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Análise | Aliens: Colonial Marines

(SPOILERS ADIANTE!)

Aliens: Colonial Marines foi desenvolvido pela Gearbox Studios e publicado pela SEGA em 2013, após o que pareceu ser uma verdadeira odisséia (os estágios iniciais de produção foram anunciados em meados de 2007).

Haveria de se pensar que, com tanto tempo para trabalhar no jogo, a Gearbox entregaria algo digno do panteão dos épicos, como os aclamados títulos de sua série Borderlands. No entanto, para frustração de muitos e desespero de alguns, o resultado nada se parece com a incrível demonstração apresentada na E3 de 2012. O produto final era apenas uma casca do que se viu na feira, senão pior.

Antes de falar de ACM é necessário tomarmos nota de algo:  embora seja um fracasso comercial, a qualidade dele foi amplamente afetada por um âmbito de desenvolvimento conturbado, trocando de mãos diversas vezes. Embora as histórias estejam majoritariamente sustendas em rumores, o impacto no jogo é muito perceptível.

Fracasso ou não, ACM é  considerado parte oficial da franquia de Ridley Scott e se passa 17 semanas após os acontecimentos de Aliens, O Resgate. A premissa é básica (e deveras clichê): a nave militar USS Sephora é despachada para investigar o pedido de socorro da USS Sulaco, que está orbitando o planeta LV – 426, local dos eventos ocorridos em Aliens.

BONECOS DE CERA

O protagonista é o cabo Christopher Winter, parte da força tarefa de procura e resgate designada para investigar a Sulaco. Após uma breve cutscene repleta de testosterona e um resumo da missão, o jogador é subitamente arremessado no jogo. Não há qualquer aproximação gradual à aprendizagem das mecânicas – não que elas sejam muitas – e já se pode sair atirando granadas nas paredes (no meu caso, no próprio pé, achando que “F” era o atalho para a lanterna).

É importante destacar que não há qualquer tentativa de explorar a personagem de Winter; ele é simplesmente designado para ser o avator do jogador e é isso aí. Nada de pano de fundo, melhores amigos ou família, nem mesmo um gato. Passa-se o jogo inteiro na pele de um fuzileiro qualquer.

De imediato nota-se o estado sofrível da qualidade gráfica: mesmo após patches de correção visual de 5 GBs, os modelos e animações são mecânicos e não transpiram qualquer tipo de emoção; um grande contraste com a excelente qualidade de dublagem dos personagens, talvez uma das poucas virtudes do game.

Apesar disso, o diálogo é tosco, entediante e repleto de chavões militares utilizados em vão na tentativa de criar algum tipo de atmosfera ou humor que sustente o vazio da narrativa. O bordão do jogo, repetido à exaustão é “nunca deixamos fuzileiros para trás”.

OS ALIENS ATACAM (OU  TENTAM)

Talvez devêssemos, de fato, deixar os fuzileiros para trás. As poucas funções delegadas às CPUS que acompanham o jogador são frequentemente mal executadas (SE forem executadas). Os “companheiros” de equipe tem o péssimo hábito de, por vezes, ignorar as hordas de xenomorfos que disparam em nossa direção e ficam parados contemplando o teto enquanto o jogador vira picadinho.

Outrora pensaríamos que isso é apenas uma tentativa frívola e indiscreta de aumentar a dificuldade artificialmente, mas, não, não é. A deplorável IA do jogo é de longe a pior característica.

Conhecidos nos filmes por empregarem táticas furtivas e de ataques em grupo com grau razoavelmente elevado de estratégia, os xenos em ACM preferem correr em linha reta até o jogador numa tentativa suicida de acertar pelo menos um ataque, falhando miseravelmente devido ao suprimento aparentemente infinito de cartuchos do imenso arsenal carregado por Winter e seus colegas. Também é muito comum os aliens prenderem-se em algum pedaço do terreno ou simplesmente ficarem parados no meio da fase enquanto levam chumbo.

Essa situação se agrava pois a IA inimiga prioriza atacar o jogador ao invés dos bots a não ser que ele esteja bem longe. Se quem está jogando se mantiver suficientemente afastado, poderá matar todos os aliens em segurança enquanto seus aliados servem de escudo de carne.

Ainda por cima, as CPUs são invulneráveis. Se forem “derrotados”, ficarão deitados no chão até que a área seja completamente expurgada de inimigos, mas continuam sendo alvos válidos para a IA dos aliens. Isso gera um exploit grave, no qual o jogador pode  matar oponentes em espaços abertos à vontade enquanto o pelotão ferido barra todos os ataques.

