Crítica | Além da Imaginação : 1ª Temporada - O tropeço de Jordan Peele
Uma série se torna um clássico, geralmente, por trazer algo de original ou de inovador em um cenário em que produções não conseguem mais trazer nada de novo em relação ao que se tem feito. Foi exatamente isso que aconteceu quando Além da Imaginação (The Twilight Zone nome original) foi lançado em 1959, com Rod Sterling no comando e tendo um ótimo roteiro e temas excêntricos sendo apresentados ao telespectador, algo que na época foi tido como diferente por fazer o que antes era possível de assistir apenas no cinema, e que na TV ainda não havia sido transmitido com tamanha qualidade narrativa.
E é justamente pensando nessa questão da qualidade que Além da Imaginação ganhou um novo reboot nas telas, agora com Jordan Peele (Corra!) a frente do show, e tentando trazer para o público atual as histórias surpreendentes e bizarras envolvendo as mais diversas situações. O principal problema desta temporada está em relação a tentar fazer algo de surpreendente e inusitado a respeito de temas que pautam a sociedade, isso utilizando a estrutura narrativa das temporadas passadas, ou seja, Jordan Peele, e o grupo de roteiristas, se prende demais no estilo dos anteriores, no jeito de se fazer a narração, de contar a história, e até mesmo na tentativa de criar uma atmosfera de suspense, mas nada disso funciona, pois essa preocupação, por parte do roteiro, em não sair do formato acaba por deixar a trama menos inovadora e menos atraente para o telespectador.
O que pode ser presenciado neste novo capítulo de Twilight Zone é a obrigatoriedade em ter que colocar alguma mensagem relevante a cada episódio.Tal fato acaba deixando o roteiro óbvio e sem criatividade em abordar algo que realmente importe, pois essas mensagens não são aprofundadas, e o debate acaba se tornando superficial em muitos momentos. Sempre que um capítulo começa a ficar interessante, termina com a mensagem sendo passada pela metade, o que dá uma sensação de decepção ao terminar de assistir.
Pegue como exemplo o episódio The Blue Scorpion, em que a ideia é debater o cenário atual americano sobre a liberação das armas de fogo para a população, a questão não é debatida, está ali apenas para mostrar como as armas são maléficas, tornando a trama fraca em sua abordagem e tirando o foco da ação dos acontecimentos envolvendo o personagem. Em Point of Origin também há uma tentativa em dialogar a respeito dos campos de refugiados e como essas pessoas são tratadas, mas outra vez o tema importante se esvai, acaba ficando na mesmice de sempre, sem nada de relevante sendo discutido, e com uma mensagem que era para ser impactante, e que por fim se torna monótona.
O mistério e o suspense são situações que andam lado a lado no reboot. Há alguns momentos em que o roteiro tenta criar uma atmosfera de terror psicológico mesclado ao suspense, mas em muitos episódios isso não funciona, como em Not All Men, em que os homens se tornam os vilões por se tornarem violentos, a situação até que é interessante, mas logo todo o ar de terror vai embora com o andamento da trama. Em Replay, em que a questão racial americana é discutida, com um policial perseguindo uma mulher e seu filho, é criativo e lembra bastante Black Mirror, mas peca pela falta de ambição em se fazer algo mais focado no suspense. Outros episódios ficam tão presos em querer colocar um mistério onde não existe que deixa tudo sem peso ao final de cada história, isso ocorreu principalmente em A Traveler e Blurryman, esse segundo é uma homenagem ao o que a série Além da Imaginação representa, mas somente quem assistiu as temporada de 1959 irá entendera referência.
Outro fato que atrapalha bastante Twilight Zone é a obrigatoriedade em surpreender e revelar algo extremamente grandioso ao fim de cada episódio, que é mais uma prova de que estavam mais preocupados em manter o formato original de realmente criar algo diferente e inovador. Os capítulos mais fracos, de longe, são aqueles que justamente os diretores, alinhados ao roteiro, tentam colocar um terror psicológico que não funciona, casos de The Comedian, Blurryman e A Traveler, que trazem boas ideias, mas que foram pessimamente executados ao longo da trama, algo no roteiro deixa de funcionar pelo caminho, e isso tem muito a ver com o jeito com que a narrativa é tocada, com um fato sendo apresentado de início, cortando para uma narração de Jordan Peele e depois com uma tentativa de desdobramento que seja impactante, que esteja a altura não apenas de Além da Imaginação, mas também de Jordan Peele, isso é algo que atrapalhou bastante o andamento e finalização de cada história.
O público de hoje em dia assiste a cada episódio de uma série com aquele entusiasmo e atenção criado, possivelmente, pelo fato da produção (no caso de Além da Imaginação) já ter um nome a zelar e por ter Jordan Peele como uma das cabeças pensantes da série. Porém, em uma época em que Black Mirror se tornou referência para o telespectador quando o assunto diz respeito a mensagem relevante que se quer passar para a sociedade, alinhado a um final surpreendente, que faz Além da Imaginação ser obrigado a superar a antologia sobre tecnologia da Netflix, isso pode ser visto no jeito com que a trama é trabalhada. Cada diretor criou o seu ambiente diferente para contar as histórias de cada episódio, mas fica evidente que tentaram fazer uma mescla, em relação a narrativa, das séries antigas de Além da Imaginação com o jeito com que Black Mirror toca a trama.
Há boas intenções em Além da Imaginação, e nem tudo é de se jogar fora. A estrutura criada para estes capítulos, provavelmente, será utilizada para construir as tramas da segunda temporada. Jordan Peele, mesmo sem ter dirigido nenhum episódio, mas tendo trabalhado no roteiro de todos, tem boas idéias, mas erra ao não saber direito qual tom que quer dar para a narrativa. O reboot de Além da Imaginação não será lembrado daqui alguns anos como um clássico, e sim como uma série bastante esquecível por ter errado em não saber como dialogar da maneira certa com o público e nem de que forma levar a história adiante de uma maneira satisfatória. É uma pena, pois havia grande potencial para ser uma excelente temporada, coisa que acabou não acontecendo.
