Crítica | Os Muitos Santos de Newark traz um bom fan service de Família Soprano
Admito que cheguei bem tarde no trem de Família Soprano. Lançada originalmente em 1999 pela HBO, a série redefiniu o conceito de dramas na televisão, sendo até hoje considerada como uma das obras definitivas que o audiovisual já ofereceu - e cujo enigmático final também ainda é debatido por fãs e pelo criador, David Chase. Mais de 20 anos depois, a saga da família mafiosa volta a fazer barulho com o inusitado retorno a seu universo na forma de um filme prelúdio: Os Muitos Santos de Newark.
A trama é ambientada cerca de 30 anos antes dos eventos da série, acompanhando a vida e a trajetória de Dickie Moltisanti (Alessandro Nivola) um carismático gângster que está prestes a iniciar uma guerra territorial com um antigo amigo, Harold McBrayer (Leslie Odom Jr). Tudo isso enquanto Dickie tenta ser um exemplo de bússola moral para o filho de seu grande amigo Johnny (Jon Bernthal), a quem considera seu próprio sobrinho: o jovem Tony Soprano (Michael Gandolfini), que precisa lidar com os excessos de sua mãe desequilibrada Lívia (Vera Farmiga) e as escolhas de carreira que o moldarão.
Bada bing!
Quase que como um esquenta para o longa, assisti todas as temporadas de Família Soprano quando a série chegou ao HBO Max no Brasil. É de fato uma narrativa ambiciosa, surpreendente e repleta de elementos valiosos o que não só justifica o grande hiato entre o fim da série e um novo projeto da franquia, mas também a pressão que o filme de Alan Taylor carrega. É um alento ter o próprio David Chase por trás do roteiro (ao lado de Lawrence Konner, veterano de Sopranos e também de Boardwalk Empire), já que o texto é fiel ao estilo de linguagem e caracterização dos personagens vistos na série: é o mesmo universo, com uma nova visão e novos temas.
O problema vem com a indecisão. Ao longo de enxutos 120 minutos, Chase e Konner querem abordar muitos temas (as lutas raciais dos EUA parecem ser o principal), mas nunca há o desenvolvimento apropriado para nenhuma delas. São arcos que se resolvem fora da tela, personagens que nunca justificam sua presença e um gosto de quero mais pelo elemento que realmente deve atrair os fãs: a juventude de Tony Soprano. Através de cenas que concretizam momentos mencionados em diálogos na série, a origem do grande mafioso certamente garante o ponto alto da produção, especialmente ao espelhar a relação que este viria a ter com o personagem de Michael Imperioli (que tem aqui uma mórbida participação) na figura do Dickie de Nivola.
E se Os Muitos Santos de Newark funciona, é por conta dos dois. Alessandro Nivola sempre foi um ator subestimado (quem lembra do Billy de Jurassic Park 3?), e o papel de Dickie é a oportunidade para qualquer um brilhar. Nivola se sai bem ao explorar a vaidade e a elegância do gângster, assim como sua complicada relação com o personagem de Ray Liotta e também com o próprio Leslie Odom Jr - a troca de olhares que os dois compartilham em meio a um tiroteio é um momento de silêncio que praticamente incendia a tela. O mesmo se aplica a Michael Gandolfini, que obviamente se beneficia da gigantesca semelhança com seu falecido pai, James, mas é capaz de trazer muita ternura e momentos de simpatia como o jovem Tony - assim oferece indícios de sua natureza explosiva.
Rostos conhecidos
O elenco de apoio também se diverte bastante, ainda que sejam mais imitações dos personagens da série do que realmente performances multidimensionais. Vera Farmiga aproveita o nariz falso para uma ótima versão de Lívia Soprano e sua personalidade bipolar, enquanto Corey Stoll é excelente ao captar a personalidade mais frágil (porém raivosa) de Junior Soprano - e sua última fala no filme é daquelas de se elaborar uma série de teorias. Vale também destacar a ótima maquiagem que transforma Billy Magnussen e John Magaro nos icônicos Paulie e Silvio, que infelizmente têm um papel bem reduzido aqui.
Já na direção, quem conhece Alan Taylor apenas pelo cinema deve ficar assustado, já que Thor: O Mundo Sombrio e O Exterminador do Futuro: Gênesis não são exatamente os melhores créditos para o IMDB. Porém, Taylor é um mestre no ramo da televisão e comandou alguns dos episódios essenciais de Família Soprano, então é apenas natural que seja ele quem comande o novo filme. É um trabalho seguro e que não se arrisca tanto, apenas quando a história toma alguns rumos surreais (algo que a série fazia de forma magistral) em relação a rumos do personagem de Nivola.
