em ,

Crítica | Fargo – 03×01: The Law of Vacant Places

O Princípio dos Lugares Vagos é um simples método usado para estimar a localização provável de qualquer carta particular nas quatro mãos. Pode ser usado tanto para ajudar em uma decisão na mesa como para derivar toda a tabela de probabilidade de divisão do jogo.

– definição do Wikipedia

Com um ano de hiato para que Noah Hawley pudesse trabalhar em sua fantástica adaptação de Legion, enfim a antologia Fargo retorna para mais uma temporada no FX! Infelizmente, ainda não há sinal de estreia da série no Brasil, que continua ainda sendo aquele tipo de seriado que infelizmente passa batido pela maioria das pessoas. A boa notícia, é que a terceira temporada das sagas criminosas inspiradas no cinema dos irmão Ethan e Joel Coen começa maravilhosamente bem com The Law of Vacant Places.

Seguindo a tradição da série e dos Coen de nos oferecer cenas que aparentemente nada tem a ver com o restante do seriado, começamos com uma misteriosa sequência ambientada na Alemanha Oriental em 1988. Um carrancudo interrogador vivido por Sylvester Groth (de Bastardos Inglórios) espera enquanto um prisioneiro é levado até seu escritório, onde o militar imediatamente o acusa de assassinato. O prisioneiro nega tudo isso, afirmando inclusive que seu nome não está correto, mas acaba cedendo à burocracia quando o interrogador simplesmente afirma que o Estado está correto, e não há nada que ele possa fazer a respeito.

É uma cena no melhor estilo Um Homem Sério, que começava com um prólogo ambientado em uma época passada e narrava um antigo conto judaico, sem qualquer ligação com a história do filme a não ser o tema. Dessa forma, o diálogo na Alemanha Oriental já nos alerta para os perigos da burocracia e a confusão de identidades, além de a divisão da Alemanha pelo Muro de Berlim na época nos trazer um paralelo na Minnesota de 2010 com os irmãos Emmit e Ray Stussy (ambos vividos por Ewan McGregor), que também representam uma família completamente distinta e dividida, além de movida por ideais diferentes. Ray é um modesto agente de condicional que precisa de dinheiro para casar-se com sua namorada, Nikki (Mary Elizabeth Winstead), então ele recorre a seu rico irmão para ajuda financeira.

Quando ele recusa, Ray arma um plano para que um de seus segurados, Maurice (Scoot McNairy) invada a casa de Emmit e roube uam valiosa coleção de selos de carta vintage, uma relíquia que é sua por direito. Fargo sendo Fargo, as coisas saem completamente fora do controle e temos início a uma nova comédia de erros, que ainda inclui a presença de um misterioso visitante vivido por David Thewlis, que aparece para chantagear e ameaçar a empresa de Emmit, e da policial Gloria Burgle (Carrie Coon), mãe solteira e que trabalha para crescer no departamento de polícia de Minnesota.

Escrito e dirigido por Hawley, este foi um episódio que perfeitamente estabeleceu e introduziu uma nova fatia do universo de Fargo. Percebe-se aqui a segurança e calma do diretor em manter o fluxo dinâmico, e ao mesmo tempo calmo do episódio, que divide sua trajetória nos núcleos de Ray, Emmit e Gloria. É a velha tática de nos apresentar núcleos distintos antes do incidente incitante que acaba unindo-os, e isso é muito bem orquestrado quando o nada confiável Maurice confunde os endereços do local onde deveria roubar e acaba ligando a trama do irmão com a da policial de Coon.

Os diálogos seguem com a excentricidade e elegância que já estamos acostumados a receber de Hawley, com o destaque nesse quesito ficando para a estranhíssima aparição do personagem de Thewlis. Com uma óbvia dentadura que lhe oferece dentes podres, o personagem chamado V.M. Varga surge como um coitado perdido e até um tanto estúpido, mas lentamente vai revelando-se uma figura assombrosa e poderosa, com uma excelente brincadeira com o som da palavra investimento. É o núcleo que deixa o maior mistério até então, com Varga clamando que o empréstimo que Emmit fizera de seus empregadores ocultos – representados por um tal Sr. Ehrmentraut – fora convertido em um investimento do mesmo.

A Gloria de Carrie Coon é a nova variação da Marge de Frances McDormand no filme originale da Molly de Allison Tolman na primeira temporada, com a diferença de que temos uma personagem um pouco mais “hands on” no quesito ação, mas igualmente simpática e carismática como suas antecessoras. É o núcleo narrativo menos interessante até agora, mas que ganha mais densidade ao entrar em conflito direto com as ações de Ray, e também pelo background curioso que seu padrasto (Scott Hydlands) parece ter com miniaturas de madeira. É uma sequência que ganhou uma áurea particularmente sombria com a música indiana “Oskus Urug”, de Radik Tülüsh.

Mas todo o destaque vai mesmo para Ewan McGregor. Em uma impressionante performance dupla, o ator é capaz de criar dois personagens completamente distintos em visual e comportamento, variando do tom mais energético e puxa saco de Emmit para a postura mais silenciosa e assustada de Ray.  As interações do ator com o advogado Sty (Michael Stuhlbarg, um ator que os Coen deveriam ter aproveitado novamente) e sua namorada Nikki são fabulosas, com destaque para esta última. Winstead dá vida a uma personagem mais inteligente do que parece, sendo capaz de surpreender com a rapidez de suas decisões – e a crueldade destas – durante os minutos finais do episódio.

Foi um belíssimo começo para este novo ano de Fargo. Surpreendendo pela qualidade de seu roteiro, direção e a riqueza de seus personagens, Noah Hawley promete mais uma comédia de erros original e fora do comum. Tal como o título do episódio, baseado em uma regra do jogo de Bridge e também ligada à Nikki e Ray, a nova temporada promete explodir todas as probabilidades da forma mais precisa possível.

Fargo – 03×01: The Law of Vacant Places

Criado por: Noah Hawley
Direção: Noah Hawley
Roteiro: Noah Hawley
Elenco: Ewan McGregor, Carrie Coon, Mary Elizabeth Winstead, Michael Stuhlbarg, David Thewlis, Scoot McNairy, Scott Hydlands
Emissora: FX
Gênero: Drama, Comédia, Crime
Duração: 65 min

Confira AQUI nosso guia de episódios da temporada.

Avatar

Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Crítica | Samurai Jack – 05×05: XCVI

Crítica | Samurai Jack – 05×06: XCVII