Além da Imaginação (Twilight Zone, EUA – 2019)
Criado por: Rod Serling
Direção: Ana Lily Amirpour, Christina Choe, Owen Harris, Mathias Herndl, Simon Kinberg, Craig William Macneill, Gerard McMurray, Richard Shepard, Jakob Verbruggen, Greg Yaitanes
Roteiro: Simon Kinberg, Jordan Peele, Marco Ramirez, Rod Serling, Glen Morgan, Heather Anne Campbell, Alex Rubens, John Griffin, Andrew Guest, Selwyn Seyfu Hinds, Richard Matheson
Elenco: Jordan Peele, David Epstein, Shalyn Ferdinand, Zazie Beetz, John Cho, Taissa Farmiga, Ginnifer Goodwin, Sanaa Lathan, Kumail Nanjiani, Chris O'Dowd, Adam Scott, DeWanda Wise, Steven Yeun, Chris Diamantopoulos, Lucinda Dryzek, James Frain, Betty Gabriel, Jacob Tremblay, Patrick Gallagher, Seth Rogen
Emissora: CBS
Episódios: 10
Gênero: Drama, Fantasia, Horror
Duração: 45 min. aprox.
https://www.youtube.com/watch?v=29_gA_GDGvE
Crítica | Meu Amigo Enzo - Uma trama que não emociona
Se há um gênero que não fica saturado com tamanha oferta de filmes sobre o assunto, esse é o do segmento de filmes com cachorros. Produções deste tipo cativa o público por trazer um personagem que quase todos amam adorar, que são os cães. Muitas vezes foram colocados em filmes de comédia ou aventura para dar maior força para a trama e empolgar a quem assiste, mas nos últimos anos vem ganhando força um outro estilo, que é o de longas com maior dramatização envolvendo os animais, e é nessa categoria que entra Meu Amigo Enzo (Simon Curtis).
Seguindo essa linha de produções emocionantes estão Marley e Eu (2008), Sempre ao Seu Lado (2009) e Quatro Vidas de Um Cachorro (2017). Todos se deram bem com os telespectadores por trazer histórias universais de amizade e amor, e por colocar o melhor amigo do homem em várias situações com que o público, muitas vezes, se identifica e se emociona. O jeito com que o drama é trabalhado também é o mote de Meu Amigo Enzo.
The Art of Racing in the Rain (nome original) segue a vida do piloto de testes Denny Swift (Milo Ventimiglia) que decide adotar um filhote, e com o passar do tempo ambos vão se tornando grandes amigos, até que Denny se apaixona por Eve (Amanda Seyfried), ambos têm uma filha e tudo caminha para que tenham uma vida feliz, até que Denny tenha que viver uma situação dramática que altera a sua rotina e mude para sempre a sua vida.
A trama é construída justamente com o intuito de fazer o público chorar, isso explica a cena inicial que é um grande spoiler e já prepara a todos para o que vai acontecer no final, possivelmente para tentar fazer com que todos se comovam com a história do início ao fim. Tal finalidade da cena inicial entregar o final foi uma tentativa do diretor de fazer algo que fosse igual a Marley e Eu e Sempre ao Seu Lado, mas que fosse diferente na narrativa, no jeito que os fatos foram contados.
Essa cena inicial é um grande tiro no pé, pois além de entregar o final também acaba por tirar a força de uma possível surpresa do que poderia acontecer no último ato, e isso desfavorece demais o andamento da história, tanto que o acontecimento trágico que ocorre no segundo ato não tem a carga emotiva e dramática que deveria ter, e isso se dá pelo fato de como a cena foi montada, mais uma vez Simon Curtis já prepara o telespectador para o que virá pela frente e isso mata o que irá se suceder nos próximos minutos.
Quem vai assistir a um filme sobre cachorro espera que ele seja o protagonista e não é isso que ocorre em Meu Amigo Enzo. O cão em questão é um mero coadjuvante, para fazer uma análise mais próxima dos acontecimentos, Enzo é apenas um telespectador dos fatos que acontecem na vida de Denny, como sua profissão, sua relação com o sogro, seu drama com a esposa e a filha. O cachorro é apenas um narrador que está lá para nos contar a história e isso é muito frustrante, pois Enzo está inserido na trama, mas por ser um mero observador acaba se tornando um elemento sem vida no longa, é como se fosse uma árvore pensante. O pior é o nome nacional do filme que dá a impressão que o cachorro é muito importante para a trama, sem Enzo a trama seria a mesma que foi com ele. O nome em inglês é mais honesto The Art of Racing in the Rain, em tradução livre seria "A arte de correr na chuva", algo mais sincero com o que ocorre na produção.
Por ser o protagonista é meio óbvio que o destaque seja Milo Ventimiglia, um ator um pouco injustiçado em Hollywood, mas que se sai bem no papel de Denny, um homem sozinho e que luta por seus direitos. Sua cara de triste durante toda a história ajuda a tirar o filme da monotonia, e suas cenas com o cachorro são sem sentimento, falta felicidade nos momentos alegres e sensibilidade nos momentos mais tristes. Amanda Seyfried é o destaque negativo, sua personagem não ajuda muito, mas sua interpretação é apagada e falta simpatia para dar luz para o papel da esposa de Denny.
O diretor Simon Curtis (Sete Dias com Marilyn) parece não saber ao certo o seu real objetivo ao dirigir Meu Amigo Enzo. Não sabe se conta a vida do cachorro ou se foca apenas na vida de Denny e acaba por não saber qual história contar. Essa confusão pode ser presenciada durante a trama, e por ter um cachorro simpático como personagem faz com que o longa saia sombras e tenha momentos interessantes. O fato é que o filme tinha potencial para ir mais longe e contar algo mais emocionante, até mesmo de passar uma mensagem mais relevante. Como produção de cachorro passa longe das boas produções que estão por aí, como drama funciona bem, mas também não sai da mesmice de sempre.
Meu Amigo Enzo (The Art of Racing in the Rain – EUA, 2019)
Direção: Simon Curtis
Roteiro: Mark Bomback, Garth Stein (livro)
Elenco: Milo Ventimiglia, Amanda Seyfried, Kevin Costner, Gary Cole, Martin Donovan, Kathy Baker, Lily Dodsworth-Evans, Ryan Kiera Armstrong
Gênero: Comédia, Drama
Duração: 100 min.
https://www.youtube.com/watch?v=YSCUzOuUUCo
Crítica | Histórias Assustadoras para Contar no Escuro - O terror sem susto
Filmes de terror, hora ou outra, acabam por cair na mesmice de sempre por abordar, quase sempre, histórias parecidas ou por colocar os personagens em uma situação de de perigo já vista em muitos longas. Produções como A Bruxa de Blair (1999), Jogos Mortais (2004) e Atividade Paranormal (2007), para citar as mais recentes, tentaram dar uma mudada no que já foi visto em demasia no gênero, isso sem precisar ter um grande trabalho de roteiro, apenas criando medo e suspense de forma simples.
Em Histórias Assustadoras para Contar no Escuro, o diretor André Øvredal (O Caçador de Troll) adapta o livro de Alvin Schwartz de uma forma se não original e nova, pelo menos competente e digna de impressionar a plateia. O que mais chama a atenção, em um primeiro momento, é a similaridade que o longa tem em relação a duas outras produções de terror que foram muito bem de bilheteria. A primeira é It, que tem como vilão um palhaço assustador que se alimenta do medo de seus alvos, e outro filme é Goosebumps, que tem as criaturas mágicas saindo de livros e ganhando vida. Essa mistura é o foco principal de Histórias Assustadoras, em que adolescentes encontram um livro velho no dia das bruxas e precisam sobreviver aos contos escritos no livro, tais histórias usam o medo dos personagens para os atingir.