Não é fácil seguir uma obra-prima monumental, então não é surpresa alguma que Os Muitos Santos de Newark fique bem distante do nível da série da HBO. É uma forma inofensiva de revisitar alguns personagens, se divertir com fan service e testemunhar boas atuações (e imitações) dentro do universo de Sopranos. Não vai muito além disso, mas serve parar matar a saudade.
Os Muitos Santos de Newark (TMuitos Santos de Newark, EUA - 2021)
Direção: Alan Taylor
Roteiro: David Chase e Lawrence Konner
Elenco: Alessandro Nivola, Leslie Odom Jr., Michael Gandolfini, Vera Farmiga, Jon Bernthal, Corey Stoll, Michela De Rossi, Billy Magnussen, Ray Liotta, John Magaro, Michael Imperioli
Gênero: Drama
Duração: 121 min
https://www.youtube.com/watch?v=v42KSIVto_g
Crítica | Eternos é ambicioso, mas insuportável
Falando de forma totalmente pessoal, tenho um grande problema com a Marvel Studios. Sim, a gigante do cinema blockbuster reinventou a forma de se fazer negócios e contar histórias com filmes interconectados desde que Homem de Ferro iniciou a gigantesca franquia do MCU em 2008, abrindo a porta para inúmeros novos personagens e possibilidades de histórias originadas dos quadrinhos. Pelo menos, essa era a proposta no papel, já que os últimos 13 anos resultaram na criação de uma fórmula que raramente é mudada ou arriscada, onde o chefão Kevin Feige oferece (com algumas raras exceções) a mesma versão do mesmo tipo de filme, todas as vezes.
Eternos não é assim. Novamente apostando em personagens que certamente são desconhecidos para o público geral, o novo filme do estúdio tenta fugir da fórmula e das convenções do estúdio (e até mesmo do gênero no geral) ao lado de uma cineasta completamente autoral e premiada com o Oscar. É a melhor das intenções, e eu sou uma das pessoas que mais grita pela quebrada de regras no gênero, mas o resultado - infelizmente - é dolorosamente enfadonho e entediante.
A trama é ambientada “no começo”, como o letreiro inicial nos avisa, ao criar um panorama ancestral para a criação do Universo. Na ameaça de criaturas conhecidas como Deviantes, os divinos Celestiais dão origem aos Eternos, seres super-poderosos que têm como única função destruir os tais monstros e auxiliar diferentes civilizações em seus processos evolutivos. Na Terra, o grupo liderado pela sábia Ajak (Salma Hayek) acompanha toda a História da Humanidade e, milênios após sua primeira missão, são reunidos por Sersi (Gemma Archan) e Ikaris (Richard Madden) para combater uma misteriosa nova ameaça que coloca o destino do planeta em xeque.
Confusão narrativa em Eternos
É uma premissa extremamente ambiciosa e de proporções gigantescas, tanto que o roteiro fica a cargo de um batalhão quase tão grande quanto o dos personagens nos pôsteres. Além de Patrick Burleigh, Ryan Firpo e Katz Firpo, a diretora Chloé Zhao (de Nomadland) também tem um crédito em dobro no roteiro (algo extremamente incomum), o que talvez justifique todo o trabalho narrativo: ao mesmo tempo em que Eternos segue o grupo titular se reencontrando nos dias atuais, o longa aposta em uma série de flashbacks ao longo da História para acompanhar momentos chave na vida desses seres imortais; uma ferramenta de dramaturgia difícil de se acertar, e que também vem como uma novidade para o MCU.
Mas isso vem com um grande custo. Ao longo das mais de 2h30 de projeção, a experiência de Eternos se torna maçante e entediante enquanto o filme salta entre os períodos temporais. Praticamente todas as cenas ambientadas no passado são irrelevantes para o desenvolvimento da história, servindo apenas como “curiosidades” acerca do envolvimento dos personagens e as sementes de alguns conflitos entre eles - especialmente o conflito interno da Thena de Angelina Jolie que não faz o menor sentido em qualquer uma das linhas temporais.
