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Crítica | Haunted: Eu Vi – E me arrependi

Em sua expansão ininterrupta de conteúdo original em sua plataforma, a Netflix com certeza acaba apelando. Em uma de suas últimas extravagâncias temos a série Haunted: Eu Vi que traz seis histórias diferentes sobre casos reais extremamente perturbadores adaptados de modo cinematográfico.

Chamando a atenção pela premissa muito focada na venda de que a série retrata a realidade, é absolutamente risível o desleixo que a produtora se permite realizar ao finalizar a obra, pois é muito, mas muito fácil desbancar completamente as histórias que são apresentadas.

A começar, há um detalhe de erro estrutural bastante perverso. Os episódios são constituídos sempre no mesmo formato. O sujeito e alguns colegas que viveram em suas vidas a assombração ou bizarrice na vida real conversam entre si. Conforme a narrativa contada pelo sujeito progride, o espectador encara encenações do que ele viveu em algum momento do passado.

Ao todo, temos seis histórias, uma mais fraca que a outra, sempre partilhando dos mesmíssimos defeitos que detonam a proposta da série. Há de se reconhecer, porém, que, apesar das atuações cartunescas e exageradas, há sim boa qualidade de produção nas encenações que são caprichadas com boa direção de câmera, fotografia, maquiagem e até mesmo efeitos visuais. O que sempre é ilógico nessas adaptações é o clima sombrio e bastante escuro, como se os personagens não tivessem descoberto a energia elétrica.

Do ponto de vista cênico, faz sim sentido para causar alguma apreensão e provocar o suspense – mesmo que esse seja dilatado tão intensamente que a experiência, às vezes, se torna tediosa. O fato é que as encenações poderiam ser desnecessárias, caso o formato fosse melhor pensado. Baseada na verdade, a série funcionaria muito bem como uma antologia de documentários, acompanhando a vida dessas pessoas que, segundo elas, são assombradas em uma frequência quase que diária.

Com manifestações tão intensas, seria, no mínimo, bastante fácil para capturar algum fenômeno sobrenatural com o bom posicionamento de câmeras noturnas, etc. Porém, como isso não ocorre, o espectador é obrigado a trabalhar com a influência da força do discurso dos interlocutores – o que quase sempre não é suficiente.

Essas pessoas vivem sim sob estresse, caso não sejam atores contratados, pois demonstram medo e emoções genuínas em seus relatos bastante incompletos. A produção de Eu Vi, não se preocupa muito em exigir provas e acompanhar momentos decisivos desses relatos com maior apuro ao detalhe.

O caso mais absurdo que evidencia as falhas grotescas do seriado é justamente no segundo episódio. Nele, duas irmãs afirmam que seu pai era um serial killer. Morando afastadas na cidade, o pai trazia suas vítimas e as matava na casa se livrando dos corpos nas florestas da redondeza. Obviamente, para acompanhar o pacote, o indivíduo era um tremendo satanista e invocava demônios que aterrorizavam as crianças. Além disso, a casa foi construída sobre um terreno que era um cemitério indígena (clássico).

Depois de anos aturando as torturas do pai e de testemunhar matanças absurdas, é bastante “compreensível” que as irmãs fossem procurar a Netflix para contar a história de suas vidas que “pouco” deve interessar a polícia da cidade e de outros estados envolvendo casos de desaparecimentos. A família chega ao cúmulo de confessar que são cúmplices ao dizerem que queimaram os souvenires das vítimas que o pai guardava no porão. É simplesmente ridículo.

Os outros episódios seguem a mesma linha trazendo demônios que nunca ferem ou ameaçam a vida de alguém, de fantasmas vingativos de pessoas que se mataram após assassinar toda a família – e ainda assim, cuja história nunca foi publicada em jornal algum, à fumaças demoníacas que desejam transar com adolescente e a uma história de abdução alienígena.

Todos os indivíduos compartilham alguma história de abuso quando crianças, como maus-tratos, traumas diversos ou doenças e, rapidamente e convenientemente, começaram a experimentar assombrações em suas vidas. Não é preciso ser descrente para notar que as histórias mantêm um padrão que fragiliza os relatos das supostas vítimas, além de danificar a imagem da Netflix em explorar pessoas que, provavelmente, não estão bem psicologicamente, remoendo imagens difíceis de suas infâncias e projetando em coisas sobrenaturais.

De todo o modo, Eu Vi é um entretenimento bastante banal com histórias risíveis em sua maior parte. Mesmo com um apelo técnico mais caprichado e com episódios bastante curtos, não creio que valha a pena gastar um tempo precioso consumindo um produto que nem mesmo consegue se manter fiel à sua proposta. Eu vi e agora desejo não ter visto.

Eu Vi (Haunted, EUA – 2018)

Direção: Jim Pavlacky
Roteiro: Robert Campgna
Elenco: Victoria Hogan, Petra Buckova, Oskar Hes
Gênero: Terror, “Documentário”
Duração: 6 episódios de 30 minutos

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Publicado por Matheus Fragata

Editor-geral do Bastidores, formado em Cinema seguindo o sonho de me tornar Diretor de Fotografia. Sou apaixonado por filmes desde que nasci, além de ser fã inveterado do cinema silencioso e do grande mestre Hitchcock. Acredito no cinema contemporâneo, tenho fé em remakes e reboots, aposto em David Fincher e me divirto com as bobagens hollywoodianas.

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