É difícil fazer algo de diferente do que é relatado na obra literária. E mesmo sem mexer na história, o time de roteiristas, dentre eles Guillermo del Toro (A Forma da Água), tenta a todo o custo fazer algo novo, não no jeito de se contar a narrativa, pois a maneira se assemelha bastante aos formatos já consagrados de Hollywood, mas no jeito de se tentar dar susto. Há uma mescla de fantasia com horror típicos do estilo de Del Toro, mesmo o diretor mexicano não sendo o diretor há muitas peculiaridades de seu estilo de cinema com o que é visto em Histórias Assustadoras para Contar no Escuro.
Não são os sustos que tornam o filme mais interessante, e sim a criação da atmosfera em que o horror está inserido. Aos poucos os roteiristas vão criando situações com cada um dos personagens que vai jogando a trama para a frente, e tais acontecimentos acabam por trazer uma interação maior com os casos horripilantes nos quais estão inseridos. Assim como It não dá medo, Histórias Assustadoras cria uma sensação de pavor que é interessante, até o momento que acaba por se tornar repetitivo no jeito de tentar fisgar o público, pois a partir de um momento a narrativa se torna óbvia. Essa falta de originalidade no jeito com que a trama é apresentada mata um pouco os sustos, até porque é bem provável que os monstros vão pegar um por um dos personagens, algo como é feito em Premonição.
O ponto forte do longa é sem dúvida alguma os monstros. Guillermo Del Toro se notabilizou no cinema como um ótimo criador de criaturas bizarras e horripilantes, e em Histórias Assustadoras o diretor repete sua fórmula consagrada, e junto com o diretor André Øvredal, que também já havia trabalhado com monstros em O Caçador de Troll, conseguem fazer com que as criaturas se destaquem a tal ponto que em alguns momentos acabam se tornando mais importantes e interessantes que os próprios protagonistas.
No primeiro ato há todo um cuidado, por parte do diretor, em querer dar uma ideia dos acontecimentos para o público. É louvável e elogiável que o diretor não perde tempo em enrolar e logo já nos mostra sobre o que é o filme. Mas a fórmula que de início parece funcionar, com o primeiro surgimento de perigo envolvendo o espantalho, logo se torna repetitivo e as várias aparições se tornam fantasiosas e nada arrepiantes. O terror só volta a funcionar com o aparecimento da criatura gorda e nada mais de impressionante ocorre, algo que não acontece com It, que a todo momento tenta pegar o telespectador de forma surpreendente.
Histórias Assustadoras para Contar no Escuro não é um filme fantástico, mas não por isso deixa de ser interessante e divertido de conferir. Quem curte produções sobrenaturais e com criaturas bizarras irá curtir bastante, até porque longas do gênero geralmente se saem bem com o público, justamente por trazer tais aspectos sobrenaturais para a história. O longa não dá sobrevida para o gênero, nem tenta reinventar algo que já se observa em demasia no cinema, mas pelo menos é competente no jeito de se fazer o terror, com um suspense que funciona e sustos sem o exagero do uso de jump scares, que em algumas produções mais atrapalham do que ajudam. Quem procura um bom passatempo irá encontrar em Scary Stories to Tell in The Dark (nome original) o que procura.
Histórias Assustadoras para Contar no Escuro (Scary Stories to Tell in the Dark – EUA, 2019)
Direção: André Øvredal
Roteiro: Dan Hageman, Dan Hageman, Guillermo del Toro, Marcus Dunstan, Patrick Melton, Alvin Schwartz (Livro)
Elenco: Zoe Margaret Colletti, Michael Garza, Gabriel Rush, Dean Norris, Gil Bellows, Lorraine Toussaint, Austin Zajur, Natalie Ganzhorn, Austin Abramsr
Gênero: Horror, Mistério, Thriller
Duração: 100 min.
https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=fBerhvb8oA8
Crítica | Rainhas do Crime - Um grande tiro no pé
A Warner Bros parece estar se especializando em lançar filmes inspirados em quadrinhos que são uma perfeita bomba. Rainhas do Crime é inspirado na hq The Kitchen do selo Vertigo, da DC Comics e conta a história das personagens Ruby O'Carroll (Tiffany Haddish), Claire Walsh (Elisabeth Moss) e Kathy (Melissa McCarthy) que precisam viver a uma nova realidade sem os maridos presos pelo FBI, e sem dinheiro começam a tomar conta máfia local e assim se tornam gângsters famosas pelo bom caráter e bom mocismo.
Obviamente que a ideia do longa, dirigido por Andrea Berloff, é o de dar um caminho para as protagonistas que seja o de mostrar como elas se viraram sem nenhum homem por perto e como, de um jeito ardiloso, se vingam e se despregam das amarras dos maridos. A mensagem feminista do filme é algo que está presente na HQ e que é bem explicada e dirigida ao público, algo que não ocorre com o filme, que acaba por deixar uma mensagem tão interessante e bacana mal explicada e desenvolvida, fazendo com que muitas cenas que eram para ser de libertação feminina das personagens acabem se tornando algo extremamente caricato, jogado e sem um direcionamento claro.
Tal fato se dá por conta de diversos fatores. Um deles é o roteiro preguiçoso que pula etapas e faz com que Claire, Kathy e Ruby rapidamente tomem coragem de confrontar os poderosos da máfia, sem um trabalho mais especifico em relação a essa motivação que veio quase que do nada. Há ainda vários diálogos frágeis que são desperdiçados com facilidade, fora o tom meio teatral visto na interpretação das três protagonistas que soa como algo novelesco e que não funciona na produção. O roteiro confuso também erra por ir por outro caminho que traz uma mensagem no mínimo equivocada.
Os filmes sobre a máfia, geralmente, trazem uma mensagem que foge do heroísmo, pois muitas das pessoas que escolhem ir pelo caminho do crime vão por algum motivo, mas sempre acabam sendo presos ou participando de atos violentos contra aqueles que os desafiam. Longas como O Poderoso Chefão, Os Bons Companheiros e Scarface sempre mostraram que o crime não compensa, e Rainhas do Crime vai para o outro lado ao dar a entender que o crime compensa sim. Há uma motivação inicial para que as três mulheres entrem nesse mundo obscuro. A ideia era ganhar dinheiro para se sustentarem, mas não há menção do porque estão continuando nesse mundo se já conseguiram o dinheiro, fora que não há um momento que alguma personagem reflita se aquilo é legal ou ilegal, e nem o roteiro dá a entender se aqueles atos são imorais ou não, algo que é comum em produções do gênero.