Por exemplo, há um breve flashback onde vemos Phastos (o ótimo Brian Tyree Henry) devastado pela detonação da bomba atômica em Hiroshima. É um momento delicado e bem atuado, mas que não serve para nada: logo após a curtíssima cena, estamos de volta para a progressão no presente, que já tem seus problemas para lidar com toda a atrapalhada exposição (só faltou o Power Point) envolvendo a origem dos Eternos, o nascimento de Celestiais, explicar múltiplas vezes onde os Eternos estavam durante o conflito de Thanos, além de uma série de outros conceitos que desafiaram minha capacidade de permanecer acordado.
Elenco de peso
Com tanto tempo de projeção e possibilidades narrativas, Eternos garante erros e acertos com seu gigantesco elenco. A figura protagonista fica com Gemma Chan (que curiosamente já havia vivido um papel menor em Capitã Marvel), que se mostra uma atriz carismática e capaz de lidar com o drama e a responsabilidade de Sersi. Só é difícil comprar a relação amorosa que Sersi carrega com o apático Ikaris de Richard Madden, personagem que só se mostra um pouco mais interessante na segunda metade do longa - e que ao menos tem mais presença do que o bobalhão Kit Harington que fica refém das clássicas piadinhas Marvel.
Angelina Jolie infelizmente é completamente desperdiçada pelo drama bobo envolvendo sua Thena, enquanto suas habilidades de luta são substituídas por uma bonecona digital de péssima qualidade. Enquanto Kumail Nanjiani se especializa nas piadas sem graça que tem feito pela última década (apesar de protagonizar uma homenagem divertida a Bollywood), o coreano Ma Dong-seok (que roubou a cena em Invasão Zumbi) garante uma boa presença física na ação, mas quem realmente se destaca é a energética Lauren Ridloff como a velocista Makkari, Lia McHugh como a pequena Duende e o cada vez mais interessante Barry Keoghan como o desafiador Druig.
Oscarizados também erram
Quando chegamos ao trabalho de Zhao na direção, o resultado é um pouco mais complicado. Sim, ao lado do diretor de fotografia Ben Davis, a cineasta é bem feliz em trazer belíssimas imagens com paisagens naturais, pôr do sol e um olhar típico de western para os diversos diálogos e “encaradas" que seu volumoso elenco compartilha ao longo da narrativa; uma verdadeira pérola em meio à pobreza visual que assombra grande parte dos longas da franquia, e que Zhao também aproveita quando os membros do elenco protagonizam momentos mais intimistas e carregados por emoção.
Infelizmente, Zhao se mostra bem mais amadora quando Eternos parte para a ação, apresentando uma mise en scene confusa, perdida e dependente de efeitos visuais pedestres que me trouxeram flashbacks da luta de Neo contra o exército de Smiths em Matrix Reloaded (mas sem a criatividade das irmãs Wachowski, diga-se de passagem). Não ajuda também que os principais oponentes dos Eternos, os Deviantes, sofram do design pobre e sem qualquer imaginação que assola produções do gênero na Hollywood contemporânea: quando as criaturas enfrentam os heróis, é uma verdadeira cacofonia visual de pixels e imagens escuras. Nem mesmo o compositor Ramin Djawadi consegue levantar um ânimo em tais sequências.
Fico realmente feliz que a Marvel Studios tenha se arriscado com algo ousado e diferente com Eternos. O resultado acabou sendo uma das obras mais irregulares e difíceis de se assistir até o final que o estúdio já fez, se perdendo entre sua ambição cósmica, belas paisagens e um elenco que é mais ou menos bem aproveitado. É um filme bem problemático, cujo maior elogio que posso fazer, é o fato de que definitivamente não é um genérico.
Eternos (Eternals, EUA - 2021)
Direção: Chloé Zhao
Roteiro: Chloé Zhao, Patrick Burleigh, Ryan Firpo, Kaz Firpo
Elenco: Gemma Chan, Richard Madden, Angelina Jolie, Salma Hayek, Kumail Nanjiani, Brian Tyree Henry, Richard Madden, Lia McHugh, Lauren Ridloff, Barry Keoghan, Ma Dong-seok, Bill Skarsgard
Gênero: Aventura
Duração: 154 min
https://www.youtube.com/watch?v=lRrSFvZUgGw
Os Muitos Santos de Newark, filme de Família Soprano, chega em novembro na HBO Max
Foi anunciado oficialmente nesta sexta-feira (29) que Os Muitos Santos de Newark (The Many Saints of Newark) terá sua estreia no Brasil diretamente na HBO Max, em 5 de novembro.
