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Crítica | Zona de Interesse é um dos filmes mais chocantes do ano

O que é preciso para chamar a atenção do público ao abordar um tema extremamente pesado e já mostrado e debatido em diversas produções audiovisuais? O tema em questão, no caso, refere-se à Segunda Guerra Mundial, e é evidente que ainda há muito a ser mostrado sobre ele. Zona de Interesse, dirigido por Jonathan Glazer (Sob a Pele), consegue, de forma simples e brutal, apresentar esse cenário de morte e crueldade que ocorreu nos anos 1940 por um outro ângulo. 

Em vez de mostrar execuções, destruição e pilhas de corpos, como puderam ser vistos no impactante A Lista de Schindler (1993) ou no desumano O Pianista (2002), The Zone of Interest (nome original) segue por outro caminho e apresenta a crueldade que foi o holocausto sem mostrar um pingo de sangue ou alguém sendo assassinado – não do modo como vimos nas produções acima listadas. E mesmo assim, sem ser explícito, é bastante chocante.

Uma família vive em uma casa linda, o sonho de qualquer família, com um grande jardim em que as flores florescem belamente e um ambiente em que a família pode se reunir para ler um livro ou até mesmo para as crianças brincarem à luz do dia. Há um porém nisso tudo: o domicílio fica ao lado, com o muro grudado, ao campo de concentração de Auschwitz.

Cerca de um milhão de pessoas morreram nos campos de concentração de Auschwitz e as várias barbaridades cometidas no campo de extermínio já foram mostradas em diversas produções, mas poucas alcançaram o impacto visceral de Zona de Interesse

O roteiro da dupla Martin Amis e Jonathan Glazer desvenda o cotidiano de um oficial nazista em sua residência com a família. A relação com o regime nazista se manifesta em conversas “comuns” sobre o destino dos prisioneiros, o que por si só é um soco no estômago. O oficial fala sobre atrocidades com a mesma naturalidade com que provaria um prato de sopa.

Por não mostrar explicitamente o que acontece no campo de concentração, o filme assume uma abordagem original. A matança desenfreada que ocorre ali é sugerida por elementos sensoriais, como sons de tiros ao longo do dia, chamas irrompendo pela noite e gritos incessantes. Essa estratégia é particularmente assustadora, pois incita a imaginação do espectador e o confronta com o horror de forma profunda e impactante. Ao invés de mostrar a violência de forma direta, o filme trabalha com a experiência sensorial do público, criando um efeito ainda mais perturbador.

Hedwig Höss (Sandra Hüller), esposa do oficial Rudolf Höss (Christian Friedel), demonstra conivência com tudo o que acontece ao lado de seu lar. Uma passagem no filme chama a atenção: Hedwig fica revoltada ao saber que o marido será transferido para outro local, mesmo ele se destacando em sua sádica missão. Essa cena serve como um poderoso símbolo da conivência de grande parte da população alemã com os horrores que se desenrolavam nos campos de concentração, impondo sofrimento a judeus, poloneses e outras etnias.

Em uma primeira análise, a história pode parecer vazia em sua essência, sem aprofundar em debates ou ir além do prometido. No entanto, essa não era a intenção do roteiro. A ideia era questionar a imparcialidade da população frente aos assassinatos na Alemanha nazista, e o longa cumpre esse objetivo de maneira acertada.

Obras sobre a Segunda Guerra Mundial existem aos montes, e a maioria impressiona pela qualidade narrativa e pela trama chocante. Zona de Interesse é parecido com O Filho de Saul (2015) ao deixar implícito o horror da Alemanha Nazista no período retratado. O diferencial do longa dirigido por Glazer reside na abordagem original do tema, sob um ponto de vista singular e de forma crua e realista. Sem dúvida, um dos grandes filmes do ano.

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Publicado por Gabriel Danius

Jornalista e cinéfilo de carteirinha amo nas horas vagas ler, jogar e assistir a jogos de futebol. Amo filmes que acrescentem algo de relevante e tragam uma mensagem interessante.

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