A direção de Andrea Berloff se mostra preguiçosa e óbvia em muitos momentos, pois todos os acontecimentos são coreografados quanto ao jeito que Irão ocorrer. Não há uma surpresa decente que sirva para dar uma virada no roteiro. Há uma tentativa envolvendo a personagem de Melissa McCarthy com o seu marido, mas que é abandonada de uma maneira banal pela diretora. O pior é em relação aos personagens, alguns aparecem sem muito destaque e são rapidamente abandonados pelo foco ser todo nas protagonistas. Tais personagens não são atraentes, até porque não são explorados, mas poderiam servir para dar maior dinâmica e aprofundamento para história, casos dos três maridos das protagonistas e do capanga Gabriel, que aparece como uma mudança para a história, mas que também se torna coadjuvante.
Rainhas do Crime é daqueles filmes de máfia que não acrescentam absolutamente nada de novo ao tema, além de não discutir nada de importante, como o próprio feminismo e até mesmo da violência constante da máfia na época. Parece que tudo no longa foi aprontado de forma tão superficial que fica difícil de comprar a ideia, pois dos diálogos ao jeito que as situações são apresentadas é quase tudo aprontado de forma forçada, sem naturalidade alguma. O pior é o fato da produção ser vazia em novas ideias. Tal fato se deve a falta de experiência da diretora que ficou a frente de um projeto que tinha tudo para ser tão interessante, mas que acabou se perdendo no caminho.
Rainhas do Crime (Rainhas do Crime – EUA, 2019)
Direção: Andrea Berloff
Roteiro: Andrea Berloff, Ollie Masters (autor da HQ), Ming Doyle (Ilustrador da HQ)
Elenco: Elisabeth Moss, Melissa McCarthy, Domhnall Gleeson, Tiffany Haddish, Annabella Sciorra, Common, James Badge Dale, Margo Martindale, Jeremy Bobb, Brian d'Arcy James
Gênero: Ação, Crime, Drama
Duração: 100 min.
https://www.youtube.com/watch?v=2SSlqzdQDhY
Crítica | Euphoria: 1ª Temporada - Um Espelho da Realidade
Produções teens quase sempre estiveram em destaque na programação das TVs, pois ao abordar esse universo jovem, com vários temas a serem explorados e desenvolvidos, é natural que o seu público-alvo o assista esperando retirar algum de ensinamento para a vida, ou que tente encontrar na produção uma inspiração para algum problema que os aflige. A série Euphoria, da HBO, nasceu com essa missão, a de ter de espelhar a realidade do mundo dos adolescentes que estão próximos do fim do ensino médio e perto de outra fase de suas vidas que exige mais responsabilidade, que é a fase adulta.
E logo no primeiro episódio, com a protagonista Rue (Zendaya) sendo apresentada, a série já deixa claro que chegou para dialogar com a realidade de muitos jovens. Temas como vício em drogas e medicamentos, aborto, relacionamentos tóxicos, exposição na internet e sexo são mostrados de maneira crua, sem nenhum pudor e medo de chocar o telespectador. É algo que já havia sido presenciado na produção britânica Skins, mas com a diferença de Euphoria focar muito mais na vida dos personagens e as desenvolver em prol do episódio, ou seja, cada novo capítulo era contando a vida de algum protagonista importante para a trama.
Mesmo tratando de muitos temas o seriado não cai no mesmo erro da série da Netflix 13 Reasons Why, em que vários assuntos eram jogados sem se discutir nada. Já a série da HBO vai pelo caminho de não querer inchar os episódios com vários assuntos e assim acabar por tornar tudo superficial, foi por outro caminho e conseguiu se aprofundar em muitas questões importantes e atuais. Uma delas foi a do vício nas drogas, algo bastante presente na vida de muitos jovens e que o seriado usou para se espelhar, criando uma rotina em que Rue conta como começou os seus abusos em todo quanto é tipo de entorpecente. Outro tema interessante e que rendeu burburinhos na internet foi em relação ao personagem de Nate Jacobs (Jacob Elordi) que é o machão da trama e líder do time de futebol americano, e que possivelmente é homossexual, mas ainda não se descobriu, e cada vez que Nate se prende a esse fato acaba por se tornar mais violento com o tempo.
Outro ponto forte da narrativa está em relação em como os diálogos foram montados. Hora funcionam como auto-ajuda, com os personagens dizendo o que sentem, algo que é como uma reflexão do que muitas pessoas sentem e não conseguem expor, hora esses diálogos se tornam violentos por mostrar traumas dos personagens e por apresentar o lado cruel do ser humano, quem se encaixa muito nessa relação de violência é a dupla Nate Jacobs e Maddy Perez (Alexa Demie). O sexo é outro fator que é utilizado pelos roteiristas para dar maior tom de realidade para a trama, e as cenas de nudez e de sexo não são jogadas ali apenas para mostrar o elenco nu, essas cenas estão lá por outro motivo que é o de dar naturalidade ao que é apresentado, tanto que a série coloca mais os figurantes aparecendo nus que os protagonistas.
O ponto alto da produção e que certamente ajuda a segurar bastante a história são os personagens. Rue, Jules Vaughn (Hunter Schafer), Maddy Perez, Nate Jacobs e Kat Hernandez (Barbie Ferreira) são tão cheios de segredos e traumas que se tornam protagonistas ricos e fazendo com que fique fácil os desenvolver durante a trama. Isso feito com pequenas narrativas rápidas contadas no início de cada episódio. Tal fato é feito para contar mais sobre a vida de cada um sem se perder tempo. O mais interessante disto é que fica possível fazer um paralelo de como eram quando criança e como ficaram na fase adulta. Alguns destes personagens ficam em segundo plano e mesmo sendo interessantes não ganham o destaque que deveriam casos de Lexi Howard (Maude Apatow), Fezco (Angus Cloud) e Cassie Howard (Sydney Sweeney).
Zendaya dá uma aula de atuação e mostra que tem um excelente futuro pela frente, sua protagonista não é fácil de interpretar, cheia de traumas e viciada em drogas, e mesmo assim Zendaya tira tudo de si para transformar a garota. Em contrapartida Hunter Schafer estréia como atriz no seriado e surpreendentemente tira de letra seu papel, sua personagem é uma garota trans e que acaba tendo que entrar em um jogo maléfico feito por Nate Jacobs, além de Jules também se apaixonar por Rue. A principal surpresa do elenco fica a cargo de Jacob Elordi, que havia feito um péssimo papel em A Barraca do Beijo e que em Euphoria dá a volta por cima, é o vilão que comete as maldades e faz a história girar.