Confira o trailer legendado abaixo.
O filme é um prelúdio da elogiada série Família Soprano, acompanhando a trajetória do mafioso Dickie Moltisanti (Alessandro Nivola) e sua relação com o jovem Tony Soprano (Michael Gandolfini).
O elenco conta também com Vera Famiga, Jon Bernthal, Corey Stoll, Leslie Odom Jr. e Ray Liotta. David Chase (criador da série) escreve o filme, que tem direção de Alan Taylor (Thor: O Mundo Sombrio).
Os Muitos Santos de Newark estreia na HBO Max em 5 de novembro.
https://www.youtube.com/watch?v=v42KSIVto_g
Indiana Jones 5 é adiado para 2023
A Disney sacudiu seu calendário de estreias na manhã desta segunda-feira (18), e um dos filmes mais afetados foi a quinta aventura de Indiana Jones. O longa de James Mangold teve sua estreia adiada em quase 1 ano.
Anteriormente marcado para julho de 2022, o filme estrelado por Harrison Ford agora só estreia em 30 de junho de 2023.
Além de Ford, o novo Indiana Jones conta com Phoebe Waller-Bridge, Antonio Banderas, Mads Mikkelsen e Boyd Holbrook no elenco. É o primeiro filme da franquia que não tem Steven Spielberg na direção, contando com James Mangold (Ford vs Ferrari, Logan) como substituto.
Ainda sem título, Indiana Jones 5 estreia nos cinemas em 30 de junho de 2023.
Patrulha do Destino é renovada para 4ª temporada na HBO Max
Durante o evento ao vivo do DC Fandome, foi anunciado que a série Patrulha do Destino terá uma quarta temporada na HBO Max!
A novidade veio de um vídeo gravado pelo próprio elenco, que pode ser visto na terceira temporada, atualmente em exibição.
O elenco da série da DC conta com Diane Guerrero, April Bowlby, Jovian Wade, Matt Bomer e Brendan Fraser.
A 4ª temporada de Patrulha do Destino ainda não tem data de estreia confirmada.
Aquaman e o Reino Perdido tem primeiras cenas reveladas no DC Fandome
Durante o evento ao vivo do DC Fandome neste sábado (16), o vindouro Aquaman e o Reino Perdido, continuação do bem sucedido primeiro filme do herói de Jason Momoa, foi destaque de um dos painéis.
O vídeo mostra diversos momentos de bastidores e das filmagens, além de alguns vislumbres de cenários e novos visuais dos personagens, com destaque para o Arraia Negra de Yahya Abdul-Mateen II.
Confira abaixo.
O elenco traz de volta Jason Momoa, Amber Heard, Yahya Abdul-Mateen II, Patrick Wilson, Randall Park e Nicole Kidman. James Wan retorna para dirigir.
Aquaman e o Reino Perdido estreia nos cinemas em 15 de dezembro de 2022.
https://www.youtube.com/watch?v=gTJ1MrSjO1E
Dwayne Johnson poderoso em cena de Adão Negro revelada na DC Fandome
Durante o evento ao vivo da DC Fandome neste sábado (16), o primeiro vislumbre do aguardado novo filme do Adão Negro foi divulgado. O clipe mostra Dwayne Johnson como o anti-herói da DC, além de vislumbres das filmagens e entrevistas com o elenco.
Confira abaixo.
Além de Johnson, o elenco conta com Pierce Brosnan, Noah Centineo, Aldis Hodge, Sarah Shahi e Quintessa Swindell.
Jaume Colett-Serra (Jungle Cruise) dirige o filme.
Adão Negro estreia nos cinemas em 28 de julho de 2022.
https://www.youtube.com/watch?v=xjyHvajaScI
Crítica | Duna é um espetáculo sem muita profundidade
Duna é um dos casos de amor mais complexos do cinema. Desde que Frank Herbert lançou seu revolucionário romance de ficção científica em 1965, Hollywood buscou formas de levá-lo para as telas. Quase aconteceu pelas mãos do cineasta surrealista Alejandro Jodorowsky na década de 70, rendeu uma adaptação bem terrível pelas mãos do talentoso David Lynch em 1984 e até foi parar na TV com uma minissérie do canal SyFy, estrelada por James McAvoy. Mas nenhuma delas fez justiça ao poder do livro.