A IA dos soldados da Weyland Yutani não é muito melhor e faz com que eles procurem cobertura na frente do jogador, literalmente dando as costas para nós numa tragicômica tentativa de se protegerem.

DETECTAMOS UM MONTE DE NADA

Uma das mecânicas centrais envolve a utilização do icônico motion tracker. O jogador pode erguer seu rastreador com a tecla “Q” a fim de detectar inimigos, aliados, objetivos, etc. Embora funcional e interessante, o dispositivo é praticamente inútil, outra adição supérflua que se enquadra no quesito “fan service”.

O simples fato de que não se pode atirar e rastrear ao mesmo tempo reduz drasticamente a utilidade do aparelho, pois o ritmo veloz do jogo raramente permite uma análise propícia dos arredores. Ainda assim não é necessário saber a posição dos inimigos, pois eles invariavelmente fazem ataques frontais. Enfim.

O jogo possui dois tipos de coletáveis que podem ser encontrados nas fases: plaquetas de identificação e registros de áudio. Caçar extras pelos cenários é uma tradição bem conhecida e antiga no mundo dos games, como em Megaman X, Bioshock, Duke Nukem, entre outros.

ACM falha até mesmo nesse aspecto. A grande razão de procurarmos segredos em jogos é, em geral, a satisfação de encontrá-los, achando caminhos alternativos, alavancas e outros meios para então sermos recompensados com partes ocultas da história, easter eggs, itens, habilidades, etc.

Talvez uma das escolhas de design mais contraditórias do jogo, porém menos influentes no gameplay, é que os extras podem ser rastreados pelo sensor de movimento, fazendo com que as já limitadas razões para exploração dos níveis ficassem ainda menos relevantes.

SIGA EM FRENTE, OLHE PARA FRENTE

Falando-se em níveis, o level design é muito mal aproveitado. As fases não contém quase nada, exceto alguns extras, pick ups de vida,  armadura e, dependendo da fase, “armas lendárias”, as quais são versões melhoradas (leia-se: redundantes) de algumas das armas do jogo e que pertenciam ao elenco de fuzileiros do segundo filme.

Embora a composição visual dos estágios seja bem trabalhada, o tamanho exagerado deles, aliado à linearidade atordoante acabam por lembrar os cenários de Final Fantasy XIII, enormes corredores isentos de ambientes complementares para os jogadores explorarem.

Conforme o jogador derrota inimigos, ele ganha pontos de experiência e eventualmente sobe de patente, ganhando uma incrementação de arsenal por nível, a qual serve como moeda para comprar melhorias para armas. Ao atingir certas patentes ele destrava ainda mais armamentos e melhorias para eles.

A maioria desses upgrades é redundante ou inútil; silenciadores nunca verão a luz do dia já que não há segmentos de ação furtiva real por causa da acuidade de detecção dos inimigos; outros, como lança granadas, escopetas acopladas e miras laser são bons, mas encontrados em praticamente todo o arsenal, descaracterizando a maior parte dele e conferindo um aspecto de shooter genérico ao jogo (o que ele é).

Por mais estranho que soe, os armamentos futurísticos de ACM são extremamente imprecisos. O rifle de assaulto, por exemplo, quase nunca acerta o alvo, mesmo com disparos em rajada, por conta das doses homeopáticas de recuo que possui. Além disso, a mira tem um balanço  terrível, que não ameniza nem quando Winter está agaichado, resultando em uma tremenda dor de cabeça para alvejar os oponentes, estejam eles próximos ou distantes.

Essa é apenas uma das muitas contradições que o game apresenta. A maior delas está calcada no fato de que ACM é um jogo de Aliens que raríssimamente nos faz sentir vulneráveis. E esse é o ponto em que a experiência degrada de verdade. Com tantos armamentos, dispositivos, companheiros imortais e péssima IA, é fácil percorrer o jogo sem sequer sentir-se ameaçado. A sensação persistente de que algo está nos espreitando e de perigo iminente é a marca registrada dos xenomorfos da franquia Alien, mas isso sequer ocorre em Colonial Marines. Deve-se apenas seguir em frente, atropelando qualquer coisa que se mova.

NOSTALGIA

Para ser justo, o jogo tem seus momentos de glória, por mais breves que sejam. E quase todos são puro fan service! Além da caracterização extremamente fiel ao filme, no que diz respeito aos equipamentos, cenários, etc, é possível encontrar vestígios dos acontecimentos. No hangar da Sulaco, por exemplo, jogadores encontrarão a metade inferior de Bishop.

