente confuso. Ao apresentar os acontecimentos envolvendo um homem que nem se quer era o pai de Grace, houve uma tentativa em enganar o espectador, sendo que no final pareceu algo bem idiota e sem sentido. O desfecho da narrativa também faz sentido, sendo que nem dá para entender se era uma obra sobre vidas passadas, demônios ou sobre o nascimento de alguma entidade.

Não necessariamente uma obra audiovisual precisa ter uma mensagem clara e objetiva, mas a falta desta em O Convento é apenas mais um dos vários erros do roteiro. No primeiro ato, parecia que o longa faria uma crítica à religião, algo que não se concretizou com o passar da história. O mesmo pode-se dizer da luta entre o bem o mal, um elemento clássico em produções do gênero e que praticamente inexiste no roteiro.

O Convento perde uma grande oportunidade de se fazer um filme assustador e de marcar seu nome entre os fãs do estilo. Os vários furos de roteiro, direção genérica e os personagens rasos, acabam fazendo com que o público perca a atenção da obra ainda em seu segundo ato. Filmes de terror com freiras continuarão sendo produzidos, até porque há uma demanda alta para esse tipo de conteúdo, sendo que alguns serão de boa qualidade, enquanto outros, como é o caso de O Convento, serão pura perda de tempo.

O Convento (Consecration, Brasil, 2023)

Direção: Christopher Smith
Roteiro: Christopher Smith, Laurie Cook
Elenco: Jena Malone, Danny Huston, Janet Suzman, Ian Pirie, Thoren Ferguson
Gênero: Terror, Suspense
Duração: 91 min


Crítica | Perdida tem bons momentos em meio a muitos clichês

Crítica | Perdida tem bons momentos em meio a muitos clichês

A indústria cultural, tanto a audiovisual quanto a literária, adora trabalhar elementos clássicos dos contos de fadas em suas obras. O cinema em si costuma inserir clichês desses mesmos contos em suas produções, como o da Princesa que está em perigo e surge um Príncipe Encantado para salvá-la.

Em Perdida, filme em que Katherine Chediak Putnam dirigiu e participou da concepção do roteiro, é uma adaptação do livro Perdida (Vol. 1): Um amor que ultrapassa as barreiras do tempo, de Carina Rissi. No longa, Sofia (Giovanna Grigio) é uma garota independente e habituada com os tempos modernos, sendo fã de romances, como a obra Orgulho e preconceito, de Jane Austen. Após pegar um celular emprestado de uma misteriosa taxista tudo muda em sua vida, sendo transportada para o século XIX, mais especificamente no Brasil de 1830.

Perdida é um conto de fadas brasileiro

Contando com uma franquia de seis livros e com mais de 500 mil exemplares vendidos, é de se concluir o motivo de Perdida ter sido adaptado para a telona. A obra literária em si já era bastante midiática e famosa, portanto, a ideia era a de aproveitar toda essa popularidade e tentar levar o máximo possível de espectadores para as salas de cinema. O resultado final foge bastante do que o cinema nacional está proporcionando nos últimos anos, em que as comédias de estilo pastelão estão dominando o cenário audiovisual, e é bem vinda uma tentativa de se fazer algo variado, mesmo se tratando de uma adaptação.

A direção e o roteiro acertam na forma que abordam a história, enviando a protagonista em uma viagem no tempo – algo parecido com o que pode ser presenciado na série norte-americana Outlander – para a época que Sofia sempre sonhou em viver, no período em que os romances de Jane Austen se passam, e assim o filme cai em um dos maiores clichês dos contos de fadas e que é replicado em Perdida, que é o jeito como Sofia tem seu encontro com o jovem “Príncipe”, ou no caso Clarke (Bruno Montaleone), um homem que se apresenta com trajes que seriam considerados cafonas para os dias atuais, mas que para a época era a última moda.

Um ponto negativo do longa é o fato de não abordar a escravidão que ocorreu no período em que a trama ocorre – e que no livro também não é abordado – seguindo assim os caminhos narrativos da obra original ignorando um tema tão importante. Não é por ser uma adaptação que é obrigatório seguir a narrativa da obra original, sendo possível alterar alguns trechos e o filme erra nesse cenário.