Eis que a estrela em ascensão Denis Villeneuve entra no jogo. Após se consolidar como um dos grandes autores de sua geração, em filmes como Os Suspeitos, Sicario: Terra de Ninguém, A Chegada e Blade Runner 2049, o cineasta franco-canadense encara seu maior desafio com esta nova e revitalizada empreitada de Duna nas telas do cinema. O resultado é sem sombra de dúvida a melhor tentativa até agora.
A trama comporta metade do primeiro livro de Herbert, apresentando-nos ao jovem Paul Atreides (Timothée Chalamet), herdeiro de uma das famílias mais influentes da galáxia. Quando seu pai, Leto (Oscar Isaac) recebe a função de administrar o planeta Arrakis, que abriga uma valiosa substância que permite viagens interestelares, toda a família se muda para o desértico planeta. Porém, dado o interesse geral nessa grande duna, os Atreides logo se encontram à beira de um conflito delicado com os habitantes do deserto, os Fremen, e também a hostil família Harkonnen, chefiada pelo grotesco Barão (Stellan Skarsgard).
Duna O Guia da Enciclopédia das Galáxias
Duna definitivamente não é um projeto fácil. Apesar de podermos encontrar facilmente diversos elementos de sua narrativa em obras como Star Wars, o que a obra original de Herbert oferece é uma análise profunda, biológica e metafísica sobre elementos mais “plásticos" da ficção científica. Escrevendo o roteiro em conjunto com Eric Roth e Jon Spaihts, Villeneuve passa boa parte da primeira metade da projeção explicando e elaborando uma série de conceitos: desde a natureza tecnológica dessa sociedade futurística até o funcionamento de trajes, seitas religiosas, habilidades sobrenaturais e profecias ancestrais que tomam emprestadas diversos termos árabes. É uma grande exposição, e arrisco a dizer que o roteiro de Duna é mais sobre o funcionamento de coisas do que o desenvolvimento delas, o que pode ser algo muito maçante para os não familiarizados com o universo da saga. Confesso que, até para um conhecedor, o processo fica repetitivo.
Isso certamente garante um aprofundamento emocional bem limitado. Confesso que só me importava com os personagens dado ao conhecimento prévio do livro, e temo que alguém não familiarizado com a obra possa se sentir distanciado. Apesar da clássica jornada do herói “predestinado" estar presente ali, não garante nenhum impacto grandioso em quesitos emocionais, nem mesmo quando alguns personagens importantes que acabam encantando meramente pelo carisma de seus intérpretes sofrem destinos trágicos. Sempre discordei da crítica de que os filmes de Villeneuve eram "frios", mas em Duna isso é inegável.
É grande mérito de Timothée Chalamet conseguir entregar uma performance bem convincente e carismática considerando o material técnico. A pressão de ser um grande líder está sempre evidente no rosto bem expressivo do jovem ator, que não deixa ninguém roubar a cena. Oscar Isaac, Jason Momoa e Josh Brolin estão todos ótimos como os "role models" masculinos de Paul, enquanto Rebecca Ferguson oferece uma performance apropriadamente alienada e durona para sua mãe, Lady Jessica.
E, apesar da participação reduzida, a britânica Sharon Duncan-Brewster consegue ser o grande destaque entre os coadjuvantes. Na pele da Dra. Liet Kynes (que no livro era um homem), a atriz confere uma áurea de mistério e sabedoria para a ecologista imperial, sendo também muito mais eficiente em lidar com exposição do que outras ferramentas do roteiro. Dou grande destaque também para Stellan Skarsgard, completamente asqueroso como o monstruoso Barão Harkonnen, que eu espero ter mais destaque na segunda parte da adaptação.
Tecnicamente perfeito
O grande trunfo do novo Duna é certamente em quesitos plásticos. O design de produção é excepcional na proposta de oferecer um olhar sóbrio e moderno para castelos, salas e espaçonaves desse universo, ao mesmo tempo em que um inconfundível camp da década de 80 é bem visível em alguns capacetes cartunescos ou trajes espalhafatosos: o equilíbrio perfeito. Seja em locações reais ou artificiais, os efeitos visuais são utilizados de forma orgânica e sempre complementares a seus ambientes, garantindo uma obra tecnicamente perfeita em todos esses quesitos visuais.
