Quando Denis Villeneuve assumiu a gigantesca responsabilidade de adaptar o clássico Duna para as telas, imediatamente teve uma ideia sábia: oferecer 2 filmes para comportar toda a complexidade da obra de Frank Herbert. Se o primeiro era uma longa (e um tanto desequilibrada) introdução ao universo e seus personagens, o épico Duna: Parte Dois é uma expansão ainda mais desafiadora e fascinante.
Com uma história que começa logo após o final do anterior, o novo filme segue acompanhando o jovem Paul Atreides (Timothée Chalamet), que precisa se unir ao povo nômade do deserto do planeta Arrakis, os Fremen, para se converter no grande messias que derrotará os perversos Harkonnen e cumprir uma antiga profecia – que o próprio filme indica ter consequências nada nobres para o restante da galáxia.
Novamente escrito por Villeneuve e Jon Spaihts (agora sem o experiente Eric Roth), Duna: Parte Dois se preocupa mais com emoções e personagens do que o anterior. O romance entre Paul e a jovem Chani (Zendaya, em papel muito mais expansivo) se apresenta como o principal motivador dramático, mas sem um peso tão considerável que justifique as múltiplas cenas mais emotivas entre o casal; Chalamet e Zendaya têm química, mas é um clássico caso de romance abrupto que só acontece por motivos de exigências do roteiro.
Como Villeneuve está adaptando a segunda metade do livro, é difícil tirar a impressão de que Duna: Parte Dois consiste em uma obra sem muita estrutura narrativa: é um longo terceiro ato, com variações estranhas em sua progressão de história. Ao longo dos 160 minutos de projeção, Duna: Parte Dois diversas vezes soa como um amontoado de cenas costuradas, sem muita evolução ou progressão coerente; ainda mais com a exploração de alguns dos conceitos mais esotéricos da obra de Frank Herbert, que forçam o espectador a aprender mais alguns nomes e alegorias religiosas complexas.
Infelizmente, a segunda parte desperdiça também algumas das valiosas adições de elenco: a talentosa Florence Pugh está tão apagada como a Princesa Irulan que faz sua participação em Oppenheimer parecer uma performance central. Já o grande Christopher Walken aparece bem tímido e contido como o temível Imperador, dando a impressão de que o papel poderia ter sido interpretado por qualquer outra pessoa. E se ao menos Léa Seydoux consegue provocar um grande impacto com sua participação reduzida, o carismático Austin Butler surge todo transformado como o maléfico Feyd-Rautha, um dos personagens mais fascinantes do livro, mas cuja caracterização e performance o transformam em um antagonista forçado, exagerado e que diversas vezes me remeteu ao Coringa “atrevido” de Jared Leto em Esquadrão Suicida.
Mas se Villeneuve apresenta algumas questões mais atrapalhadas no texto, o espetáculo técnico e visual de Duna: Parte Dois é de impressionar. Aliando-se mais uma vez ao diretor de fotografia Greig Fraser, Villeneuve oferece alguns dos planos mais deslumbrantes de toda a sua carreira, numa mistura formidável de gravação em locações reais e ótimos efeitos visuais para conceber naves, estações espaciais e grandes vermes de areia. Fraser ainda consegue inovar seu trabalho ao apostar em cenas com fotografia infravermelha (para apresentar o caricato vilão vivido por Austin Butler) e até um criativo efeito alaranjado para representar um eclipse peculiar em Arrakis – muito mais eficiente do que a noite extremamente escura do anterior. Vale também destacar o trabalho sobrenatural de Hans Zimmer com sua trilha sonora absolutamente marcante e original.
Villeneuve também se mostra muito mais à vontade com a ação, que envolve e impressiona muito mais do que as péssimas sequências de luta do anterior. O diretor/co-roteirista também se beneficia de um futuro já escrito, e preenche Duna: Parte Dois de diversos pontos de história que se tornaram mais relevantes no próximo livro de Herbert, O Messias de Duna. Por um lado, isso torna a exploração da clássica trope do Escolhido mais fascinante por flertar com os perigos do fanatismo e da idolatria obsessiva. Por outro, acaba tornando a conclusão da história na inevitável sensação de ser um capítulo do meio.