Amor através do tempo

Por se tratar de um romance que se passa em outro tempo é natural que iria haver um choque cultural e de tradições entre o moderno e arcaico, relacionado à ida de Sofia para o passado, algo que rende algumas risadas em certas ocasiões. O romance da dupla de protagonistas é puro clichê, não funcionando tão bem quanto se imaginaria que iria acontecer, e muito disso se dá pela falta de originalidade do roteiro, que até funciona, mas mesmo assim não chega aos pés de um Meia-Noite em Paris (2011).

O elenco em si não atrapalha o andamento da trama, sendo que Giovana Grigio se sobressai, não apenas por ser a protagonista e ter mais tempo de tela, mas também por ser ótima atriz. Porém, o mesmo não se pode dizer da atuação de Bruno Montaleone, que é um bom ator, mas sua interpretação não foge do básico, sendo bastante teatral em alguns momentos.

Perdida tem bons momentos, mas é de se estranhar a falta de noção em lançar um longa que poderia se dar bem nas bilheterias nacionais, em um mês que contou com a estreia de dois blockbusters dos mais esperados do ano: Barbie e Oppenheimer. Poderia ter maior sorte e uma vida mais longa nos cinemas, mas provavelmente não é isso o que irá ocorrer. O que resta à produção é o fato de que tentou trazer algo de novo sem cair na mesmice que acontece tanto com os filmes atuais nacionais.

Perdida (Brasil, 2023)

Direção: Katherine Chediak Putnam, Luiza Shelling Tubaldini
Roteiro: Rod Azevedo, Karol Bueno, Katherine Chediak Putnam, Dean W. Law, Luiza Shelling Tubaldini, Carina Rissi (Livro)
Elenco: Giovanna Grigio, Bruno Montaleone, Bia Arantes, Luciana Paes, Nathália Falcão, Hélio de la Peña
Gênero: Romance
Duração: 115 min


Crítica | Missão: Impossível - Acerto de Contas Parte Um mostra sinais de cansaço e repetição

Ao longo de quase 30 anos em atividade, a franquia Missão: Impossível trilhou um caminho curioso para se estabelecer como uma das joias do cinema de ação contemporâneo. Abandonando algumas convenções do século passado, a saga de espionagem agora é ancorada na habilidade impressionante de Tom Cruise em arriscar a própria vida para realizar cenas espetaculares, que empurraram a jornada de Ethan Hunt em seu sétimo capítulo; agora dividido em duas partes, ambas capitaneadas por seu braço direito, o diretor Christopher McQuarrie.

Porém, a ambição e escala de Missão: Impossível - Acerto de Contas Parte Um começa, pela primeira vez, a demonstrar alguns sinais de esgotamento e repetição de fórmula, infelizmente representando um dos pontos menos inspirados da tão consistente franquia.

A trama coloca mais uma vez o agente secreto Ethan Hunt (Cruise) em uma missão perigosa para a IMF, agora pra recuperar duas peças de uma chave misteriosa. O artefato, disputado por agentes do mundo todo, seria crucial para barrar a ameaça exponencial de uma inteligência artificial rebelde, conhecida apenas como a Entidade.

Durante todos os filmes anteriores, a fórmula de Missão: Impossível nunca mudou. Sempre envolveu o implacável Ethan Hunt em busca de um objeto misterioso (o mcguffin) com alguma capacidade de destruição mundial, e geralmente sua jornada acaba indo de encontro com os interesses e protocolos da IMF, forçando o protagonista e sua leal equipe - formada por Simon Pegg, Ving Rhames e agora Rebecca Ferguson - a agirem de forma clandestina. Todos esses elementos se repetem no sétimo filme da franquia, que em Acerto de Contas Parte Um não parece ter nada de muito inovador ou interessante para desenvolver; ainda mais tratando-se de apenas metade da história completa.

A ideia da inteligência artificial é divertida e surpreendentemente contemporânea, mas o roteiro de McQuarrie e do autor Erik Jendrensen é dolorosamente enfadonho. Ao longo de inchados 160 minutos, Acerto de Contas sofre com problemas de exposição, uma enorme quantidade de personagens em cena e até algumas redundâncias narrativas - já que o mistério do que as chaves abrem é mantido para os personagens durante todo o filme, mas revelado para o espectador literalmente na primeira cena. Além da obviedade, ainda há a sobrecarga de subtramas, que além de brincar com a ameaça de IA, ainda aposta em vilões do passado de Ethan, perseguidores independentes da CIA e conexões com antagonistas dos filmes anteriores. Nunca ficou tão evidente quanto neste sétimo filme que a "trama" é um mero pretexto para amarrar as diversas cenas de ação, algo que o próprio McQuarrie já revelou em algumas entrevistas.