E quando chegamos à fotografia de Greig Fraser, há muito o que se elogiar. As tomadas que registram imagens dos personagens pelos desertos que dão nome ao filme são lindíssimas, e ganham ainda mais textura durante as imagens captadas no frame estendido do IMAX. Fraser também é criativo no uso de objetos futuristas que lhe garantem fontes de luz, como o “ring light flutuante” que acompanha as feiticeiras da ordem Bene Gesserit ou o revestimento amarelado de um dos veículos voadores chamados de ornicópteros, que garantem uma atmosfera forte para uma cena envolvendo Paul e sua mãe. Minha única crítica a Fraser vai para uma cena climática envolvendo o icônico verme de areia gigante, que é completamente prejudicada pela falta de iluminação: é simplesmente escuro demais, mesmo para uma cena noturna, chegando a esconder o visual da criatura dentuça.
Quanto à direção de Denis Villeneuve, não há dúvidas de que o cineasta é realmente talentoso. Já havia ficado bem claro em Blade Runner 2049 seu olhar para criar quadros lindíssimos que valorizam o tamanho de uma tela de cinema e diferenças espaciais de grande escala. Não é diferente em Duna, ainda mais considerando que um planeta inteiro é o centro das atenções da história. É um deleite para os olhos, especialmente nas visões enigmáticas que Paul tem do futuro, mas algo que também havia sido uma suspeita em seu trabalho com Blade Runner se confirma aqui: Villeneuve é ótimo com atmosfera, mas não é exatamente um bom condutor de ação.
Não que Duna esteja mais interessado em ação do que em seus temas metafísicos, mas considerando que o novo filme tem tantas cenas do gênero, chega a ser decepcionante. Ainda que contem com belos enquadramentos e iluminações diversas, Villeneuve é pouco imaginativo na forma como orquestra perseguições, embates e lutas corporais: há uma sequência envolvendo Jason Momoa lutando em um corredor repleto de espadachins que consegue ser sem qualquer energia ou senso de urgência, assim como uma cena completamente virtual em que acompanhamos uma nave dando piruetas enquanto foge de explosões. Nada empolgante, e infelizmente bem burocrático do ponto de vista do espetáculo, que só ganha um pouco de charme graças à energética trilha sonora de Hans Zimmer. Nem todos são como James Wan em Aquaman, afinal.
Há também toda a questão do final. Sim, sabemos que a proposta de Villeneuve com a Warner Bros e a Legendary é a de uma adaptação em duas partes da obra de Frank Herbert. Porém, esta primeira parte não se sustenta sozinha como um filme único, acabando abruptamente em um cliffhanger que ainda tem a sem vergonhice de declarar que "é apenas o começo". Para fins de comparação, a primeira parte da adaptação dupla de It: A Coisa de Andy Muschietti era um filme completo, independente de continuações ou não. Já Duna permanecerá como apenas uma parte de algo maior ainda por vir.
A adaptação de Denis Villeneuve para Duna é um feito e tanto. Com um design impressionante e uma escala que merece a tela grande, o longa merece ser lembrado como um dos mais caprichados dos últimos anos. Só é uma pena que a conexão com a história e seus personagens seja tão superficial e perdida em meio a conceitos complexos e dependentes de uma grande mitologia. Torcer pela Parte 2, agora.
Duna (Dune, EUA - 2021)
Direção: Denis Villeneuve
Roteiro: Denis Villeneuve, Eric Roth e Jon Spaihts, baseado na obra de Frank Herbert
Elenco: Timothée Chalamet, Rebecca Ferguson, Oscar Isaac, Zendaya, Stellan Skarsgard, Josh Brolin, Jason Momoa, Javier Bardem, Dave Bautista Sharon Duncan-Brewster, Stephen McKinley Henderson, Che Chang, Charlotte Rampling
Gênero: Ficção Científica
Duração: 152 min
https://www.youtube.com/watch?v=hfLkFZWFmLM&t=3s
Michael Myers vive! O Ranking da franquia Halloween do pior ao melhor
Quando Michael Myers voltou para casa em 31 de outubro de 1978, o cinema de terror americano ganhava um marco eterno. A franquia Halloween se estabelecia como uma das mais populares do gênero slasher, e inspirou diversos "seguidores" a criarem seus próprios monstros em inúmeras outras franquias.
Não sempre um sucesso fácil, a franquia teve seus muitos altos e baixos, contando com reboots, retcons, remakes e tudo o que você pode imaginar. Assim, trazemos aqui nosso ranking de todos os filmes da saga, começando do pior ao melhor.