Mesmo tendo uma estrutura narrativa de fácil assimilação há de se elogiar um mecanismo utilizado pela direção e que ajuda muito a contar a trama que é a narração onisciente, aquela voz da Rue em todo início de episódio contando os acontecimentos na vida de cada protagonista, é como se Rue já soubesse tudo o que aconteceu e que nada mais é segredo. Mas nem tudo é elogio quanto as ótimas direções de Sam Levinson, Pippa Bianco, Augustine Frizzell, Jennifer Morrison, que é o fato de muitos episódios parecerem repetitivos, na narrativa e no jeito que os eventos iam se desenrolando. Um exemplo são as várias festas feitas para fazer com que a série ganhasse um ritmo e uma direção.
A 1ª temporada de Euphoria mostrou que o seriado veio para fazer algo de diferente, que se via em muitas séries do gênero, mas não com a profundidade presenciada na produção da HBO. O principal fato é a tentativa de quebrar estereótipos, como a do capitão do time de futebol americano que é homossexual, a da protagonista que se apaixona por uma garota trans, e muitos outros aspectos tabus em séries ou que são apenas apresentados de forma superficial. Euphoria não foi criada para agradar, e nem para chocar e sim para mostrar um retratado real de acontecimentos presentes do dia a dia, mas que muitos preferem manter escondido.
Euphoria - 1ª Temporada (Idem, EUA – 2019)
Criado por: Sam Levinson
Direção: Sam Levinson, Pippa Bianco, Augustine Frizzell, Jennifer Morrison
Roteiro: Ron Leshem, Daphna Levin, Sam Levinson
Elenco: Zendaya, Maude Apatow, Angus Cloud, Eric Dane, Alexa Demie, Jacob Elordi, Barbie Ferreira, Nika King, Storm Reid, Hunter Schafer, Algee Smith, Sydney Sweeney, John Ales, Austin Abrams, Keean Johnson
Emissora: HBO
Episódios: 8
Gênero: Drama
Duração: 45 min. aprox.
https://www.youtube.com/watch?v=6XGnv7Zgbeg
Crítica | Missão no Mar Vermelho - Chris Evans Salvando o dia novamente
Chris Evans se notabilizou no cinema por interpretar o herói da Marvel Capitão América. É quase que impossível desvencilhar a imagem do ator ao do vingador tamanha foi sua capacidade de recriação do personagem. Mas agora o protagonista do avenger deixou Steve Rogers para trás e o artista está tomando novos rumos, e um deles é o regular Missão no Mar Vermelho (Gideon Raff), produção da Netflix inspirada em fatos reais.
Na trama, Ari Kidron (Chris Evans) é chamado pela Mossad (agência de inteligência de Israel) para realizar uma engenhosa missão de salvar judeus etíopes do Sudão e levá-los em segurança para Israel. Nisso uma equipe junto cm Ari Kidron se fingem de novos donos de um hotel no meio do nada chamado de Mar Vermelho. A Netflix está descobrindo nos filmes que se passam na África um bom filão a ser explorado. Lembrando-se de dois longas originais da plataforma de streaming O Menino Que Descobriu o Vento (Chiwetel Ejiofor) e O Caderno de Sara (Norberto López Amado) que são uma prova de como essas tramas tem um público fiel, isso por tratar de questões atuais, históricas e por, na maioria das vezes, esses filmes serem dramas capazes de fazer com que as pessoas se insiram na história e sigam os personagens e os perigos nos quais estão inseridos.
A ideia do roteiro de Missão no Mar Vermelho se assemelha a de outras produções que tiveram foco em operações de resgate reais, por isso é natural que ao assisti-lo tenha a impressão que já viu aquela história em algum lugar. O jeito com que o diretor Gideon Raff montou a narrativa fez com que ficasse parecido com dois filmes que se inspiraram na realidade, casos de Argo (Ben Affleck) e 7 Dias em Entebbe (José Padilha). Com a diferença de que o longa da Netflix é muito mais rápido na ação de resgate e seus desdobramentos são bastante atropelados no modo que são contados, principalmente o lado etíope da trama que em raras oportunidades são apresentados ao público. O que conta mesmo é o lado da equipe israelense e apenas isso, o sofrimentos dos judeus a serem resgatados é algo bastante secundário.
Mesmo tendo um olhar superficial sobre a questão dos refugiados funciona bem e encanta por ter um tema ligado a fatos heróicos e na ajuda de minorias que estão sofrendo um massare. Mas não por isso que o roteiro é um primor, na realidade ele é bastante fraco em criar uma ligação mais profunda entre personagens e os acontecimentos. Falta emoção em momentos chaves e a tensão dá uma falsa sensação de que os israelenses estão em perigo. Esses fatos são mal concebidos justamente por erros envolvendo a direção de Gideon Raff, pois o diretor mesmo contando a história de forma rápida não dá agilidade para as cenas, algo que acaba matando também a ação do filme, o tornando sonolento.
É um fato que Chris Evans é o queridinho de Hollywood e o ator se esforça bastante para dar vida ao personagem de Ari Kidron. Mas há um problema em seu protagonista, pois não há um sentimento de tristeza em seu semblante, nem de comoção quanto aos massacres que acontecem, fazendo com que fique um personagem sem vida, e mesmo com todo o carisma de Chris Evans fica difícil de acompanhá-lo em sua rotina de resgates.
Em contrapartida ao protagonismo de Chris Evans há um grande problema em relação ao elenco de apoio, que é pessimamente estruturado e além de não ter importância alguma para a trama acaba por ter personagens secundários fracos e sem destaque. Haley Bennett (A Garota no Trem) talvez seja a que ainda tenha algum destaque, mas de forma escondida sua personagem passa despercebida, ainda mais que o diretor não faz questão nenhuma de abordar nada de relevante sobre sua vida.
Mesmo tendo suas falhas narrativas Missão no Mar Vermelho acaba por ser uma surpresa no repertório da Netflix no meio de tanta coisa ruim envolvendo um histórico recente. O longa tenta tratar de um assunto pertinente e desconhecido pelo grande público e isso é elogiável, é um esforço em se trazer histórias esquecidas, mas que aconteceram e salvaram muitas vidas. Esse é o ponto alto do filme, o de contar uma história real para a massa, algo que possivelmente não aconteceria se a Netflix não se interessasse pelo projeto.
Missão no Mar Vermelho (The Red Sea Diving Resort, EUA – 2019)
Direção: Gideon Raff
Roteiro: Gideon Raff
Elenco: Chris Evans, Haley Bennett, Alessandro Nivola, Michael Kenneth Williams, Michiel Huisman, Michiel Huisman, Alona Tal, Anthony Oseyemi, Ben Kingsley
Gênero: Drama, História, Thriller
Duração: 130 min
https://www.youtube.com/watch?v=YzFV-thA0wE
Crítica | Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal - Zac Efron em uma de suas melhores performances
Por algum motivo os seriais killers quase sempre são alvos dos diretores que levaram suas histórias para o cinema e para a TV ao abordar suas histórias sangrentas de assassinatos e ao mostrar como os criminosos faziam para buscar seus alvos. Produções como Seven – Os Sete Crimes Capitais e O Silêncio dos Inocentes levaram este tema a outro patamar. O primeiro filme é clássico por abordar a vida de um policial que tenta descobrir uma série de assassinatos, e o segundo por focar na protagonista policial que investiga crimes e precisa da ajuda de um famoso assassino canibal para solucionar a investigação de uma série de crimes.