No que diz respeito à ação, Acerto de Contas Parte Um segue mantendo o bom padrão de espetáculo da franquia. McQuarrie aposta em mais perseguições de carro, lutas de espada e até mesmo uma longa e complexa sequência envolvendo um trem, onde Tom Cruise ainda realiza o já famoso salto de motocicleta de um penhasco. São todos momentos bem coreografados e fotografados (agora pelo competente Fraser Taggart), mas sem o fator de novidade ou impressão que os superiores Nação Secreta e Efeito Fallout (também de McQuarrie) deixaram com muito mais gosto. Há também, para uma franquia tão orgulhosa de seu uso de efeitos práticos, uma dependência em telas verdes e CGI que certamente saltam aos olhos de forma negativa.

O que garante o investimento positivo aqui é, mais uma vez, o elenco. Tom Cruise mostra-se intenso e carismático como de costume, mas é a britânica Hayley Atwell quem rouba a cena, despejando charme e humor como uma ladra que acaba se envolvendo na missão da IMF. Ainda que a personagem de Atwell também seja uma repetição do mesmo tipo de arquétipo brilhantemente representado por Rebecca Ferguson, é inegável que sua presença garanta uma energia formidável ao projeto. Vale destacar também que Pom Klementieff faz um trabalho divertidíssimo como uma assassina de aluguel que constantemente persegue os heróis, compensando imensamente pelo fraquíssimo vilão principal vivido por Esai Morales.

Ainda que mantenha o nível de entretenimento e grande escala de seus anteriores, Missão: Impossível - Acerto de Contas Parte Um acende um alerta para a franquia da Paramount. Por mais que Tom Cruise permaneça esforçado, o esgotamento de fórmula e repetição de convenções começam a se tornar muito evidentes, e talvez não sobrem lugares altos o suficientes para Ethan Hunt poder saltar mais uma vez.

Missão: Impossível - Acerto de Contas Parte Um (Mission: Impossible - Dead Reckoning Part One, EUA - 2023)

Direção: Christopher McQuarrie
Roteiro: Christopher McQuarrie e Erik Jendresen
Elenco: Tom Cruise, Hayley Atwell, Rebecca Ferguson, Simon Pegg, Ving Rhames, Esai Morales, Pom Klementieff, Vanessa Kirby, Henry Czerny, Shea Whigham, Greg Tarzan Davis
Gênero: Ação
Duração: 163 min

https://www.youtube.com/watch?v=N-dsoMpDvLs&t


Crítica | Oppenheimer é o filme mais experimental de Christopher Nolan

Crítica | Oppenheimer é o filme mais experimental de Christopher Nolan

Uma das figuras chave do lado americano na Segunda Guerra Mundial, o físico J. Robert Oppenheimer é conhecido como o pai da bomba atômica. Trabalhando como diretor do Projeto Manhattan na década de 1940, Oppenheimer liderou um time de cientistas para desvendar os segredos do átomos e desenvolver a bomba atômica antes dos nazistas. Há quem diga que Oppenheimer é uma das figuras mais importantes da História, moldando o mundo contemporâneo e a assombrosa capacidade de autodestruição nuclear.

É certamente nisso que Christopher Nolan acredita. Tendo trabalhado com grandes produções de ficção científica, ação inovadora e heróis de quadrinhos, Nolan enxerga em Oppenheimer seu objeto de estudo definitivo, em uma de suas raras produções que leva como base um material publicado - no caso, a biografia Prometeu Americano, de Kai Bird e Martin J. Sherwin. É também seu segundo filme inspirado em eventos reais, após o também ambientado na Segunda Guerra Mundial Dunkirk.

A trama segue a vida de J. Robert Oppenheimer (Cillian Murphy) desde seus dias como professor universitário até o convite do governo americano para liderar o projeto Manhattan. O objetivo é desenvolver a bomba atômica para encerrar a Segunda Guerra Mundial. 