Confira:
12. Halloween 6: A Última Vingança (1995)
É um daqueles casos de "o que diabos os roteiristas fumaram nessa?". Tentando desesperadamente amarrar os eventos de todos os filmes envolvendo Michael Myers, A Última Vingança descamba para o ridículo ao apostar em seitas macabras e maldições que justifiquem os "poderes" de Michael e sua habilidade implacável, mas jamais funciona de forma efetiva. Pior ainda é ver a personagem de Jamie Lloyd porcamente resolvida, além de um Paul Rudd risível em um de seus primeiros papéis.
11. Halloween 5: A Vingança de Michael Myers (1989)
Com Michael Myers fazendo sucesso em seu retorno no filme anterior, os produtores jogam no seguro e entregam um dos filmes mais sem graça e descartáveis da franquia. A Vingança de Michael Myers carece de uma boa direção, de personagens cativantes e ainda oferece a péssima ideia de criar uma conexão neural entre Jamie e o assassino. Acho que isso diz tudo, certo? Próximo.
10. Halloween: O Início (2007)
Michael Myers entra na era dos remakes pelas mãos de Rob Zombie, que se propõem a uma abordagem mais psicológica e violenta sobre a infância e crescimento do assassino. Há elementos interessantes e aqui e ali, com destaque para o bom retrato de Malcolm McDowell como Samuel Loomis, mas no mais, é apenas um exploitation de mal gosto. É difícil decidir se Zombie é pior diretor ou roteirista, algo que fica mais evidente quando a trama avança e simplesmente oferece uma cópia mal feita do filme original. Mas é definitivamente o mais sangrento.
9. Halloween 2 (2009)
Na segunda incursão de Zombie nos eventos de Haddonfield, as coisas saem um pouquinho melhor. Sem interesse em repetir a trama dos anteriores, o diretor e roteirista tenta mergulhar ainda mais fundo na cabeça de Michael Myers, oferecendo sequências oníricas onde o assassino é guiado pelo espírito sinistro de sua mãe - o que garante boas resoluções visuais. Infelizmente, são pequenos momentos em um filme que ainda carece de uma condução digna, e nem quero imaginar como Jamie Lee Curtis deve ter reagido ao ver o que foi feito de Laurie Strode nessa versão.
8. Halloween III: A Noite das Bruxas (1982)
O famoso filme sem Michael Myers, após uma proposta da Universal em apostar no formato de antologia, tem a melhor das intenções. É uma trama assumidamente B e pulp, que parece ter saído de uma ideia rejeitada para Além da Imaginação, e que acerta na ambientação do Dia das Bruxas e teorias da conspiração envolvendo grandes corporações. Porém, é um roteiro fraquíssimo e povoado por personagens insuportáveis e que não consegue abraçar todo o potencial da proposta maluca.
7. Halloween: Ressurreição (2003)
Provavelmente em uma posição mais alta do que comparada a outras listas por aí, devo dizer que Ressurreição não merece todo esse hate. É um dos poucos filmes da saga que realmente tenta algo novo com Michael Myers, enfim livrando-se do arco de Laurie Strode e seus descendentes, para experimentar algo mais próximo de uma comédia sombria ao apostar em um reality show sendo sabotado pela presença súbita do assassino. É um roteiro fraco e com personagens insuportáveis, mas o conceito e a direção de Rick Rosenthal tornam a experiência um bom guilty pleasure.
6. Halloween H20: Vinte Anos Depois (1998)
Beneficiando-se do retorno de Jamie Lee Curtis ao papel de Laurie Strode, H20 traz o toque do terror mais self aware de Pânico em uma trama que celebra o aniversário do clássico de Carpenter. Ainda que não traga nada necessariamente novo (e o jovem Ethan Hawke seja absolutamente insuportável), é divertido por trazer Curtis de volta e ignorar toda a maluquice dos capítulos anteriores.
5. Halloween Kills: O Terror Continua (2021)
Após uma retomada de respeito com a madura e bem pensada reinvenção de 2018, a Blumhouse e o diretor David Gordon Green continuam seu legado. Ainda que Halloween Kills careça de personagens mais carismáticos e deixe Laurie Strode de escanteio, ainda oferece ótimos momentos de suspense e uma análise interessante sobre a "fúria das multidões" ao oferecer a simples ideia de Haddonfield se unindo para lutar com Michael Myers. Um filme imperfeito, mas eficiente.