Na fase No Hope in Hadleys o jogador pode revisitar a colônia que serviu de bastião para os fuzileiros desafortunados de Aliens, completamente recriada, com o infame corredor barricado e com duas torres automáticas, o centro de operações e os laboratórios. Apesar dos gráficos serem muito inferiores ao que se esperaria de um triple A de 2013, a fidelidade estética impressiona.

A quinta missão, The Raven, é possivelmente a que mais se aproxima de uma atmosfera de terror e, ao meu ver, a melhor. Nela, Winter está completamente desarmado e deve esgueirar-se pelos esgotos de Hadleys Hope evitando os boilers, xenos cegos que se movem esporadicamente e correm até fontes de som para então explodir-se. É um estágio que tem um bom acúmulo de tensão e ótima composição de nível, utilizando corredores sombrios com luzes intermitentes e “cascas” de boilers já expirados que são aterrorizantes. É possível, inclusive, encontrar a boneca de Newt!

No entanto, nem todo o fan service do mundo pode remediar o que talvez seja um dos maiores tropeços na história dos jogos em termos de ritmo de gameplay. E isso se deve a uma boss fight que beira a imbecilidade.

MAMÃE

Após muitos tiroteios e enrolação, o jogador deve enfrentar a Alien Queen, o zênite da hierarquia alienígena. Haveria de se esperar que a batalha contra a rainha fosse utilizar todas as mecânicas já implementadas, o vasto arsenal e esquadrão de fuzileiros. Eu honestamente tinha esperanças de que um último, épico duelo contra o espécime mais poderoso pudesse dar um pouco de brilho a um jogo tão opaco. Porém.

O confronto final é entregue no formato de puzzle. A esperada batalha contra a rainha não aproveita absolutamente nada do pouco que foi apresentado no jogo. Não há uso de power loaders, combate em grupo, exploração de pontos fracos, motion tracker, nada.

Winter deve simplesmente correr sozinho pelo hangar de uma nave FTL (faster than light) enquanto ativa alavancas que gradualmente armam uma plataforma. A rainha fica confinada a uma área no centro na qual estão as ditas alavancas, mas os espaços ao redor da arena são inalcançáveis para a criatura. Não é necessário nem mesmo levar um golpe do monstro para terminar a luta.

Ao atrair a rainha alienígena para cima da plataforma armada, basta apertar um botão para ejetá-la para fora do local, como se ela nunca estivesse ali. E é isso. Após “vencer”, há uma curta cinemática na qual ocorre um dos suprassumos dos clichês: a rainha, na realidade, não caiu. Ela consegue se agarrar ao chão da FTL e volta para o hangar. O comandante Cruz, em um último esforço heróico (e mais clichê ainda) utiliza a pequena nave na qual está preso para se jogar junto com a rainha de volta ao planeta, matando ambos na queda.

A “batalha” contra a rainha não faz  o menor sentido, como grande parte do jogo, é uma quebra de ritmo injustificável e a definição de anticlimático. Sem contar que inutiliza todo o trabalho de ganhar patentes e melhorar o arsenal, já que a criatura não pode ser ferida por meios convencionais.

NÃO, OBRIGADO

O que mais impressiona no jogo não é a quantidade anômala de escolhas duvidosas de design ou a péssima implementação delas: é o que falta. ACM é um antro de bugs com execução pífia e imaginação paupérrima, mas a ultra simplicidade mecânica é o que torna-o monótono e desinteressante. Os modelos e animações de personagem apenas retificam essa percepção e afastam ainda mais a atenção do jogador de uma trama já notoriamente rasa.

No início, Aliens: Colonial Marines até consegue ser fresco e divertido. Só que as raras vezes em que acerta em suas escolhas – como o fan service e dublagem impecáveis – rapidamente são ofuscadas pela avalanche de problemas e inconsistências apresentadas e um gameplay extremamente enfadonho e repetitivo. ACM teve potencial para ser o melhor jogo da franquia, e o fator primário para sua destruição pelos críticos e fãs foi justamente a disparidade de qualidade entre promessas e o produto entregue.

Aos fãs da saga Alien: se seu objetivo é uma experiência imersiva, de altíssima fidelidade aos filmes e narrativa envolvente, não percam tempo e adquiram Alien: Isolation.

Aliens: Colonial Marines (Idem, EUA – 2013)

Desenvolvedora: Gearbox Studios, Time Gate Studios, Demiurge Studios, CheckSix Games e Nerve Software
Publisher: SEGA
Gênero: FPP – Fracasso em Primeira Pessoa
Data de lançamento: 11 de fevereiro de 2013
Plataformas: Microsoft Windows, Ps3 e Xbox 360.

Texto escrito por Bruno Ribeiro de Mello

Redação Bastidores

Publicado por Redação Bastidores

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