Muito mais próximo de sua linguagem mais complexa e focada em personagens, que moveram obras como Following, Memento e O Grande Truque, Christopher Nolan está em contato próximo com seu passado em Oppenheimer. É uma execução fascinante que parece combinar as ferramentas mais complexas e intrincadas do diretor, que assina o roteiro e trabalha com a montadora Jennifer Lame para construir um intrincado mosaico que salta constantemente no tempo; e que em seus momentos mais frenéticos se esforça para colocar o espectador na mente de seu protagonista, que enxerga a e recebe o tempo e espaço de uma forma muito requintada.

A atenção dispersada se reflete em uma narrativa dividida em duas linhas do tempo principais: a jornada de Oppenheimer para se juntar ao Projeto Manhattan e desenvolver a bomba e um julgamento anos depois que investiga suas conexões com o partido comunista. É uma estrutura complexa e que, em seus primeiros minutos, demora para acostumar o espectador, mas cujo resultado parece aproximar Oppenheimer de grandes thrillers políticos do passado, em especial o excelente JFK: A Pergunta que Não Quer Calar e também de produções mais modernas, como A Rede Social, de David Fincher. Uma experiência que não é fácil o tempo inteiro - especialmente durante a narrativa do julgamento -, mas que sempre mantém a narrativa acelerada e interessante.

Naturalmente, tudo envolvendo o arco do Projeto Manhattan representa o ápice de Oppenheimer. São inúmeras discussões e diálogos sobre a natureza do átomo, os limites da ciência e, surpreendentemente para uma obra de Nolan, uma elegante discussão política sobre os impactos que uma arma de destruição em massa resultaria não apenas para a comunidade científica; mas todo o mundo. Esse arco se desenrola e culmina em uma das grandes sequências que Nolan já realizou em sua carreira, transbordando tensão pela tela ao registrar o teste Trinity, que detonou a primeira bomba atômica no deserto de Los Alamos. É uma sequência formidável e que fica praticamente angustiante graças à excelente trilha sonora de Ludwig Göransson, que brilhantemente transforma sons abstratos de medidores de radiação em uma sinfonia apavorante.

Nunca antes Nolan foi tão experimental ou curioso como em Oppenheimer. Além de trazer seu apreço por narrativas não-lineares e sequências em paralelo, o filme também aposta em imagens surrealistas e brutais que raramente se manifestaram em sua carreira; com um grande enfoque em drama, emoções e até mesmo sexualidade. Chega a ser realmente curioso ver Nolan e o diretor de fotografia Hoyte Van Hoytema usando as pesadíssimas câmeras IMAX, sempre usadas para grandes paisagens e quadros, agora servindo para registrar grandes discussões e - em especial - closes impactantes do rosto de seu protagonista. É o casamento do cinema blockbuster de grande escala com um íntimo e complexo estudo de personagem.

O que nos leva ao gigantesco elenco de Oppenheimer, que garantiu uma infinitude de astros de Hollywood, espalhados a cada frame de filme. Naturalmente, Cillian Murphy domina grande parte do filme, enfim ganhando o merecido espaço para brilhar e apresentar um J. Robert Oppenheimer complexo, enigmático e outrora contraditório. Em especial, o trabalho de Murphy para retratar a culpa e o ressentimento de Oppenheimer após a detonação da bomba garante o grande investimento dramático do filme, cujos olhos profundos e esbugalhados parecem ainda mais enigmáticos na película enorme do IMAX.

Ao longo do grande elenco coadjuvante, é de se destacar o excelente trabalho de Robert Downey Jr. como Lewis Strauss, que garante o ponto de vista principal durante a segunda linha do tempo. Há temos não víamos o ator, eternizado pelo papel do Homem de Ferro, de fato experimentando e trabalhando com um material versátil. Em uma medida similar, Emily Blunt quebra qualquer expectativa ao viver Kitty Oppenheimer, a nada fácil e até grosseira esposa do protagonista; que garante um dos melhores e mais importantes monólogos da produção. Dentre todos os excelentes intérpretes, Matt Damon oferece um contraponto bem humorado como o general Leslie Groves, o ator e diretor Benny Safdie brilha como o complexo Edward Teller e Florence Pugh, mesmo que em curta duração, garante uma peça crucial ao quebra-cabeças ao viver Jean Tatlock, amante de Oppenheimer.