Em Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal, Joe Berlinger volta a tratar do assassino em série Ted Bundy que matou com requintes de crueldade, na década de 70, mais de 30 mulheres nos EUA e que já havia sido alvo do diretor na série documental da Netflix Conversando com um serial killer: Ted Bundy, em que Joe Berlinger faz uma análise da perversidade de um dos primeiros assassinos em série dos Estados Unidos, época em que nem se usava ainda no país o nome para denominar um serial killer.
A grande questão em Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal está em relação ao porquê de se fazer outro longa sobre o criminoso em ta pouco tempo, logo depois da série da Netflix ter sido disponibilizada para os telespectadores, sendo que a série já havia trabalhado tantos elementos e preenchido tantas lacunas sobre os crimes que é difícil de imaginar sobre o que o filme iria tratar o assunto. Para dar um ar de originalidade para a produção Joe Berlinger utilizou uma ideia interessante, a de pegar um livro e adaptá-lo. No caso, o livro usado foi The Phantom Prince: My Life with Ted Bundy, escrito por Elizabeth Kendall, a namorada de Ted Bundy que é interpretada por Lily Collins no filme.
Foi uma ideia interessante e que dá outra direcionada para a trama que continua abordando a vida do serial killer, mas não apenas mostrando a visão de Ted Bundy dentro da cadeia, mas também o ponto de vista a partir do olhar de Elizabeth Kendall, a namorada do criminoso e que foi parcialmente citada na série documental da netflix. Os dois lados são apresentados, o de Elizabeth como uma jovem mulher que se relacionou com um homem que ela fica na dúvida se é criminoso ou se é inocente e a questão de Ted Bundy dentro da cadeia se relacionar com Elizabeth e com Carole Ann Boone (Kaya Scodelario).
Algo de novo visto no longa e que é bastante interessante, além de seus relacionamentos e seus planos de defesa, é o fato do diretor apresentar de forma mais detalhada como Ted Bundy faz para tirar o corpo fora e se mostrar inocente perante o júri. Há dois caminhos que a narrativa segue o de tom acusatório, feito pelos promotores para tentar incriminá-lo, apresentando as provas no julgamento, e o de Ted Bundy se mostrando inocente e que é alvo de perseguição pela polícia.
Há algumas mudanças feitas no roteiro em relação ao documentário, isso para deixar o longa mais cinematográfico em alguns momentos que contam o que aconteceu na vida real e que não funcionariam no filme. O roteiro em Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal é montado para que a história seja contada resumida de forma e para que as situações sejam mais ágeis. Por ser uma produção que copia, em tese, algumas passagens da série é natural que isso seja feito, até porque quem assistiu a produção da Netflix não irá perder o tempo assistindo a um filme que seja igual ao documentário. Esse jeito de contar a trama de forma resumida funciona e serve para dar novos caminhos para questões não muito debatidas na série.
O grande destaque da produção fica por conta da atuação de Zac Efron, uma das melhores de sua carreira e que faz com que o longa não caia no marasmo por conta de seu carisma e de ser um ator com bastante presença de tela. Sua interpretação, além de ter uma caracterização ótima de Ted Bundy, também tem o ar de ousadia que o serial killer passava no tribunal e que pode ser vista na série da Netflix. Ted Bundy tirou onda no julgamento, foi inteligente em usar caminhos não esperados pela defesa e soube como ninguém enrolar todo o sistema judiciário ao evitar sua morte inúmeras vezes. Todo esse atrevimento pode ser presenciado na expressão de Zac Efron, que cada vez mais cresce como ator e faz com que o público esqueça de vez o garoto de Hith School Musical.
Quem não assistiu ao documentário da Netflix não terá problemas em entender o filme, até porque o longa vai ao mesmo sentido da série, mas apenas inserindo novos elementos. Quem quiser algo mais aprofundado a produção da Netflix é um prato cheio, até mesmo para entender questões não muito discutidas no filme, como o poder da beleza de Ted Bundy, fato que chamava bastante a atenção da mídia e de muitas mulheres na época, que não acreditavam ser ele o assassino das jovens. Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal é um filme de serial killer diferente do que estamos habituados a assistir, sem sangue jorrando e apenas mostrando como era a vida do criminoso no período dos crimes dentro e fora da prisão, além de ser um estudo de imersão à mente de um dos assassinos mais sádicos que já existiu.
Irresistível Face do Mal (Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile, EUA – 2019)
Direção: Joe Berlinger
Roteiro: Elizabeth Kendall (Livro The Phantom Prince: My Life with Ted Bundy), Michael Werwie
Elenco: Lily Collins, Zac Efron, Angela Sarafyan, Sydney Vollmer, Haley Joel Osment, Kaya Scodelario, Dylan Baker, John Malkovich, Jim Parsons
Gênero: Biografia, Crime, Drama
Duração: 110 min
https://www.youtube.com/watch?v=DKb0MorZDtc&feature=youtu.be
Crítica | As Trapaceiras - Uma Comédia que Cai na Mesmice de Sempre
Muitas comédias americanas, em alguns momentos, têm um lapso de criatividade e conseguem sair da mesmice que estamos acostumados a presenciar em suas produções cinematográficas. Filmes como Dois Caras Legais (Shane Black) e Fora de Série (Olivia Wilde) são exemplos de como com um bom roteiro arrojado faz com que piadas e situações bem trabalhadas prendam a atenção do telespectador e ainda causem riso em conseqüência aos acontecimentos, algo que certamente As Trapaceiras (Chris Addison) não alcança.
Anne Hathaway (O Diabo Veste Prada) e Rebel Wilson (A Escolha Perfeita 3) são duas trapaceiras profissionais que vivem de golpes. A personagem de Anne Hathaway é uma ricaça que tem um esquema sofisticado de golpes, enquanto a personagem de Rebel Wilson vive como se não houvesse amanhã, apenas aplicando golpes por diversão. Obviamente que o roteiro dá um jeito de fazer com que as duas se encontrem e possam, a partir de então, se juntar em uma aposta para enganar um empresário do Vale do Silício e em consequência ganhar uma bolada.
O roteiro peca por ter uma estrutura narrativa bastante óbvia e nada original. Ao conceber o encontro das duas trapaceiras fica nítido que elas irão meio que rivalizar para saber qual a melhor trambiqueira do pedaço e essa obviedade mata muito das surpresas que poderiam ser mais bem exploradas. Um exemplo fica em relação a mencionada aposta para passar a perna no empresário, é algo tão subaproveitado e construído que o resultado é pífio em criar alguma reação em quem assiste. Há também um grande problema em não ter um vilão designado para fazer com que a trama vá para a frente com situações criadas ao seu redor. Longas como Meu Ex É um Espião e O Espião que Sabia de Menos são exemplos de como um vilão faz com que uma história fique muito mais interessante.
