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Crítica | Venom – Nasce um novo ícone trash

Quando se trata em sua relação com o universo do Homem-Aranha, a Sony tem mais erros do que acertos. A trilogia comandada por Sam Raimi e estrelada por Tobey Maguire ainda se mantém como a obra definitiva do personagem, enquanto tudo o que a versão de Tom Holland apresenta de melhor provavelmente é fruto do envolvimento de Kevin Feige e a Marvel Studios. Quando tiramos isso, temos o reboot fracassado com Andrew Garfield em O Espetacular Homem-Aranha, os projetos cancelados do Sexteto Sinistro e agora a nova ideia de um universo compartilhado de personagens do herói.

É uma ideia que, por si só, já parece errada e não inspira confiança, da mesma forma que a Universal Pictures quebrou a cara com o desastroso Dark Universe e o reboot pavoroso de A Múmia. Ainda com planos para lançar um filme do vampiro Morbius com Jared Leto, um filme das ano-heroínas Gata Negra e Silver Sable e até mesmo do caçador Kraven, a tarefa de dar esse pontapé fica com Venom, marcando o primeiro filme solo do herói.

A julgar pelo resultado, a Sony certamente produziu algo que é divertido, mas pelos motivos errados, e que não botam confiança na equipe envolvida para novos derivados.

A Sina do Anti-Herói

A trama nos leva para a cidade de São Francisco, onde Eddie Brock (Tom Hardy) trabalha como repórter investigativo para uma emissora local. Um de seus mais recentes furos jornalísticos envolve investigar a Fundação Vida, laboratório chefiado pelo ambicioso Carlton Drake (Riz Ahmed), que faz experimentos com uma estranha substância alienígena conhecida como simbionte. Quando Eddie invade o laboratório atrás de evidências, ele é contaminado por uma das amostras que o transforma no monstruoso Venom. 

Originalmente criado como vilão do Aranha nos quadrinhos, Venom ganha o tratamento do anti-herói aqui. Mesmo que seja um status onde o personagem já tenha sido retratado nos quadrinhos, é no mínimo desafiador conseguir tornar um ser alienígena devorador de humanos como uma figura protagonista capaz de gerar empatia, e muito menos heroísmo, sendo mais representativo da Sony Pictures em tentar encontrar um herói para iniciar mais um novo universo cinematográfico.

Não é uma tarefa bem sucedida pelo quarteto de roteiristas formado por Scott Rosenberg, Jeff Pinkner, Will Beall e Kelly Marcel, que até são bem sucedidos em conseguir isolar a história da presença do Homem-Aranha, trazendo muita inspiração de obras de ficção científica como O Enigma do Outro do Mundo e O Dia em que a Terra Parou em seu primeiro ato (muito dependente, também, da trilha sonora inspirada de Ludwig Goransson, que funciona como estrutura, mas que falha ao gerar qualquer interesse com seus personagens genéricos ou a mitologia que é explorada de forma rasa, definição que é generosa para o péssimo antagonista formado por Riz Ahmed; isso pra não falar do “plano secreto”dos simbiontes…

Potencial cômico

Não é um bom roteiro, o que acaba resultando em um filme medíocre e muito abaixo do nível que o gênero veio alcançando nos últimos anos. Porém, com tanto caos e decisões absurdas, é perfeitamente passar a admirar Venom como uma experiência acidentalmente trash. Juntando-se à Batman & Robin e Motoqueiro Fantasma: O Espírito da Vingança como obras de qualidade duvidosa, mas com incrível potencial para entreter e provocar o riso descontrolado, o filme de Ruben Fleischer acaba se saindo surpreendentemente bem.

O histórico do diretor com comédia (ele dirigiu o fantástico Zumbilândia) certamente veio a calhar, já que diversos momentos do filme funcionam justamente por sua carga cômica – seja em cenas mais calculadas para atingir o riso, como quando Eddie se recusa a pular de um prédio na forma ide Venom, com um corte seco para o protagonista esperando o elevador, como em curiosos momentos inusitados; vide o enquadramento que inesperadamente se vira para a reação preocupada de um dos empregados de Drake em seu laboratório. É rodada como uma cena séria e dramática, mas que torna-se hilária graças ao contexto e os absurdos enunciados por Drake.

E nem vou comentar as ideias ridículas que envolvem a “possessão” do simbionte em outros organismos senão Brock, rendendo coisas que eu pessoalmente nunca achei que veria em uma tela de cinema na vida – muito menos protagonizadas por Michelle Williams, que vive a namorada do protagonista. E, no que diz respeito à curiosidade mórbida, fico feliz que Venom tenha tido coragem de apostar em algo tão ousado e ridículo.

As Loucuras de Tom Hardy

Mas se há um elemento que definitivamente torna a visita bem-vinda, é Tom Hardy. O ator está completamente alinhado com essa veia trash cômica, mas tudo o que o ator faz parece ser intencional, desde seu andar engraçado até seus ataques de histeria e desespero quando começa a interagir com a voz do simbionte. É uma performance exagerada e diferente de tudo o que já vimos o ator fazer, e que garante risadas genuínas e muita energia para o filme, que também revela o vislumbre de uma oportunidade perdida em realizar uma série adaptação de O Médico e o Monstro com o ator. Hardy é tão divertido que o monstrão em CGI de Venom nem é necessário para nos manter entretido, até porque a criação digital deixa a desejar – assim como todas as interações entre os simbiontes e personagens humanos.

Por falar nessa área, a ação do filme sofre com a abundância de efeitos digitais simplesmente incompreensíveis. É até possível admirar a mise en scene moderadamente inventiva de Fleischer durante cenas em que ainda temos elementos live action em evidência, como a perseguição de moto pelas descidas íngremes de São Francisco, mas quando temos Venom e Riot se espancando através de uma ponte – em um ambiente completamente digital – não é nada além de meleca se espatifando, em um efeito similar à carnificina metálica de Michael Bay em seus filmes de Transformers.

Um bom filme ruim

Venom é mais uma adição ao catálogo podre de produções da Sony para o universo da Marvel nos cinemas. É um filme mal desenvolvido e completamente perdido em suas intenções, mas que acaba revelando-se como um passatempo precioso e genuinamente divertido graças à seu absurdo e humor acidental, que automaticamente acabam colocando-o no status de um trash. O tempo pode fazer muito a favor do filme de Ruben Fleischer, mas fãs do anti-herói certamente ficarão decepcionados. 

Entre um genérico seguro e esquecível como Homem-Formiga e a Vespa e algo completamente caótico e errado como Venom, eu definitivamente escolho Tom Hardy surtando dentro de um tanque de lagostas.

Venom (EUA, 2018)

Direção: Ruben Fleischer
Roteiro: Scott Rosenberg, Jeff Pinkner, Will Beall e Kelly Marcel, baseado nos personagens da Marvel Comics
Elenco: Tom Hardy, Michelle Williams, Riz Ahmed, Jenny Slate, Woody Harrelson, Reid Scott, Michelle Lee, Scott Haze, Sope Aluko
Gênero: Ação
Duração: 112 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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