Ao longo de suas 3 horas de duração, Oppenheimer definitivamente não é um filme fácil. É longo, denso e sua narrativa intrincada deve apresentar alguns desafios, mas o resultado final garante uma experiência satisfatória e impressionante. Aliando o cinema de grande escala com um estudo íntimo e profundo, Christopher Nolan oferece seu filme mais experimental até o momento, oferecendo um forte sopro de vida para o cinema histórico em Hollywood.

Oppenheimer (EUA, 2023)

Direção: Christopher Nolan
Roteiro: Christopher Nolan, baseado no livro de Kai Bird e Martin J. Sherwin
Elenco: Cillian Murphy, Robert Downey Jr., Emily Blunt, Matt Damon, Florence Pugh, Kenneth Branagh, Rami Malek, Josh Hartnett, Jack Quaid, Alden Ehrenreich, Dane DeHaan, Josh Peck, Tom Conti, David Dastmalchian, Dylan Arnold, Gary Oldman, Jason Clarke, Casey Affleck e Benny Safdie
Gênero: Drama
Duração: 181 min

https://www.youtube.com/watch?v=9-lJZ-r5XoU


Crítica | O Urso - 1ª Temporada Vai muito além da Gastronomia

Já faz algum tempo que as redes de TV e os serviços de streamings são bombardeados por programas e realities de culinária, dando dicas culinárias e colocando os competidores em situações de pressão, esses tendo como finalidade agradar ao paladar dos chefs. Quase sempre é possível presenciar os competidores falhando ou se consagrando perante os chefs.

Em O Urso, série do Star+ que alcançou enorme sucesso de público e crítica - fato que fez a produção receber uma segunda temporada - é possível acompanhar a rotina de uma equipe de um restaurante de Chicago trabalhando na cozinha arduamente com o objetivo de se estabelecer como um restaurante consagrado, com o seriado contando com tramas e subtramas potentes e eficientes.

Em busca da receita perfeita

Interpretado por Jeremy Allen White (Shameless), que interpreta o chef Carmy, considerado como um prodígio do mundo da culinária. Carmy herdou o restaurante de seu irmão que cometeu suicídio e é nesse ambiente que tenta se estabelecer profissionalmente, mais por apego pessoal a seu irmão e ao que herdou dele. O roteiro de O Urso é espetacular nesse sentido, apresentando o protagonista, seus dramas pessoais e no jeito em que o chef toca seu negócio, com muita criatividade e vontade de crescer.

É uma delícia de acompanhar o dia a dia de Carmen Berzatto (Carmy) e sua equipe em busca de conseguir dinheiro para que o restaurante funcione por mais um dia, de acompanhar as diversas discussões envolvendo Carmy e seu primo Richie, e o principal: que é o de acompanhar o desenvolvimento de novos pratos em que Carmen e seu time desenvolvem com o objetivo de dar uma nova cara e identidade para o local.

Criada por Christopher Storer e Joanna Calo, a série tem um roteiro leve, trazendo à tona temas que fazem com que o espectador se identifique rapidamente com a trama, como as relações familiares dos personagens, amizade, e a busca pelo sucesso e autoconhecimento. É de se entender os motivos que levaram The Bear (nome original) a agradar tanto ao público em geral, abrangendo um universo em que muitos - ou a maioria - irão se reconhecer nos papéis e nas situações envolvendo os carismáticos chefs.

Esse certamente é o grande acerto do seriado, que é o fato de trazer o público para perto da tela, abordando o tema da comida como condição de unir as pessoas, até porque não existe nada mais tradicional para estabelecer laços afetivos se não através do paladar. The Bear faz isso de modo peculiar, retratando de forma real a rotina da cozinha, principalmente em relação a pressão sobre a equipe e no jeito de se elaborar pratos perfeitos de forma ágil.

O carisma de um protagonista

Jeremy Allen White (Vigiados) é uma das várias boas surpresas da série, até porque o ator dá vida a um personagem cheio de camadas, com dramas pessoais que voltam para atormentá-lo e com o desejo de alcançar sua meta particular: a de transformar o negócio herdado de seu irmão em um restaurante de sucesso. A atuação de Jeremy Allen é de impressionar, até porque não são poucos os momentos em que o protagonista surge em situações de tensão.