Para piorar está o fato das piadas serem péssimas e quando há, em alguns momentos, uma chance delas serem engraçadas acabam por ser desconstruídas com seu mal aproveitamento sendo feito pelas personagens. Sempre que alguma piada parecia tomar um caminho relevante que seria possivelmente o de criar uma boa narrativa para se fazer rir, as protagonistas acabavam por tropeçar e ao final a piada perdia a graça, ou pela situação ser mal trabalhada ou pelo fato de as piadas simplesmente não terem graça. Outro ponto fraco está nos diálogos de baixo rendimento, que não ajudam em desenvolver a trama, são apenas frases jogadas com algumas tiradas, mas sem função alguma.
Algo que ajuda bastante na total falta de graça do longa está na péssima química entre a dupla de trapaceiras. Não há uma relação competente entre as duas, mesmo não sendo amigas, as personagens acabam por não parecer sinceras no que estão sentindo e isso passa muito pela interpretação das duas atrizes. Rebel Wilson está na sua zona de conforto, interpretando praticamente a mesma protagonista de longas passados e sempre forçando para tentar tirar risos da platéia, enquanto Anne Hathaway se esforça em ser uma ricaça que só pensa em si própria, mas desliza quando aparece em cena com Rebel para discutir algo mais significativo.
As Trapaceiras falha justamente em criar uma abordagem mais sóbria e intrigante da narrativa e que passa muito pela não criação de algum mistério, que possivelmente ajudaria a deixar o filme mais atraente e com alguma motivação mais relevante para as personagens. Não é a primeira vez que uma dupla interessante se sai tão mal em uma produção, e provavelmente não será a última. Havia potencial na história, ainda mais por ser um tema tão explorado em diversas produções hollywoodianas, mas pede-se que o diretor tenha pelo menos um bom senso ao explorar esse universo das trapaças, coisa que Chris Addison (Doctor Who) não teve.
As Trapaceiras (The Hustle, EUA – 2019)
Direção: Chris Addison
Roteiro: Stanley Shapiro, Paul Henning, Dale, Launer, Jac Schaeffer
Elenco: Rebel Wilson, Anne Hathaway, Alex Sharp, Dean Norris, Emma Davies, Ingrid Oliver
Gênero: Comédia, Crime
Duração: 93 min
https://www.youtube.com/watch?v=pzOayCip1kM
Crítica | Brinquedo Assassino (2019) - Um Reboot Desnecessário
Brinquedo Assassino é um dos grandes clássicos dos slashers dos anos 80 que com sua fama acabou por ter inúmeras sequências até os dias de hoje. Queira ou não há um ar de nostalgia ao acompanhar os longas antigos de Chucky, uma boneco que é a encarnação de um assassino que entrou em corpo inanimado e que vive indo à procura de um humano em que possa depositar sua alma. A verdade é que a franquia há muito vinha perdendo força, e o então brinquedo malvado passou a ser visto como chacota por uma parcela do público, com filmes bizarros como O Filho de Chucky (Don Mancini).
Para tentar melhorar a imagem da franquia tentaram reinventar o bom e velho Chucky ao filmar o reboot de Brinquedo Assassino (Lars Klevberg/2019). A primeira coisa que salta aos olhos de quem assiste é o fato de terem mudado a origem do boneco. Se antes era um assassino dentro do brinquedo agora há uma mudança mais drástica, com Chucky entrando de vez na era digital, sendo programado, no Vietnã, para aprender a praticar violência sem filtros. Não para por aí com as mudanças, também deram um jeito de mudar sua fisionomia e o deixaram com um ar mais jovial, como se tivesse passado por algum tratamento estético e tivesse perdido todo o aspecto cruel dos filmes anteriores, se tornando literalmente bonzinho, ou no caso Amigão, apelido dado pelos seus fabricantes.
São mudanças drásticas que fazem com que toda a história original seja esquecida, e ainda os roteiristas desfiguraram tudo o que foi criado, possivelmente para começar uma nova franquia com este novo boneco. Essa modificação na trama é um grande erro, mesmo fazendo com que o filme flua com os acontecimentos que Chucky vai provocando e com a sua nova motivação, que não é mais a busca de Andy para depositar a alma do assassino, acabam por deixá-lo mais fraco em um quesito importante para um longa de terror que são os sustos e o suspense, ambos muito mal trabalhados e concebidos.
A mudança da origem macabra é um erro e que acaba por perder outro aspecto importante que são os sustos, tendo um impacto baixo no telespectador justamente porque não há a já esperada crueldade de nascença. Outro erro que afugenta o suspense ficou em relação ao ambiente em que Chucky está inserido. O diretor ao deixar tudo mais bonitinho, como a transformação física do boneco e sua origem acabam por deixar as cenas mais leves do que deveriam ser. Além dos sustos não assustarem, também não dão medo, pois as situações em que Chucky aparece são tão óbvias que fica difícil de ser enganado ou surpreendido.
Algo que mudou em relação aos filmes anteriores, e de certa forma é um acerto, fica em relação à violência empregada. Chucky mata sem piedade seus adversários e com grande crueldade, e tudo é mostrado na tela sem o mínimo corte. É possível presenciar fratura exposta entre outros tipos de danos impostos pelo boneco. Essa sanguinolência é colocada na história possivelmente para cobrir buracos e a já mencionada falta de terror, assim obrigando o telespectador a usufruir de um artifício chocante e esquecer de seus defeitos.
O roteiro tentou fazer uma mescla com uma linha violenta com cenas hilárias, algo que é bem trabalhado e até que faz algum sentido para o longa, que decidiu ir por um caminho mais leve e na hora das mortes colocando uma carga bastante pesada para nos lembrar que ainda estamos assistindo a um filme de terror. Ainda sobre o roteiro há algumas incoerências que foram apresentadas de forma atropelada e não tiveram a atenção necessária. O primeiro caso é em relação ao programador que dá um jeito de deixar o boneco Amigão com ensinamentos assassinos. Algo que não falam com clareza é o motivo, apenas o mostram digitando uns códigos e nada mais. Outra incoerência fica em relação ao próprio nome Chucky que nos longas anteriores era o nome do assassino. No reboot resolveram colocar o nome Chucky em uma artimanha forçada e jogada.
