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Crítica | Os Incríveis 2 – Continuação arrisca pouco e repete fórmula do original

Ao longo de toda a a trajetória da Pixar nos cinemas, foram poucos os casos em que um de seus projetos gritava por uma continuação. Não precisávamos necessariamente de um prequel para Monstros S.A., uma continuação para Procurando Nemo e definitivamente ninguém – além de fabricantes de brinquedo – implorou por toda uma trilogia de Carros. Porém, ao lado dos bem sucedidos exemplares de Toy Story, Os Incríveis era o filme mais merecedor de uma expansão daquele universo maravilhoso, que ainda permanece uma das três melhores produções sobre super-heróis já realizadas.

Dessa forma, 14 anos após a conclusão aberta do primeiro filme, Os Incríveis 2 finalmente chega aos cinemas. Se por um lado é gratificante reencontrar essas figuras tão carismáticas e satisfazer nossas imensas doses de nostalgia, é de uma tremenda decepção observar a queda na qualidade de Brad Bird, que joga no seguro e entrega exatamente o mesmo filme de antes – mas sem o sentimento de surpresa ou magia.

A trama começa imediatamente após o final do anterior, com a família Parr se preparando para enfrentar o vilão Escavador (John Ratzenberg). Após uma demonstração de heroísmo seguida por inevitáveis danos ao espaço público, o empresário Winston Deavor (Bob Odenkirk) e sua irmã Evelyn (Catherine Keener) elaboram uma estratégia para limpar a imagem dos heróis e tornar sua presença legal novamente. Mas para a surpresa de todos, os Wilson optam por concentrar a campanha na Mulher-Elástica (Holly Hunter), por ver sua atuação como a “menos catastrófica” em termos de preservação do espaço, o que deixa o Sr. Incrível (Craig T. Nelson) na função de cuidar da casa e das crianças, Flecha (Huck Milner), Violeta (Sarah Vowell) e do bebê Zezé (Eli Fucile); agora manifestando seus imprevisíveis super-poderes.

Síndrome do remake

No intervalo de tempo que separa os dois filmes de Os Incríveis, o gênero de super-heróis passou por mudanças significativas. O mundo se rendeu aos Vingadores, universos compartilhados e super-heróis para adultos, e era de se esperar que Bird se adequasse a essas transformações – mesmo que seu filme estivesse um pouco a frente de seu tempo, em 2004. Agora, muito pouco parece ter mudado. Seu roteiro apresenta absolutamente a mesma estrutura e as mesmas reviravoltas do anterior, apenas trocando o gênero do protagonista de forma a dar uma representatividade feminina maior à Mulher-Elástica (único ponto do texto que mostra-se relevante atualmente), mas sem muito esforço. Se no original todo o arco do Sr. Incrível era sobre reacender a chama do passado e encontrar o valor real na união de sua família – e não no combate ao crime, especificamente – tudo o que ocorre com Helen não traz desenvolvimento algum.

Enquanto isso na casa dos Parr, a situação é um pouco mais divertida. Mesmo que seja uma clara exploração do subgênero cômico do paizão dono de casa, Bird se diverte com a interação do parrudo Sr. Incrível e os problemas do mundano, desde ensinar matemática a Flecha ou ajudar Violenta com desilusões amorosas em sua fase adolescente. É onde, além do humor realmente eficiente com as habilidades de Zezé, Bird é capaz de trazer algum arco emocional mais forte, especialmente com Robert se conectando com Violeta, que acaba ganhando mais destaque nesse arco coadjuvante – mesmo que signifique reduzir Flecha a um mero acessório e alívio cômico.

E se um filme de super-herói só é tão bom quanto seu vilão, temos sorte que Os Incríveis 2 seja acima da média. Sem entrar em detalhes muito específicos (mas qualquer um que possa somar 2+2 vai sacar previsível sua reviravolta), a figura misteriosa batizada de O Hipnotizador é reminiscente dos piores vilões da Marvel Studios, apresentando uma justificativa sem sentido e contraditória. Se compararmos com o Síndrome do primeiro filme, sua motivação está diretamente ligada à sua experiência pessoal com o protagonista, e oferece uma inversão inteligente para suas motivações. E ainda que não exatamente no campo antagonista, temos um grupo de novos super-heróis que se mostram desinteressantes e genéricos – tanto em seu visual quanto personalidade.

Motor Gráfico

Quando entramos em quesitos técnicos, era evidente que Os Incríveis 2 seria um aprimoramento gigantesco em relação ao primeiro. A animação em 3D está mais refinada, e a fotografia virtual atinge níveis espetaculares, seja pelas tomadas noturnas que captam os desenhos de luz e sombra com verdadeira precisão cinematográfica, até os momentos mais oníricos, como o deslumbrante confronto entre Mulher-Elástica e Hipnotizador em uma sala com telas psicodélicas (imagine este pôster de O Grande Truque como o cenário), rendendo uma experiência visual que é realmente diferente de tudo o que já vimos em animações. A maneira como os poderes são ilustrados também é muito mais rica, com destaque especial para as distintas calibrações dos jatos congelantes de Gelado (Samuel L. Jackson, sempre divertido) e os portais

Ainda nesse quesito, Bird mostra que ainda sabe como visualizar e dirigir ação. Voltando a um mundo sem limites após suas experiências no live action com Missão: Impossível – Protocolo Fantasma e Tomorrowland, o domínio do diretor é invejável. A combinação dos heróis usando seus poderes é criativa em um nível que apenas Bryan Singer e Sam Raimi conseguiram atingir, e ainda ganha créditos por manter a bem-humorada dinâmica familiar durante o primeiro confronto. Em sequências isoladas, a forma como transforma o corpo da Mulher-Elástica em diferentes formas e texturas durante a ação e a criatividade no uso dos portais da personagem Voyd (Sophia Bush), que brincam com a geografia espacial magistralmente, são apenas alguns exemplos da condução irrefreável do diretor. E, claro, nenhuma dessas sequências seria tão inspirada se não fosse a ótima trilha sonora de Michael Giacchino, que oferece novos acordes para sua vibrante e heroica orquestra de jazz.

Jogo seguro

Os Incríveis 2 é um filme divertido e que tem momentos empolgantes, mas era de se esperar algo mais corajoso após 14 anos de espera. Brad Bird joga muito no seguro e repete a estrutura do primeiro filme quase que integralmente, nos passando a sensação de que nada realmente mudou ou evoluiu de um longa para outro, algo muito evidenciado na tomada final da animação. Faltou muito para chegar no incrível.

Os Incríveis 2 (Incredibles 2, EUA – 2018)

Direção: Brad Bird
Roteiro: Brad Bird
Elenco: Craig T. Nelson, Holly Hunter, Samuel L. Jackson, Bob Odenkirk, Catherine Keener, Sarah Vowell, Huck Milner, Eli Fucile, Sophia Bush, Isabella Rossellini, Jonathan Banks, John Ratzenberg, Brad Bird
Gênero: Aventura, Ação
Duração: 118 min

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Publicado por Lucas Nascimento

Estudante de audiovisual e apaixonado por cinema, usa este como grande professor e sonha em tornar seus sonhos realidade ou pelo menos se divertir na longa estrada da vida. De blockbusters a filmes de arte, aprecia o estilo e o trabalho de cineastas, atores e roteiristas, dos quais Stanley Kubrick e Alfred Hitchcock servem como maiores inspirações. Testemunhem, e nos encontramos em Valhalla.

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