Esses dramas particulares de cada personagem, que vão sendo mostrados e explorados pouco a pouco durante a narrativa, contando com tramas e subtramas que vão se ajeitando ao longo dos episódios, proporciona a possibilidade de crescimento de cada intérprete, contando com um estudo de personagens sem os clichês habituais que o formato costuma cair, apresentando protagonistas que batalham entre o sucesso e a decadência.

O Urso é uma fascinante viagem ao mundo da gastronomia, com uma história sobre ambição, altos e baixos e o amor em criar a receita perfeita. Em produções do gênero, normalmente se trabalha bastante com a alta gastronomia, como ocorreu em O Menu. Há sim espaço para outros tipos de histórias, como a série do Star+ fez de forma criativa e com êxito.


Crítica | Barbie é uma jornada existencialista e fora da caixa

Após anos mergulhado no longo inferno de desenvolvimento de Hollywood, finalmente chega a hora da Barbie ganhar as telas do cinema em live-action. Certamente um dos brinquedos mais famosos do mundo, a boneca da Mattel ganhou uma infinitude de longas animados ao longo das décadas passadas, mas foi preciso o star power de Margot Robbie e a escolha nada óbvia de Greta Gerwig para dar vida ao projeto - que certamente é fora da caixa.

A história do filme começa na mítica Barbielandia, quando Barbie a vivida por Margot Robbie começa a questionar a artificialidade de seu mundo plástico, levando a uma série de acontecimentos estranhos. Para encontrar a verdade, ela embarca em uma viagem para o mundo real, acompanhada do atrapalhado Ken, vivido por Ryan Gosling.

Desde o início, o projeto de Barbie é literalmente fora da caixa. A ideia de recrutar Greta Gerwig, saída de um início promissor de carreira como diretora após os premiados Lady Bird e Adoráveis Mulheres, e seu marido Noah Baumbach, também elogiado e premiado por obras como História de um Casamento, desde já indica que Barbie não é um filme qualquer; ou uma mera peça publicitária para encher os cofres da Mattel - ainda que essa consequência seja inevitável.

O roteiro assinado por Gerwig e Baumbach é criativo e ousado, trilhando pelo caminho mais sábio ao abordar produtos famosos: a metalinguagem, praticamente seguindo a fórmula brilhantemente aperfeiçoada pela animação Uma Aventura LEGO. Todas as Barbies e Kens são versões reais de suas contrapartidas de brinquedo, garantindo uma imersão na artificialidade proposital de sua terra - garantindo um trabalho fenomenal de design de produção e a fotografia de Rodrigo Prieto - e as performances de seus intérpretes que contribui para o bem pontuado tom de humor do longa - que constantemente está quebrando a quarta parede, fazendo referências a si próprio e até mesmo comentando a indústria cinematográfica; mérito da hilária narração onisciente de Helen Mirren.

Gerwig também bebe da fonte de obras como O Show de Truman e Matrix, ao trazer sua protagonista questionando a realidade e apontando falhas na "perfeição" de seu pequeno mundinho. A referência logo joga Barbie em uma jornada de peixe fora da água, com a protagonista e Ken conhecendo os abusos e contradições do mundo real, com consequências surpreendentes em especial para o personagem de Gosling - que passa por uma reviravolta inusitada ao descobrir que os homens têm poder fora da Barbielândia.

Evitando entrar em spoilers, é uma reviravolta que certamente contribui para os temas abordados em Barbie, mas que podem soar repetitivos e até redundantes em sua abordagem; certamente evidenciando o quão livre Gerwig foi durante o processo de roteiro. Dentro desse núcleo, o humor excessivamente cartunesco também pode incomodar aqueles que não embarcarem 100% na galhofa, já que números musicais exageradamente cafonas podem cansar com o tempo.

Dito isso, Barbie consegue triunfar graças a uma jornada emocional forte e catártica com sua personagem principal. Ainda que dependa de arcos humanos pouco desenvolvidos com a personagem de America Ferrera, a Barbie de Margot Robbie atinge níveis de Toy Story ao atingir sua reta final, garantindo uma excepcional performance da atriz australiana - que combina o melhor de seu carisma explosivo e radiante com uma inesperada carga dramática.