Realizar um reboot é algo bastante perigoso e que demanda uma maior criatividade dos roteiristas ao recriar todo o ambiente e seus personagens e dar novos caminhos para seguirem. A verdade é que Brinquedo Assassino tenta dar uma nova vida para algo que já vinha perdendo força e acaba por se tornar um reboot bastante desnecessário e sem graça, até porque as mudanças drásticas em relação ao boneco não seguram o telespectador e nem impressionam. Talvez as mortes cruéis sejam o ponto forte, mas isso é algo feito no limite da forçação de barra e feito para tirar a atenção do público.
Brinquedo Assassino (Child's Play, EUA – 2019)
Direção: Lars Klevberg
Roteiro: Tyler Burton Smith, Don Mancini
Elenco: Aubrey Plaza, Mark Hamill (Chucky), Tim Matheson, Brian Tyree Henry, Gabriel Bateman, David Lewis, Beatrice Kitsos, Trent Redekop
Gênero: Horror
Duração: 90 min
https://www.youtube.com/watch?v=UPq81oORbgk&t=1s
Entenda o final do anime e do filme Neon Genesis Evangelion
É normal, após terminar de assistir Neon Genesis Evangelion na Netflix, ficar com aquela dúvida em relação a todos os acontecimentos que levaram ao final do anime. Este artigo tem como finalidade explicar seu emblemático final e do filme The End of Evangelion.
É estranho, mas Evangelion tem dois finais e tanto a série quanto o filme estão na Netflix. O primeiro final é da série de TV Neon Genesis Evangelion que termina nos episódios 25 e 26 e que foi transmitida no ano de 1996. Em 1997 foi ao ar o filme The End of Evangelion, e entre estas duas produções teve outro filme chamado Death and Rebirth e que também está disponível na Netflix com o título de Death (True). Não é necessário assistir a este último para entender este artigo, pois este OVA serve apenas para relembrar fatos da série de TV com o acréscimo de imagens novas que serviam de ponte entre os finais da série e do filme.
Spoilers
O Final Apocalíptico
Começando pelo final do anime Neon Genesis Evangelion. No final do episódio 24, Shinji acaba por matar Kaworu, personagem que havia sido declarado como sendo o último anjo. Isso feito para que se junte a Lilith, e assim destruindo com a humanidade e deixando os Anjos como a forma de vida dominante no planeta Terra. Kaworu então acaba por entregar sua vida em prol da humanidade. Na realidade isso ocorre para que Shinji continue adiante. Após o sumiço dos anjos, o pai de Shinji e SEELE colocam em prática um projeto que servirá para unir todos os seres humanos em apenas uma consciência só.
O projeto conhecido pelo nome de Instrumentalidade (que irá criar a consciência compartilhada) é o objetivo dos dois lados, mas com idéias diferentes para seu uso. SEELE quer que essa fusão seja algo permanente. Os integrantes do SEELE participam do culto da morte, em que acreditam que a humanidade não tem nenhuma condição de sobreviver do jeito que está e para isso precisam se tornar um ser superior.
Já Gendo (pai de Shinji) em contrapartida está trabalhando em um plano que sem saber é algo que sua falecida esposa Yui queria. A ideia de Gendo é utilizar o EVA Unit 01 para usar de forma que desse a oportunidade de todos se curarem de seus traumas, e também de ter suas individualidades de volta. Isso não é algo implícito na série, mas é algo que ocorre de forma explicita em The End of Evangelion e que na série de TV acontece antes do episódio final.
O que será descrito agora não fica tão evidente na série de TV. O episódio 25 já se inicia com Shinji tendo o processo de instrumentalidade já em andamento. O que é mostrado, em relação ao corpo de Misato tendo o mesmo ferimento a bala de Asuka, é de se presumir que o acontecimento mostrado no filme também está ocorrendo no fim do episódio 24 com o início do 25 da série, que não se importa muito em abordar a ideia do cosmo e o apocalipse e sim em trabalhar melhor os sentimentos dos personagens.
A SEELE cria um plano de tomar a Unidade 01 e realiza um ataque contra à NERV, matando grande parte dos funcionários. Misato é ferida, e antes de ser atingida fala com Shinji sobre relação entre os anjos e todos da raça humana serem descendentes de Lilith, e que cada anjo seria uma espécie de versão diferente do que seria a raça humana caso tivesse se evoluído. Desta forma, a humanidade estaria tentando se unir com Lilith e assim ascender a outra forma, que seria a instrumentalidade. Misato pede para Shinji não deixar que isso aconteça, mas o EVA 01 não sai do lugar.
No porão da NERV Rei suga o embrião de Adam – a criatura encontrada pela SEELE na Antártica e que foi criada pela Primeira Raça Ancestral – mas não admiti Gendo como condutor do apocalipse. Como sabemos REI é um clone criada com os DNAs de Lilith e Yui, e por isso consegue se unir com a máscara bizarra de Lilith e assim se tornar uma REI gigantesca e aterrorizante. Ao conseguir este feito Rei vai à procura de Shinji que entrou no EVA 01.
Shinji fica assustado ao ver o EVA de Asuka destroçado, fica imponente e sem reação e desta forma não consegue impedir o EVA de se unificar com Lilith (Rei gigante). Rei-Lilith surge para todos como uma pessoa, enquanto Shinji é Kaworu, Maya é Ritsuko e Hyuuga é Misato e assim sucessivamente, com exceção de Gendo. Tais fatos são apresentados até a metade do filme, mais ou menos, e nos leva até o início do episódio 25 da série de TV.
É um final bastante confuso, mas que tem sua beleza em um apocalipse cheio de simbologia. O fim de Evangelion pode ser interpretado deixando a narrativa de lado e pensar em tudo como uma grande metáfora do armageddon. Pensando no fim do mundo como resultante de doenças mentais como depressão e ansiedade. Muitos fãs acabam por interpretar, levando em conta o fim de End of Evangelion, como sendo um universo diferente do apresentado na série de TV em relação a instrumentalidade, com cada rumo diferente que Shinji poderia ter seguido. Essa ideia de multiverso é uma teoria bastante conhecida e aceitável entre o público e até que faz sentido e serve para explicar como dois finais diferentes podem existir dentro da mesma história.
Conclusão
É estranho o que será dito a seguir, mas na realidade Evangelion não tem um jeito considerado certo de se entender seu final. Isso pode estar relacionado a sua produção problemática, tendo alguns elementos da história mudado de caminho durante a trama, algo que explica, de alguma forma, a confusão da estrutura narrativa. A série teve dois finais diferentes, fora os vários diálogos entre personagens que davam margens a diversas interpretações. Portanto, querer entender o final de forma direta e racional é uma tarefa bastante ardilosa e complicada.
Pode-se dizer que Evangelion é uma espécie de Lost, em que as pessoas interpretaram a sua maneira o final. E talvez seja isso que deixa a produção mais fascinante em se assistir, pois a emoção e os vários rumos que os personagens tomam ajudam nessa tarefa de assistir e se deliciar com este grandioso anime.
