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Crítica | Pobres Criaturas – um conto sobre libertinagem sexual

Yorgos Lanthimos (O Lagosta) não aparece no leque de grandes cineastas da história do cinema, muito menos entre os principais da atualidade. No entanto, é preciso reconhecer que o diretor sabe como chamar a atenção do público com produções bastante polêmicas. Sua nova fase hollywoodiana parece ser mais “leve”, com um trabalho eficiente com com A Favorita (2018) e com o ótimo Pobres Criaturas.

Com uma trama poderosa e com mensagens relevantes, o longa foi indicado em onze categorias ao Oscar 2024, incluindo algumas das mais importantes, como Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Atriz (Emma Stone). Poor Things (nome original) é um filme bizarro em sua essência, sendo sim a obra mais excêntrica do diretor, que anteriormente dirigiu o igualmente bizarro Dentes Caninos (2009).

A trama acompanha a rotina de Bella Baxter (Emma Stone) em sua jornada de autoconhecimento, após ser revivida de maneira tosca pelo Dr. Godwin Baxter (Willem Dafoe) em uma cirurgia bizarra. Nessa nova vida, ela aprende a andar, a falar e a explorar o prazer pelo sexo.

Sexo, Sexo e mais Sexo

O roteiro de Tony McNamara (Cruella), baseado no livro de Alasdair Gray, é um dos mais belos trabalhos experimentados nesta temporada. Não apenas pela mensagem forte e pela beleza ímpar da direção de arte, mas principalmente pela construção narrativa, que é fantástica. Bella é retratada como uma mulher ingênua, o que faz sentido pelo fato de ela ter “nascido” há pouco tempo, apresentando a protagonista descobrindo os prazeres da vida e, principalmente, o interesse sexual.

A questão sexual tem um grande impacto na narrativa, sendo um fator impulsor para desenvolver a personagem e aprofundar a história. É através das sensações sexuais que Bella conhece Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo), que a leva a viajar pelo mundo. A partir disso, por decisão pessoal, Bella tem vários amantes em Paris, sem mencionar sua parada no Egito, onde descobre a miséria e o sofrimento humano pelos quais as pessoas passam naquele local, o que a choca profundamente.

Essa cena em particular, em que Bella vislumbra crianças mortas, funciona como uma chave para que a protagonista, que vive de modo hedonista, desperte de seu transe originado pelo prazer sexual. É como se ela tivesse acordado e aprendido uma enorme lição. 

Na verdade, o que Yorgos quer mostrar é que o mundo está repleto de caos e devastação. Viver seus dias de modo hedonista e escondida, como Bella vivia, onde o Dr. Godwin não a deixava sair de casa e depois vivendo de maneira fútil com Duncan, é apenas uma máscara que faz com que a protagonista viva em um mundo de fantasia, sem desfrutar da realidade externa.

Pode-se dizer, no mínimo, que Poor Things tem o potencial de escandalizar aqueles que não estão acostumados com as obras de Yorgos Lanthimos e filmes com cenas repletas de sexo. As várias – e realmente são várias – situações em que Bella tem relações sexuais funcionam como uma expressão de sua libertação sexual, mas também carregam uma mensagem feminista, destacando que a mulher pode escolher seus parceiros sem a necessidade de submissão a um homem.

Emma Stone, o Oscar é seu

Bella é praticamente uma criança em um corpo de mulher, segredo este que só será desvendado durante a história. Em sua jornada de descoberta, ela se lança ao mundo, onde tudo é novo para ela: o paladar de novos alimentos, a dança, as conversas formais. Essas questões são apresentadas aos poucos, com Lanthimos fazendo algo semelhante ao que já havia feito em Dentes Caninos, que é nos fazer conhecer o mundo através das nossas experiências.

E para interpretar uma Bella que aprende 15 palavras por dia e anda de forma desajeitada, nada melhor e mais óbvio do que a escolha de Emma Stone para o papel. A atriz, que já havia trabalhado com o diretor em “A Favorita”, entrega o tom sarcástico e engraçado que a narrativa necessita. Sua performance traz uma realidade à personagem, transformando-a ao longo do filme de uma garota ingênua para uma mulher objetiva e de pensamentos próprios, e faz isso sem que sua atuação seja superficial ou forçada.

Uma das principais influências na cultura pop é a obra Frankenstein. Entre suas numerosas releituras, destaca-se o trabalho de Lanthimos, que, ao invés de uma simples nova versão, oferece uma protagonista e uma narrativa que funcionam como uma sincera homenagem à obra de Mary Shelley

Os personagens secundários estão igualmente maravilhosos, com um tempo de tela bem definido e cada um possui seu próprio arco dramático, que surge e desaparece da trama no momento certo. O que mais chama a atenção, no entanto, é o humor bem empregado na história. É difícil não se divertir com as várias situações bizarras que envolvem Bella e o libertino Duncan Wedderburn.

Pobres Criaturas é esteticamente lindo, com paisagens fantásticas deslumbrantes que amplificam ainda mais a força da trama. A odisseia de descoberta de Bella pelo mundo é como se fosse um deslumbrante sonho do qual a protagonista está acordando. Sem dúvida, é um dos grandes filmes da temporada.

Pobres Criaturas (Poor Things, EUA – 2023)

Direção: Yorgos Lanthimos
Roteiro: Tony McNamara, Alasdair Gray
Elenco: Emma Stone, Willem Dafoe, Ramy Youssef, Jack Barton, Mark Ruffalo, Kathryn Hunter, Jerrod Carmichael, Vicki Pepperdine
Gênero: Comédia, Drama, Romance
Duração: 141 min

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Publicado por Gabriel Danius

Jornalista e cinéfilo de carteirinha amo nas horas vagas ler, jogar e assistir a jogos de futebol. Amo filmes que acrescentem algo de relevante e tragam uma mensagem interessante.

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