4. Halloween II: O Pesadelo Continua! (1981)
Arriscando-se a continuar uma trama perfeitamente fechada e atmosférica, Rick Rosenthal e a Universal não fazem feio com a primeira continuação da franquia. Claro, falta a direção elegante de John Carpenter e o fator surpresa impossível de se replicar, mas toda a atmosfera em torno do hospital sombrio, o senso de imediatismo por termos uma continuação direta e a excelente performance de Jamie Lee Curtis fazem valer a visita.
3. Halloween 4: O Retorno de Michael Myers (1988)
Mesmo que seja uma reciclagem de outras ideias da concorrência – e nem de longe se equipare ao brilhantismo do original – O Retorno de Michael Myers é uma boa continuação. É eficiente em atualizar e trazer novas ideias para o mesmo conceito claustrofóbico e da noite de Halloween, ao mesmo tempo em que oferece rimas inteligentes com seu primogênito. Mas o grande acerto fica mesmo com a pequena Danielle Harris, que faz um excelente trabalho ao fornecer empatia a uma personagem que tinha tudo para parecer forçada, mas que segue com honra o legado de Jamie Lee Curtis.
2. Halloween (2018)
Isso mesmo. A nova empreitada de David Gordon Green e Danny McBride é a melhor coisa que Michael Myers teve nos últimos 40 anos, com o novo filme fazendo um bom trabalho ao explorar o trauma de Laurie Strode e sua recuperação para enfrentar o assassino da Forma mais uma vez. É um filme imperfeito, que sofre com alguns clichês e subtramas desnecessárias, mas que acerta em cheio no retrato antagônico dos dois protagonistas - que se tornam faces opostas de uma mesma moeda.
1. Halloween: A Noite do Terror (1978)
Não tinha como ser outro. Mesmo 40 anos depois, Halloween: A Noite do Terror permanece como um dos clássicos definitivos para o gênero do terror. Popularização do slasher e de recursos narrativos valiosos, o filme de John Carpenter ilustra as infinitas possibilidades de se realizar algo de qualidade com recursos limitados, tendo a criatividade e uma visão sofisticada como força motriz. Um clássico absoluto do terror americano, e que para sempre será uma referência a jovens cineastas.
Concorda com a nossa lista? Tá todo mundo louco? Comente abaixo qual é o seu Halloween preferido!
45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo | Cobertura
Após um ano de pandemia e muitos desafios, a 45ª Mostra Internacional de São Paulo chega com muitas novidades. Há filmes de diferentes tons, gêneros e nacionalidades para os mais variados gostos possíveis.
Aqui, reuniremos todas as críticas da cobertura do Bastidores do maior evento de Cinema do estado de São Paulo!
Confira.
Assim Como no Céu
Publicado originalmente em 29 de outubro de 2021
Armugan
Publicado originalmente em 13 de outubro de 2021
Bob Cuspe: Nós Não Gostamos de Gente
Publicado originalmente em 20 de outubro de 2021
As Bruxas do Oriente
Publicado originalmente em 15 de outubro de 2021
O Cão que Não se Cala
Publicado originalmente em 25 de outubro de 2021
Capitães de Zaatari
Publicado originalmente em 27 de outubro de 2021
Coisas Verdadeiras
Publicado originalmente em 14 de outubro de 2021
O Compromisso de Hasan
Publicado originalmente em 22 de outubro de 2021
Deserto Particular
Publicado originalmente em 14 de outubro de 2021
Eu Vejo Você em Todos os Lugares
Publicado originalmente em 27 de outubro de 2021
Um Forte Clarão
Publicado originalmente em 15 de outubro de 2021
A Garota e a Aranha
Publicado originalmente em 23 de outubro de 2021
Um Herói
Publicado originalmente em 20 de outubro de 2021
Higiene Social
Publicado originalmente em 12 de outubro de 2021
I Comete: Um Verão na Corsega
Publicado originalmente em 15 de outubro de 2021
Os Inventados
Publicado originalmente em 15 de outubro de 2021
Lidando com a Morte
Publicado originalmente em 13 de outubro de 2021
Lingui
Publicado originalmente em 29 de outubro de 2021
Lua Azul
Publicado originalmente em 20 de outubro de 2021
Madeira e Água
Publicado originalmente em 15 de outubro de 2021
Mar Infinito
Publicado originalmente em 25 de outubro de 2021
Na Prisão Evin
Publicado originalmente em 29 de outubro de 2021
No Táxi do Jack
Publicado originalmente em 14 de outubro de 2021
Noite Passada em Soho
Publicado originalmente em 21 de outubro de 2021
Pedregulhos
Publicado originalmente em 23 de outubro de 2021
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