Ainda que imperfeito, Barbie garante uma abordagem original e audaciosa para lidar com bonecos inanimados. Injetando boas referências e uma surpreendente dose de existencialismo, o filme de Greta Gerwig consegue o raro feito de apresentar uma obra absolutamente autoral em meio à maquina de produção hollywoodiana - e financiada por uma empresa de vender brinquedos, ainda por cima.

Barbie (EUA, 2023)

Direção: Greta Gerwig
Roteiro: Greta Gerwig e Noah Baumbach
Elenco: Margot Robbie, Ryan Gosling, America Ferrera,Will Ferrell, Simu Liu, Issa Rae, Emma Mackey, Michael Cera, Kate McKinnon, Kingsley Ben-Adir, Alexandra Shipp, Ncuti Gatwa, Helen Mirren e Rhea Perlman
Gênero: Comédia
Duração: 114 min

https://www.youtube.com/watch?v=4diQ09nsY7E


Crítica | Sobrenatural: A Porta Vermelha é o capítulo mais fraco da franquia

Crítica | Sobrenatural: A Porta Vermelha é o capítulo mais fraco da franquia

Iniciada em 2010 de forma muito modesta pelo diretor James Wan e o roteirista Leigh Whannell, a franquia Sobrenatural é outra lucrativa criação do cinema de terror moderno. Após praticamente inaugurarem o torture porn em Hollywood com Jogos Mortais, a dupla ofereceu um olhar marcante para o clássico subgênero de casa mal assombrada, com um thriller instigante e que gerou uma saga que perdura até hoje.

Após alguns prelúdios e spin offs ao longo dos últimos anos, Wan e a Blumhouse trazem a história de volta para seu núcleo original com Sobrenatural: A Porta Vermelha, que volta a se concentrar na família Lambert, em especial o agora adolescente Dalton, vivido por Ty Simpkins e seu pai Josh, vivido por Patrick Wilson - que também faz sua estreia na direção.

Apesar do bom conceito e da promessa de retornar a saga às origens, o resultado em A Porta Vermelha é fraquíssimo. Nota-se que a ausência de Whannell no roteiro (trabalhando apenas no argumento), carece o longa de algo realmente inovador ou interessante, já que Scott Teems não oferece material o suficiente para desenvolver ou explorar seus personagens. Nenhuma nova característica ou criatura do "Further" é explorada, com apenas o passado misterioso envolvendo o pai de Josh surgindo como novidade.

Mas o grande problema infelizmente é Patrick Wilson. Diretor de primeira viagem, a inexperiência do ator mostra-se um fator realmente incômodo, já que até mesmo as mais simples cenas de diálogo e interação humana falham em provocar emoção, humor ou seriedade. Falta verdade e carisma a cada uma das entregas, onde até mesmo o próprio Wilson não surge com seu carisma e talento habitual, evidenciando que o astro não foi muito eficiente em dirigir a si próprio.

No lado do terror, Wilson faz o possível para simular a linguagem de James Wan, em atmosfera e antecipação, mas não faz muito além de oferecer jump scares baratos e sustos que são facilmente previsíveis. Há uma boa sequência envolvendo um exame de ressonância magnética (tirada diretamente de O Exorcista), mas definitivamente não há um terror forte o suficiente em A Porta Vermelha; além de um triste desperdício da criatura demoníaca vermelha vivida pelo compositor Joseph Bishara.

De longe, o resultado do quinto Sobrenatural se garante como o mais fraco da franquia até agora. O que era para ser uma conclusão digna de uma ótima franquia acaba sendo uma péssima despedida, que praticamente implora para um sexto filme a fim de amarrar melhor as pontas.

Sobrenatural: A Porta Vermelha (Insidious: The Red Door, EUA - 2023)

Direção: Patrick Wilson
Roteiro: Scott Teems
Elenco: Ty Simpkins, Patrick Wilson, Rose Byrne, Sinclair Daniel, Leigh Whannell, Angus Simpson, Lyn Shaye, Joseph Bishara
Gênero: Terror
Duração: 107 min

https://www.youtube.com/watch?v=6qLJdMzNGmM&t=3s